[sempre de acordo com a antiga ortografia]

segunda-feira, 27 de janeiro de 2014





Ainda a propósito...


Ainda a propósito do meu texto 'In memoriam', publicado há umas horas, acerca do 27 de Janeiro comemorando a libertação de Auschwitz, campo de extermínio onde se cometeram barbaridades inomináveis, gostaria de acrescentar mais umas considerações.

Tais «barbaridades», se bem as quisermos entender, são apenas parte de um novelo muito complicado que, na sua quota parte de resp
onsabilidade, uma série de povos europeus envolvidos nos seus fios, assumem-naos com tanta dificuldade como os alemães.

De facto, os comandantes dos campos eram alemães, como alemão era o Estado Maior que tudo geria. Mas, então, os colaboracionistas em toda a Europa, cuja face mais descarada é a da França, através do governo de Vichy, que representava a esmagadora e silenciosa maioria dos franceses, e que enchia vagões e vagões com famílias de judeus, o mesmo acontecendo a Norte, no Sul, do Leste ao Oeste de todo o continente?

Não coincidente, mas no mesmo contexto, que histórias já foram contadas e quantas haverá por contar da actuação dos fascistas portugueses, espanhóis e italianos, bem como do genocídio de tantos milhões de cidadãos na Rússia Soviética? Tudo isto nos envergonha porque o Homem - portanto, nós - somos assim, capazes das maiores «barbaridades». Não são os outros, não são os alemães. Somos todos assim.

A semente que somos tem uma vertente de malignidade que é temível quando encontra terreno fértil. Nós, portugueses, por exemplo, que pedras poderemos atirar aos alemães? Só por ter sido «anteontem», há 75 anos? Bem podemos «limpar as mãos à parede», com as históricas «barbaridades» que concretizámos, em todas as latitudes, durante séculos, nada nos consolando o facto de «os outros» terem feito o mesmo...

Os alemães, as novas gerações de alemães - e não se confunda povo alemão com o actual governo alemão, como não pode confundir-se povo português com o actual governo português, apesar de, em ambos os respectivos países, vigorarem Estados Democráticos de Direito - os alemães, escrevia eu, estão num complicado processo de exorcismo dos fantasmas do nazismo. E ainda estarão a lamber as feridas durante muito tempo. É ver a Arte que produzem, o Teatro, a Ópera, a Literatura, testemunhando como assim está a acontecer.

O mínimo que podemos, nós que temos dificuldade de fazer o mesmo em relação a outras cenas que nos envergonham, é ir acompanhando, sem precipitados juízos de valor, respeitando o processo. Tentar ser civilizado, embora tenha um preço altíssimo, está ao alcance de todos. Pelo menos, tentemos.

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