[sempre de acordo com a antiga ortografia]

sexta-feira, 30 de julho de 2010

Mercado abastecedor
do Sintrense


De facto, ele há sintrenses de tudo capazes. Há, inclusive, aqueles que, como eu e muitos outros ingénuos, se convenceram de que habitam um lugar civilizado da União Europeia. Porém, em Sintra, basta comparar algumas situações do viver quotidiano – que, apesar de sempre nos desconcertarem, jamais deixam de surpreender – com o que vamos vendo e ou vivendo noutros locais, para concluir que o aludido convencimento corresponderá, quanto muito, a alguma ficção consequente de noite mal dormida…

Vamos a factos. Quem pretender confrontar-se com a gratificante experiência que me foi dado viver, só terá de deslocar-se manhã cedo, qualquer terça ou sexta-feira, ao recinto fronteiro ao estádio do Sintrense. O que passo a contar-vos foi presenciado, em directo e a cores, à mistura com os odores que imaginarão, num local que, à falta de oficial designação, nem sei que nome atribuir. Enfim, Mercado Abastecedor de Frutas e Legumes Frescos do Sintrense. Talvez…

Imaginem a cena. Às oito e meia da manhã, [no meu caso, em dia de temperaturas altíssimas, com o Sol já abrasando], está o parque cheio de camionetas de carga, com as mercadorias expostas no pavimento ou em cima de umas caixas, sem quaisquer condições. Negociam os interessados, comerciantes retalhistas, donos de restaurantes, etc, que ali se deslocam em viaturas que acabam por «estacionar» igualmente a eito. Alguns daqueles carros – vi eu! – atravessam o recinto, e, quando param, permanecem com o motor a trabalhar e a empestar o ambiente com os gases dos escapes, enquanto que, na ausência do mínimo sinal de higiene, as mosquitas já iam fazendo o trabalhinho da ordem.

Atenção, meus senhores, ali transacciona-se produtos alimentares. Por muito estranho que vos pareça, à vista, não há autoridade sanitária, municipal, de segurança pública ou de qualquer natureza. Ali é o reino da informalidade, da porcaria mais ordinária, da autêntica clandestinidade, a funcionar como em qualquer país de terceiro mundo. Não é em casos que tais que a ASAE costuma e deve actuar?

Não me perguntem como mas, armado de ingénua curiosidade, lá acabei por indagar se não era habitual aparecer por ali algum fiscal da Câmara. Responderam-me pela negativa, acrescentando a pessoa com quem falei, tratar-se aquela de uma facilidade que o Sintrense concedia, que nada tinha a ver com a Câmara Municipal de Sintra e que se quisesse falar com alguém responsável, talvez só com o Sintrense…

Pelos vistos, não bastava que, nas imediações do Mercado Municipal da Estefânea, se continuasse a fazer o mesmo tipo de transacções, com as camionetas «estacionadas» ali à volta, impedindo a boa circulação de pessoas e outros veículos, perante a passividade das autoridades e, naturalmente, sem que a autarquia tome qualquer providência civilizada. Não, como sempre acontece, o despautério alastrou como mancha de óleo.

Voltando ao assunto principal, lá fiquei esclarecido. Ou seja, para todos os efeitos, o clube da Portela está envolvido no negócio. Provavelmente, seria interessante saber quais as contrapartidas... Com que estatuto terá o Sintrense concedido a tal facilidade a que aludiu o meu interlocutor da ocasião? Que entidade e, com que autoridade bastante para o efeito, estará a montante de tão estranha situação?

Com que argumentos justificarão os autarcas de Sintra a existência, às escâncaras, desta nojeira? Como já tenho ouvido e lido de tudo, nada me surpreenderia se afirmassem que, em face da situação social do concelho, com tanta refeição a acudir às criancinhas das escolas e respectivas famílias, não sobram recursos para remediar esta situação… Sei lá, tudo é possível. Em Sintra? Tudo é possível.

Pois se até foi possível afirmar tão emotivas razões, perante o próprio Presidente da República! A propósito, tê-lo-ão feito na presunção de que, com tais argumentos, tapam os olhos e os ouvidos dos munícipes que, por outro lado, incrédulos, estão na iminência da concretização de um projecto de endividamento de muitos milhões de euros, para aquisição da Quinta do Relógio? E tudo isto, enquanto permanecem por resolver gravíssimos problemas, como a questão do caótico estacionamento público na sede do concelho?

Diante de tanta razão de queixa, já que ninguém nos acode, pois que nos valha São Pedro! Ah, como ele esqueceu esta terra que o invoca como patrono!...
De qualquer modo, fica o assunto à consideração bem terrena da ASAE...




terça-feira, 27 de julho de 2010

Sintra e a lógica dos caça-níqueis

Esclarecimento

Por estar ausente do país, pedi a amabilidade do meu Amigo João Cachado para que o texto que seria (e foi) publicado na edição de 21 de Julho do CORREIO DE SINTRA aqui fosse posteriormente divulgado.

Faltou a indicação de ter sido retirado daquele cada vez mais prestigiado órgão de informação de Sintra.

Do lapso, peço desculpa ao CORREIO DE SINTRA e a quantos o leram sem essa referência.

Saudações de

Fernando Castelo

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Sintra,
desgosto e compensações


Nascer entre brutos, viver entre brutos e morrer entre brutos é triste. [Rodrigo da Fonseca (1787-1858), notável político e parlamentar liberal].


No Verão, pouco é o tempo que passo em Sintra. E, estando em Sintra, sabem o que me vale? Pois, nem mais nem menos, o facto de Lisboa e Cascais ficarem bem perto... Não fora tão propícia vizinhança, como afogaria eu os desgostos que aqui me atingem?

Na realidade, pensando bem, apesar de estar tão ligado a esta terra, como ignorar o terrível desleixo a que se chegou na sede do concelho? Por outro lado, raríssimas são as manifestações de carácter lúdico, desportivo e cultural que a ela me prendem. Além das caminhadas de todos os dias, da leitura e da escrita que, registe-se de passagem, concretizo em qualquer local onde me encontre, em Sintra, cada vez mais são os desgostos, embora não o afastamento.

Falta o quê? Além do que importaria resolver, em especial a questão do estacionamento, faltam a oferta cultural, a boa música, conferências, exposições, teatro, cinema. Com a expressão da qualidade que seria de esperar, tais manifestações não existem. Não fosse a persistência do João Alvim no Chão de Oliva e Sintra seria um perfeito subúrbio, com umas coisitas promovidas por umas associações culturais, recreativas e desportivas, muito bem intencionadas, coitadas, mas que disso não passam. Um deserto!


Justo seria de esperar que o Centro Cultural Olga Cadaval oferecesse uma programação anual, em articulação com a oferta da capital, em complemento e suplemento das suas propostas culturais, obedecendo aos únicos parâmetros que importa respeitar, os da qualidade. Se possível, sempre, da mais alta qualidade.


Claro que não é isso que acontece. Salvo raríssimas excepções, à programação do CCOC não se reconhece uma linha de força que a distinga nalguma especificidade. Infelizmente, até o Festival de Sintra, que eu próprio cheguei a classificar como o produto cultural mais nobre de Sintra, se degradou a um ponto dificilmente previsível desde que, há poucos anos, acolheu o desconchavo dos designados contrapontos.

No meio desta "(...) austera, apagada e vil tristeza (...)", injusto seria não mencionar como a Parques de Sintra Monta da Lua, empresa civilizada e competente, responsável por um sofisticado património natural e edificado, me dá o único alento na relação pessoal com Sintra. Quanto ao resto, é de tal modo escasso, tão raro o que de eventual sinal positivo existe, que não tem expressão no contributo para o enriquecimento espiritual que seria suposto usufruir, num enquadramento tão propício quanto mal tratado.

Felizmente, por via da proximidade de Lisboa, acabo por fazer do arquipélago Gulbenkian a minha segunda casa. Realmente, é nas ilhas da Fundação que mais tempo passo, para além do local onde vivo. E, como tantas vezes tenho expressado nas páginas deste blogue, também Estoril e Cascais compensam, em larga medida, as falhas e faltas sintrenses, nomeadamente, as decorrentes e consequentes da tão proverbial e florescente cultura do desleixo.


PS:


Já repararam que, nem as praias, escapam à endémica incompetência de Sintra? Se dúvidas tiverem, basta fazer o Paredão, entre a Azarujinha e a Praia da Rainha – não deixando de aceder ao Parque Palmela, através da recém disponível passagem subterrânea, dotada de uma belíssima colecção de azulejos de Nadir Afonso – e depois comparar com os arranjos [?!?] ali à volta da Praia Grande ou da Praia das Maçãs…








sexta-feira, 23 de julho de 2010

Nem à Missa!...

O texto que publiquei no dia 16 do corrente, subordinado ao título Sintra, para quando um festival assim?... mereceu alguns sugestivos comentários. Vejam lá que, pelo menos dois dos leitores, tiveram a ousadia de sugerir que a organização do Festival de Sintra deveria contar com a minha colaboração!...

Aquilo que poderei interpretar como testemunho de simpatia, acabou por redundar, lamento afirmá-lo, no pior dos votos, já que tal coisa não se deseja a quem - como será o meu caso - até parece que apenas bem querem. Por considerar que vale a pena trazer, a esta primeira página, tais comentários e as minhas respostas, eis a sua transcrição:


Caro Dr. João Cachado,
Acompanho o seu blogue e as suas notas acerca do Festival de Sintra. Com os seus conhecimentos é uma pena que não o chamem para a organização. Como já percebi que vai para Bayreuth, quando voltar fico (ficamos) à espera dos seus comentários sobre as óperas que vai assistir. Infelizmente, eu só posso ver o site... Deve ser um deslumbramento. Cumprimentos, Carlos Tovar
18/07/10 17:19

João Cachado disse...

Caro Carlos Tovar,
Só depois de ler o seu comentário, me dei conta de que o último parágrafo do meu texto era susceptível de induzir interpretação análoga à que o Tovar dá conta, ou seja, de que poderia eu estar a candidatar-me a qualquer coisa...Por isso me apresso a esclarecer o que se afigura inquestionável.

Porém, primeiramente, agradeceria a confiança que deposita na minha eventual competência para a organização de um festival. Mas, meu amigo, nada de confusões. É um facto que tenho uma experiência de muitos anos de frequência dos festivais nacionais e internacionais mais interessantes. Mas, como compreenderá, isso não me confere qualquer especial capacidade organizativa de iniciativas congéneres.

Há muita gente que me ouve, que me honra muito com a consulta acerca de assuntos afins da organização de iniciativas culturais. Essa possibilidade de partilha de conhecimento e da experiência que vou acumulando em Salzburg, Bayreuth, Luzern, Lugano, Schwezinger, Schleswig, Leipzig, etc, não só me honra mas também é quanto me basta.

Há, de facto, quem esteja cada vez mais interessado em ouvir o meu testemunho, na primeira pessoa, acerca dos festivais onde tenho o privilégio de ver e ouvir o que há de melhor no domínio da música, em todas as suas vertentes, interagindo com todos os fenómenos e suportes culturais com os quais se relaciona. Escrevo-o sem presunção.

Infelizmente, tal não acontece em Sintra. E, já agora, respondo àquele seu repto sobre a hipótese de colaborar na organização do festival, com um conselho do meu querido e saudoso pai: "Há pessoas com quem nem à Santa Missa se vai..." Confesso que, para meu prejuízo, nem sempre o tive em consideração mas, com o passar dos anos e experiência acumulada, reconheço a imensa sabedoria da sentença.

Outra coisa que ele me dizia, acabava por se revelar muito afim do que acabo de recordar, indo no sentido de que todo o indivíduo deveria cuidar de vender o seu trabalho, tão somente, a quem o merecesse, a quem, pelo menos, partilhasse nível idêntico. Sabe, Caro Tovar, eu estou nessa. Sem presunção, repito, estou mesmo muito selectivo quanto às companhias...
Abraço
João Cachado
18/07/10 18:17

Ester Levi disse...
Eu fui uma das pessoas que tiveram a infelicidade de assistir à ópera que encerrou o festival de Sintra. Sei pouco de ópera mas o bastante para perceber que aquilo que vi não se apresenta a público nenhum, foi um desrespeito muito grande. Na realidade,o festival chegou a um ponto de degradação que nunca esperei.


O Dr. Cachado tem toda a razão. Aquilo não tem proveito para ninguém. Estava gente ao pé de mim que nunca tinha visto uma ópera e não foi assim que aprendeu qualquer coisa. Alguém tem que fazer qualquer coisa para que coisas destas não se repitam no festival de Sintra. Sintra não é o refugo.
Ester Levi
18/07/10 22:07

Anónimo disse...
Não há dúvida que o João Cachado é das pessoas que, em Portugal, tem melhor informação acerca da organização de festivais culturais. A confirmar isso mesmo, acabo de ler na revista "Visão" a opinião do professor universitário, poeta, romancista e tradutor Frederico Lourenço acerca do festival que o João Cachado considera ter a melhor programação em Portugal.Escreve ele o seguinte:


«Coimbra em Alta.
Ainda melhor do que a primeira é a segunda edição do Festival das Artes da Fundação Inês de Castro, na Quinta das Lágrimas e noutros locais de Coimbra. Programação aliciante e variada (...)».

Esta opinião é um grande aval para o artigo do João Cachado. Ele até pode escrever que não se quer envolver com certas pessoas que têm estragado o Festival de Sintra. Entendo completamente o que deve sentir perante a ignorância que afirma com tanta reazão. Se não quer, não vá à missa com elas. Mas se as coisas mudarem, julgo que deve dar a sua colaboração se lha pedirem.FS
22/07/10 18:10


João Cachado disse...

Muito obrigado pelas suas tão simpáticas palavras. Ainda bem que o Frederico Lourenço partilha a minha opinião. Conheço-o pessoalmente, desde miúdo. Conheci o seu pai e fui colega e amigo da mãe. As Letras, especialmente no âmbito das Clássicas, já lhe devem trabalhos inestimáveis, como as suas traduções directas do grego. Como homem da Literatura, é um autor com uma voz muito singular e, para além de todos estes atributos, é um melómano respeitadíssimo e um verdadeiro artista, que toca maravilhosamente, alguém que poderia ter feito uma carreira musical de grande nível.

Já fui ler a rubrica da Visão a partir da qual FS transcreveu a opinião sobre o Festival da Quinta das Lágrimas. Aproveito a oportunidade para repetir o que afirmei, não deixando de sublinhar o alto nível cultural da proposta que não faz a mínima concessão a qualquer solução de facilidade.

Os designados contrapontos de Sintra são uma caricatura grotesca que, em relação ao que Coimbra propõe, sugere e suscita, apenas podem ocupar uma posição, ou seja, a dos antípodas, e numa moldura cultural que só gente culta e informada pode subscrever para desafios afins do enriquecimento pessoal e da comunidade.

Quanto à possibilidade da colaboração na organização do Festival de Sintra, por favor, releia a minha resposta a Carlos Tovar.Olhe, nem por sombras! Então acha que eu ia invocar um tão sábio dito do meu próprio pai, só para encher a prosa? Aquele nem à missa é mesmo para respeitar. Ou, se prefetir, jamais!!! Se tem algum apreço por mim, faça o favor de não me desejar tal envolvimento...

Muito grato,
João Cachado
23/07/10 15:04






quinta-feira, 22 de julho de 2010

Sintra e a lógica dos caça-níqueis

Aquelas caixinhas que, sem custos para o explorador, nos caçam moedas em cabines, parquímetros, estampilhas e, até, para massagens, sem satisfação do desejado, criam a convicção de impunidade pelos proventos indevidamente recolhidos, ainda por cima com pouco risco.

Estamos perante uma habilidade em que os manipuladores das moedas recolhidas não denotam intenções de reinvestir no desenvolvimento, antes as usam para alargar o seu espaço e interesses. Incentivados pela quase indiferença dos lesados, também na política se nota uma cáfila de sujeitos cada vez mais convencidos de que o voto lhes deu direito ao esbanjamento dos níqueis que são de todos nós.

Graças à progressiva falência da moral pública e de actos concretos para a salvaguarda dos mais alargados direitos dos administrados, os caça-níqueis têm sido génese de outros segmentos em que a filosofia é sacar o mais possível ou esbanjar segundo calendários estabelecidos. A grande maioria dos portugueses tem incertezas sobre o futuro? Somos cada vez mais penalizados com a desculpa de que é preciso recuperar e economia? Paciência, há sempre um motivo para gastar de qualquer maneira, mesmo que isso venha a hipotecar o futuro. Como tudo seria diferente se o dinheiro fosse dos decisores...

Nesta matéria, conhecendo-se as carências estruturais em Sintra, a que se acrescentam afirmações frequentes do Presidente da Câmara sobre os gastos e apoios à pobreza (a sociedade é que apoia...), élegítimo que nos questionemos sobre algumas transacções em curso. À cabeça de todas está a ameaça de se concretizar a aquisição da Quinta do Relógio, usando um empréstimo de muitos milhões de euros, sem que se saiba quantos outros milhões custará a recuperaçãoe quais os fins em vista.

Trata-se de um gasto não reprodutivo que apenas irá tornar milionários os vendedores. Para os munícipes será mais um sacrifício a pagar por um negócio que não é deles. Nestas coisas não pode haver abstenção. Muito menos o recurso à habilidade semântica de pretender justificá-la politicamente como distanciamento...

Que devemos pensar quando num espaço pago com dinheiros públicos por uma Freguesia de Sintra (em canal fechado de TV), a pretexto de Feiras Temáticas, são notórias as promoções ao futebol e ao clube em que o presidente também o é da Junta? O facto de serem super-amigos (ver “Portugal SemFronteiras”, RTP, 14.2.2009) justificará que o Presidente da Câmara, depois de o seu rosto ser mostrado durante dois segundos, sem palavras, venha a perorar também sobre futebol?

Do território, seus problemase anseios, nada foi abordado, num nítido sintoma de total alheamento. Para terminar os exemplos de como se gasta o nosso dinheiro, refira-se que numa autarquia onde a pobreza é frequentemente invocada, deveria ser publicamente conhecida a lista de assessores e outros cargos ocupados por vocação partidária, com custos, serviços que desempenham e respectiva utilidade.

Se os munícipes soubessem os contornos dos envolvimentos partidários neste bodo, ficariam claras as razões porque tudo parece correr em Sintra no melhor dos mundos, sem que haja a denúncia activa de muitos actos praticados. O silêncio de certas forças é justificado pela exacta dependência das benesses...

Aqui chegados, não é despiciendo que os caça-níqueis tenham evoluído para os esbanja-níqueis. O perigo está, isso sim, cada vez mais, nos níqueis-dependentes, porque vendem a alma ao diabo. Pelo meio, quase a adormecer os súbditos, organizadamente, são precisas histórias de encantar...

Fernando Castelo





sexta-feira, 16 de julho de 2010

Sintra,
para quando um Festival assim?



A tão controversa quanto ilógica programação dos denominados contrapontos, mais uma vez, acabou por transformar a edição de 2010 do Festival de Sintra em manta de retalhos, sem qualquer ponta por onde se lhe pegasse. Como sabem, para tal peditório já eu muito contribuí e em dose desproporcional ao gabarito da iniciativa... Por isso, mais nada acrescento aos textos já neste ano publicados no sintradoavesso [08.03.10, 05.04.10, 04.05.10 e 24.05.10].

Póvoa de Varzim, Espinho, Óbidos e Estoril, depois do sensacional Alcobaça, continuam a somar sucesso cada vez mais assinalável. Entretanto, se alguma dúvida existisse em relação à pertinência daquilo que tenho escrito, sobre festivais que abrangem os mais diversos suportes artísticos, explorando um núcleo temático de afinidades, aí está, já em segunda edição, o Festival da Quinta das Lágrimas, em Coimbra, verdadeiro paradigma nacional da lógica e coerência interna de programação. *

Uma vez definido o tema central desta segunda edição – Água – eis que a organização desenvolve a programação em diferentes ciclos, nos seguintes termos, que passo a transcrever:

Ciclo da Música

A história da música será representada desde o século XVIII (Handel, Telemann e dall’Abaco, Gluck, Mozart) até à actualidade (António Pinho Vargas, Angles), passando por uma diversificada galeria de notáveis criadores musicais histórica e/ou esteticamente radicados no século XIX (Haydn, Beethoven e Schubert; Chopin e Liszt; J. Strauss e Offenbach; Wagner, Mahler, Verdi e Puccini) e da(s) modernidade(s) que explode(m) no século XX (Debussy; Ravel e Chausson, Sibelius, Orff, Berio, Ligeti e Stockhausen), para além da evocação, em jeito de boas-vindas a Coimbra, de nomes como Luís Goes, José Afonso e Virgílio Caseiro.

Para a reinvenção deste reportório, e para além das boas-vindas a cargo da Orquestra Clássica do Centro e do Coro dos Antigos Orfeonistas dirigidos por Virgílio Caseiro, visitarão o Festival o Concerto Köln, a Orquestra Gulbenkian dirigida por Joana Carneiro e a Orquestra Metropolitana de Lisboa, dirigida por Cesário Costa, os pianistas Pedro Burmester, Etsuko Hirosé, Miguel Henriques e António Pinho Vargas, as cantoras Ana Quintans e Sónia Alcobaça, o Quarteto de Cordas de Matosinhos e o coro Lisboa Cantat. Assinale-se, ainda, a visita da Orquestra Geração durante a qual será divulgado o projecto social que a integra.

Ciclo da Coreografia

No âmbito coreográfico, têm lugar no Festival
“O auto da barca do Inferno” de Gil Vicente (séc. XVI) numa produção do TEUC (Teatro de Estudantes da Universidade de Coimbra);
“Maiorca” pela Companhia Paulo Ribeiro (séc XXI), sobre os “24 prelúdios” de Chopin.


Ciclo de Cinema

O cinema clássico será ilustrado por duas obras emblemáticas entre os filmes que misturam exemplarmente drama e aventura:
“Revolta na Bounty” de Frank Lloyd (1935);
“A rainha africana” de John Huston (1951).
Em contraponto, cabe a “Respirar (debaixo de água)” de António Ferreira (2000) representar o actual cinema português. E haverá espaço para o documentário “Oceanos” de Jacques Perrin (2009).


Ciclo da Palavra

A palavra escrita será representada por leituras de
“Carta de Pêro Vaz de Caminha” (séc. XV) por André Gago e Carlos Barretto.
“A menina do mar” de Sophia de Mello Breyner (séc. XX) por Beatriz Batarda, com música original de Bernardo Sassetti.


Ciclo das Artes Plásticas

Nos domínios das artes plásticas, estarão em permanência, durante todo o período do Festival, 4 exposições:
“Do mar profundo”, sobre ilustrações de Miguelanxo Prado para o seu filme “De Profundis”;
“Valsamar”, instalação de António Barros, a partir de um texto de José Tolentino Mendonça.
“Curtas sobre a Água: Messages”” com projecção de 11 filmes de vídeo, produzido pela Dupla Cena.
“Imaginário da Paisagem”, colecção BESart, curadoria de João Silvério.


Ciclo da Vida

A água como motora civilizacional e elemento de sustentabilidade ambiental incluirá:
“O rosto da água” de Viriato Soromenho Marques (água e civilização);
“Inventar a água”, projecto escolar sobre “A Menina do Mar” de Sophia de Mello Breyner;
“E a água aqui tão perto” com participação de Helena Freitas, Nelson Geada e Francisco Manso, com participação de Rui Ferreira dos Santos;
“As águas dos rios”com participação de Francisco Nunes Correia, Neves de Carvalho e Paulo Constantino, com participação de João Pedro Rodrigues;
“Água e Património” (projecto escolar).


Ciclo do Património

Finalmente, o festival proporciona um ciclo do património que será preenchido com 4 propostas:
“Por este rio acima”, percurso no Mondego a bordo do barco “Basófias” com música jazz ao vivo,
“Coimbra, um outro olhar”, percurso na cidade com apontamentos cénicos da Casa da Esquina
“Dos vinhos em volta” (visita à Quinta do Encontro em S. Lourenço do Bairro – Anadia)
“Desta água que corre” (visita ao complexo termal do Luso, Palácio do Buçaco e envolvente).


Ciclo da Gastronomia

Integra também o programa do Festival um ciclo gastronómico que inclui 3 jantares “gourmets”, confeccionados por:
Santi Santamaria, Ana Moura com apoio de Joachim Korper e Vítor Dias com apoio de Albano Lourenço,
Completa o ciclo a conferência “Sabores e luxúrias” de José Bento dos Santos sobre água e gastronomia.


Ciclo da Esperança

“Inventar a água”, Exposição permanente –trabalho de ilustração criativa por crianças dos 3 aos 5 anos.
“Correntes de Esperança” – Projecto da Orquestra Geração dirigida por Osvaldo Ferreira.
“Contos à volta do lago”, selecção de histórias para crianças pela Camaleão Associação Cultural.
“Regata Barco-Dragão”, no rio Mondego, organizada pela Câmara Municipal de Coimbra com a Associação Naval Amorense


Ciclo das Conferências

“Uma gota no Oceano” de Leonor Nazaré (água e representação)
“Marcas da água” de Alexandre Ramires (água e paisagem urbana).
“Águas mil” de Jorge Calado (água e fotografia),
“Desenhar a água” de João Miguel Lameiras (água e banda desenhada)
“Águas filmadas” de Abílio Hernandez (água e cinema).
“Os 4 rios do Paraíso” de Cristina Castel-Branco (água e arquitectura)


Escusado será confirmar que, a partir de hoje e até 1 de Agosto, antes de partir para Bayreuth, estarei em Coimbra sempre que puder. Como é de calcular, uma proposta com este calibre - já a primeira, no ano passado, subordinada ao tema Noite, foi extremamente atractiva - pressupõe uma equipa que não deixa os seus créditos por mãos alheias. Reparem nos responsáveis e principais colaboradores:

Manuel Ivo Cruz é o Presidente, enquanto que a Direcção é partilhada por
Cristina Castel-Branco, Ilda Rodrigues, José Miguel Judice, Luis do Amaral Alves, Luisa Braz de Oliveira, Margarida Mendes Silva, Nuno Antas de Campos, Pierre Lavoix, Teresa Costa Neves, contando ainda com a colaboração de
Abel Moura Pinheiro, Andrew Swinnerton e António Mega Ferreira.


Pois é, tudo gente de primeira água, que não estamos habituados a ver envolvidos em projectos de fancaria ordinária.

Enquanto o Festival de Sintra contou com equipas de qualidade análoga, o produto jamais se degradou. Durante décadas, coisa inimaginável seria o nível do descalabro de que venho dando conta nos anos mais recentes, opinião partilhada por imensos leitores. No meio do destempero, tenho a maior pena que, tanto o Dr. Luís Pereira Leal como Mestre Vasco Wellenkamp consintam que o seu trabalho se misture com o resto.

De qualquer modo, não tenho a menor dúvida de que, muito rapidamente, será possível recuperar a excelente reputação de que gozou o Festival de Sintra ao longo de tantos anos. Como escrevi há uns meses, soube que o Senhor Presidente da Câmara está preocupado com a situação. Basta que manifeste ele vontade nesse sentido e tome as medidas que se impõem - não sendo necessárias mais verbas do que actualmente - para que tudo se recomponha.

Então, Sintra não merece?


* http://www.festivaldasartes.com/
[o sítio é estupendamente concebido, uma lição de eficácia]



quarta-feira, 14 de julho de 2010

PRESIDENTE DA REPÚBLICA E SINTRA

Eles estavam lá! Insiste-se que estavam presentes, para que não sacudam para o lado.

Na breve passagem por Sintra, O Presidente da República fez declarações com muitos dos destinatários presentes. As câmaras televisivas mostraram.

A necessidade de "boas práticas locais" e que "é preciso muito cuidado na definição das prioridades" assentaram que nem luvas de pelica nos autarcas, ficando clara a exigência de muitas cautelas na gestão dos dinheiros públicos e dos investimentos.

Mas é essa a realidade do que se passa em Sintra?

Escutando as palavras de Cavaco Silva, salta-nos logo à memória a ameaça - o pedido de empréstimo para aquisição da Quinta do Relógio, proposto por Fernando Seara ameaça mesmo as finanças e o futuro dos munícipes - de se gastarem mais de 6 milhões de euros num bem improdutivo, que só enriquecerá os vendedores.

Nestas coisas, não há ABSTENÇÃO que se invoque, porque o bem-estar da colectividade não pode estar à mercê de qualquer "distanciamento".

Depois do "Monteiro dos Milhões", entrámos, pelas mãos de quem pouco tem a ver com Sintra, no Município dos Milhões...a crédito. Em Novembro de 2008 um empréstimo de 10.000.000 de euros; em Fevereiro de 2009 de 50.000.000 de euros a título de "construção e ampliação de novos equipamentos escolares"; Dezembro de 2009 mais 10.000.000 de euros; Em Janeiro de 2010 o empréstimo proposto foi de 26.607.629 euros (envolvendo a referida Quinta do Relógio, o Complexo de Fitares por 4.800.000 euros e "ampliação de equipamentos educativos" por 13.056.629,12 euros).

Será que o Dr. Passos Coelho, empenhado na sua Cruzada de Virtudes da Era Moderna, ainda não teve tempo de se debruçar sobre a vida sintrense e os mistérios que a mesma envolve?

Ontem, foi dito que a escola de Serra das Minas está a fornecer aos seus alunos uma refeição quente 365 dias por ano, mantendo o refeitório aberto durante as férias. O facto, podendo querer justificar dificuldades financeiras, leva-nos a repensar na forma como se "distribuem" dinheiros públicos em Sintra, que nos deixa muitas vezes abismados.

É uma pena que os cidadãos não acompanhem as deliberações da Câmara, apesar de muitas delas já não indicarem os montantes envolvidos, nomeadamente nas que agora se apelidam de "Contrato-Programa".

Ficariam a saber para onde vão milhões de euros. Notariam contradições inacreditáveis, se tivermos em conta que até associações de idosos ou outras de índole social por vezes não beneficiam de instalações condignas ou confortáveis, mas um Núcleo de Árbitros de Futebol "arrecadou" entre 2008 e 2009, qualquer coisa como 70.000 euros.

Pode o Presidente da República falar em "boas práticas locais", que os seus objectivos serão sempre contrariados enquanto Sintra não acabar com a política de distribuição de subsídios com os mais diversos pretextos, de onde resultam, certamente, muitos votos.

Antes deveria aplicar os dinheiros directamente no efectivo desenvolvimento local, aos níveis social, cultural e desportivo. Até lá, a indignação terá de ser a principal arma dos munícipes.

Não nos podemos calar.

Fernando Castelo


(Para aceder às "Deliberações" Camarárias:

2007
http://www.cm-sintra.pt/Categoria.aspx?ID=190
2008
http://www.cm-sintra.pt/Categoria.aspx?ID=241
2009
http://www.cm-sintra.pt/Categoria.aspx?ID=253
2010
http://www.cm-sintra.pt/Artigo.aspx?ID=4592

segunda-feira, 12 de julho de 2010

O malandro do futebol…


Decididamente, o futebol não é coisa que me suscite qualquer particular interesse. E tanto assim é que, em toda a minha vida, apenas por duas vezes, entrei em estádios para ver um desafio, a última das quais há cerca de quarenta anos. Embora saiba as regras e consiga perceber se e quando uma equipa joga como grupo coeso, o melhor é não entrar em detalhes porque muita coisa me escapa.

Se, ao longo do ano, não me passa sequer pela cabeça ver qualquer jogo pela televisão, o mesmo se não passa quando o contexto é internacional e a selecção portuguesa anda por lá. Se assim for, até sou capaz de ver um ou outro desafio desde que nada de mais interessante haja para fazer na altura.

Não admira, portanto, que até eu, completamente a leste do futebol, nestas últimas semanas, tenha visto quatro das partidas disputadas no Campeonato do Mundo, dentre as quais as que opuseram a nossa equipa à Coreia do Norte e à Espanha, a Alemanha à Espanha e, ontem, a final.

Quanto ao encontro com a Coreia, foi de tal modo atípico que aquele resultado até podia ter sido mais expressivo, perante um adversário perfeitamente desarticulado. Foi um autêntico bater no ceguinho. Quanto ao desaire com a Espanha, quero lá bem saber se o insucesso da nossa equipa fica a dever-se à falta de sentido de estratégia do Prof. Carlos Queirós ou ao amadorismo do Dr. Madaíl como gestor da Federação.

Até um desconhecedor como eu pôde verificar, isso sim, como os nossos jogadores, depois de sofrido o golo marcado pelo Villa, nunca mais se encontraram, e, sem ponta de força anímica, cederam a uma equipa determinada que, percebe-se, fez o trabalho de casa que foi preciso, sem grande estardalhaço, mas de modo tão convincente que, dizem os conhecedores, mesmo o primeiro encontro com a Suiça terá dado para entender que o resultado negativo seria tudo menos concludente.

A Espanha e os outros

Bastaram tónicos de um a zero para que, até à tarde de ontem, a Espanha tenha imposto ao mundo a força do seu futebol. Mas só isso, só o futebol. Mal da Espanha se – infelizmente, como acontece em Portugal…– precisasse do resultado do seu desempenho neste campeonato de futebol na África do Sul, para se afirmar como um país capaz.


A Espanha é, sempre foi um grande, grande país. Tal como a França, a Alemanha, a Holanda, a Inglaterra, a Itália, grandes países europeus e de inegável gabarito mundial, com os quais emparceira na grande Arte, na Ciência que neles acontece há muitos séculos. Não pelo futebol, coisa relativamente recente e secundária, mas inequivocamente mediática, que a Espanha e os outros citados, como grandes países que são, também acabariam por cultivar com grandeza. Pois claro, com a grandeza de sempre.

Mas significa isto que há outros, outros, de segunda linha? Então, Portugal? Bem, decididamente, não pertence àquele grupo. É outra coisa. Mas não é a mesma coisa que a Suécia, a Finlândia, a Dinamarca, a Noruega, a Áustria, a Suiça, etc., por exemplo, onde os índices económicos andam de mão dada com um inequívoco bem estar dos cidadãos, onde as Artes e as Ciências se cultivam ao mais alto nível, onde o futebol, enfim, também se joga, de vez em quando com sucesso.

Os outros e Portugal

Não, Portugal nem pertence ao grupo dos grandes que inclui a Espanha e os outros cinco e também não se aproxima sequer dos do parágrafo precedente. Não, Portugal é coisa bem diferente. Quanto ao que espera do futebol, a plataforma em que se situa é mais próxima da que se vive noutras latitudes. Se bem entendem, algo mais de América do Sul, do género Brasil, México. É um país europeu mas muito longe da Europa, continente, aliás, para onde continua a emigrar, apesar de pertencer à União Europeia e até estar integrado na zona Euro…

Como não atina em quase nada, como está na cauda de tudo quanto há para escalonar [e quando está à frente, como no caso da mortalidade infantil – sucesso do Sistema Nacional de Saúde, coisa pública e com muita honra – não está descansado enquanto não entregar tal êxito nas mãos de privados…] atira-se ao futebol, qual tábua de salvação, na expectativa de que eventuais êxitos devolvam aos cidadãos um pingo da auto-estima de que estão em perda há gerações. Naturalmente, de vez em quando, o futebol até faz um jeitinho, como em 1966, governava Salazar, lembram-se?…

Mais recentemente, o sucesso teima em não chegar, apesar de investimentos absolutamente catastróficos, em estádios de futebol, alguns dos quais estão às moscas, projecto concretizado sob a orientação de um ministro – lembram-se? – que é hoje Primeiro Ministro. A classe política desespera. O Governo, em aflição, nada mais pode fazer do que cobrar impostos iníquos, sem a alegria de um lugarzito minimamente digno no campeonato. Nem aos quartos de final chegou a selecção…

É o horror instalado nas hostes. O povo patrioteiro (não patriota, incapaz de perceber que o patriotismo é a outra face do civismo…) espeta as bandeiras, grita, acompanha o autocarro ao aeroporto, sopra na vuvuzela e nada! Fica na fossa, na fossa do mais profundo desânimo, contando os tostões que o Governo, mesmo assim, insiste em receber, sem a compensação de uma alegria que suavizasse tanto descontentamento.

Neste Sudoeste europeu, os deuses não dão sinais de qualquer mercê. A velha crise nacional, há muito endémica, continua a fazer o seu estrago. A crise global agravou a que estava muito longe de ser debelada. E nem o futebol – tanta esperança que havia no futebol, para esconder ou fazer esquecer os lamentáveis índices que os diagnósticos vão evidenciando, com tanta crueza – nem o futebol, que injustiça, dá uma mãozinha! Ou deveria escrever um pezinho? Tratando-se de futebol, é capaz de ser mais apropriado…







sexta-feira, 9 de julho de 2010


Sintra, papas e bolos


Acabo de confirmar que a décima etapa da Volta a Portugal em Bicicleta vai acontecer entre Sintra e Lisboa. Adivinha-se o trabalho da Câmara Municipal para que a referida prova por aqui passasse.

Naturalmente, em relação ao saudável desporto que é o ciclismo – que, como se sabe, em nada se relaciona com aquela e outras Voltas nacionais e estrangeiras… – logo ocorre a promessa do Dr. Fernando Seara de dotar o concelho não sei com quantas e quantas dezenas de quilómetros de ciclovias.

Pena é que, nesta próxima ocasião de festa ciclista, não seja possível inaugurar nem um centímetro de tão desejadas pistas. Fácil é abrir a boca e prometer. Fácil é anunciar dedicação a rodos. Muito mais difícil, isso sim, a capacidade de concretizar qualquer iniciativa de apoio a modalidades desportivas que ultrapasse a habitual futebolada tão cara ao Presidente.

Ciclovias? Uma piscina em cada freguesia? De facto, não se trata apenas de mais algumas das flagrantes promessas por cumprir em que tão pródigo é o chefe do executivo municipal. Por favor, não é preciso insistir. Bem sabemos, ele há muita maneira de designar as papas e os bolos com que se enganam os tolos…





quarta-feira, 7 de julho de 2010


AINDA AS CASAS DA CP


Muitas vezes tem sido referida a necessária tomada de medidas que eliminem estas degradantes imagens de Sintra, oferecidas a sintrenses e visitantes.

Infelizmente, as histórias de encantar propaladas com a dedicação a Sintra da RTP, não têm contemplado esta zona de chegada de milhares de turistas.

É isto turismo? É isto desenvolvimento? É Isto uma situação compatível com a exigível tomada de medidas para que Sintra seja prestigiada cá dentro e lá fora?

As imagens falam por si.























Entretanto...a última imagem recolhida é esta:













(Por favor, clicar sobre as fotos para melhor apreciação)

Fernando Castelo

segunda-feira, 5 de julho de 2010



As casas da CP


Ao passar pelos números vinte e oito e trinta da Rua Dr. Alfredo da Costa, estamos na zona da estação terminal do famoso Larmanjat. Em qualquer local civilizado – Sintra, infelizmente, teima em não seguir essa pauta – haveria uma placa relativa a esta memória, tão curiosa, do percursor do serviço de caminhos de ferro entre Sintra e Lisboa. Aqui não há qualquer menção, nada.

Nada, enfim, é como quem diz… Porque, afinal, até há muita coisa. Há o costume e o que seria de esperar, ou seja, imundície por todo o lado, a partir de dois corredores que abrem para um amplo e sombrio pátio, onde as designadas casas da CP, degradadíssimas, desbotadas, afaveladas, ali estão à devassa de quem, à cota mais alta, na Av. Miguel Bombarda, a rua da estação, se detém espreitando e até fotografando – que vale a pena levar esta recordação de Sintra Paisagem Cultural da Humanidade – testemunho da tão proverbial e sintrense cultura do desleixo.

Como é possível tanto desaforo, tanta desatenção do município e de quem, ao longo de uma década, ainda não teve maneira de exercer a autoridade democrática de que está investido, no sentido de obviar esta e outras quejandas situações. É certo que isto se arrasta há dezenas de anos. Tal como a Garagem Sintra, também a poucos metros, e, na mesma freguesia de Santa Maria, passou a constituir mais um atestado de geracional incompetência da gestão autárquica.

É uma vergonha, apenas mais uma, a envenenar o quotidiano de quem não se demite da denúncia que se impõe. A propósito, como não recordar a amargura com que o nosso bom e saudoso José Alfredo acabou os seus dias, desgostoso de assistir à degradação da sua e nossa Sintra. Como o compreendo, eu que já tenho filhas aqui nascidas, a caminho dos quarenta, e netos que jamais viram esta terra como nós, os mais velhos, nos recordamos.

Ao contrário do que acontece em tantos lugares, cá e lá por fora, que melhoram com o passar do tempo, Sintra regride. Sintra dá-se ao luxo de mostrar estes cantos e recantos podres, mal cheirosos, desafiando quem daria o que não tem para poder dispensar semelhante espectáculo.



sexta-feira, 2 de julho de 2010



Bolonha, sinais dos tempos

No passado sábado, dia 26 de Junho, o jornal Público trazia um anúncio que deve ter chamado a atenção a muita gente. Passo a reproduzir o que, na economia deste meu texto, é a parte útil daquela mensagem:


“Admissão de Administrativo(a) / RP / Associação Pública Profissional pretende seleccionar colaborador(a) para as áreas de administração e de relações com o exterior / Habilitações requeridas: Licenciatura pré-processo de Bolonha (cinco anos) ou Mestrado pós-processo de Bolonha em áreas de Administração e de Relações Públicas (…)”

Atestando análoga atitude, traria à colação o litígio entre o Dr. Marinho Pinto e os candidatos ao estágio na Ordem dos Advogados, agora obrigados a submeterem-se a um exame de acesso depois de o Bastonário ter verificado quão deficiente é a preparação académica dos pretendentes, bem patente, aliás, nos resultados da prova em apreço, traduzidos em apenas 10% de notas positivas…


Não há dúvida de que estes são sinais dos tempos. E sinais demasiado preocupantes para que não nos detenhamos, embora muito sumariamente, na reflexão que merecem. Para quem tivesse andado algo distraído, aí estão os indícios de que, não só os potenciais empregadores mas também as próprias associações profissionais, desconfiam dos cursos superiores e consideram-nos incapazes de proporcionarem os conhecimentos que é suposto serem adquiridos pelos jovens que os frequentam no sentido de se candidatarem ao mercado de trabalho.


Uma certa dose de desleixo e de falta de exigência, bem como quantum satis de facilitismo institucionalizado, constituem a explosiva mistura que, já há muitos anos, vem armadilhando a granada. Desde o ensino secundário – isto para mais não recuarmos… – até ao superior, geralmente anquilosado e reprodutor de modelos perfeitamente ultrapassados, que recebe os jovens já com imensas deficiências, eis o quadro que, grosso modo, está na origem da impreparação da geração recém-licenciada de acordo com o modelo Bolonha.

Todavia, o problema é muito mais compósito e complexo do que, até ao momento, estes simples e despretensiosos parágrafos indiciam. Como não pretendo meter a foice em seara alheia, apenas me circunscreverei aos cursos superiores de Letras, nomeadamente os de Línguas e Literaturas Modernas, mais curtos do que os das Licenciaturas de antigamente, nas diferentes áreas filológicas (clássicas, românicas, germânicas) que bem conheço por se reportarem ao meu modelo académico de origem.


Para não me alongar para além do desejável, apenas me detenho num aspecto da questão, lembrando que, portanto, muito antes do modelo de Bolonha, já havia professores de Português que jamais aprenderam uma palavra de Latim. Afirmo, sob palavra de honra, sem qualquer ponta de hipérbole ou de ironia, desconhecer como é possível ensinar Língua Portuguesa, em qualquer dos níveis e ramos de ensino, sejam quais forem os destinatários, sem ter aprendido Latim…*
Vem este caso à baila, tão somente, no sentido de estranhar que, de momento, tal como já aconteceu com os empregadores e associações profissionais acima mencionados, ainda não tivessem surgido associações de pais e de encarregados de educação preocupadas com a bagagem científica dos professores de português dos seus filhos e educandos.

Ou muito me engano ou muito não faltará para que, em tempo oportuno, assistamos a manifestações nesse sentido… Ah, se tais cidadãos contribuintes soubessem alguns detalhes, menos convenientes ou politicamente incorrectos, do cabedal científico e académico de alguns dos pseudo mestres a quem entregam os miúdos para que estes aprendam o que eles, pais, julgam que, na realidade, é ensinado competentemente!...

Entretanto, uma das poucas coisas que podem fazer, será aceder à informação disponível. Recentemente, por exemplo, a Dra. Maria do Carmo Vieira publicou O Ensino do Português, em edição da Fundação Francisco Manuel dos Santos, obra perfeitamente acessível e esclarecedora da situação enunciada no título. Leiam e, depois, tirem as conclusões. Certamente, não se afastarão daquelas a que chegaram, tanto o redactor do anúncio como o Dr. Marinho Pinto…

* A propósito, ler no sintradoavesso O desconcerrto da citação, 18.04.08 e Acordo ortográfico, 04.04.08