[sempre de acordo com a antiga ortografia]

quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Luminárias hipócritas

Mais uma vez, venho abordar o tema das luminárias natalícias cujos objectivos de animação do espaço urbano me permito duvidar. Reparem que recorri ao verbo duvidar porque, apesar de se tratar de domínio tão luminoso, prevalece a penumbra da incerteza em relação a hipotéticos benefícios. Assim sendo, prefiro ser comedido e deixar para os autarcas as positivas avaliações do costume, a eles que, mesmo à noite, observam o que lhes convém com óculos cor de rosa.
Embora, em Notas Diárias da passada segunda-feira, já me tenha pronunciado com uma ou outra consideração de ordem estética, manifestando a minha perplexidade quanto à ligeireza como os responsáveis camarários autorizam a instalação de dispositivos decorativos luminosos de tão baixo nível, ainda gostaria de chamar a atenção para o que acontece à luz do dia.
É que, para além de não ter alternativa e, mal o Sol se põe, ser obrigado a tolerar a exibição de tão duvidosa, mas flagrante, falta de gosto, assisto à sistemática hostilidade diurna de estruturas metálicas impositivas, invasoras, agrestes, extremamente desagradáveis. Aço, metal brilhante, apontando ao alto mas bem à altura dos olhos, não há como escapar-lhes na Heliodoro Salgado. Como não tenho qualquer motivo para autopunição ou penitência, apenas conheço o que se passa na Estefânea e Vila Velha. Pela amostra, imagino o resto...


Por outro lado, também gostaria que me acompanhassem em brevíssima observação da prática decorativa que consiste no sublinhar das linhas dos monumentos com milhares de lâmpadas. Enquanto testemunhos de um património que importa respeitar e saber mostrar, devem eles suportar esta performance? A dignidade monumental joga com tal manifesto de provinciano exibicionismo? Ou não será que preferem atitudes de sábia e sofisticada iluminação, a que nos habituaram os casos dos Jerónimos e Aqueduto das Águas Livres, em Lisboa, só para citar dois dos mais conhecidos?


Quem terá convencido certos decisores de que os objectos assim sublinhados ganham alguma coisa com tal prática? Bem sei que algumas destas soluções são importadas. Mas isso, o facto de ser prática no estrangeiro, continua a ser argumento? Ou será que tanta luz ofusca o discernimento?
Pó debaixo do tapete...
Em terra onde tanto há que fazer no sentido de a limpar das horríveis mazelas que escancara todos os dias para nosso desgosto e vergonha, estas luminárias têm o condão de reforçar a ofensa. As tais centenas de milhar de lâmpadas funcionam como perfeito simulacro de que tudo, à superfície, está aparentemente bem, mais não fazendo que, afinal, reproduzir a táctica da dona de casa porca e relaxada que atira para debaixo do tapete a sujidade que por lá abunda...
Só no que se refere à questão da iluminação, na sede do concelho, nem sequer faltam à Câmara Municipal de Sintra motivos de preocupação. Para além de a edilidade jamais ter decidido manter a unidade do modelo de candeeiro que mais convém,* a evidente falta de iluminação pública constitui inquestionável factor de insegurança em determinadas zonas. O que se passa entre a Regaleira e Seteais é flagrante exemplo do que não deveria acontecer. Infelizmente, são inúmeros os casos em São Martinho, São Pedro, Santa Maria e São Miguel.
Como se tudo isto já não constituísse um ramalhete bem recheado, acresce o recentíssimo facto de, dia sim, dia sim, ocorrerem inoportunos, desagradáveis e sistemáticos cortes de corrente na Estefânea, por causas atribuíveis à sobrecarga das luminárias e/ou incorrecta manipulação das linhas eléctricas pelo pessoal que as instalou. Já no ano passado se verificou a mesma situação e, como de costume, ninguém vem a público dar a mínima satisfação.


Ah como tresanda a hipocrisia a mensagem que Sintra (qual Sintra?) pendurou nas rotundas!
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* Em 5 de Agosto de 2005, o Jornal de Sintra publicava um artigo que subscrevi subordinado ao título Volta do Duche volta a dar que falar no qual identifiquei, sem pretender ser exaustivo, dez diferentes modelos de candeeiros de iluminação pública, só entre a Estefânea e a Regaleira!... É admissível a existência de várias tipologias, todavia coerentes com as características da zona, do bairro. Ou não passará tudo de bizantinice do escrevente?

2 comentários:

Anónimo disse...

Acompanho o seu blogue co interesse mas acho tudo muito sério.
As luminárias como o senhor lhes chama, alegram Sintra nesta quadra do Natal. É assim em todo o lado e Sintra não podia ser diferente. Tristezas já chega as que temos. O melhor é divertir-se e não levar tudo tão a sério.

Sintra do avesso disse...

Olhe,provavelmente, o melhor será não frequentar estas páginas. Já deve ter percebido que, neste blog,a seriedade dos assuntos e das suas abordagens não é incompatível com uma pitada de humor, de ironia. Pelos vistos, estará interessado no barulho das luzes... Como diz o outro, ele há gente para tudo!

Passe bem.