o desgosto
De todas as situações que aqui tenho tratado, a do estacionamento caótico junto à Quinta da Regaleira é, na minha opinião, uma das que suscita maior sensação de impotência dos cidadãos.
É um caso que, ao longo de anos, tenho vindo a denunciar, com a veemência de que sou capaz, em sessõesões públicas, em reuniões com técnicos da autarquia e vezes sem conta, tanto nas páginas do Jornal de Sintra como nas da saudosa Sintra Regional, em séries de artigos sucessivos, com sugestivas e elucidativas fotografias.
Já tive oportunidade de abordar o assunto com o próprio Presidente da Câmara junto de quem, justo é assinalá-lo, colhi a impressão de que, com os mais avisados, partilha a perspectiva integrada de uma solução que há-de abranger todas as vertentes afins, fruto da visão sistémica -não se cansa de a sublinhar - que, inequivocamente, afirma perfilhar para resolução de todos os problemas. Infelizmente, no entanto, nada se vê que seja compatível e consequente com tão correcto modo de pensar.
Incivilidade, incultura & Cª Lda.
Em perfeita sintonia com as medidas que não saem da autarquia, os membros da direcção da Quinta da Regaleira, do alto da torre, impávidos e serenos, continuam com a sua conhecida cena de sobranceria, não dando a mínima satisfação à comunidade, nem o mais leve indício de que a questão sequer afecte as suas digestões. E tão atentos estarão, olhando para os respectivos umbigos, perfeitamente alheados do que se passa cá por baixo que, durante anos, até se permitiram estacionar as suas particulares viaturas em cima de artísticos passeios que, tal como todos os edifícios e jardins, constituem uma das componentes dos bens patrimoniais sob sua custódia...
A Guarda Nacional Republicana, indissociável vertente da resolução do problema, tem-se posicionado como parte do problema. Em vez de assumir a mais correcta atitude de outra força da ordem pública, a Polícia Municipal - que se revelou como a única eficaz nos últimos anos, através da colocação de pilares e cintas bicromáticas ao longo da rua, certo é que apenas em dois fins de semana... - tem autorizado o estacionamento em cima dos passeios, deixando de cumprir e fazer cumprir a Lei vigente, numa lamentável atitude de demissão, para evidenciar a mais ordinária prática laxista de uma incompreensível e condescendente «tolerância» cujas consequências, de convite à falta de civismo e flagrante insegurança, só não vê quem convém a manutenção do statu quo de terceiro mundo.
Estão apontadas e não podem ser outras as soluções alternativas, nomeadamente no sentido de pôr a funcionar carreiras de transporte público, à semelhança das que servem os destinos do Castelo dos Mouros e Pena a partir dos actuais terminais rodoviários, pelo menos enquanto se não instalam os parques dissuasores, junto às entradas que servem a sede do concelho, em Chão de Meninos/Ramalhão, Lourel e Várzea, no âmbito e contexto de todas as outras medidas, com estas articuladas, que temos exaustivamente apontado.
Parece impossível como, só neste conhecido e demandado lugar da Regaleira, a comunidade sintrense se dá ao luxo de evidenciar uma tal desorganização, perante nacionais e tantos estrangeiros. Como é que esta comunidade que, parcialmente e paredes-meias, vive num território classificado pela Unesco como Paisagem Cultural da Humanidade, se permite propiciar tanta agressão ambiental, tanta falta de civismo, tanta irregularidade, à porta de um monumento cujo acesso não autoriza tais desmandos? Será apenas com o receio de perder visitantes na Regaleira?
Está na hora
Como tantas vezes tenho repetido, o facto de ainda não terem sido concretizadas as alternativas que se conhecem, não significa que a Lei se não cumpra. Na realidade, o incumprimento da Lei tem tido tão nefastas consequências, bem evidentes no local em apreço, que só uma escandalosa demissão, não só dos responsáveis mas, naturalmente, de todos nós, continua a permitir que permaneça quadro tão vergonhoso e perigoso.
O inequívoco respeito pelos bens patrimoniais que lhe estão confiados, deveria ter levado a Fundação, com a sugestiva designação de CulturSintra a defender, com a maior tenacidade, as medidas apontadas e a não meter a cabeça na areia, implicitamente fomentando a prevaricação dos potenciais visitantes, convidando-os à condição de co-autores de um caos horroroso, como se o usufruto de um bem patrimonial sofisticado tudo justificasse e se compaginasse com tais desconchavos.
Está na altura de não pactuar com este estado de coisas. Militantes da defesa do património natural e edificado, em geral todos os cidadãos atentos e preocupados, que se identificam com estas considerações, só podem ser consequentes com o que pensam e sentem. Como, no dizer de um nosso amigo, não andamos por cá para «defender as florinhas da Volta do Duche», só nos resta mobilizar os fregueses e munícipes para manifestarem o seu direito à indignação. E operacionalizar essa mobilização.
4 comentários:
Meu caro co-munícipe, imaginará como as sua crónicas agravam o sofrimento que sinto pelo estado a que Sintra chegou. Porque o presidente da Câmara não é uma pessoa qualquer, não é parvo,finge ter coelhos na cartola e quando quer e lhe dá jeito, arranca uma frases de elevação, pouco perceptíveis para a plebe, em que me incluo, que votou nele e, infelizmente, muitos por serem adeptos de um clube de futebol de referência.
Não tivesse lido, com a lentidão que a minha cultura exige, uma entrevista na Revista Imobiliária de Junho de 2007, e calar-me-ia. Mas li, e o síndroma do "paradigma" tomou posse desta alma sintrense, desiludida por não saber se viverá até 2015, ano em que o autarca prevê a suprema felicidade em Sintra, depois do “êxito” que foram as ciclovias prometidas com pompa em Seteais ou da “salutar” construção de piscinas em todas as freguesias do concelho...
Por sorte, tinha tomado todos os meus remédios quando li que “Hoje em dia o silêncio vale muito dinheiro e nós queremos que Sintra seja espaço de silêncio”. Tocou-me o saber que em 2015 (daqui a oito anos, para quem ainda estiver vivo), graças a um modelo de desenvolvimento estratégico alcunhado de Sintra Ideal, teremos a Sintra Romântica, a Sintra Rural e a Sintra Urbana.
Quase atingi o paroxismo ao saber daquele casal de alemães (dois, certamente) que lhe disse ser o nosso Palácio da Pena muito mais bonito que o Palácio equiparado da Baviera...talvez por não terem muito gosto em soletrar Neuschwanstein...
Para terminar, que pena não ter perguntado ao tal casal de alemães, como foi fácil solucionar os acessos ao tal Castelo, estabelecendo de imediato um sistema de transportes do género, acabando com a incapacidade militante que ressalta do que aqui tem sido dito sobre o estacionamento à volta da Quinta da Regaleira.
Amigo João,
Conforme conversa de sabado passado, cá estou eu a fazer uma visita pelo teu blog.
Li alguns posts e gostei. Irei voltar em breve...
Aquele abraço do Jaime
Para Carrazola,
Primeiramente, vou ter que ler essa entrevista para, mais tarde, me pronunciar. Entretanto, mesmo sem o ter feito, não será difícil pegar na deixa que o seu comentário proporciona, ao aludir o Castelo Neuschwanstein, mandado construir pelo desafortunado Luís II da Baviera, para me referir ao modo como foi solucionado o acesso lá acima.
Pura e simplesmente, a todas as viaturas particulares é imposta a obrigatoriedade de estacionarem em parques, a partir dos quais se processas aquilo que, para a maioria dos visitantes, é uma saudável caminhada de mais de meia hora para vencer a bem íngreme estrada de acesso.
Há a possibilidade de apanhar transportes públicos adequados, mini bus ou de galeras puxadas por parelhas de equídeos.
Jamais ali se passaria o desgraçado quadro da Pena, româmtico parque e palácio construído cerca de trinta anos antes que Neuschwanstein. As agressões sofridas pela Serra de Sintra, em consequência do constante subir e descer de automóveis particulares, são algo de possível apenas num país de terceiro mundo.
Já tive oportunidade de aludir o caso de Neuschwanstein e Hohenschwangau em textos publicados neste blog e, certamente, mais vezes o farei. Lá está, a solução que acabará por ser definitivamente adoptada no caso de Sintra. Pena é que, no fim do século passado (Século vinte...)esta soução tenha aqui vigorado, com a proibição de transitar pela rampa da Pena, para terminar no fim de uns meses. Para nós, era atitude demasiado civilizada...
Continue a aparecer.
Meu caro Jaime,
Imagino que, do alto da tua varanda beirã, o passeio por Sintradoavesso puderá ter-se revelado algo indigesto...
Como sabes, em Sintra, passa-se muita coisa desconcertante, nada coincidente com a ideia geralmente difundida de terreal eden impoluto... Todos os dias, assistimos a cenas muito pouco edificantes, constantes desafios para uma intervenção cívica cujos resultados são muito escassos.
Tu que és um viajante consumado por Áfricas e Europas, tu que tão amiúde te deslocas à Alemanha, sabes como eu tenho razão, como era possível que Sintra, por exemplo, pudesse emparceirar, a todos os níveis, com os melhores lugares germânicos congéneres, deixando de se apresentar suja, descuidada, degradada, gozando ainda dos rendimentos de uma romântica imagem de antanho, sem correspondência com a infeliz realidade quotidiana.
Apesar de tudo há boa gente, que continua a lutar, em todas as instâncias, que me sinto na obrigação de ir estimulando para que não esmoreça o ânimo que ainda persiste.
Fico muito contente pela visita com que nos honraste. Claro que incluo os «comentaristas de serviço» cuja participação é indissociável do bom proveito que manifestaste. Creio poder afirmar que espera«mos» não decepcionar...
Um abraço
João Cachado
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