[sempre de acordo com a antiga ortografia]

segunda-feira, 21 de julho de 2008

Cosmética

A propósito da destruição do tanque de Seteais, não vos dava eu a entender, há umas semanas, como seria previsível que alguma atitude de cosmética fosse concretizada, no sentido de atenuar o impacte causado pela ofensa perpetrada naquele lugar, contra o ingénuo e discreto bem patrimonial, sacrificado à prosaica necessidade de construir um reservatório de água?

Pois, para quem alguma dúvida tivesse quanto à minha sugestão, aqui vos venho confirmar quão pertinente ela era. Não que tivesse sequer confirmado a notícia que passarei a partilhar convosco já que, por mais diligências empreendidas, nada transpirou. Na realidade, apenas os operários que ali continuam a trabalhar me anunciaram qual o destino da placa-tecto de betão que cobre o depósito edificado a partir dos muros da primitiva construção.

Um espelho de água é o que nos espera. Nem mais nem menos, espelho de água, cenário construído sobre o betão puro e duro de uma realidade patrimonial descaradamente desrespeitada, cuja legitimidade certamente haverá quem reclame, afirmando como até se relaciona com o espírito do lugar... Pois não era um espelho de água o que via o observador quando havia água no tanque?...

Olhem, sabem que mais? O que eu e vós somos, com estas nossas exigências pelo repeito e defesa do património, é uma cambada de fundamentalistas, avessos a qualquer tipo de intervenção que, a exemplo desta, lá por aplicar umas toneladas de betão em cima do que havia, até acaba por alindar o recanto...

Aliás, se ainda não tinham assumido, preparem-se para serem confrontados com a acusação de que somos tão retrógrados, tão trogloditas, que nem percebemos como aquela intervenção betonal - valha-nos Deus, ainda por cima num tanque insignificante - se inscreve na atitude de compaginar os antigos testemunhos patrimoniais, por maior que seja a sua respeitabilidade, com a intimidade de novos materiais. Isto mesmo nos dirão, reparem, invocando o caso do Louvre, por exemplo, com as suas recentes pirâmides de vidro que, depois de tanta controvérsia, hoje são universalmente aceites...

Eu e vós, que já tudo ouvimos, estamos preparados. À descarada ignorância de um grupo de provincianos papalvos, que destroi e julga saber justificar toda e qualquer destruição, atirando a areia que sobra para os olhos de quem ousa enfrentá-los, contrapunhamos a couraça da lucidez. Apenas isto nos resta.

5 comentários:

Anónimo disse...

Meu caro amigo João Cachado,

Provavelmente a idade já me faz ver coisas do outro mundo, levando-me a não situar no tempo a fantastiquice.

Tivesse o meu amigo escutado, a propósito deste tema - melhor, desta luta - palavras de alguém que se situa como um dos melhores conhecedores da Unesco e estaria aqui desvanecido com o mal que nos é feito.

Nunca a minha querida professora, a menina Alicinha como todos a tratavamos, foi tão lembrada. Avisava-nos a todos - e como ficavamos com medo - que em cada mentira nos cairia um dente e nós, que ainda não conheciamos os políticos do futuro (deles), acreditavamos.

Agora, meu amigo, chegámos a um ponto em que já não sabemos a quem nos devemos queixar.

Sintra do avesso disse...

Meu querido amigo Castelo,

Pois é, mais tarde ou mais cedo, a gente acaba por se arrepender... O «grande conhecedor da Unesco» que o meu amigo alude, se tivesse actuado em tempo oportuno, bem podia ter evitado este estrago.

E lá vem a menina Alicinha. Já tinha saudades da sua ´proverbial sabedoria. Mas, afinal, ela tinha mesmo razão. Ainda não reparou nas próteses que esses tipos afivelam atrás dos sorrisos?

E não são apenas os políticos. Então e a corujinha, por exemplo? Ainda no passado sábado, na Cruz Alta, aparecendo na carrinha de serviço da PSML, ela que se diz uma caminheira impenitente, não teve pernas para andar uns metros a subir... Como mentirosa militante, foi apanhada mais depressa que a coxa... Aquela, nem mesmo com prótese dentária se safaria!

Um abraço do

João Cachado

Anónimo disse...

Caro João Cachado partilho inteiramente do seu fundamentalismo. Se defender Sintra e o seu património é ser fundamentalista então eu também o sou, e com muita honra. E que cresca o número destes fundamentalistas para protestar e defender Sintra das agressóes de que ela constantemente é vítima. Alguém tem que denunciar os crimes que aqui se cometem, e melhor é denunciá-los por antecipação, como costuma fazer neste blog e no Jornal de Sintra. Um abraço do Guilherme Duarte

Sintra do avesso disse...

Meu caro Guilherme Duarte,

Depois do nosso breve mas tão agradável encontro na Cruz Alta, venho agradecer o seu testermunho de solidariedade e cumplicidade militante...

Para que nada lhe escape, ficará o meu amigo a saber que o tal epíteto de «fundamentalista», devêmo-lo ao Senhor Vereador da Cultura que assim nos apelidou os membros da Alagamares que ousaram manifestar o natural desconforto contra a decisão de encerramento do terreiro de Seteias, ainda antes que se tivesse dado a desconchavada intervenção no tanque.

Quanto à restante parte do meu escrito, relativamente à necessidade de saber acolher os projectos que pressupõem o envolvimento de linguagens diferentes e anacrónicas, refere-se, como sabe, a um argumento muito usado, mesmo a nível internacional, já quase em desespero de causa, por parte de quem devia - mas não soube ou não pôde - intervir no sentido de impedir um qualquer desmando que contemple tal prática de misturas espúrias...

Um abraço do

João Cachado

Sintra do avesso disse...

Meu Caro Guilherme Duarte,

Ainda a tempo, lhe peço que me informe sobre o seu endereço de correio electrónico para lhe enviar um texto que escrevi na sequência da ida à Cruz Alta.

Mais um abraço

João Cachado