[sempre de acordo com a antiga ortografia]

quinta-feira, 27 de setembro de 2007

Na Casa Mantero





Tomei-lhe o gosto e não saio da Correnteza, este nobre espaço cujo arranjo remonta ao tempo em que o General Francisco Higino Craveiro Lopes foi Presidente da Câmara Municipal de Sintra. Actualmente, não tendo abandonado a sua inicial vocação de zona residencial, nascida por altura da construção da linha de Sintra, marcam-lhe a face, a vertente de jardim, de passagem, entre a estação dos comboios e a zona de Serviços onde avultam a Biblioteca e a Segurança Social.

Não conheço sintrense que não tenha saudado com júbilo a recuperação da Casa Mantero, no contexto da construção da Biblioteca Municipal e da sua mútua articulação, depois de dezenas de anos de abandono. Tudo é positivo. É do melhor que Sintra disponibiliza aos seus munícipes e visitantes pelo que quaisquer referências só podem afinar pelo diapasão de uma qualidade que importa saber manter intransigentemente.

Gostaria hoje de fazer uma particular referência ao restaurante que funciona no rés-do-chão e à esplanada anexa. Não há muitos lugares que possam gabar-se de tão estratégica como magnífica implantação. Calculo quais possam ser as limitações impostas a quem procede à exploração comercial do espaço que, em função da sua íntima relação com a Biblioteca, estará altamente condicionado quanto a horários, características das próprias refeições, impedimento de determinados consumos, por exemplo, de bebidas alcoólicas, etc.

Atrevo-me a afirmar que, numa tal localização, apetece poder almoçar, jantar e cear aquilo que poderia oferecer um pequeno mas muito bom restaurante, com excelente cozinha e líquida oferta a condizer. Que pena se tal não puder ser equacionado. Não sendo possível, ainda assim, se aconselha vivamente a lá ir e permanecer. É de divulgar e não estragar.






Ainda na Correnteza

A Biblioteca Municipal é um edifício do maior interesse, quer em termos do enquadramento e articulação com a recuperada Casa Mantero, quer ao nível da sua própria arquitectura que obedeceu a um projecto cuja estética privilegia o carácter não impositivo, despojado.

É um equipamento discreto onde acontecem as melhores coisas de Sintra. Não concordam comigo que o melhor dos locais de vocação cultural e educacional é aquele onde se motiva e se faz animação da Leitura? Pois, como não têm outro remédio senão anuir, o melhor é lá irem confirmar. E fazerem-se leitores, levarem os filhos, os netos à Bedeteca, interessarem-se no sentido de que, actualmente e mais tarde, as crianças e jovens da família frequentem um espaço tão cativante.

A Biblioteca é indissociável da Correnteza. Assim sendo, a Correnteza, o jardim da Correnteza, todo aquele espaço da varanda de Sintra só pode funcionar, pelo menos, tão bem como a própria Biblioteca. Ao contrário do que é normal acontecer em Portugal, os edifícios não são ilhas, articulam-se intimamente com o exterior circundante. Daí que, neste caso, por exemplo, a bibliotecária municipal esteja, com certeza, tão preocupada como eu no sentido de que a Câmara Municipal de Sintra cumpra o que deve para que seja reposta a harmonia do local.

(continua)
Na Correnteza

Não percebo a razão pela qual os sintrenses se desinteressaram deste espaço. É tão especial, tem uma situação tão estratégica sobre o Vale da Raposa, o panorama que se alcança daquela varanda é de tal modo abrangente e soberbo que, na realidade, dificilmente se compreende como pode assim tratar-se um local tão aprazível.

O pavimento, em calçada à portuguesa, já conheceu melhores dias. Actualmente, é irregular, até algo esburacado. Há um cantoneiro de limpeza que, diariamente, faz o que pode, com uma alegria e eficácia que contrastam com tudo o que, de resto, por ali apenas são sintomas de desleixo.

Os escrementos dos pombos, certo é que são varridos, mas acumulam-se em tal quantidade que basta um pouco mais de humidade para tornar escorregadio e perigosíssimo aquele piso que deveria estar impecável para poderem passear os namorados de todas as idades, as famílias em seu sossego, os bebés nos primeiros passos, correndo atrás das aves.

Faltam traves aos bancos de jardim, não estão adequadas, à segurança exigível, as condições gerais de desfrute do local. E é uma pena que assim seja porque, na verdade, quem atravessa regularmente a zona, não pode deixar de reconhecer que, de vez em quando, há tentativas de melhorar a situação.

Ainda há dois ou três meses foram de verde pintadas as armações de madeira às quais se abraçam, quando disso é o tempo, as velhas glicínias floridas, outro espectáculo para a vista e uma embriaguez de perfumes. A principal razão de queixa é, como em tantas outras situações, quer em Sintra quer no país em geral, a falta de manutenção sistemática que, umas vezes, deveria ser diária, noutras mais intervalada, periódica.


Trata-se de um problema cultural que, em função das taxas do analfabetismo pleno, da iliteracia - infelizmente sem termo de comparação possível em noutro país parceiro da União Europeia - parece não afectar o cidadão comum, que não tem a educação de base indispensável, sequer para perceber que outro galo poderia cantar se se sentisse ofendido...

(continua)
A caminho da Correnteza

Iniciado o passeio em pleno coração da sede do concelho, na Estefânea, escolhemos o caminho para a Correnteza, através da Rua Câmara Pestana, onde ainda se conservam, de outros tempos, os vestígios de zona de charneira, periférica, entre a urbe e os campos limítrofes, servindo as frescas quintas de Santo António, a Vila Eugénia, e, um pouco mais à frente, a dos Plátanos.

A Câmara Pestana era rua de sossegos. Com o encerramento da Heliodoro Salgado e a modificação dos fluxos de trânsito, transformou-se em via declaradamente perigosa. Já tenho assistido à iminência de acidentes cuja causa mais comum é a velocidade com que por ali circulam os automóveis, conduzidos por autênticos criminosos que, ignorando os limites, transformam a rua em pista de autódromo.

Já não sei quantas vezes os residentes, fregueses de Santa Maria e São Miguel, solicitaram à Junta e à Câmara a instalação de bandas dissuasoras da velocidade. Mas não, não foram ainda contemplados com tal benefício. Devem estar à espera que aconteça mesmo o acidente indispensável. A edil Edite Estrela, por altura do fim do seu consulado, teve o topete de afirmar, numa sessão pública, que era preciso ser muito prudente com a instalação de tal dispositivo porque as mulheres grávidas até podem abortar...


Assim, não admira que, às tantas, as coisas venham a apresentar-se da maneira mais contrária ao interesse da comunidade.

Feitiço

Chegou o Outono, ameno, sem excessos, impositivo, apenas quanto baste, para uma doce exaltação dos sentidos, como em nenhuma outra época do ano. A luz, mais oblíqua, arrasa nascentes e poentes. Tão aumentada é a quantidade dos matizes que explode o espectro cromático em tons difusos, inusitados. O vento, de tanto abrandar, parece extinguir-se. Mas não, aí está, sereníssimo, da Serra descendo com os cheiros dos primeiros apodrecimentos.

Quando damos por isso, tão evidente é a quietude que acabam por se fundir Tempo e Espaço. É possível? Pois é. Coisas do Outono, neste declínio de Setembro, preâmbulo de festas cíclicas, de castanhas e vinhos novos, promessa de sossego, sempre cumprida antes das tormentas invernis.

Sintra é um perigo no Outono. Há quem fique tão cativo do apelo vindo dos montes que não consegue meter-se no comboio para ir trabalhar. Acontecendo isso, o melhor é mesmo obedecer ao feitiço do chamamento, ousar não ir, deixar o cais e a estação, partir para outros caminhos...

quarta-feira, 26 de setembro de 2007

O Guarda Leão

Na sequência do texto ontem publicado, alguns leitores que conhecem o Guarda Leão, tão bem ou melhor do que eu, consideram que haveria vantagem em que escrevesse um pouco mais acerca dele. Pois, sim senhor, a pedido de várias famílias, como soe dizer-se, aqui vão mais umas notas sobre o homem. [Antes de o fazer, contudo, gostaria de lembrar que podem e devem utilizar a possibilidade de escrever quaisquer comentários, pedidos de esclarecimento, etc., no espaço do próprio blog reservado para o efeito, evitando o recurso a mails ou telefonemas que, naturalmente, não são partilhados].

Os guardas são como os chapéus, há muitos, para todos os gostos e de todos os feitios. Há até alguns, como o saudoso guarda Ricardo, nacional figura de cartoon, que se permitia insinuar as mais inteligentes e ingénuas farpas, suscitadas por episódios bem reais da vida nacional... O Guarda Leão, é bem real, se bem que, no exercício da autoridade, algumas das suas bem concretas e contundentes atitudes, possam apontá-lo como personagem de quase ficção.

Neste momento, não sei por onde anda este agente da PSP que deixou marca absolutamente indelével em Sintra pelo modo como, corajosamente, enfrenta qualquer prevaricador. Com toda a pachorra, faz por ignorar a directa ou indirecta chacota com que é mimoseado. Num país onde, sobretudo, se valoriza o jeitinho, não se respeita, antes se contorna o cumprimento da Lei, onde qualquer cidadão é tanto mais habilidoso, espertalhão e bem sucedido quanto melhor souber safar-se, o Guarda Leão constitui tal excepção que, nem por um só momento, hesitaria em classificá-lo como o último abencerragem...

uma leonina actuação...


Sei tanto acerca do que hoje dou conta neste escrito que, eu próprio, serei testemunha de defesa do Guarda Leão, quando o Meretíssimo Juíz do 3º Juízo Criminal de Sintra decidir, finalmente, marcar o julgamento de um Processo Comum (Tribunal Singular) em que o Autor é o Ministério Público e arguida uma senhora que, em 2003, em plena via pública, na Rua Câmara Pestana, à porta da Junta de Freguesia de Sta. Maria e São Miguel, perante a actuação do referido agente, contra uma sua prática de estacionamento proíbido, teve o desplante de o insultar e ridicularizar.

A atitude do Guarda Leão da PSP está nos antípodas da que - precisamente hoje, nas mesmas circunstâncias, portanto, no mesmo local - se pode assistir por parte dos agentes da GNR. Como a Lei não mudou, ou a lógica é uma batata ou a actuação da PSP era quixotesca ou a da GNR é tudo menos recomendável, já que se afigura fora do dispositivo legal vigente... Então a autoridade, umas vezes tolera e noutras corta a direito? Quem define tais orientações, desobrigando-se do escrupuloso cumprimento do espírito e da letra da Lei?

Como não me passa pela cabeça que haja um qualquer comando local a orientar os agentes num tal sentido de actuação que possam incorrer numa conivência com os prevaricadores, apenas me resta esperar por um esclarecimento tão oportuno quanto possível. A ver se sossego e se me deixo destas invectivas que, cada dia que passa, mais razão encontram para continuarem. Apenas tenho aludido a casos na Estefânea mas, como terão oprtunidade de me acompanhar, verão que na Vila Velha, na Regaleira é a mesma coisa.

Digna herança


No cumprimento da Lei, seja em matéria de estacionamento ou outra qualquer, os agentes, todos os agentes, não podem deixar de agir como o guarda Leão da PSP. Os sintrenses esperam da GNR, têm direito, como todos os portugueses, que não haja esmorecimento da sua parte. Esperam da GNR uma atitude que honre o passado nobilíssimo da autoridade, em defesa dos cidadãos munícipes de Sintra, que já chegou a custar a vida de alguém, como a do guarda Delfim, cujo sacrifício ninguém esquece.

Dir-me-ão que não é preciso dramatizar. Concedo pela afirmativa. Todavia, por vezes, parece não restar outro caminho, tão aviltados estão princípios e valores pelos quais todos dizem bater-se. Talvez que uma pontinha de drama tenha benéficas consequências na mente de quem, tão somente, está habituado a partilhar o drama vivido no espaço demarcado pelas quatro linhas dos campos de futebol...
Saudades do agente Leão


Se alguma dúvida poderia subsistir quanto a uma assumida estratégia de tolerância que a Guarda Nacional Republicana estaria a concretizar em Sintra, relativamente à questão do estacionamento, ontem ficou definitivamente dissipada.
Para atestar tão flagrante conclusão, socorro-me do autêntico barómetro que constitui o caso do estacionamento ilegal de viaturas sobre o empedrado em frente ao edifício onde está instalado o Centro Cultural Olga Cadaval. Durante todo o dia o espaço esteve atravancado de carros, numa tal quantidade que ultrapassou mesmo a do dia em que o então Ministro da Administração Interna, António Costa, veio apresentar naquele auditório um qualquer sistema de segurança para taxis. O exemplo de laxismo do ministro das polícias, parece ter frutificado e de que maneira!...
Ou a GNR esclarece em definitivo qual é a sua posição, perante o respeito a que está obrigada de salvaguarda da Lei, em matéria que é da sua estrita competência, isto é, impedindo o estacionamento onde ele não é autorizado, ou, então, deveremos concluir, para todos os efeitos, que entrou em regime de conivência com os prevaricadores.
Fica o observador atento perfeitamente desconcertado ao lembrar como, apesar de todo o desleixo habitual, da tal cultura da irresponsabilidade, durante anos e anos a Polícia de Segurança Pública, multou quem se atrevia à prática da ilegalidade em questão. Foram montados pilaretes, postes em ferro circundando o recinto, tudo no sentido de impedir e dissuadir o acesso ao local. E agora, fazendo tábua rasa de tudo quanto está determinado, a autoridade passou a autorizar o desmando... E esta, hem?!...
Na realidade, quem se escandaliza com a situação que, quotidianamente, salta à vista, não o faz por razões de ordem estética (como, no dia 18 do corrente, insinuava alguém que acrescentou um comentário ao Notas Diárias da data precedente). O escândalo causado radica numa evidente prática de injustiça que consiste em considerar normal, em sancionar positivamente os habilidosos e espertalhões do costume, que não utilizam os lugares de estacionamento disponíveis no parque da EMES, furtando-se ao pagamento da respectiva tarifa, contando com a designada tolerante benevolência da autoridade.
Isto, meus senhores, causa escândalo, é injusto, não é um problema menor. Infelizmente, não só constitui sintoma do estado a que as coisas chegaram em Sintra, mas também faz parte da síndrome que afecta o país em geral, muito para além da específica matéria do estacionamento. Em Sintra, urge equacionar e concretizar medidas que ponham cobro a esta vergonha de terceiro mundo, de acordo com as soluções objecto do texto publicado neste espaço no passado dia 13. Não são de minha autoria mas as únicas que, até hoje, se conhecem e praticam em latitudes consideradas civilizadas...
Entretanto, estou cheio de saudades do agente Leão da PSP...

terça-feira, 25 de setembro de 2007

Acesso à Pena,
um caso especial(íssimo)



Ao longo de anos, através de artigos em vários meios da imprensa regional, tenho-me permitido avançar com alternativas para resolução de situações, cujos contornos - por ainda não terem sido modificados - continuam a determinar indispensável e prévia reflexão que conduzam à subsequente adopção de medidas que tardam.


Uma dessas situações é a do acesso ao Castelo dos Mouros e Parque da Pena. O absoluto privilégio de ter tão excepcionais lugares ao pé da porta, não tem constituído, como deveria, motivação bastante para que os responsáveis tivessem decidido, com a correcção que se impõe, quanto ao modo de ali aceder, sem comprometer valores e princípios tão inquestionáveis como os afins da defesa do ambiente.


Ora isto é realmente deplorável em qualquer país e, por maioria de razão, hoje mesmo, em Portugal, dia em que o primeiro ministro se dirige à Assembleia Geral das Nações Unidas chamando a atenção para o respeito intransigente dos limites convencionados para as emissões de gases que agravam o efeito de estufa. Neste caso, como em todos os demais, o discurso tem que estar sintonizado com a acção e a acção, muitas vezes, passa pela alteração de hábitos e comportamentos lesivos dos mais nobres propósitos que, naturalmente, não podem ficar-se pela declaração de intenções...



Que Pena!...

Em Notas Diárias, deste mesmo blogue (*), lembrava eu uma série de alternativas relacionadas com a necessidade de resolver o caos instalado em Sintra no domínio do estacionamento. Tratando-se de um problema que carece de abordagem sistémica, o estacionamento articula-se com muitas outras questões, entre as quais a do controlo dos fluxos de trânsito. E, como não poderia deixar de acontecer, mencionava os casos do Castelo dos Mouros e do Parque da Pena, propondo, nomeadamente:

"(...) por razões de carácter ecológico, encerramento do trânsito automóvel individual em direcção à Pena e Castelo dos Mouros, apenas permitindo o acesso a veículos de transporte colectivo «amigos do ambiente», eléctricos - incluindo funicular - mistos, biodiesel, etc., também as grandes galeras de tracção animal, a exemplo do que já sucede há décadas, em congéneres lugares europeus (...)".
Na realidade, conheço vários e famosos lugares europeus, onde estão implantados bens patrimoniais tão estimáveis como a Pena, analogamente na encosta ou no cimo de montanhas, onde não se coloca, nem por sombras, a remota hipótese do acesso em carro próprio... Quem quiser, pois que vá a pé, de autobus ou utilizando o serviço hipomóvel. E, garanto-vos, não deixa de gozar que nem um perdido.
Deixo apenas dois exemplos, Hohenschwangau e Neuschwanstein, os castelos reais de Luís II da Baviera onde, depois de íngreme subida, por vezes, ainda é preciso esperar horas para a visita. E não consta que, devido à aparente dificuldade do acesso, tenha decrescido o interesse de potenciais visitantes...
Como esquecer o testemunho, tão certo, tão a propósito do meu bom e saudoso amigo, Manuel Rio-Carvalho, que afirmava ser indispensável merecer o privilégio da Pena, sofrer até, para lá chegar, e, só então, acabar por ganhar o doce prémio daquela revelação, alcançada com dificuldade e esforço. Afinal, como tudo o que, na vida, se nos revela como grande, belo, imperdível e que passa a constituir nosso património pessoal. Uma autêntica epifania...
Esperança, apesar de tudo
O que, no caso da Pena continua a surpreender é que, depois de, há quase dez anos, ter sido condicionado, o acesso à Pena em viatura particular acabasse por ser retomado tão displicentemente. E ainda, com foros de perfeito escândalo, mais admira que a administração da responsabilidade de Paulo Serra Lopes, tenha decidido instalar parques de estacionamento, que tanta controvérsia suscitaram, com uma irresponsabilidade que só é filha da ignorância, convidando os visitantes a fazerem-se transportar nos seus carros...
Instalada, indelevelmente entranhada uma lusitana cultura do desleixo que origina atitudes que tais, continuamos a arrostar com danos evitáveis se forem concretizadas as civilizadas medidas que acabarão por acontecer. Eu tenho uma enorme esperança nos resultados da gestão do Professor António Ressano Garcia Lamas que, na condução dos destinos da empresa Parques de Sintra Monte da Lua, está a dar passos extremamente significativos no sentido de a todos devolver - aos sintrenses em particular, que estes cantinhos são muito nossos - o usufruto de um património sublime que, antes de si, foi tão desrespeitado.
Tenho muita confiança porque vou acompanhando os trabalhos em curso. Aliás, deixem-me aconselhar que façam como eu, voltem a vossa atenção para tudo quanto diga respeito à PSML porque, da Serra, os sinais são dos mais consoladores, daqueles que causam maior lenitivo, compensando outros males que, em Sintra, não dão descanso. Enfim, como se tal fosse possível...

(*) vd. Notas Diárias, 13.09.07

segunda-feira, 24 de setembro de 2007

Vale da Raposa? Mas que insistência...

Em continuação da abordagem de questões de estacionamento, o que não falta é assunto permanente uma vez que, só muito raramente, se resolvem os problemas.

Conforme têm acompanhado, venho chamando a atenção para a zona da Estefânea, em pleno coração do concelho. Infelizmente, estamos longe de ter esgotado as persistentes razões de queixa - que se articulam com preocupantes situações de insegurança - cuja resolução deverá ir de braço dado com o ordenamento dos fluxos de táfego, com a adopção de um civilizado regime de cargas e descargas, etc.

Não me passando pela cabeça que a questão do estacionamento possa ser considerada isoladamente de um contexto muito mais vasto, pareceu-me particularmente bizarro que esta perspectiva global e integrada de análise do problema estivesse, não direi ausente, mas tão significativamente esbatida dos testemunhos inseridos no artigo publicado pelo Jornal da Região de 4 a 10 do corrente.

Mais intrigante, contudo, me pareceu que todo o enfoque da matéria noticiosa incidisse sobre a possibilidade de retomar o projecto de construção de um parque de estacionamento subterrâneo, no Vale da Raposa, solução que, em diferentes ocasiões, foi liminarmente repudiada por diferentes entidades, objecto de intervenções em sede de Assembleia Municipal e, inclusive, tendo merecido uma «tirada de peso» do actual Presidente da Câmara, dando a entender que tal só seria possível por cima do seu cadáver...

Quem dirá o que será?

Que o sítio é lindíssimo e do mais apetecível, que há por ali grandes interesses económicos envolvidos, disso ninguém parece ter a mínima dúvida. Frágil em termos ambientais e muito vulnerável - perante a cupidez de promotores imobiliários que, aqui e em todas as latitudes, mascaram os seus reais objectivos sob a capa de uma aparente preocupação ecológica - está o Vale da Raposa, mais uma vez nas bocas do mundo.

Tanto quanto me parece e julgo saber de boa fonte, há um projecto que pode ser digno das características do local, o qual não pressupõe qualquer vertente de parque de estacionamento à superfície, subterrâneo, em sucalcos ou sob qualquer outro disfarce. E parece ser coisa tão interessante que terá recebido encómios de avaliação por parte de peritos da Unesco. Como há quem disto saiba mais pormenorizadamente e, de algum modo, sendo responsável, mantenha estratégica reserva, não serei eu a quebrar o efeito de uma certa expectativa.

Não deixa de me parecer curioso como ainda há quem insista em não compreender que as razões aduzidas, por residentes, militantes ambientalistas e da defesa do património, contra o parque projectado há sete ou oito anos para a Volta do Duche, continuam perfeitamente pertinentes para algo que se perfilaria, na Correnteza, apenas trezentos metros a montante...

Vá lá perceber ...

E também custa a perceber como se pode continuar a fazer orelhas moucas à voz da razão, que aponta a solução de respeitar e potenciar todas as bolsas residuais de pequena e média escala cuja situação e características se conhecem, casos do Rio do Porto, da Sintra Garagem, por exemplo. E, por outro lado, mas em complementaridade, dificilmente se chega à conclusão sobre qual o propósito do desinteresse (?!) quanto ao total aproveitasmento do parque contíguo ao edifício do Departamento de Urbanismo, do outro lado da linha do combóio, e ainda mais perto do que o Vale da Raposa, do mercado municipal, de todo o comércio tradicional da Heliodoro Salgado, da Portela e de áreas circundantes...

Urge equacionar e, paulatina mas decisivamente, ir concretizando toda uma estratégia integrada que satisfaça a resolução do problema da Estefânea, na Freguesia de Santa Maria e São Miguel mas, naturalmente, em simultânea articulação e coordenação com São Martinho e São Pedro que, igualmente, são zonas críticas de estacionamento na sede do concelho.

Finalmente, não perderia a oportunidade para lembrar como está imundo o pavimento da Correnteza, como aquele verde do Vale da Rapousa esconde um matagal infecto, inseguro e perigoso, sujíssimo junto aos muros. São situações gritantes de desleixo insuportável, facil e rapidamente resolúveis que nos lavariam a cara de uma vergonha quotidiana que, vejam lá, parece não afectar os promotores da solução que tresanda a negócio por todos os lados...

sexta-feira, 21 de setembro de 2007

Sintra e a Escola de Recuperação do Património

Numa altura em que, pelas melhores razões, tanto se fala sobre a necessidade de, cada vez mais, promover a vertente profissional da oferta pública do Ensino Secundário, considero da maior oportunidade, propor-vos brevíssimas notas de reflexão sobre uma matéria que, para a comunidade sintrense, só pode constituir, por um lado, motivo de orgulho e, por outro, pretexto para alguma apreensão.

Trata-se apenas de um pontapé de saída para a abordagem do assunto neste blogue. Se os destinatários - alunos, professores, pais e encarregados de educação, direcção da Escola, a empresa municipal Sintraquorum (da qual depende a Escola Profissional de Recuperação do Património de Sintra) e a própria autarquia assim o vierem a considerar, esta tribuna, tão acessível, poderá constituir um ponto de encontro cujo alcance de opinião até pode ser muito interessante.

Orgulho e apreensão

Portanto, melhor circunstanciando, o orgulho na já longínqua origem da Escola Profissional de Recuperação do Património, há cerca de vinte anos, radicada no projecto dinamizado pelo então Secretário de Estado Joaquim de Azevedo. Na Câmara Municipal de Sintra, alguém estava particularmente atenta à possibilidade de apresentar à comunidade uma oferta de ensino que, constituindo uma alternativa coerente e credível, se articulava, indissociavelmente, com o perfil de um concelho privilegiado, cujo património edificado é tão rico como carecido de manutenção, de recuperação e de restauro.

Por isso, justo é, ainda que apenas na seguinte breve linha, lembrar o grande entusiasmo, o determinante e decisivo empenho da Dra. Ana Xavier para que, de um belo projecto, se tivesse passado a coisas tão concretas como o digníssimo espaço hoje ocupado, onde bem é afirmado como se está à altura do tempo.

Ora bem, não só orgulho, mas também apreensão, como acima afirmava, por distintas e complementares razões, tais como a aparente «feroz concorrência» dos cursos profissionais que, no ano lectivo ora iniciado, foram lançados pelas Escolas Secundárias da rede pública ou, aquilo que, deveras, me parece muito mais preocupante, ou seja o futuro imediato do enquadramento profissional dos jovens diplomados pela Escola de Recuperação do Património de Sintra.

Haverá mais, muitas mais razões razões de preocupação mas, por hoje, ficar-me-ia por estas. E tenham em consideração que apenas me refiro ao Curso de Assistente de Conservação e Restauro ainda que a escola tenha autorização e capacidade para ministrar outros dois, nos domínios da Arqueologia e dos Jardins, que só não abriram por falta de interessados na sua frequência.

Concorrência e empregabilidade
Vejamos o que, neste momento, praticamente no início do ano lectivo, se poderá acrescentar. Quanto à concorrência, desde logo, que, num mercado tão escancarado como o nosso, só é salutar. Se fosse possível concorrer com a EPRPS, não tenhamos dúvida que os concorrentes já teriam aparecido. Todavia, esta escola é tão especial, tão específica, o ensino nela ministrado é tão único e dispendioso que seria preciso muito atrevimentodo àqueles que a tanto se abalançassem. É público e notório que, na EPRPS, a fasquia da qualidade está colocada a grande altura, com bons professores, protocolos sabiamente negociados com as mais distintas entidades nacionais detentoras de bens patrimoniais inestimáveis, enfim, um quadro de referência pouco acessível...

Todavia, não resta a mínima dúvida que, desde já, será necessário desenvolver uma campanha de promoção, ainda mais eficaz e atempada do que a concretizada recentemente, no sentido de conquistar, em tempo oportuno e pelas razões mais convincentes, todos os alunos com potencial para a frequentarem, no concelho, no distrito e no país. Será, eventualmente, aconselhável acrescentar argumentos de muito peso, tais como a facilidade de alojamento e de transporte, a assegurar pela própria escola, em termos a definir, sem significativo aumento de encargos.

Já no que se refere à empregabilidade dos jovens diplomados pelas Escolas Profissionais, em geral, e, portanto, também pela EPRPS, ela é superior a oitenta e cinco por cento, uma taxa declaradamente superior a qualquer outra das hipóteses de saída do Ensino Secundário. Tal não significa, por outro lado, que o posto de trabalho seja encontrado perto da residência. Muito pelo contrário, com as especialidades de recuperação do património, nas áreas de azulejaria, cantaria, estuques, madeiras, metais e pintura mural, os jovens profissionais estão preparados para as deslocações que se revelem necessárias, para qualquer ponto do país ou da União Europeia, porquanto a sua qualificação, de Nível III, também é reconhecida internacionalmente.

Enquanto espaço multiregional, a UE é um grande território sem fronteiras onde, cada vez mais, como acontece na grande federação americana, é possível demandar trabalho à distância de vários milhares de quilómetros, sem qualquer drama e sem o estigma da emigração. Os jovens diplomados pela EPRPS, naturalmente, também são alertados nesse sentido. Contudo, um tal quadro de perspectivas laborais futuras, longe da porta, não pode dar descanso às entidades oficiais que tudo deverão fazer para, de qualquer modo, sempre facilitar um enquadramento profissional, o mais próximo possível, e nas melhores condições.

Apenas duas questões

E isto, muito francamente, não sei se está a acontecer. Seguidamente, e, com o claro propósito, sem qualquer sofisma, de a todos permitir a partilha de informação pertinente, deixaria uma ou duas perguntas, para as quais esperaria obter uma resposta em tempo útil. Não pretendo, é bom que fique esclarecido, uma resposta satisfatória, de carácter positivo. Não senhor, apenas uma resposta, a breve trecho, acerca das seguintes questões:

- sendo a Câmara Municipal de Sintra, a entidade promotora da Escola Profissional de Recuperação do Património de Sintra e seu principal investidor desde 1988, quantos postos de trabalho, para além dos monitores da própria escola, terá directamente criado que permitiram, desde o fim do primeiro curso, o recrutamento no concelho, de jovens profissionais ali diplomados, assim rentabilizando investimentos tão significativos?

- que diligências de carácter jurídico, administrativo e afins, têm sido concretizadas pela autarquia, no sentido de privilegiar, por exemplo, em concurso público, as empresa candidatas a determinadas obras de recuperação de bens patrimoniais públicos que, manifesta e comprovadamente, recrutem para os seus quadros jovens profissionais diplomados pela EPRPS e/ou por outras escolas profissionais com ofertas similares?

Vamos esperar que apareçam respostas, comentários a esta pequena peça de reflexão que, repito, se for julgado conveniente, por todos os interessados, poderá constituir um elemento de trabalho que auxilie na tomada das indispensáveis decisões que, a curto e médio prazos se impõem.

quinta-feira, 20 de setembro de 2007

Insegurança em permanência





Ontem, como tiveram oportunidade de verificar, o Notas Diárias trouxe-vos uma pequena reflexão pessoal sobre Aquilino Ribeiro, com os meus agradecimentos a pessoas e a lugares que me iniciaram no universo aquiliniano. Espero não terem ficado surpreendidos e entendido que, de vez em quando, como foi o caso nesta data, sempre que determinado evento o justifique, http://www.sintradoavesso.blogspot.com/ vai acolher assuntos alheios à especialidade do seu perfil, i.e., a partilha de assuntos que preocupam a comunidade sintrense.

Temos andado às voltas com questões de estacionamento e insegurança e, para não variar, a elas voltamos. E, para que se não diga que falamos em abstrato, tenhamos em consideração coisa bem concreta, acontecida há bem poucos dias, nesta mesma zona da Estefânea da qual ainda não saímos, aqui nas imediações do Centro Cultural e do Museu de Arte Moderna/Colecção Berardo.

Como sabem, finalmente, começaram obras de recuperação do antigo Casino, trabalhos nas fachadas e no interior do edifício, absolutamente indispensáveis à manutenção, naquele espaço museológico, de espécies de um acervo que não comportam as condições menos dignas - e uso este eufemismo para não me exaltar nem provocar, em terceiros, reacções indesejáveis - a que têm estado submetidas durante o passado recente.

Apenas um parêntesis para lembrar a quem teve a paciência de me acompanhar, através dos artigos publicados na rubrica conselho adiado do Jornal de Sintra que, pelo menos, em duas ocasiões, 2 de Dezembro de 2005 (Surrealismo, memórias do futuro) e 31 de Janeiro de 2006 (Berardo põe Sintra na berlinda) também eu subscrevi opiniões afins da indispensabilidade da intervenção que agora acontece. Portanto, ainda bem que as obras estão em curso!


Causas e consequências

Entretanto, para além das consequências normais que obras congéneres sempre desencadeiam, vieram estas causar um significativo agravamento da tranquilidade e segurança a que a zona aspira e, indubitavelmente, tem direito. Não esqueçamos, entre outros importantes factores a considerar que, sendo um bairro crítico no que respeita à capacidade instalada de estacionamento legal, aqui se perfilam estes dois importantes equipamentos culturais, ambos procurados, diariamente, por públicos tão diversificados como criancinhas dos jardins de infância, jovens das escolas dos ensinos básico e secundário, muita gente da terceira idade, muitos estrangeiros.

Com o caos do estacionamento selvagem, transformando a zona numa armadilha indescritível, estas duas casas de cultura, de referência nacional, já que a sua oferta em muito ultrapassa a escala concelhia (no caso do Museu, até pode invocar-se uma dimensão internacional), ficam sob a mira de marginais que se aproveitam da insegurança, da falta de controlo, deste miserável quadro de terceiro mundo de salve-se quem puder. Infelizmente, pelo menos, por enquanto, não vale a pena gritar ó da guarda! porque, no caso da força policial em Sintra, a famigerada tolerância com que a GNR tem actuado, autorizando os desmandos que tenho denunciado (v, d. textos abaixo dos dias precedentes), acaba por complicar e tornar cada vez mais difícil a gestão do embroglio.

Como seria previsível, já há pessoas a arrostar com as nefastas consequências. A Dra. Maria Nobre Franco, directora do Museu, é a mais conhecida vítima desta situação. Não deixa de ser curioso que alguém como ela, absolutamente irrepreensível, incapaz de usar qualquer expediente de esperteza saloia para resolver o problema do estacionamento do seu automóvel, ela que é das três ou quatro pessoas com direito ao estacionamento sobre o empedrado (na área actualmente ocupada pelo estaleiro das obras) e que, mesmo assim, não recorre à solução de atirar com o seu carro para cima do passeio frontal ao edifício do CCOC, tenha sido surpreendida, cerca das onze da manhã de um destes dias, com um arrombo e roubo da sua viatura que estava, bem estacionada, nas imediações...

Agir,reagir, prever e...

A insegurança na zona é algo que se tem agravado, sem que se note qualquer estratégia de remediação. E, como se vê, pelo caso em apreço, não é coisa da noite, apenas decorrente da habitual fonte de desassossego local, que os sacrificados moradores do bairro, especialmente da Praceta Dr. Arnaldo Sampaio denunciaram, alertando a Câmara Municipal e a polícia, para o medo em que vivem. Ainda está bem viva a controvérsia suscitada pelas diligências de vários anos que culminaram com a publicação, no Jornal de Sintra, de artigos que originaram réplica e tréplica do agente perturbador visado.

Desconheço se os toxicodependentes assistidos pelo centro instalado no Bairro das Flores têm alguma relação com o recrudescimento das razões de queixa para a insegurança em que vive, não só de noite, mas também em pleno dia. Há, pelo menos uma senhora, funcionária do CCOC que, pelos vistos, por ter todas as certezas do mundo, deixou de estacionar, regular e legalmente, o seu carro na zona concessionada pela EMES para, muito convenientemente, convenhamos, o vir estacionar no já referido empedrado. Eu próprio ouvi o seu testemunho, em diálogo com um agente da GNR que a tranquilizou pois não iria actuar nem, muito menos, autuar já que preferia ser tolerante...

O que me parece é que, como tenho dado a entender, é inadmissível continuar com a tática da tolerância que, nem aqui nem em nenhuma latitude civilizada, pode conduzir a qualquer solução satisfatória, apenas contribuindo, em última instância, para a falta de qualidade de vida. Urge, isso sim, que a autoridade esteja muito atenta, patrulhando a zona dia e noite, promovendo todas as medidas tendentes a obviar comportamentos desviantes, dissuadindo e/ou controlando a frequência do local por jovens estudantes das escolas do ensino básico e secundário da zona (Don Carlos I, Don Fernando II, Santa Maria) que se dirigem a esta área com objectivos facilmente descartáveis se devidamente investigados, podendo envolver-se em cenasque só serão lamentáveis se não forem previamente evitadas.

...acrescentar beleza

Às tantas, não sei mesmo se, quem pode e foi investido para o efeito, tem efectivo interesse em contribuir para a resolução deste problema de insegurança ou se pretende continuar a fazer parte do problema... Termino, com nova referência à Dra. Maria. Para ela vai a minha simpatia pelo mau bocado por que passou. E aproveito para lembrar que é alguém a quem Sintra muito deve. Naturalmente, tem direito à tranquilidade, enquanto trabalha no «seu» museu, tentando fazer o que melhor pode e sabe, com recursos sempre escassos, com um sucesso que todos aplaudem. Olhem, a Dra. Maria é um exemplo para todos, incluindo a autoridade instituída, chamados que fomos à tarefa máxima de facilitarmos a vida uns aos outros e, se possível, como ela tão bem faz, acrescentando-lhe Beleza...



quarta-feira, 19 de setembro de 2007



[em 19 de Setembro, as Notas Diárias também estão com Aquilino]


Aquilino Ribeiro, sempre!



Hoje, a nação presta homenagem a Aquilino Ribeiro. Os seus restos mortais ficarão no Panteão de Santa Engrácia, reforçando a ideia de uma imortalidade que já fora alcançada. Não haja a mínima dúvida, esta coisa da homenagem do poder aos demiurgos, na maior parte dos casos, apenas serve para sublinhar aquilo que já estava adquirido, ou seja, uma realidade preexistente... Mais uma vez, também Aquilino, não fugiu à regra.
A imortalidade, ganhara-a Aquilino pelo Amor, em todas vertentes, com que se jogou a uma vida eminentemente telúrica e apaixonada; alcançara-a pela Força das convicções e das decorrentes atitudes, sempre inequívocas, sempre grandes, francas e generosas; merecera-a pela Beleza que espalhou, vulcânica, a rodos, por quase setenta obras-primas.
Amor, Força e Beleza, eis o ritmo triádico da Arte, de que Aquilino tinha perfeita consciência, quando escreveu, à guisa de prefácio a Andam Faunos pelos Bosques, as seguintes palavras que, afinal, se aplicam à totalidade do seu aplicado e fecundo labor:
"(...) O que fiz é honrado; não plagiei; não extorqui a jóia mais humilde ao mais invulgar dos escritores; não cedi às correntes que hoje são cortejos triunfais, amanhã depenadas Danças da Bica. Perdurei o que sou por temperamento, e adquiri por educação e algum estudo. Confesso essa soberba. Escrevi com o meu sangue; nunca molhei a pena na pia da água benta, nem nos lavabos perfumados das viscondessas. Arranquei as minhas figuras aos limos da terra, às mãos ambas, e amassei-as com a devoção de Machado de Castro ao mundo gnómico de seus presépios. Valem pelo que são. Criando, no sentido restrito do vocábulo, rendo como S. Francisco de Assis a minha homenagem ao Criador. (...)"
Que formidável Autor! Que belíssima afirmação de Autoria e de Autoridade! Que confiança, na qualidade das suas criaturas, figuras arrancadas aos limos da terra...
As minhas razões
Confesso não ter palavras que sirvam o propósito de agradecer a quem me proporcionou o convívio com a obra de Aquilino, obra que me orgulho de bem conhecer. Não estranharão, portanto, que esta data de institucional homenagem nacional, para mim, seja um dia de acção de graças. Em primeiro lugar, ao próprio Aquilino Ribeiro, na leitura de cujos livros busquei e encontrei os vestígios, o testemunho de uma arte de ser, de uma arte de viver, que acabaram por crescer comigo, transformando-se num património imperdível.
É também dia de lembrar as casas de meus avós e pais, casas onde os livros ocupavam um lugar absolutamente determinante na vida de todos, livros herdados, livros que se iam comprando, livros que me habituei a cobiçar, desde pequeno, a sonhar com o momento de poder lê-los e, pecado dos pecados, a surripiar alguns que estavam proíbidos e (mal) escondidos...
Naturalmente, o Aquilino também andava lá por casa, acabando por me ser apresentado, pelos meus treze anos, através de O Jardim das Tormentas. Ainda hoje, muita gente não considerará adequado a tão púbera idade. Pois li-o, mais ou menos pela mesma altura em que, às escondidas, me 'apoderei' de O Crime do Padre Amaro e tenho a certeza de que o Eça não viu com maus olhos tal «vizinhança» literária, uma vez que as duas obras, certo é que juntamente com outras, destes e doutros autores, iam assumindo contornos de via iniciática para outros voos.
Um pouco mais tarde, mas ainda antes da Faculdade, foi tempo de me aperceber, por exemplo, da especificidade de O Malhadinhas, tão universal como O Velho e o Mar de Hemingway e que A Casa Grande de Romarigães é uma grande alegoria deste país. Para esse entendimento, pressupondo leitura um tanto ou quanto mais sofisticada, contribuiu o imenso saber e entusiasmo de duas grandes senhoras, professoras do Liceu Don João de Castro (que frequentei durante sete magníficos anos, entre 1958 e 1965), Manuela da Palma Carlos e Helena Dá Mesquita, cuja memória está em mim tão presente como a dívida de que são credoras.
Ainda gostaria de acrescentar que tenho o gratíssimo privilégio de conhecer e, periodicamente, de conviver com Aquilino Ribeiro Machado, filho do grande escritor, a quem me liga uma afinidade de grandes valores e princípios, fraternalmente partilhados com outros amigos que, na sábia inteireza da sua atitude cívica, acabam por distinguir tão discretas quanto veementes, as grandes linhas de rumo que o pai traçou, como cidadão absolutamente exemplar.
Mágoas do dia
A grande mágoa que me assalta, neste 19 de Setembro de 2007, pesar que não é de hoje, reside na circunstância de Aquilino Ribeiro ser um perfeito desconhecido para as gerações de estudantes das últimas três décadas. Sob o estigma do falsíssimo carácter regional da escrita aquiliniana que, ao fim e ao cabo, apenas mascara a flagrante ignorância de um léxico riquíssimo - que a maior parte dos falantes, dos leitores e dos escreventes portugueses deixou de dominar - a obra deste grande cultor da Língua Portuguesa, vulto máximo da nossa Literatura, está posta de lado.
Subtraiu-se aos jovens estudantes dos Ensinos Básico e Secundário a possibilidade de acederem a páginas e páginas de Aquilino, a verdadeira Beleza ao alcance de um gesto. Esse gesto não acontece - afirmo-o eu que, como Técnico de Educação, professor e formador de professores, tenho obrigação de saber alguma coisa da poda - fundamentalmente, devido a uma geral ignorância. Infelizmente, hoje em dia, quer os governantes, medíocres gestores do Sistema Educativo, enredados em estatísticas para inglês ver e em TLEBS para português confundir, quer uma grande maioria de professores, mesmo que pretendessem redimir-se de tamanho pecado, não saberiam o que, onde, quando e como fazer a, entre aspas, reabilitação de Aquilino Ribeiro.
Vejamos que tudo isto se confirma, e, aliás, se articula com circunstâncias absolutamente fortuitas. Aconteceu que Jaime Gama, a segunda figura da hiererquia do Estado, para além de Presidente do Parlamento, por acaso, também é um verdadeiro homem de Cultura, tendo sido sensível à vontade comum a muitos homens de cultura no sentido de homenagear Aquilino.
Sublinho o «por acaso». É que, por acaso, a actual Ministra da Cultura, que não passa de uma razoável interessada pela obra de Eça, circunstância que não basta para a creditar como verdadeira pessoa de Cultura, há apenas umas semanas, esqueceu-se - coitada da senhora, deve ter mais com que se entreter - que, pelo menos ela, em representação do Estado Português, era forçoso que estivesse presente na homenagem a Miguel Torga (por acaso, outro pilar fundamental da Literatura Portuguesa do século vinte, e, por acaso, também muito acusado de regionalismo...
Portanto, se a ausência de Aquilino da Escola nos magoa, não nos deve surpreender. Talvez, daqui a uns anos, venham tempos mais propícios. Entretanto, aqueles que admiramos e sabemos como a Arte de Aquilino é imprescindível à Educação das crianças e jovens, não percamos a oportunidade de o fazer sentir, pelo menos, junto dos que estão mais próximos.

terça-feira, 18 de setembro de 2007

Alternativa ao caos

Quantas e quantas vezes, desanima uma pessoa porque a solução justa, adequada e razoável para determinado problema de estacionamento se perfila apenas num futuro longínquo e pressuporá avultado investimento, incomportável ou muito dificilmente exequível.
Todavia, no caso do caos que se instala na Estefânea - sempre que, à noite ou em fim de semana, determinado evento se concretiza no Centro Cultural Olga Cadaval - existe uma solução conveniente, expedita, perfeitamente satisfatória, nada dispendiosa para os cofres camarários e rapidamente praticável.
Efectivamente, a curtíssima distância, apenas a três minutos a pé, lá está impávida, serena, quietamente solitária na sua nocturna (também diurna) evidência, a solução para tanto desconchavo, a possibilidade de adopção de acertada e civilizada atitude que, na realidade, já em pleno século vinte e um, poderá enquadrar um probema que, até agora, tem sido resolvido (???) sem o mínimo discernimento.
Incrível, tão fácil...
E, afinal, trata-se de solução tã evidente, tão acessível, que não parece credível como ainda nos damos ao luxo de a ignorarmos. Como já adivinharam, refiro-me ao parque de estacionamento, actualmente improvisado mas, enfim, praticável, que circunda o edifício onde está instalado o Departamento do Urbanismo da Câmara Municipal de Sintra que, todos os dias, a partir do fim da tarde, fica invariavelmente deserto.
Este terreiro, que acolhe centenas de automóveis, é fácil e extremamente acessível a quem o demande, vindo de qualquer proveniência. Como é do conhecimento geral, basta utilizar a passagem sobre a via férrea, para estar em plena zona pedonal da Heliodoro Salgado e, portanto a escassa distância do Centro Cultural Olga Cadaval, a cerca de dois, três minutos.
Sem dramas, sem atropelos, civilizadamente, eis a resolução do problema! O que é preciso fazer? Na realidade, pouca coisa se tivermos em consideração que está em causa um seríssimo problema de insegurança, cada vez que há um espectáculo no CCOC. Enquanto não forem tomadas medidas definitivas, haverá necessidade de assegurar uma iluminação adequada, ainda que provisória, e assegurar o policiamento enquanto decorrer o evento.
Pormenores? Talvez não...
Ignoro que entidade deveria assegurar o pagamento da vigilância policial. Provavelmente, a Sintraquorum, promotora do espectáculo. Mas, por outro lado, a EMES, na sua qualidade de empresa municipal, com vocação específica para as questões de estacionamento, poderia encarregar-se do parqueamento das viaturas por altura de espectáculos nos períodos acima assinalados, fazer-se pagar por tal serviço e, por si só, ou em articulação com a Sintraquorum, pagarem a patrulha de segurança destacada para o efeito.
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Não é difícil imaginar o sossego decorrente da adopção desta medida. O que não se percebe é a razão de tanta demora. Para que não se fique com a ideia de que esta é uma questão mais ou menos recente, cumpre-me informar que, nos últimos anos, várias vezes a abordei em artigos no Jornal de Sintra e, até a nível mais formal, contactei, por escrito, a Sintraquorum, a PSP e também a Câmara Municipal de Sintra que, por ocasião da minha última diligência, me respondeu, em 14 de Março de 2006, que tinha sido pedida uma avaliação ao Senhor Vereador Luís Duque, com o pedido de articulação entre a Sintraquorum e a EMES.
Não tenho qualquer razão para duvidar dos propósitos, dos bons propósitos da Câmara Municipal, em especial deste executivo, a quem os sintrenses devem muito mais do que julgam saber... [Por exemplo, a posição que tomou contra o famigerado projecto da Sintralândia (ainda decidido pelo executivo liderado por Edite Estrela), é algo que jamais esquecerei e que fica a crédito desta vereação, como medida de inegável defesa dos mais inequívocos interesses de Sintra. E, igualmente, o mesmo se afirme quanto à decisão de não autorizar qualquer parque de estacionamento no Vale da Raposa].
Por isso, contenho-me, tento controlar o meu direito à indignação, porque não ignoro como constrangimentos de toda a ordem obstaculizam as melhores intenções. Contudo, os anos passam e, infelizmente, o que fica a marcar os dias de Sintra, é esta incontornável síndrome da tal tolerância ordinária, sempre coincidente com a cultura do desleixo, com os desígnios da irresponsabilidade, de que tenho falado nestas Notas Diárias, desde o passado dia 12 do corrente.
Não consigo acomodar-me a este estado de coisas. Dói-me, não poder fazer mais, especialmente quando o que há para fazer é fácil, dependendo da actuação de quem, por nós, está incumbido de dar esses passos. Como administrados, cumpre-nos colaborar com a Administração, a nível central e/0u junto do poder local, demonstrndo disponibilidade, debatendo, alvitrando soluções, apontando alternativas, não denunciando apenas o que está mal. Mas, então, a contrapartida?

segunda-feira, 17 de setembro de 2007

O (cansado) coração do concelho
São duas e dez da tarde. Acabo de passar pela Praça Francisco Sá Carneiro onde, em cima do empedrado fronteiro ao CC Olga Cadaval, estão estacionados (??) doze automóveis; na Rua Câmara Pestana, entre os Armazéns Baeta e a Conservatória do Registo Predial, estão estacionados (??) , os mesmos seis automóveis que ocupavam tais proibidos lugares, pelo menos, já há uma hora; do outro lado da Heliodoro Salgado, na sua perpendicular Rua Capitão Mário Alberto Soares Pimentel, estão estacionados (??) sete automóveis, em zona pedonal, de estatuto perfeitamente idêntico ao da área pedonalizada da já referida Heliodoro Salgado (transformada, aliás, em via de quase constante circulação...).

Ora bem, para que conste, quer na própria Câmara Pestana, na zona de sentido único ascendente, quer na Adriano José Coelho, até ao fim do Bairro das Flores, a esta hora, há dezenas e dezenas de lugares vagos... Pois é, estacionamento pago. Naturalmente, os cidadãos mais vivaços, os mais espaertalhões, que bem conhecem a área e as práticas vigentes da autoridade, não estão com cerimónias e, logo pela manhã, estacionam o seu automóvel em cima do empedrado.
Naturalmente, todos se comportam de maneira tão condenável, confiados que se sentem na sacrossanta, instalada filosofia de universal tolerância, adoptada pela Guarda Nacional Republicana, à qual também já se renderam muitos estrangeiros que demandam a Estefânea, já que «em Roma, sê romano»... Se, porventura, a GNR faz rebocar um automóvel, é coisa, consabidamente, tão rara que os tais espertalhões não pensam duas vezes, nada receiam pois, no caso, o crime compensa mesmo...

Ultimamente, até há quem invoque a insegurança provocada pela instalação do Centro de Apoio aos Toxicodependentes no Bairro das Flores, para ali não estacionar - claro que furtando-se ao pagamento da respectiva tarifa - para vir arrumar o carro, pois claro, onde haveria de ser? No empedrado da Praça Francisco Sá Carneiro... [A propósito, hei-de verificar se, em Lisboa, perto do CAT da Rua das Taipas, também deixaram de estacionar veículos e, se afirmativo, terão ido para cima de qualquer empedrado ali das redondezas, talvez no Camões...].

Este é o quadro, num raio de cinquenta metros, mais ou menos a qualquer hora de expediente,
uma vez que esta é uma zona muito propensa a expedientes, normalmente muito bem sustentados em esfarrapadas, ridículas desculpas.

Insegurança e perigos reais

Se, por acaso, como já tem acontecido, é dia de mercado, há funeral a saír de uma das capelas mortuárias da igreja de São Miguel, ao fundo da Rua Câmara Pestana, e estão dois carros estacionados nesta mesma rua mas no segmento em que há dois sentidos, arma-se um salsifré
indescritível em que tudo entope. Pura e simplesmente, deixa de se poder circular! É impossível aceder ou saír do Bairro das Flores, o trânsito fica bloqueado, por vezes até Monte Santos, de um lado, até ao quartel dos bombeiros e Escola Don Carlos I, para que provém do Lourel, e/ou até à Portela. Foi numa situação que tal, há uns três anos, relatada no Jornal de Sintra, que o condutor de uma ambulância, transportando um doente, desesperado perante o trânsito que não fluia, atirou com o carro para cima do perigoso separador da Heliodoro Salgado, em previsível risco de capotamento.

Mas, naquela manhã, Nossa Senhora de Fátima devia estar particularmente atenta, anulando o pernicioso efeito da proverbial tolerância da autoridade (na altura, a PSP que, tudo leva a crer, deverá ter lido a mesma cartilha...). O pior é se Nossa Senhora, São Cristóvão, patrono dos motoristas, e São Judas Tadeu, advogado dos impossíveis, se distrairem em dia que, depois, não faltará quem considere de grande azar, de desastre...

E quando é noite de espectáculo no CC Olga Cadaval? E olhem que até nem é preciso que aconteça o que já sucedeu, isto é, noite de espectáculo coincidente com o velório de alguém muito conhecido aqui em Sintra, com muita gente tentando acercar-se da capela mortuária. O quadro é de tal modo indescritível e preocupante que raia os limites da indecência. Chega-se ao ponto de, na eventualidade de qualquer sinistro, não poder passar uma viatura de bombeiros. Os carros são literalmente atirados para onde houver um buraco, atravancando outros, impedindo saídas de prédios (onde, inclusive, há gente doente que, não raro, carece de socorro), instalando-se uma situação de salve-se quem puder, totalmente indigna, intolerável em qualquer latitude e, muito menos na sede de um concelho com território classificado como património da humanidade...
Tolerância? Basta!

Esta é a consequência da desenfreada estratégia da tolerância que, desgraçadamente, se confunde com a cultura do desleixo, da irresponsabilidade. É este o espelho que reflecte uma maneira de ser e de estar altamente condenável, egocêntrica, sem qualquer ponta de civismo, determinando e avalizando o modo sobranceiro, que alguns considera imperialista, como nos olham certos povos europeus, incrédulos quanto à possibilidade de pertencerem ao mesmo barco em que embarcou esta lusa gente, já foi avaliada como choldra ingovernável que, no entanto, me recuso a aceitar como tal.

É uma vergonha inominável. Não é despropositado qualificar como potenciais criminosos, todos quantos, de algum modo, são responsáveis por tal estado de coisas.

Será preciso pôr mais no cartel para demonstrar como deve ser abandonada qualquer atitude tolerante?

sexta-feira, 14 de setembro de 2007

(Continuação)
Na falta de alternativa...

Este pequeno acrescento ao texto já hoje publicado, apenas serve de post-scriptum, com o objectivo de sublinhar uma ideia que subjaz, não só a todas as considerações já expendidas mas também às que terei oportunidade de continuar a partilhar. Nestes termos, gostaria que tivessem em consideração que a circunstância de não estarem concretizadas - nem total nem sequer parcialmente, as soluções que, futuramente, satisfarão a correcção do problema do estacionamento em Sintra, à semelhança do que se passa noutros lugares mais afortunados -não habilita ninguém em particular e, muito menos, a autoridade instituída, à prática da famigerada tolerância, com a esfarrapada desculpa de que não existe alternativa...

Esta ideia, tão perniciosamente vulgar, tem como consequência que ninguém faz o que, efectivamente, lhe compete porque, enfim, como se verifica, não estão reunidas as condições... Por isso, como não há parques dissuasores, autoriza-se que os automóveis sejam caoticamente parqueados (??), em tudo quanto é sítio, à revelia da Lei... Pois é, a generosa mas corrosiva tolerância tem este resultado horroroso, em certos casos perigosíssimo, como terei ocasião de apontar, que parece não afligir os nossos concidadãos, todos muito ocupados, todos muito stressados, todos muito ciosos do seu umbigo, da sua circunstância, completamente nas tintas para os direitos do outro.
Ignorância + Analfabetismo = Laxismo

Atitudes que tais ainda são consequência, não só da iliteracia mas também do analfabetismo funcional e pleno, este último ainda a rondar os mais de dez por cento, a nível nacional, percentagem escandalosa, totalmente desconhecida em qualquer país da União Europeia, a doze, a quinze ou a vinte e sete... Pois é, às vezes esquecemo-nos da herança dos tempos da outra senhora... Ela aí está, bem patente, a herança da esperteza saloia, por um lado, mas espelhada, por outro, na correspondente tolerância que nos habituámos a confundir com o designado nacional porreirismo o qual, para todos os efeitos, tem contribuído como nenhum outro factor socio-cultural ou económico, para um progresso que, naturalmente, teima em não acontecer...

Mas será que não se percebe que tudo isto está indissociavelmente ligado? Será que não se percebe que um agente da ordem, em plena rua, no estrito cumprimento do dever, nâo pode ser ridicularizado, pelos tais espertalhões, pelos tais habilidosos ou simplesmente ignorantes, como tantas vezes acontece, por cumprir e fazer cumprir a Lei? Será que não se percebe que o agente da autoridade, não pode, não deve, está proíbido de ser tolerante porque, se o for, está agindo contra o interesse geral? Não se percebe que esta tolerância é a maior inimiga da qualidade de vida?

Tanto trabalho a fazer para que princípios universalmente aceites como inquestionáveis, a concretizar sem tibieza de qualquer ordem, sejam assumidos entre nós, que somos tão europeus como os nossos vizinhos espanhóis ou como os austríacos, mas, infelizmente, tão distantes e tão tolerantes...
Da Estefânea, com mágoa
Na sequência do assunto que venho abordando, eis-me prestes a focar o primeiro caso concreto na zona do Bairro da Estefânea. Situemo-nos: estamos na Praça Dr. Francisco Sá Carneiro, mais precisamente na Rua Câmara Pestana, no passeio ao lado dos Armazéns Baeta e oficina de mecânica auto do Sr. José Luís, à nossa frente, do outro lado da rua, o terreiro empedrado e a fachada do edifício que acolhe o Centro Cultural Olga Cadaval e, um pouco mais à direita, o antigo Casino, actualmente Museu de Arte Moderna/Colecção Berardo.

Esta rua, onde está instalada a Junta de Freguesia de Santa Maria e São Miguel, começa na sua perpendicular Av. Heliodoro Salgado, e, desde este ponto até ao fim da Praça, delimitada pela Rua Adriano José Coelho (que dá acesso ao Bairro das Flores), tem dois sentidos de trânsito, continuando apenas com um, para passar à Vila Eugénia, às capelas mortuárias da igreja de São Miguel e à Quinta de Santo António, desaguando numa bifurcação que, à direita descendente, acede ao edifício da Segurança Social e, à esquerda, à zona da Correnteza, onde se encontra a Biblioteca Municipal.

Parecem pormenores em demasia mas, na realidade, até peco por defeito. É que, embora a situação inicial seja a do parágrafo anterior - portanto, Rua Câmara Pestana - para caracterizar minimamente a área em questão, deverei lembrar que, apenas num raio de cem metros, se encontram todas as principais agências da banca e dos seguros, conservatórias do Registo Civil e do Registo Predial, consultórios médicos, farmácias, mercado municipal, notários, comércio tradicional e a igreja. Mas não esqueçamos que, a mais duas ou três centenas de metros, estão o quartel dos bombeiros e as Esolas D. Fernando II e D. Carlos I, por exemplo.
Grandes males...

Trata-se, pois, de uma zona extremamente crítica, com uma inusitada afluência de pessoas e veículos, onde a mínima distracção pode originar incidentes e acidentes de ordem vária. Hoje em dia, já ninguém se lembra dos problemas causados pelos contentores de lixo, até há cerca de dois anos, ocupando a via pública, na Rua Câmara Pestana, junto à vivenda Margarida. Parece incrível mas terão sido necessários quase três anos de negociações entre a Junta de Freguesia - sob a presidência do saudoso e meu querido amigo Pinto Vasques - e a Câmara Municipal para fazer deslocar os depósitos cerca de quinze metros, para a sua actual localização, evitando as constantes razões de queixa suscitadas pelo trânsito que não fluia...

Mas voltemos ao assunto. Há uma quantidade enorme de condutores que continua a estacionar junto ao referido passeio da Rua Câmara Pestana, entre os Armazéns Baeta e a Conservatória do Registo Predial. Não há dúvida que ali existe sinalização contrária a essa prática. Mas, sem querer afirmar que os sinais são equívocos, devo referir que o local onde estão colocados não é absolutamente propício a evitar mal-entendidos. Se há muita gente relapsa e sem qualquer ponta de civismo, também há quem seja induzido em transgressão se, para o efeito de a evitar, não faltasse, bem patente e visível no pavimento, inequívoco tracejado a amarelo, impedindo e confirmando a proibição.
...nenhuns remédios

Pois bem, sempre que é confrontada com a contravenção em apreço, a GNR actua, multando os condutores e, em caso de necessidade, fazendo rebocar as viaturas. O que não se compreende e, inclusive, causa escândalo a quem assiste, é que o mesmo agente que assim procede - e, repito, muitíssimo bem - igualmente o não faça em relação a todos os habilidosos condutores, os oportunistas do costume que, evitando sujeitarem-se a tal procedimento por parte da autoridade, estacinam os seus automóveis sobre o empedrado fronteiro ao edifício do Centro Cultural Olga Cadaval.

De acordo com o que, certamente, a GNR tem conhecimento, há um pequeno conjunto de viaturas, afectas às direcções do Centro Cultural e do Museu, cujo estacionamento está autorizado naquela placa empedrada. Abro um parêntesis para recordar que, no local, até havia um pilarete cujo accionamento permitia o controlo do acesso à área. Mas, como seria previsível, dispositivo tão civilizado, foi estrategicamente aniquilado, anulado ou vandalizado na primeira oportunidade...

Fecho o parêntesis para afirmar, com a maior veemência, que, no estrito cumprimento da Lei, a GNR não pode fechar os olhos, não pode nem deve tolerar a atitude de perfeita sobranceria dos referidos automobilistas pois, se assim fizer, é fonte de flagrante injustiça. Ora bem, uma das coisas que mais escandaliza qualquer pessoa minimamente bem formada é ser confrontada com alguma actuação da autoridade que, inequivocamente, ponha em causa o espírito e a letra da Lei.
Tolerância inadmissível

Pois é absolutamente lamentável que, sistematicamente, isto mesmo venha acontecendo.
É lamentável que os agentes sejam instruídos no sentido de não procederem consoante está determinado, chegando um deles, na minha presença e, perante o meu escândalo, manifesto de viva voz, autorizar condutores ao estacionamento na aludida zona interdita, afirmando mesmo que ali nada o incomodava... Aliás, para além de mim próprio, há testemunhos da ocorrência.

Sendo este um caso suficientemente grave para se poderem retirar ilacções menos positivas, não constituiria o mínimo problema se não fosse sintomático de um modo geral de actuação. Tive oportunidade, a propósito de um outro episódio, junto à Quinta da Regaleira, de falar com outro agente da GNR que, precisamente, também invocou argumentos afins da tolerância para desculpar a atitude de condutores que, naquele local, estacionam em cima dos passeios. [Numa das minhas próximas "Notas Diárias" abordarei a questão do estacionamento selvagem junto à Regaleira, razão pela qual não continuo com o assunto].

Fica, no entanto, registada a ideia de que esta coisa da tolerância, por parte da GNR é mais geral do que a posição individual de um agente em particular, e tão preocupante que coincide, afinal, com uma instalada cultura de desleixo - contra a qual o então Presidente da República Jorge Sampaio tanto verberou - que nos compete contrariar com a maior veemência até ao justo limite das nossas capacidades.

Mas não acabam aqui as considerações que, acerca desta zona, tenho por bem partilhar com todos os interessados. Este é apenas um caso de estacionamento problemático, entre os muitos
para os quais continuarei a alertar, a partir da próxima segunda-feira. Por exemplo, nos dias de espectáculos, no Centro Cultural Olga Cadaval, o evitável pandemónio instalado, com uma expedita solução disponível a dois minutos a pé... Ou, atravessando a Heliodoro Salgado - cujo separador de faixas de rodagem é factor de grandes transtornos - outro perfeito escândalo na área pedonal (?!?) da Rua Capitão Mário Alberto Soares Pimentel, também patrocinado e tolerado pela força da ordem...
No mesmo país?

Por outro lado, tudo isto é ainda mais lamentável e caricato quando, em Lisboa, precisamente nos dias que correm, se assiste a uma campanha de oportuníssima moralização e indução de boas práticas, contra o estacionamento selvagem, em cima dos passeios e situações afins. Ontem mesmo ouvi, via rádio e, depois, assisti pela televisão, a reportagens sobre o assunto cujo teor e pedagógicos propósitos constituem inequívoca satisfação, tão mais significativa quanto é rara...

Mas será que me engano ou tal não se passa apenas a menos de vinte quilómetros de Sintra? E os agentes da Polícia de Segurança Pública que actuam em Lisboa não dependem do mesmo Ministério da Administração Interna que também superintende à Guarda Nacioinal Republicana que actua em Sintra? E a Lei que, em Lisboa, está a ser cumprida não é a mesma a que todos estamos obrigados neste Estado Democrático de Direito?

quinta-feira, 13 de setembro de 2007

Estar à altura
Por mais uns dias, como ontem dei a entender, continuarei a considerar o assunto do estacionamento automóvel, em articulação com recentes atutudes da GNR que, sob a aparência de generosa tolerância, mais não constituem do que uma demissão pública da missão que lhe está cometida de cumprir e fazer cumprir a Lei vigente.

Importará ter em consideração que apenas me circunscreverei a algumas situações, na sede do concelho, especialmente nas freguesias de Santa Maria e São Miguel, São Martinho e São Pedro que, pelas suas características de potencial indução de periculosidade, com nefastas consequências para a segurança de pessoas e bens, já foram objecto de dezenas de artigos de minha autoria publicados pelo Jornal de Sintra nos últimos anos.
Alternativas civilizadas

Tanto hoje como outrora, procuro não perder a perspectiva de que a resolução do problema do estacionamento, quer em Sintra quer noutro qualquer lugar com idêntico perfil, se inscreve num quadro que pressupõe actuações integradas, articuladas, fruto de uma análise privilegiando a abordagem sistémica a qual, em simultâneo, deverá equacionar os problemas que lhe são afins, ou seja:

-instalação de parques dissuasores de estacionamento, nas entradas da sede do concelho, servidos por um sistema de transportes cujas tarifas incluam a do parque, servindo os diferentes destinos quer turísticos quer de outra índole;

-um regime adequado de cargas e descargas compatível com as necessidades de uma latitude civilizada;

-instalação de novas modalidades de transporte, nomeadamente para atingir os diversos destinos turísticos do alto da Serra de Sintra, como seja uma carreira de funicular;

-encerramento ao trânsito de determinadas vias, apenas permitindo o acesso ao centro histórico por veículos de transporte colectivo e salvaguardando os casos de residentes, comerciantes e veículos de emergência;

-por razões de carácter ecológico, encerramento do trânsito automóvel em direcção à Pena e Castelo dos Mouros, apenas permitindo o acesso veículos de transporte colectivo «amigos do ambiente», eléctricos, mistos, biodiesel, etc, incluindo as grandes galeras de tracção animal, a exemplo do que já acontece há décadas em congéneres lugares europeus;
-extensão da carreira de carro eléctrico à estação terminal de caminhos de ferro e à Vila Velha;

-aproveitamento de bolsas residuais de estacionamento e sua potenciação à mais elevada expressão (caso do parque de estacionamento contíguo ao edifício do Departamento do Urbanismo);

-outras medidas que, tais como estas, têm sido estudadas, algumas oportun(istic)amente
anunciadas, todas conhecidas, todas absolutamente indispensáveis à vitalização e animação da sede do concelho, no seio de um território pela Unesco classificado como Paisagem Cultural da Humanidade.
Uma questão de autoridade

Depois deste enquadramento introdutório, passarei a factos concretos. Desde que a GNR substituiu a PSP, procurei colaborar, contactando com agentes nas ruas, telefonando ou mesmo deslocando-me ao posto da Rua João de Deus, manifestando as minhas preocupações, humildemente sugerindo determinada actuação, naturalmente, sempre no contexto da intervenção cívica de quem não consegue alhear-se das questões que afectam a comunidade sintrense.

Sem surpresa alguma me apercebi de que, ao contrário do que seria de esperar num Estado civilizado, por ocasião da passagem de testemunho de uma para a outra força policial, não tinha havido a mínima transmissão de alerta para determinados pontos, consabidamente críticos, geradores de tensão, não só a nível do estacionamento e do trânsito em geral, mas também noutros domínios.

Nos meus informais contactos iniciais com os sempre simpáticos e atentos agentes, alertando para problemas que, naquele preciso instante, estariam ocorrendo, por exemplo, na Volta do Duche, na estrada junto à Quinta da Regaleira ou na bolsa de estacionamento do Rio do Porto, também constatei que tais topónimos lhes eram parcial ou totalmente desconhecidos.

Não sendo muito grave, já que o tempo entretanto decorrido terá ajudado a colmatar aquela carência, tal circunstância não deixa de evidenciar e atestar a falta de orientações que não chega(va)m aos agentes no terreno, confrontando-se estes com os problemas específicos de tais lugares, que lhes deveriam ter sido oportunamente transmitidos, de acordo com as estratégias mais consentâneas à sua resolução. Assim sendo, não admira que, tendo começado mal, portanto, na ausência de diálogo profícuo entre as duas forças de segurança, se tenha perdido um tempo absolutamente precioso, aproveitável para a alteração, ainda que incipiente, de um statu quo deveras preocupante.

Havendo muita matéria para partilhar, lembrarei que os casos mais desesperados - deixem-me utilizar adjectivo tão retumbante mas, infelizmente, não desajustado - serão os da Estefânea, particularmente as artérias cicundantes dos equipamentos culturais Centro Cultural Olga Cadaval e Sintra Museu de Arte Moderna/Colecção Berardo e Regaleira onde, indiscutivelmente, estão a suceder-se episódios de perfeita demissão da autoridade relativamente àquilo que será de esperar, episódios que só não são caricatos porque estão em causa valores caros à sociedade democrática do Estado de Direito.

(Continua)

quarta-feira, 12 de setembro de 2007

Uma Questão de tolerância
(At: esta é a primeira peça, por ordem cronológica, da série iniciada em 12 de Setembro de 2007)
Durante meses e meses, nem no blog nem no Jornal de Sintra, escrevi sequer uma linha. É como se, durante este tempo, tivesse atravessado um luto que, infelizmente, ainda permanece. E não se trata de hipérbole. Antes fosse...

Lembro que o luto, o nojo, se faz na sequência da morte ou da separação de alguém, de alguma coisa, qual estado de flagrante perda que, melhor ou pior, o tempo vai resolvendo. O meu é um luto que ocorre nos meandros de periódica crise de descrença na possibilidade de, individualmente ou em grupo, alterar favoravelmente determinado estado insatisfatório das coisas.

Apesar de um visceral optimismo, não me consigo subtrair a tal negativismo. A propósito, apraz afirmar que nunca me abandonaram os grandes princípios da Liberdade, Igualdade e Fraternidade, espaldando toda uma intervenção cívica, quer em Sintra quer noutros lugares, fora do ou no contexto das situações profissionais que me desafiam. No entanto, depois do envolvimento, tantas vezes tão incómodo, denunciando inúmeros casos cuja resolução, fundamentalmente, compete à autoridade e ao poder local instituído, a verdade é que vou deixando de sentir a eficácia que esta atitude deveria suscitar.

Não é que me tenha rendido à inevitabilidade das consequências da instalada cultura de desleixo, mascarando as mais distintas incompetências e favorecendo a emergência das habituais, sinistras personagens que prosperam e se alimentam em tão propícias manjedouras.
Não cheguei e tenho a impressão de que jamais chegarei a tal ponto de desânimo. Contudo, relativamente à luta pela melhoria da qualidade de vida em Sintra, ainda não (re)ganhei a força bastante para recomeçar a partilhar preocupações que são de sempre e, de qualquer modo, indiscutivelmente pertinentes.

Tolerância ou laxismo?

Querem, tão somente, um exemplo que dá pano para mangas? Então, considerem a quotidiana demissão da Guarda Nacional Republicana, perante os problemas de estacionamento, que geram problemas de tremenda falta de qualidade de vida e constante insegurança na sede do concelho. Sintra nunca viu tantos agentes, em patrulhas a pé ou transportando-se em tantos carros, motas e até bicicletas. Infelizmente, tamanho factor de presença, que deveria suscitar a correspondente satisfação geral, através da resolução de casos tão preocupantes, tem-se traduzido numa inoperância que será escusado esconder ou, muito menos, desculpar.

É por aqui, precisamente, pelo problema do estacionamento e da autoridade para o enquadrar e solucionar, na multiplicidade das várias perspectivas de actuação, que vos desafio me acompanhem num percurso de reflexão que, não sei, sinceremente não sei, se poderá resultar nalgum benefício para a comunidade. Ainda neste período de descrença, sou capaz de vos pedir que juntemos as nossas reflexões, à guisa de pequena obra, como alicerce à construção da obra maior que outros, por nós investidos, estão obrigados a concretizar.

Finalmente vos direi que, com o intuito de me inspirar no exemplo de alguém que acreditava no grande alcance das pequenas obras, vim sentar-me, por uns instantes, neste pequeno parque do Lourel que foi sonho e leva o nome do meu querido amigo Pinto Vasques. Que belíssima lembrança!