[sempre de acordo com a antiga ortografia]

terça-feira, 24 de novembro de 2009

João Cachado - Sintra

Já vale tudo?

Ou muito me engano ou a comunidade portuguesa estará a viver um dos momentos de maior perplexidade que já lhe foi dado atravessar depois do 25 de Abril. E assim será porque, na realidade, não é fácil ser governado por um Primeiro Ministro, cujo polémico currículo pessoal e inerentes atitudes algo controversas, no-lo apresenta como alguém que não é habitual considerar no desempenho de tão altas funções.

Primeiramente, foi a assinatura de uns projectos de duvidoso enquadramento legal e de horrorosa arquitectura na Câmara da Covilhã. Depois, o ziguezaguear entre institutos e universidades à procura da boleia mais eficaz para alcançar um canudo de licenciado. Seguidamente, o eventual envolvimento num processo de licenciamento de um aterro na Cova da Beira, em que se cruza com um técnico, que acabaria por ser o professor que mais cadeiras lhe certificou, no tal curso de engenharia, terminado num santo domingo do Senhor.

Posteriormente, ainda nos apareceu referido numa complicadíssima rede de contactos providenciais, afins da concretização do processo Freeport. E, agora, foi apanhado em escutas telefónicas com Armando Vara, arguido este num processo de corrupção, cujo principal protagonista, preventivamente preso, é um sucateiro de Aveiro de quem há suspeitas de ter recebido verbas para, através de tráfico de influências, desbloquear circuitos e favorecer concursos em empresas públicas.

Por seu turno, o mesmo Vara, oportunamente despedido pelo Presidente da República Jorge Sampaio, por indecente e má figura, como mentor da entretanto extinta Fundação para a Segurança Rodoviária, é alguém cuja licenciatura e pós- graduação serão, pelo menos, tão controversas como o diploma do actual PM, de quem, aliás, foi colega num governo de Guterres.

E, como poderão verificar, não estou a ser exaustivo. Pois, mais recentemente, muito agastados com o desconforto de que foi vítima o PM, Vieira da Silva e Santos Silva, respectivamente, Ministros da Economia e da Defesa, permitiram-se afirmar que as escutas telefónicas faziam parte de um processo de espionagem contra o Chefe do Governo. Todavia, no desgraçado estado em que este país se encontra, isto que é gravíssimo, aparentemente, não tem consequências.

Estou em crer que, apesar da natureza dos deveres decorrentes do seu específico estatuto, nada impede que os juízes venham a terreiro reclamar o ressarcimento por uma ofensa de que, eventualmente, se sintam objecto. Tal é a situação em que se encontra o juiz de Aveiro que terá encontrado matéria susceptível de enquadrar na figura de um crime contra o Estado de Direito, no conteúdo da escuta telefónica em que o PM foi apanhado.

Então, tendo actuado em conformidade com esta interpretação – e independentemente do resultado das diligências que promoveu – subsequentemente, sendo alvo do desrespeito consubstanciado na acusação de agente de espionagem contra o PM, não assiste ao magistrado o direito de reacção, em defesa da honra, do seu bom nome e da própria Justiça?

Os referidos senhores Ministros da Economia e da Defesa, membros de um órgão executivo, num Estado democrático de Direito, cuja origem decorre do resultado de um processo eleitoral, permitiram-se afirmar uma tal enormidade, contra um qualificado agente da Justiça, e não sofrem as consequências de tal atitude de ofensa? Estarão acima do comum dos mortais? Ninguém se insurge? O próprio Presidente da República, precisamente na sua condição de mais alto magistrado da Nação, nada terá a dizer? Em Portugal, até isto já vale?



3 comentários:

Artur Sá disse...

Caro Amigo, Dr. Cachado,

No passado domingo, ao almoço em minha casa acredite que não estive nada à vontade numa conversa com os meus sobrinhos na casa dos trinta anos, sem conseguir defender a ideia de não fazer juizos apressados acerca da corrupção que atingiu as figuras públicas que a gente sabe. Os jovens comparam a nossa situação com o que se pasa em Itália mas percebem que a Itália tem mais defesas porque é um país riquíssimo e nós muito mais pobres. Somos europeus, pertencemos ao euro, mas não conseguimos aproximar-nos da média dos outros. Com a justiça na miséria em que está não sei onde me socorrer. Parecemos naufragos a dar aos braços mas a afundar-nos , sem hipótese de salvação. E vejo os jovens muito em baixo, com uma auto-estima igual à nossa que já passámos dos sessenta.
É uma lástima.

Artur Sá

Carmo Serra disse...

Já se fala em berlusconização da situação em Portugal mas não posso concordar porque nós não temos os recursos dos italianos. Além da corrupção nós temos muita miséria. Tal como diz o Sr. Artur Sá com quem concordo totalmente. Estamos numa situação escandalosa e quase insuustentável porque o primeiro ministro perdeu o crédito junto da maioria dos portugueses.

Anónimo disse...

Nunca pensei ter como primeiro ministro um homem com este CV em que já não se pode acreditar e não sei o que dizer dele depois do juiz de Aveiro ter suspendido o Penedos da REN. Que vergonha tão grande.
Lurdes Lima