[sempre de acordo com a antiga ortografia]

sexta-feira, 9 de maio de 2008

Emília Reis,
repórter da memória

Já hoje, mas como comentário ao texto que anteontem aqui publiquei, Emília Reis - uma das mais conhecidas e dedicadas militantes da causa da defesa do património de Sintra - subscreveu as palavras que, apenas com alguns destaques que me permiti introduzir, passo a transcrever integralmente:


Eu penso que o Dr.Fernando Seara vai ter que responder às pessoas que o interpelaram, por escrito, sobre o assunto do Campo de Seteais.Para o caso de isso não acontecer brevemente, poderemos, aqueles que se têm envolvido na denúncia, pedir ao senhor Presidente da Câmara que nos receba. Um ano é muito tempo.

Que diligências efectuou a Câmara junto da Sociedade concessionária do Hotel para que seja cumprida a obrigação 4ª. da escritura de aforamento de 1801 que diz expressamente que: “as sobreditas portas francas e publicas do referido gradeamento do mesmo campo que derem serventia para a entrada e sahida do dito paceio publico serão construidas de tal forma que sem dependência alguma possam entrar e sahir por ellas todas as pessoas que delle se quizerem servir e utilizar, sem nunca em tempo algum estarem fechadas com chave, ferrolho, cadeado ou outro fecho semelhante”,- perfeitamente conciliável com uma estratégia de segurança das pessoas que visitam aquele espaço?

Foi para que este direito lhes não fosse negado que se bateram os habitantes da Vila de Sintra em 1801, 1897 e 1934, apoiados pelos respectivos presidentes da Câmara da altura. Não se trata de um capricho ou de uma embirração. Trata-se de honrar, também, a vontade daqueles que nos precederam. Só como curiosidade adianto que, através da acta da reunião da Câmara de 6 de Outubro de 1897 ficamos a saber que, a Comissão que representou os habitantes da Vila que se insurgiram contra a tentativa desse ano foi constituida por alguns dos mais importantes comerciantes da altura, entre eles o fundador da Papelaria Camélia e, também, o dono do Hotel Nunes, um dos fundadores da Sociedade União Sintrense e, até, o que era nesse tempo o administrador do Palácio da Pena - (José Alfredo da Costa Azevedo cita-os todos pelos seus nomes nas Velharias de Sintra II ). Em 1934 o próprio José Alfredo interveio e conta que chegaram a tocar o sino a rebate só por ter constado que o acesso ao Penedo da Saudade estava vedado com uma cancela.

Ora, o acesso ao Penedo da Saudade já o perdemos na década de noventa - por ocasião de obras, também efectuadas pelo actual concessionário do Hotel, nas traseiras do palácio. O espaço foi, nessa altura, ajardinado e fechado com portão e grades.Quanto à fraca participação e apatia dos cidadãos, também isso me deixa muito triste. Mas, só se pode defender aquilo que se CONHECE e se AMA... A Alagamares escreveu no seu blogue em 4 de Maio, a propósito da pouca participação dos portugueses em associações cívicas ou outras, o seguinte: “Democracia não pode ser só formal. Depois não se queixem! O medo de ser livre provoca o orgulho de ser escravo”. Eu estou de acordo.

emília reis


E, muito naturalmente, concordamos todos quantos nos empenhamos nestas causas. Convém lembrar aos mais distraídos que a Alagamares já demonstrou, na sua curta existência, ser a única e verdadeira associação de defesa do património de Sintra. Ao contrário dos que, sintomática mas nada surpreendentemente, se mantêm num silêncio tão comprometedor, a Alagamares, também neste caso de Seteais, já tomou a bandeira do nosso descontentamento.

Daqui lhe lanço o repto de nos representar, a todos os que comungamos um mesmo sentimento de repúdio em relação à atitude do hoteleiro concessionário do Palácio de Seteais. Tenho a certeza de partilharmos a convicção de que, também no caso vertente, só há vantagem em que nos apoiemos numa entidade com o perfil associativo da Alagamares.

Na realidade, já passou muito tempo depois do início da afronta. E a afronta continua. A nível individual, já todos fizemos o que era suposto para demonstrar a nossa indignação. Agora, a estratégia só pode ser outra. Sem excessos, educada, civilizada e pedagogicamente - há muitos jovens estudantes cujo envolvimento seria bonito garantir - urge manifestar quanto e como pretendemos honrar a memória de todos os que nos precederam nesta luta pelo manutenção do acesso público a Seteais.

A propósito, não deixem de ler o texto de José Alfredo da Costa Azevedo que tanto nos anima a que sejamos consequentes no pensamento e na acção. Homenagear o querido e saudoso José Alfredo, na passagem do centenário do seu nascimento, não pode apenas passar por aquela sessão do Palácio Valenças, formal, bem compostinha, que muito se terá adequado apenas a quem vive as coisas pela rama e, por vezes, tão hipocritamente.

Com este caso do encerramento intempestivo dos portões de Seteais, temos oportunidade de, pública e civicamente, demonstrar que homenagear aquele homem, honrar a sua memória, é ser digno da sua luta. Afinal, hoje mesmo, continuamos uma luta que, José Alfredo e os seus contemporâneos, ouvindo o sino tocar a rebate, também já continuavam...

Os nossos filhos, os nossos netos, os miúdos das escolas de Sintra, têm de perceber isto mesmo. Estamos a viver mais um episódio da História de Sintra. Cabe-nos demonstrar que somos dignos do momento e que estamos à altura das circunstâncias.

2 comentários:

Anónimo disse...

Meu caro João Cachado,

Mandam as regras que se dê realce nos primeiros parágrafos de um escrito. Vou quebrar essa regras abordando as intervenções "do (a) anónimo(a) das 0:49" que desculpar-me-à desta forma de o(a) não identificar.

É compreensível que cite a obra da Sra. Dra. Edite Estrela, porque pior seria se ao fim de tantos anos não tivesse feito nada. Esteve, até, à beira de nos trazer um ainda maior desassossego, depois das negociações com o ministro Castro Caldas para a construção da Sintralândia. Com o panorama actual do concelho, em termos de delinquência, aquela obra, certamente, teria sido muito apreciada pelos "dealers".

É certo que as obras da zona pedonal da Estefânia não foram feitas por ela, mas sim decididas e temos à vista os resultados.

No entanto, merece apreço porque do que deixou por fazer pouco foi feito por quem se lhe seguiu. A Volta do Duche determinou a sua derrota eleitoral, mas teve a dignidade de se manter como Vereadora durante algum tempo.

Quanto à Austria, o(a) anónimo (a) por certo já estará arrependido (a) por ter chamado aqui esse País, onde as suas gentes se respeitam como poucas. Também há factos de que se envergonham - e muito - como estes que também lá sucedem, em muito menor escala do que as notícias em que o nosso País e Sintra aparecem noticiados e na Net sobre assasínios, roubos, delinquência e outras coisas do género.

Vamos agora ao mais importante: SETEAIS.

Conhecedor do Vereador a quem foi entregue este dossier, apenas admito que algo tem sucedido para lhe travar a dinâmica da actuação. Por vezes há forças de bloqueio que se movem na penumbra, isto é, gente que diz "sim" e sorrisos pela frente, mas depois trava as coisas para que não andem.

E se fosse pedida uma visita (pedir reuniões dá jeito no adiamento) ao Vereador, apenas para se saber em que ponto está o assunto? Sabe, é que pedir ao Presidente da Câmara é mais difícil face à sua agenda sempre sobrecarregada. Ou,

então, concentrarmo-nos todos à porta dos Jardins de Seteais e telefonarmos para alguns órgãos de informação.

Um abraço,

Sintra do avesso disse...

Fernando Castelo, caro amigo,

Como calcula, não posso estar mais de acordo. No que respeita à Sintralândia, a exemplo do que, infelizmente, acontece noutras paragens em empreendimentos congéneres, tais parques constituem excelentes plataformas para branquear dinheiros provenientes do tráfico de drogas e do negócio do armamento.

Esta ignorante gente de Sintra é que só ouviu o canto da sereia de milhares de postos de trabalho (!?!) em perspectiva. Como tive oportunidade de escrever, na altura própria, há muita maneira de uma comunidade se prostituir...

Como é que poderei esquecer a corajosa atitude do Presidente Fernando Seara que, ao contrário do que esperariam os seus próprios companheiros de partido, se opôs à concretização do famigerado projecto que Edite Estrela e Castro Caldas já tinham protocolado e tudo o mais?

Claro que não é contra ele, assim como não era contra Edite Estrela que eu me opus e oponho, sempre que há razão bastante para isso. A minha oposição nunca é pessoal.

Não há coisa que mais me orgulhe que é esta liberdade de poder fazer, dizer e escrever o que penso. Por isso, se tiver que elogiar Fernando Seara - ele que não comunga da minha ideologia - se for preciso ir na primeira linha de algum movimento bonito promovido por alguém, seja quem for, que não tenha a minha ideologia, lá estarei.

Neste caso da Sintralândia, não há palavras para expressar a gratidão dos sintrenses ao actual presidente. A verdade é que a maioria dos sintrenses nem lhe passa pela cabeça o que se perspectivava de belíssimas negociatas que, para desespero dos badamecos do costume, se desfizeram.

E, quanto a todos os outros pontos do seu comentário, poria o meu nome por baixo.

Leia o meu amigo o meu texto de hoje neste mesmo blogue e logo entenderá como concordo com as sugestões que aponta.

Um abraço cúmplice do

João Cachado