[sempre de acordo com a antiga ortografia]

terça-feira, 17 de janeiro de 2012



17 de Janeiro,
aniversário da Marquesa de Cadaval


Dona Olga Maria Nicolis di Robilant Álvares Pereira de Melo (Cadaval), nasceu em Torino, aos 17 de Janeiro de 1900 e morreu em Lisboa, no dia 21 de Dezembro de 1996. Foi exemplar figura de grande senhora da Cultura Europeia, protectora da Música e de muitos músicos, através de meritória actividade mecenática que beneficiou Portugal, seu país de adopção.

É uma figura absolutamente fascinante a quem tenho dedicado muitas horas de trabalho, no contexto da realização de um filme documentário da sua riquíssima biografia, trabalho de equipa em que participam os meus queridos amigos Mário João Machado, ex Presidente do Conselho de Administração da SintraQuorum (Centro Cultural Olga Cadaval), João Pereira Bastos, ex director do Teatro São Carlos e da RDP Antena Dois, João Santa Clara, realizador de cinema e Vitor Beja, produtor.

Temos horas e horas de excepcional material recolhido em entrevistas com grandes pianistas, beneficiários directos do seu mecenato, tais como Daniel Barenboim, Martha Argerich, Nelson Freire, Olga Prats, Stephan Bishop-Kovacevitch, Nella Maisa, de amigos como os Engºs João Paes Freitas Branco ou Luís Santos Ferro, Maria Germana Tânger, etc, e com os netos. Ainda falta ir a Itália, em especial, ao seu palácio, em Veneza, no Grande Canal (era descendente directa da família Mocenigo que deu doze doges à cidade...) palácio onde «só» foi estreada a ópera de Monteverdi "Il Combattimento di Tancredi e Clorinda"... E ainda há trabalho a fazer em Florença.

Não sei quando terminaremos, embora haja um cronograma que tem sido sacrificado à medida que a crise e a austeridade avançam. Mas a nossa admiração inicial tinha de aumentar à medida que nos embrenhávamos na investigação e acabou por se transformar em paixão por esta figura tutelar da cultura europeia, que atravessa todo o século vinte.

E, como não, se podia contar, entre amigos íntimos, os grandes dos mundos cultural, político, religioso, seus íntimos, desde Marinetti, Gabriele d'Annnunzio, Graham Greene, Saul Bellow, C. Chanel, Maeterlinck, Louise de Vilmorin, Francisco José (a quem a Marquesa se referia como Il Kaiserone!), Pio XII, Frau Cosima (filha de Liszt, viúva de Wagner) a Princesa de Polignac, Kenneth Clark, Marconi, a Duse, René Huyghe... para mencionar, desordenadamente, apenas alguns dos estrangeiros e não músicos. Enfim, muita coisa há a contar acerca desta senhora que não pára de nos surpreender. Aguardem mais uns tempos que não perdem pela demora. Daremos notícias logo que possível.

Porém, outra é a matéria que, acerca da comemoração do aniversário da Senhora Marquesa de Cadaval, hoje gostaria de convosco partilhar. Para o efeito, recorro ao 'Jornal de Sintra' que, em 4 de Fevereiro de 2005, publicou o texto que subescrevi e que, já de seguida, passo a transcrever. Infelizmente, passados todos estes anos, não tenho a mínima razão para alterar uma vírgula. E não deixa de ser sintomático que, já naquela altura, eu tenha sentido a necessidade de transcrever outro texto publicado em 2003...

TRANSCRIÇÃO

"Marquesa de Cadaval,
a homenagem devida

Se há pessoas a quem Sintra muito deve, a Marquesa de Cadaval é, inequivocamente uma delas. É daquelas figuras que será recordada, pelos séculos fora, a exemplo de tantos notáveis estrangeiros que se apaixonaram por Sintra, por ter sabido acrescentar ao património concreto e espiritual do lugar, um contributo tão específico e individual como a sua própria personalidade de mecenas, de cultora da Arte, de diletante, no mais nobre sentido do termo, que soube partilhar o seu alto sentido estético com quem dela se aproximava na busca da elevação do espírito.


Por tudo isto, em geral, por outras causas, em pormenor, nada mais nos poderia ter mais alegrado do que a oportuna decisão, do anterior executivo municipal, de a ter elegido como patrona do Centro Cultural, depois das discutíveis mas sérias obras de adaptação do edifício original do Arquitecto Norte Júnior.

Pois bem, a partir de então, deixou de se ver a homenagem que é suposto acontecer por altura da data aniversária. Por isso é como se não existisse. Faz-se, é verdade, mas tão discreta, tão envergonhada, que Sintra nem dá por ela. Já em anterior oportunidade (JS,24.01.03) me referi à necessidade de promover toda uma pedagogia no sentido de que a comunidade comemore, celebre quem merece, mas sabendo porque e para que o faz.Lamentavelmente, continuam pertinentes as minhas palavras de então, razão pela qual me permito fazer a seguinte transcrição:

Homenagem em dívida

“(...) Tenho verificado, infelizmente com muita frequência, que os cidadãos em geral, crianças e jovens de Sintra, desconhecem esta personagem fascinante. Julgo não errar ao escrever e propor que a comemoração de tal efeméride, mesmo no quadro de uma atitude com muito maior e merecida visibilidade, deve constituir, em si mesma, um pretexto, i.e., terá de funcionar como um pivô para a dinamização de atitudes interdisciplinares de animação cultural.

Comemorar dignamente o aniversário da Marquesa de Cadaval, há-de contemplar, por exemplo, uma chamada de atenção às escolas dos vários níveis de ensino no sentido de integrar iniciativas nos contextos que os currículos e os programas melhor enquadrarem. Também a realização de Jornadas Culturais, com recurso a conferencistas, musicólogos, instrumentistas nacionais e estrangeiros, jornalistas e homens de Letras, cineastas, etc, que comungam este sentimento do tributo que importa continuar a prestar para que se mantenha bem viva a memória e se divulgue o exemplo.

Muitas outras iniciativas poderão articular-se como sejam a organização de exposições de artes plásticas e de fotografia, constituição de um Círculo de Estudos, promoção de uma tertúlia, programação de concertos de música, criação e dotação financeira de uma Bolsa de estudos com o seu nome.

Se bem consigo atingir o meu objectivo, com a concretização destas e de outras sugestões congéneres, pretender-se-ia envolver a população em geral para que, de futuro, as comemorações (...) marquem o calendário das actividades culturais de Sintra. Se assim não vier a acontecer, mais uma vez perderemos a oportunidade de alimentar o ego (tão falho de auto-estima...) com o exemplo de alguém acerca de quem só nos podemos orgulhar e enaltecer, justificando a comemoração que não existe sem a vertente da festa. (...)”

Em festa, público e notório

Enquanto não se souber dizer às crianças e aos jovens quem foi a Marquesa de Cadaval, enquanto não for um acto comum ir colocar uma flor junto ao seu busto, ninguém diga que há homenagem. Para começar a preparar o terreno, com a devida antecedência, a Câmara Municipal, através dos seus pelouros da Educação e da Cultura, deverá dotar a iniciativa com um orçamento minimamente condigno. Estou certo de que gente não faltará que dê o seu contributo desinteressado para uma visível e justa homenagem.

Só homenageia quem tem memória e quem preserva o património de valores do homenageado. Tal deve acontecer em termos públicos e notórios, tanto como o busto à entrada, tanto como o nome na fachada do Centro Cultural."


1 comentário:

Graça Sampaio disse...

Muito bem! Mas neste país, a Cultura e os seus cultores (passe a repetição) são sempre passados para os últimos planos. Se a Senhora Dona Olga tivesse sido jogadora de futebol, talvez... ...