[sempre de acordo com a antiga ortografia]

sexta-feira, 19 de dezembro de 2014





Helder Moura Pereira,
espaço ao poeta 


[facebook, 15.12.2014] 


Sabem o que é trabalhar todos os dias, anos seguidos, com um colega, amigo, poeta? No Ministério da Educação, formámos centenas de professores, concebemos materiais didácticos em todos os suportes, escritos, áudio, audiovisuais, para a promoção da Leitura, animação da Leitura, animação de bibliotecas.
 
Como raras vezes acontece, o nosso era um trabalho em que a paixão nos atirou para o equilíbrio instável dum convívio quotidiano entre a grande Arte - que, tematicamente, se cruzava na Literatura, Música, Plásticas, Teatro, Cinema, Banda Desenhada - e os burocratas, invejosos do gozo que vendíamos...

Durou o que foi possível e não podia ter sido mais gratificante aquela nossa actividade. Em termos pessoais, com o poeta por perto, o que enriqueci não tem medida.

Eis um vislumbre do meu privilégio. Este seu poema foi publicado, a toda a largura da página do 'Expresso', no sábado passado.

[QUANDO PARO À PORTA DA ANTIGA FÁBRICA]

Quando paro à porta da antiga fábrica
onde meu avô trabalhou. Risca. Quando
a fábrica onde meu avô trabalhou
surge de repente aos meus olhos,
sem eu a ter procurado, e. Risca.
Passam de repente nos meus olhos
muitas imagens, uma delas é a porta
da fábrica onde meu avô trabalhou.
Ali me deu uma vez dez escudos para.
Risca. É um poema num café. Dele
faz parte uma mesa de café e um café.
Depois olho pela janela do café
e não está lá fábrica nenhuma,
não está lá porta nenhuma, e também
sinceramente não tenho bem
a certeza de ser eu que estou aqui.
Mas o meu avô estava lá de certeza.


["Resumo - a poesia em 2012", edições Documenta]

 

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