[sempre de acordo com a antiga ortografia]

sexta-feira, 18 de janeiro de 2008





Recomendação

Se tiverem lido os textos que preencheram as páginas deste blogue nos últimos quatro dias, terão percebido o alto apreço que nutro pelo meu fraternal amigo e companheiro de ideais António Arnault. Efectivamente, de há muitos anos a esta parte, ele é para mim uma verdadeira referência e paradigma da impoluta figura de político que soube e sabe servir o povo sem jamais se servir em benefício próprio.

É este homem de fortes convicções, discretíssimo, lutador, cuja atitude de intervenção cívica é cúmplice de Raul Rego, Fernando Vale e, muito mais remotamente, por exemplo, de Fernandes Tomás - o “patriarca da Liberdade Portuguesa” hoje em dia tão injustamente esquecido e quase desconhecido – que, recentemente, escreveu e publicou um romance cuja leitura pretendo recomendar.

Rio de Sombras é uma obra de ficção, cuja trama se serve de manifestas menções autobiográficas, umas vezes mais explícitas e, noutros casos, insinuadas ou implícitas, num quadro de referências ante e post Vinte e Cinco de Abril, que se inscreve num relativamente recente conjunto de obras da Literatura Portuguesa, testemunho do desencanto que afecta todos os grandes visionários, uma vez desrespeitados, aviltados e abastardados os mais fascinantes ideais.

Na recensão crítica a esta obra, que Eugénio Montoito escreveu e o Jornal de Sintra publicou na edição do passado dia 11, pode ler-se que “(…) Sem pretender ser um romance histórico ou um romance sociológico, os retratos ficcionados são demonstrativos das realidades comportamentais e mentais de dois momentos distintos, mas contíguos, na cronologia histórica das três últimas décadas do século passado (…) Alguns episódios, politicamente caricatos, ilustram a narrativa dando-lhe a autoral irreverência anunciada e, em paralelo, demonstram as fragilidades do sonho e o descaminho da vontade inicial”.

Vão por mim. Leiam Rio de Sombras (Coimbra Editora) e verão como bem escreve um grande senhor, cujo fino trato das letras se descortina a cada passo, numa poética do desacerto de dias de desvario, de insanidade e incompetência, enquanto o regime democrático se debilita e desacredita, num espesso quotidiano de incomodidades e desconfortos que só os mais lúcidos habitam.

NB:

Para participar na Mozartwoche, o festival mais célebre do mundo exclusivamente relacionado com Mozart, estou de partida para a minha habitual deslocação a Salzburg, nesta altura do ano, donde regressarei a 5 de Fevereiro. Durante quase vinte dias, vou assistir a dezenas de concertos, recitais, récitas de ópera, exposições, conferências, filmes, trabalharei o que puder na Biblioteca Mozartiana da Fundação Internacional do Mozarteum de que sou membro.

Vai ser um tempo de exclusiva dedicação a Mozart e aos meus amigos desta cidade que, há tantos anos me tem cativo. Como habitualmente, publicarei no Jornal de Sintra as minhas impressões. Agora, com o sintradoavesso a funcionar, não vos dispensarei deste mesmo assunto nas Notas Diárias que, portanto, só voltarão depois do Carnaval.

quinta-feira, 17 de janeiro de 2008



Pouca saúde
(conclusão)




Há muitas maneiras de um herdeiro não ser digno da herança. Ainda faltava esta destruição do SNS, com base em contas de sumir, tentando convencer os cidadãos de que se procede a uma justa, equilibrada distribuição de recursos… Então não se delapidaram milhões em supérfluos estádios de futebol? Não se prepara o Governo para gastar milhares de milhões em submarinos tão desnecessários quanto os precedentes recintos desportivos?

Ainda a propósito, não esteve o actual Governo à beira de desperdiçar milhares de milhões, se tivesse adoptado para o aeroporto de que Lisboa carece, a solução encarniçadamente defendida por um Senhor Ministro dos Transportes que ainda mais ridículo se tornou que os seus igualmente rebarbativos e substituíveis colegas da Economia, da Cultura, da Educação ou do Ambiente?

Acabava de ser anunciada a solução Alcochete e, sem que tivesse sido convenientemente explorada a hipótese Portela mais um – que a muitos se evidencia como a mais interessante e económica - e logo se atirava para as parangonas dos jornais com a (duvidosa, muito duvidosa…) necessidade de construção da ponte Chelas-Barreiro. Caramba! Isto é que é vontade de fazer negócio…

Se nos lembrarmos de que outra frente de controvérsia se abriu com a (duvidosa, muito duvidosa...) necessidade de instalação da linha de alta velocidade ferroviária ligando Lisboa a Madrid, que jamais poderá concorrer com os preços das ligações aéreas, especialmente com o advento das low cost, então temos um ramalhete de disparates que brada aos céus.

Pena é que a anestesia geral não permita a adequada resposta por parte dos cidadãos. Infelizmente, poderíamos continuar a enunciar uma lista de intermináveis burrices ministeriais. É o que bem pode designar-se como um Governo assaz representativo de uma classe política com pouca saúde...

quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

Pouca saúde (III)



Outra gente, outra cultura…

Certo é que no mesmo domínio mas pisando terreno diametralmente oposto, está o autor da Lei do Serviço Nacional de Saúde, o meu fraternal amigo e companheiro de lutas António Arnault, homem de inatacáveis princípios do Socialismo mais genuíno, grudados à maçónica tríade da Liberdade, Igualdade e Fraternidade, que todos os não maçons professam porque estão na base dos Estados Democráticos de Direito.

Pela Liberdade, pela Igualdade e pela Fraternidade, durante o II Governo Constitucional, liderado pelo então Primeiro Ministro Mário Soares, António Arnault concebeu, apresentou, fez votar e implementou aquele que acabou por se revelar um dos mais nobres objectivos saídos do Vinte e Cinco de Abril.

Pouco mais tarde, desiludido com o torvelinho do oportunismo, da traficância política, da feira de vaidades, remeteu-se a uma discreta mas, de qualquer modo, vida sempre activa em termos da cidadania de intervenção. É assim que, aliás, deve ser entendida a sua candidatura e eleição como Grão Mestre da Maçonaria Portuguesa, Grande Oriente Lusitano, precedendo António Reis, o actual GM.

Enfim, tristes asneiras…

Não deixa de ser curioso e também sintomático que o Governo de José Sócrates, sustentado pela mesma força partidária – um Partido Socialista que, no entanto, actualmente, subsiste à revelia dos seus valores matriciais – afinal, se posicione como coveiro, procedendo ao desmantelamento de uma das suas mais generosas realizações, o Serviço Nacional de Saúde.


(Continua)

terça-feira, 15 de janeiro de 2008

Pouca saúde (II)


Todos os media têm dado natural e evidente espaço às notícias sobre o descontentamento de um já incontável número de lugares, freguesias, vilas e cidades de Portugal que viram subtraídos, dos seus habituais serviços de referência, enquadrados pelo Ministério da Saúde, os que lhes têm sido acessíveis, no âmbito do Serviço Nacional de Saúde.


Pretensamente, na defesa dos interesses da comunidade e, tão sistematicamente quanto seria de prever, a partir da sua abordagem de contabilista [recuso-me a designá-la como estratégia, que é coisa bem mais sofisticada…], o Senhor Ministro da Saúde tem-se permitido suprimir serviços de proximidade de cuidados de saúde, que contribuíam para um mínimo de conforto dos utentes.


Ao serviço de uma falaciosa argumentação de defesa dos interesses do Estado que, naturalmente, no caso do actual Governo, privilegia a régua, o esquadro e o relógio em cima do cego mapa das estradas, em vez de judiciosas decisões de carácter efectivamente político - que os eleitores tinham o direito de esperar - e, ao arrepio do que determina a própria Constituição da República, o Senhor Ministro da Saúde está a fazer história e até é capaz de ficar na História, infelizmente, pelas piores razões.

(Continua)

segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

Pouca saúde (I)

Dia após dia, semana a semana, lendo a imprensa, tanto a de âmbito local como nacional, diária e hebdomadária, escutando e olhando a comunicação social audiovisual, cada vez mais se instala a sensação, transformada certeza, de que é inequivocamente muito medíocre e, por vezes, declaradamente má a qualidade dos eleitos para o desempenho de cargos políticos.

De admirar seria a presença de quadro diferente já que, na sequência de campanhas eleitorais conduzidas por eficazes publicitários - que tanto promovem a venda do dentífrico ou do preservativo como a do candidato ao parlamento ou à autarquia - os deputados e eleitos locais continuam constituindo uma classe política cuja educação, preparação cultural e conhecimentos básicos, para além do perfil do substrato sociocultural de origem, salvo raras excepções, se tem mantido mais ou menos inalterada de há muitos anos a esta parte.

Questão altamente preocupante e sintomática da situação actual é a flagrante e insidiosa adulteração da noção de Serviço Público. Do nobre exercício de desinteressada entrega à causa do bem comum, não raro, escorregam os políticos de todas as escalas e quadrantes, para a prática de ambíguos actos, pretensamente favoráveis à cobertura dos interesses da generalidade dos cidadãos.

E, afinal, o que mais se tem apontado aos actores desta classe política, a quem o povo não tem sabido devolver, com a dignidade e eficácia que se impõe, as múltiplas razões de queixa? Mesquinhos propósitos de protagonismo individual? Defesa dos próprios interesses particulares ou do partido político a que pertencem? Vaidade pessoal? É possível. E tanto mais possível quanto, entre nós, não se exerce e, muito menos, se fomenta a intervenção cívica que poderia contribuir para o controlo do Serviço Público decorrente da actividade dos eleitos.

Serviço Nacional de... quê?

Após uma semana particularmente fértil em políticos desacertos e desconcertos, em quase todos os domínios, mas particularmente evidentes nos da Economia, Transportes e Comunicações, Segurança Social e Saúde, estou certo de que vão compreender que tenha escolhido o último mencionado para, concretamente, me deter num conhecido caso que bem ilustra as anteriores considerações.

(Continua)

sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

Empresa Municipal,
Burocracia & Cia.


Morador na zona da Estefânea, na freguesia de Santa Maria e São Miguel, há quase quarenta anos, precisei de um daqueles cartões de residente que se coloca no automóvel, comprovando o acesso livre e gratuito à respectiva zona de estacionamento. Para o efeito, a Empresa Pública Municipal de Estacionamento de Sintra (EPMES) solicitou-me a apresentação de Bilhete de Identidade, Carta de Condução, Cartão de Contribuinte, última Declaração de IRS, Cartão de Eleitor, Livrete e Registo de Propriedade da viatura.

Embora tivesse considerado um exagero, mas resignado à evidência, fiz-me portador de toda a documentação e desloquei-me aos escritórios da empresa. Sumariamente analisada a situação, verificou-se que o meu domicílio fiscal não coincidia com o da residência na Estefânea pelo que fui obrigado a apresentar um Atestado de Residência. Dirigi-me à Junta de Freguesia e, em dez minutos, tinha o atestado na mão para voltar aos esritórios da EPMES que, sim senhor, imediatamente, emitiu o cartão.

Para todos os efeitos, este não seria um exemplar episódio de burocracite aguda, se a mesma EPMES não mantivesse comigo uma relação que lhe comprova, há tantos anos quantos os que esta modalidade está em vigor, como a minha é mesmo aquela residência. Na realidade, com a maior simplicidade, poderia tê-lo feito através da consulta aos seus registos dos quais constam mais dois cartões para a mesma morada...

Apesar de ter chamado a atenção para aquele pequeno pormenor, o meu reparo não surtiu efeito já que, de acordo com a opinião do próprio administrador da empresa, aquilo que eu agora solicitava era abrangido por novo enquadramento.


Empresa Municipal? Pois claro. Daquelas que nasceram para agilizar processos, lembram-se?
Não se está mesmo a ver, aliás, num particularíssimo momento de felicidade, em que os cidadãos se renderam à simplex estratégia do poder central?

quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

Atenção:
Parques de Sintra Monte da Lua


Na sequência do texto que ontem publiquei, gostaria de todos contemplar com uma verdadeira pérola. O brinde foi-me dirigido na passada terça-feira, como comentário a "Alta Tensão", datado de 18 de Dezembro do ano findo, que também apareceu na última edição do Jornal de Sintra. Trata-se do primeiro parágrafo de uma mensagem assinada por André Fernandes, que passo a transcrever parcialmente:

"(...) e convido-o desde já a deslocar-se a Monte Abraão e ver o excelente trabalho (...) os espaços verdes quase que rivalizam em beleza com alguns dos parques históricos de Sintra, e seguramente que estão mais bem cuidados (...)".

E esta, hem! De semelhante bomba é que ninguém estava à espera! Convencidos estávamos todos da absoluta excepcionalidade de Sintra, da qualidade única dos seus parques históricos, por exemplo, o de Monserrate que, em plena época victoriana, se considerou do melhor do Mundo e, de uma penada, eis que Monte Abraão aparece a reivindicar desconhecidos tesouros.

Pena? Monserrate? Pois, sim senhor, não é que Monte Abraão faça sombra, mas muita atenção! Afinal, num incaracterístico subúrbio de Lisboa, numa freguesia tão jovem quanto os dez anos de Monte Abraão, ficamos a saber que há espaços verdes quase. [certamente terão reparado no cuidado com que o autor, tão modestamente, empregou o advérbio...].

E, finalmente, a partir de agora - sim, só agora, que temos andado todos muito distraídos - também ficámos a saber que Monte Abraão, com toda a sua diversidade sociocultural "(...) faz parte integrante e fundamental do Património da humanidade de Sintra [a humanidade minúscula, é da responsabilidade de André Fernandes, o citado autor de que continuo a socorrer-me] porque Sintra não é só a Paisagem pilhada de acácias (...)".

Não me digam que não estão comovidos com as autênticas pérolas que um blogue vos pode oferecer... Compreenderão, estou certo, não só a pertinência do título desta peça, já que se impunha a chamada de atenção à PSML - não fosse dar-se o caso de, coitados, continuarem a permanecer na ignorância -mas também a necessidade que senti de partilhar convosco este duplo património oculto.
Passo a explicar. Oculto, misturado com outros, ficaria o comentário de André Fernandes, que passou a fazer parte do meu património de curiosidades; também oculto, na penumbra causada pelas sintrenses brumas, ficaria aquele que, por fim, é posto a claro como o tal património quase... É o que pode designar-se uma semana de verdadeiro enriquecimento patrimonial.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

Questão de assunção

Basta ter lido os comentários suscitados pelos textos publicados neste blogue, nos dias 17 e 18 de Dezembro do ano findo, para perceber que, para além da controvérsia em apreço, há pessoas que não sabem como assumir, sem desconfortáveis conotações, a sua condição de habitantes do subúrbio.
Não será necessário que, a fim de que nos entendamos, nos internemos pelas iniciáticas veredas da sociolinguística, embora convenha que, a propósito, façamos as indispensáveis distinções terminológicas. Desde logo, em termos objectivos, e, de acordo com a etimologia latina, suburbano é o que está situado próximo da cidade, que fica nos arredores ou nos arrabaldes da cidade.
Se problema existe no entendimento desta noção e na assunção da condição que lhe subjaz, relativa àquilo ou àquele que está ou habita fora da cidade, tal acontece porque, como verificaremos, há uma extensão pejorativa do adjectivo. Estas considerações, parecendo mais afins do contexto didáctico, só aqui são chamadas para circunstanciar e circunscrever a substância de uma terminologia que confunde o cidadão vulgar, não obrigado ao domínio de minudências filológicas e, por isso mesmo, por vezes, vítima de erróneas interpretações.

Voltemos à extensão pejorativa, para lembrar como, ao adjectivo urbano, se ligam as ideias de afável, civilizado, cortês, do que vive na cidade, do que tem ocupação e hábitos típicos da vida da cidade. Por oposição, a condição daquele que está fora destes contornos e limites, é o suburbano, portanto, que ou aquele que é pouco refinado, que revela ou tem mau gosto, grosseiro, provinciano, rude.

Interessante será verificar como, de modo muito coincidente e afim, o mesmo se passa com saloio, de etimologia árabe - provém de çahrahuii e, do árabe vulgar, çahroi - significando habitante do deserto, que se aplica àquilo que é dos arredores de Lisboa, a norte do Tejo, dos seus habitantes, ou que lhes diz respeito. No entanto, uma conotação pejorativa, remete para indivíduo que revela falta de civilidade, de traquejo social ou de bom gosto.

Se, hoje em dia, por um lado, há quem se afirme saloio e com muita honra, de certeza que, por outro, só com enorme dificuldade, encontraríamos quem, com a mesma veemência, sentido de identidade e de pertença, reivindicasse a sua condição de suburbano…

Num concelho como o de Sintra, que comporta e compreende vastíssimas zonas de duplo subúrbio, ou seja, em relação a Lisboa e à própria Sintra, não surpreende que esta questão da assunção de um modo de estar em e de habitar determinado território, adquira inquestionável interesse.

Tenho-me arriscado aos maiores mal-entendidos e incompreensões se, como tantas vezes tem acontecido, ao argumentar quanto à necessidade de cindir o gigantesco e ingovernável concelho de Sintra, em duas ou tês coerentes unidades, para possibilitar as diferentes lógicas de governança, propuser o agrupamento de freguesias afins, separando o conjunto das sete - Colares, São João das Lampas, Terrugem, Almargem do Bispo, Santa Maria e São Miguel, São Pedro e São Martinho – das outras, indelevelmente marcadas pelos contornos do dormitório betonado, tantas vezes legalizado e humanizado, a partir de clandestinas origens.

É o escândalo, o sacrilégio, tem equivalido a detestar as pessoas, a não respeitar as suas lutas. Claro que é uma pena que assim seja entendida uma proposta como esta, que nada tendo de secessionista, de falta de solidariedade ou de elitista, tem deparado com a incompreensão de quem ainda não descobriu que tal solução permitiria, aos dois ou três conjuntos subsequentes, uma administração e gestão dos territórios consentânea com as suas características. E, de qualquer modo, nenhuma das unidades decorrentes jamais seria tão homogénea que não acolhesse a diversidade e diferença que, felizmente, está instalada por todo o lado.

Tenho a maior esperança de que venha a prevalecer esta que já tem sido apontada como a solução, a mais profícua para este concelho que não tem qualquer vantagem em bater recordes de população residente, ou de extensão territorial, aos quais se deveria juntar o mais incómodo dos índices estatísticos, ou seja, o que se conota com tudo quanto é falta de qualidade de vida.

terça-feira, 8 de janeiro de 2008

Verde Pino

Ay flores, ay flores do uerde pyno,
se sabedes nouas do meu amigo!
Ay Deus, e hu é?
(...)

E eu ben uos digo que é uyu' e sano,
e seera uosc' ant' o prazo passado!
Ay Deus, e hu é?



É na Primavera. Vai terminar o prazo em que o amigo ausente, talvez no fossado, jurara regressar. A namorada, ansiosa, pede notícias dele às cristas floridas dos pinheiros, e estas respondem que ele estará com ela antes de findo o prazo.
Verde Pino. Pois claro, quando alguém se lembra de assim baptizar um lugar, logo ocorre a mais conhecida cantiga paralelística dialogada de D. Denis cujas primeira e última estrofes reproduzi. Lugar, escrevi eu, lugar assim nomeado por seu dono e senhor, que muito boas razões terá para assim o designar.
Difícil não é descortinar a mais imediata das conotações se tivermos em consideração que estamos na Várzea, num terreno com pino à volta de uma casa, abrindo para um panorama de privilégio da serra onde se alcançam o Castelo, a Pena, a Regaleira e Monserrate.


Ali tudo é propício. O ingénuo jardim exterior, a casa em estratégico assentamento para telúricas visões de arrasar um mortal, são indissociáveis do que acontece paredes adentro. A cozinha vegetariana, do mais absoluto sincretismo, com vozes e laivos de luso-tropicalismos brasilianos, indianos e africanos, servida em almoços e jantares à volta de grande mesa que acolhe até dezasseis comensais, é uma hipótese de abordagem.
Outras modalidades de acesso e usufruto passam pela acomodação durante o fim de semana, com direito a prelecção adequada à visita guiada pelo fascínio da medicina ayurvédica, descobrindo o segredo das tão cantadas massagens. Possíveis também cursos, acções de formação, encontros de empresa, etc.
Assumido mestre de cerimónias é o conhecido actor André Maia, anfitrião de mão-cheia, comunicador nato e perspicaz, ocupando o lugar que o Verde Pino precisava, para facilitar o encontro entre os amigos que demandam a Várzea, na sã procura de umas horas de sábio e culto convívio. Claro que, apesar do savoir-faire do André, muito do sucesso de cada encontro depende da qualidade do grupo...

André Maia não precisa de publicidade. Conta com bons amigos, como a minha querida Maria Almira Medina, que ali me levou para ali cativado ficar. Embora ninguém tivesse encomendado o sermão, não resisto a passar-lhes o número do telefone 919939112 para poderem contactar. Recomendo vivamente!


Não é Primavera? Estão perto e sabem os amigos um do outro? Ainda bem. Olhem que, para ir ao Verde Pino não é preciso enquadrarem-se na cantiga. O que é preciso é ir na minha cantiga...

segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

E o Quarto Poder?


De algum modo, as Notas Diárias de hoje completam o texto publicado no passado dia 3 do corrente, subordinado ao título Negócios... E se assim acontece, tal surge na sequência de alguns comentários dum habitual leitor acerca da ausência de controlo das actividades da banca que, efectivamente, parece não terem desempenhado a tarefa que lhes compete no caso do BCP.


Convém lembrar que, a propósito e muito naturalmente, também eu próprio tinha mencionado os casos mais evidentes do Banco de Portugal e da CMVM. Não há comentador a quem escape aquilo que, na generalidade das abordagens, é considerado como negligência destas duas entidades. Por isso mesmo, ainda mais de enaltecer a atitude do Comendador Berardo pela sistemática denúncia das irregularidades que estarão na origem da situação de descrédito do maior banco privado português.


Ora bem, se justos reparos têm sido feitos ao Banco de Portugal e à CMVM, na medida em que não funcionou, em tempo devido e oportuno, a esperada avaliação institucional das actividades menos correctas daquele banco, não deixa de ser igualmente pertinente referir a inexistência de qualquer trabalho de investigação por parte da comunicação social.


Mais uma vez se torna patente como, em Portugal, aquele é um tipo de jornalismo pouco interessante para as direcções e chefias de redacção dos diversos órgãos da imprensa e do audiovisual. Na realidade, as características dos riscos inerentes, os recursos humanos e materiais que habitualmente envolve, a experiência e o profissionalismo que pressupõe são pouco consentâneos com o mau momento que atravessa o que é considerado o quarto poder nas sociedades democráticas.


Perguntarão porque haveria de ser diferente se, para todos os subsequentes e nefastos efeitos, impera uma mediocridade generalizada, nada propícia ao regular funcionamento das entidades públicas e privadas com perfil para actuação no domínio em questão. Aliás, pouco ou nada mais há a dizer quando a solução para a crise naquele banco passa pela nomeação de uma administração cujo processo está inquinado por tão manifesta promiscuidade entre os poderes político e económico.


Assim não vale. Continuamos todos a perder…

sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

Sempre a manutenção...

Sintra tem um significativo deficit de piscinas. Longe está a concretização do objectivo que, em tempo de campanha eleitoral, foi objectivo de dotar cada freguesia do concelho com um complexo desportivo afim das modalidades aquáticas. Em tempo de vacas magras, impondo-se uma enorme selectividade na afectação de verbas às diferentes rubricas orçamentais, mal se entende que, sistematicamente, ao longo de anos, não sejam contemplados estes equipamentos.

No contexto deste assunto, vem a propósito referir o caso da piscina municipal de Ouressa que, apesar de ter atravessado períodos mais ou menos difíceis - causados por uma multiplicidade de factores cujo detalhe dispensarei – tem proporcionado a uma enorme quantidade de utentes, de todos os níveis etários, um serviço absolutamente inestimável e de grande qualidade, ao longo de anos.

O pessoal afecto às instalações é de uma simpatia e cordialidade pouco comuns. Em condições de trabalho que se adivinham nada fáceis, percebe-se que há espírito de equipa e vontade de corresponder a todas as expectativas. Mas também é patente que não é possível fazer melhor, embora haja o direito de esperar mais.

O que mais flagrantemente se evidencia é a falta de manutenção sistemática, tanto no interior como no exterior das instalações. Verdade é que tudo se mantém operacional, mas na absoluta fronteira do admissível. Ora bem, como não se efectuam, com a devida e esperada periodicidade, os indispensáveis trabalhos de preservação, há riscos que todos os dias se enfrentam desnecessariamente, no âmbito da higiene e da segurança. Não se trata de grandes obras, tão somente as decorrentes de uma grande carga de utilização.

Deixo uma palavra de alerta aos serviços competentes da Câmara Municipal de Sintra, no sentido de corrigir e acudir com a intervenção que, de todo em todo, não é possível adiar. Há muitas centenas de munícipes, de várias freguesias do concelho de Sintra, servidos pela piscina de Ouressa que, certamente, subscrevem estas observações, que jamais se transformarão em razões de queixa se a actuação for tão oportuna como se espera.
Enfim, mais um caso de evidente necessidade de manutenção. Bom seria que, cada vez mais, se generalizasse a prática das normas de execução permanente que, para além de pressuporem imediata actuação, na sequência de qualquer pequeno estrago ou avaria, obedecem a um esquema de intervenções periódicas que fazem economizar muito dinheiro.

quinta-feira, 3 de janeiro de 2008


Negócios...


Ao passar pela Heliodoro Salgado, cruzando-me com dois amigos à porta da dependência do Millenium, a conversa abordou de imediato o descalabro dos recentes eventos para, logo de seguida, ficar a saber a última anedota, com a Opus Dei a sair muito mal tratada… Eis um pequeno episódio que, naturalmente, se poderia multiplicar por milhares por esse país fora, a atestar o incalculável prejuízo que o BCP estará sofrendo na sua imagem pública e a corroer, dia a dia, o valor de mercado das respectivas acções.
Na edição do Expresso de 29 de Dezembro só para citar um exemplo daquele fim de semana - quer Miguel Sousa Tavares quer António Barreto davam a entender ou afirmavam mesmo que, noutras civilizadas latitudes, práticas fraudulentas como as que vieram à luz do dia, equivaleriam a prisão pela certa dos seus autores. Depois da distracção do Banco de Portugal e da CMVM, que parece só terem acordado da letargia quando os americanos começarem a meter a colherada no assunto, ainda não é previsível o desfecho do caso.


Para já, de uma vez por todas, caiu e se desfez o paradigma da competência imaculada dos administradores, gestores e directores do sector privado! Agora, os amanuenses balconistas vão fazer o quê, daqueles fatos completos de cangalheiro engravatado, símbolo de uma filosofia da empresa, assumida à mistura com a diáfana imagem de impolutos patrões, muito católicos e respeitáveis? Agora, com um grande chefe vindo do sector público - que paradoxo! - manter-se-ão os adereços?


A Joe Berardo, com todas as suas contradições, defeitos e virtudes, ficam a dever os portugueses a sistemática denúncia dos escabrosos negócios cuja existência, pelos vistos, não era desconhecida nos mentideiros frequentados pelas comadres antes da pública zanga. Sem a atitude do Comendador, servida pelo desabrido estilo do costume, até quando continuaria o farisaísmo do BCP a abotoar a conveniente capa de santidade?


Não deixa de vir a propósito lembrar ter sido com Joe Berardo que a Câmara Municipal de Sintra celebrou um protocolo, nos termos do qual parte da sua colecção de obras de Arte permanece disponível, num museu que já se tornou referência nacional e internacional. Tal acordo, que remonta ao tempo da presidência de Edite Estrela, foi recentemente renovado. Apesar de algumas ignorantes vozes se terem levantado contra, Sintra e Joe Berardo só têm vantagens nesse que é limpíssimo negócio...

quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

À beira da estrada

Ultimamente, ao sair de Sintra pelo IC16, tanto na direcção de Lisboa como na de Mafra, tenho deparado com trabalhos de limpeza, corte e desbaste da vegetação espontânea, nos terrenos circundantes.

Habituado à constante agressão de indescritíveis cenas de desleixo, não posso deixar de assinalar tão positiva atitude. Tão surpreendido tenho ficado que ainda não identifiquei a entidade promotora, que gostaria de saudar com a maior vivacidade. Custa-me a perceber como é possível não generalizar esta prática.

Entendo mas é muito difícil admitir como a maioria dos cidadãos se mostra insensível ao quotidiano convívio com bermas descuidadas, vedações e muros degradados ou inexistentes, matagais infectos, edifícios sujos, decadentes, permanentes quadros de vergonha a ladear certas estradas do concelho como, por exemplo, entre a Abrunheira e Albarraque, a caminho de São Domingos de Rana.

Por isso que este seja um bom sinal, excelente pretexto para partilhar convosco uma nota de optimismo em época tão avessa a sinais de esperança. Quem nos dera o arranjo sistemático, o nosso sossego, a possibilidade da singela, da eficaz beleza, a que temos direito. À beira da estrada, uma estética a defender.