[sempre de acordo com a antiga ortografia]

quarta-feira, 30 de abril de 2008

Vinte e cinco de Abril
à moda de Sintra
(continuação)

Tão distraídos!...

Admirou-se Sua Excelência com o grau de ignorância dos jovens portugueses quando, em resposta a um inquérito promovido pela própria Presidência da República, evidenciaram como estão longe da vida política. Pois eu não percebo a surpresa e, muito menos, vinda de quem assim a expressa, ao não reconhecer a sua própria quota-parte de responsabilidade, em especial durante o período de dez anos em que foi Primeiro Ministro.

Por outro lado, tal admiração é tanto mais estranha quanto se revela impossível dissociá-la da ignorância que, não só os jovens mas também a generalidade dos cidadãos, igualmente revelam em muitos outros domínios, com certificação assegurada pela permanente cópia de índices estatísticos nacionais, dando razão àqueles que, normalmente, são apelidados de profetas da desgraça…

Quem prefere descurar a visão alargada e articulada deste tipo de questões fica altamente prejudicado nas suas conclusões. De facto, uma perspectiva devidamente integrada, permitiria aos aprendizes de analista que não se precipitassem em afirmações tão frágeis como as que remetem para os políticos a culpa do divórcio das jovens gerações em relação ao conhecimento que se passa na res publica.

No fundo, bem no fundo da questão – e por muito que me considerem repetitivo de tão maçador, sempre trazendo à colação o mesmo argumento – no fundo, a proverbial iliteracia, o analfabetismo pleno e funcional, afectando larguíssima percentagem da população portuguesa, sem comparação próxima com o que se passa na União Europeia a vinte e sete, constituem a matriz essencial deste aparente destempero, que só causa surpresa aos muito distraídos.

Razões profundas

Se não fossem a iliteracia e as diferentes vertentes do analfabetismo, onde iríamos buscar justificação para comportamentos tão desviantes como a instalada e, mais uma vez, acima aludida e tão abrangente cultura do desleixo? Ou como compreender o facto de sermos o país cuja média ponderada de consumo de bens culturais (frequências de teatro, cinema, aquisição de livros e de jornais, etc) é a mais baixa da Europa? Onde encontraríamos espalda para tanta irresponsabilidade no comportamento dos condutores nas estradas e ruas do país?

Tanto quanto, de momento, me ocorre, apenas num sector não se poderá invocar a ignorância como factor que afecte o cidadão comum. Claro que me reporto ao futebol. Num país com tão desfavoráveis sintomas de falta de qualidade de vida, onde tão pouco se lê, espantamo-nos com a existência de vários jornais diários, prática e totalmente afectos ao futebol embora se afirmem desportivos. Ver um cidadão a ler qualquer coisa, significa estar debruçado sobre qualquer notícia de futebol.

A propósito, se o inquérito que o PR citou, tivesse incluído questões sobre qualquer acontecimento futebolístico, recente ou longínquo, estou certo de que não haveria hesitações nem erros. Nesse domínio, não tenham dúvidas, o trabalho foi e continua a ser bem feito, a informação passa, é assumida, faz parte de um património comum que se partilha e discute acaloradamente, com desmedido empenho.

(continua)

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