[sempre de acordo com a antiga ortografia]

terça-feira, 5 de maio de 2009



Ah, as massas…


Há que tempos, se bem se recordam, tinha o Partido Comunista Português, pendente de resolução, o sério problema do enquadramento legal das verbas apuradas durante a Festa do Avante, a sua mais bem conhecida e sui generis forma de financiamento anual. Até à semana passada, de acordo com a legislação vigente, aquilo era um verdadeiro quebra-cabeças.

Ora bem, bastou que a questão tivesse sido hábil e subtilmente ventilada, para que, tão pressurosos quanto os vimos, todos os partidos com representação no hemiciclo, logo tivessem corrido para acolher, de braços abertos, o pretexto que se lhes apresentava, assim, de mão beijada, tão a propósito, em vésperas de uma importante tríade de eleições.

Não deixou de ser comovente o modo como, desde o Bloco De Esquerda ao CDS, todos se solidarizaram para, definitivamente, resolverem aquela maçada. Coitado do PC! Então alguma coisa justificava que, por virtude de tão desumana lei, ficasse privado da substancial fonte de rendimento? Não senhor. Pois havia que fazer qualquer coisa, e urgentemente, pela rapaziada da Soeiro Pereira Gomes.

Parece impossível como, afinal, a coisa revestia tanta simplicidade. Se o problema era o de arranjar um modo de acolher dinheiro vivo, a solução, em poucas palavras, passaria por tornar acessível e generalizável aquilo que, à primeira vista, apenas era suposto beneficiar o partido que se via em palpos de aranha. Portanto, à pala da resolução do problema do PC, e, como havia moralidade, todos comeriam… Podem os particulares contribuir à tripa forra que já deixou de haver impedimento.

O fiscalista de serviço, Doutor Saldanha Sanches – que jamais será professor catedrático porque abre demais a boca – veio afirmar que, com toda a lógica, a nova Lei, aprovada por unanimidade no Parlamento, vai abrir a porta a todas as imagináveis irregularidades, nomeadamente, às malas e aos famigerados envelopes que não carecem de justificativos. Tal como ele, e para desgraça minha, que também abro demasiado a boca, eu estou de acordo.

Como se ainda fosse preciso lembrar, poucas coisas concitam tanta concertação entre os diversos partidos do luso espectro político. As massas, ah as massas, pois com certeza, claramente, encabeçam a lista. Como sempre, aliás. Pois não! Na realidade, não fora esta, que outra estratégia permitiria multiplicar, por quase sessenta vezes, a verba que, até ao presente, era permitida receber em contado?

Já que ao processo atribuí o qualificativo de comovente, então permitam-me que estenda o adjectivo à forma como Alberto Martins se tem desdobrado para contradizer todos os palermas que, como eu, consideram ter o PC dado uma fenomenal e formidável mas escusada boleia, tanto à sua esquerda como à direita. E tudo por via daquela, chamemos-lhe assim, fragilidadezita. Ah, as massas…


4 comentários:

Anónimo disse...

Amigo Cachado,

Registei. Vá lá, ontem tive o merecido. Eu era incapaz de ter aquela atitude contra o Dr. Vital Moreira mas também lhe digo que se não quer ser lobo não veste a pele.

Quanto às massas o Saldanha Sanches tem toda a razão. Vai ser uma grande trapalhada mas ninguém vai protestar porque todos concordaram com esta maneira de poderemn receber dinheiro dos particulares. Sei muito bem que o PC tinha um grande problema com a festa do Avante mas acho que não devia ceder de maneira que os outros aproveitem. Da parte do PC não vai haver trapalhada mas dos outros tudo se espera.
Cumprimentos

Artur Sá

Rosa de Lurdes disse...

Caro Dr. João Cachado,

Esta questão ainda é mais vergonhosa porque o financiamento público não baixou. Os partidos são indispensáveis à democracia mas a maneira como os deputados funcionam em Portugal sem ligação com os eleitores é que não pode continuar. Qualquer dinheiro é muito para o que a maioria dos deputados fazem. Ainda se fosse como em Inglaterra que dão contas aos votantes, tudo bem. Porque é que os partidos portugueses não querem um parlamento mesmo representativo dos cidadãos? Assim não admira a abstenção que se espera. Eu vou lá mas a votar em branco porque aquela gente não me representa.

R. Lurdes

PS-Parabens, Vi o seu blogue no jornal Destak de 2ªFeira. Os seus postes merecem que sejam muito divulgados.

Nuno Rodrigues Távares disse...

Caro João Cachado,

O PC não deu uma boleia. O PC apanhou uma boleia de um autocarro para um destino que não devia interessar-lhe. Mas depois de ver todo o trânsito seguir sempre na mesma direcção quis aproveitar,

Eu vejo assim a questão. Estão todos bem uns para os outros. Não consigo perceber como ainda há gente que vai votar.

Nuno Távares

Catarina Pires disse...

Este caso só aumenta a falta de confiança que os portugueses sentem contra os políticos. Mas agora sente-se cada vez mais a vontade das pessoas não irem votar. Se calhar é da crise e do cansaço geral. Por ser ano de eleições ouve-se mais que as pessoas desta vaz não vão lá. Eu própria não sei que fazer embora sempre vote. É uma pena ter chegado a esta situação. Já tenho duas netas e cada vez estou mais desanimada. Não foi para isto que fizemos o 25 de Abril,

Catarina Pires