[sempre de acordo com a antiga ortografia]

quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

Os Jardins de Queluz

Com a devida vénia, recorro ao artigo assinado por Francisco Lourenço, publicado pelo último número do Jornal da Região, reportando-se ao seminário subordinado ao tema Património Edificado: Gestão, Conservação e Uso que decorreu, nos dias 28 e 29 do passado mês de Novembro, no Centro Cultural de Cascais.
Entre outos pontos de interesse, a peça jornalística faz merecido destaque à intervenção da Dra. Ana Flores, Conservadora do Palácio Nacional de Queluz, acerca da recuperação dos jardins que está em curso e decorrerá a bom ritmo. Para além das escassíssimas verbas decorrentes do orçamento nacional dos últimos anos que, para o sector da Cultura, não podia ser mais exíguo, a recuperação dos jardins, das estátuas em pedra e em chumbo conta com o mecenato do World Monumental Found.
Já há anos que sabemos ser assim. E, há anos, que a campanha de trabalhos vai vencendo as vicissitudes do costume, num país em que obras deste vulto são festejadíssimas quando terminam mas pouco acarinhadas enquanto duram. Para evitar tal atitude de desinteresse, sou daqueles que advogam a estratégia de, tanto quanto possível, envolver a comunidade enquanto acontece a intervenção, tornando-a parte indissociavelmente interessada.

O espectáculo das intervenções

Sendo esta a minha opinião, ela encontra boa espalda em atitudes que tenho observado como prática comum em alguns países europeus. Para não ir mais longe, em Espanha, por exemplo, no claustro da Catedral de León, durante uma importante campanha de recuperação de pintura a fresco, os visitantes eram convidados a acompanhar os trabalhos em curso, com todas as condições de segurança.
Já há mais de trinta anos, visitando o Rijksmuseum de Amsterdam, acedi aos trabalhos de recuperação do célebre Ronda da Noite de Rembrandt que, pouco tempo antes tinha sido alvo de tresloucado atentado à facada. Tal como no caso precedente - e já lá vão tantos anos - tinha sido montada uma explícita estratégia de animação que, simultâneamente, servia o objectivo da publicidade, da divulgação.
Normalmente, os trabalhos de recuperação do património, são de tal modo interessantes que constituem verdadeiro espectáculo. Por outro lado, em geral, estão envolvidas tais verbas, recursos humanos e materiais que os contribuintes têm o direito de aceder a todas as satisfações que, a título de informação lhes possam ser facultadas. Então, porque não promover o contacto directo com essas interessantes cenas?

Cenas silvestres

No Verão de 2004* tive oportunidade de divulgar, através de artigos ilustrados com inequívocas fotografias, a situação de escandaloso desleixo a que tinham chegado os Jardins do Palácio de Queluz. Convém lembrar que me refiro a Jardins Históricos que fui encontrar em estado silvestre, com coelhos saltando ao meu caminho...
O que mais me indignou - e, parece-me, tê-lo-ei explicado razoavelmente bem - para além do desleixo, foi a desfaçatez dos responsáveis, capazes de conviver com a degradação galopante de um bem patrimonial inestimável, sob sua custódia, continuando a receber o seu vencimento mensal, silenciando durante anos aquilo que melhor fora divulgarem publicamente para que a comunidade interviesse.
Na altura, a Dra. Ana Flores sentiu-se atingida e entrou em polémica comigo. Inadvertidamente, autovitimizou-se quando a denúncia abrangia tanta gente como aqueles cidadãos que, podendo e sabendo, não se interessam por estes assuntos, os autarcas, os técnicos, todos os que calam e consentem. Mas a razão assistia-me. A denúncia era inequívoca, flagrante, indesmentíveis as minhas palavras e eloquentes as fotografias.

O costume

De parte a parte se esclareceu o que havia para esclarecer. Na altura, dei a entender o que hoje partilhei convosco, ou seja, como sentia a necessidade de ser concretizada a tal atitude de publicitação. Fiquei à espera. Hoje, tenho uma mão cheia de nada e outra de coisa nenhuma. Quem dera estar enganado mas, infelizmente, julgo que tenho andado razoavelmente atento.
Apenas uma pequena nota final, pessoal. Se há coisa por que anseio é a recuperação das comportas que permitem represar as águas da ribeira passante pelo canal, possibilitando o usufruto das cenas descritas por aqueles azulejos tão interessantes, em cinético visionamento. Como eu gostava que todos pudéssemos acompanhar a recuperação deste património! Ainda se fosse impossível...
A campanha de recuperação vai entrar no quarto ano e estará prestes a concluir, já em 2008, de acordo com as previsões da Dra. Ana Flores. Permitam-me os leitores uma pergunta:
- No contexto destas reflexões consideram ter lucrado alguma coisa, ignorando o que, entretanto, se passou e está sucedendo nos Jardins Históricos de Queluz? Enfim, aguardemos o desenlace.
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* Jornal de Sintra, 30.07, 10.09, 24.09, 01.10.2004

2 comentários:

Anónimo disse...

Alguém aqui de Queluz me chamou a atenção para este seu post. Lembro-me bem dos seus artigos no Jornal de Sintra sobre a situação escandalosa a que chegaram estes jardins. Na altura a sua chamada de atenção deu um brado dos diabos.
Se não tem visitado o lugar e agora lá for vai notar algumas mudanças. Há obras visíveis a decorrer. É um assunto que vale a pena não esquecer. Como sei que lhe interessa, voltarei em breve com mais informação para si e, portanto para todos.
Muito obrigado. O seu blogue é uma boa surpresa.
Cumprimentos

Vasco Marques

Sintra do avesso disse...

Para Vasco Marques,

Praticamente, só vou aos jardins de Queluz por altura dos concertos durante o Festival de Sintra. Nessas alturas, procuro ir muito mais cedo para dar as minhas voltas com tranquilidade. Vou acompanhando o andamento dos trabalhos e, sinceramente, não encontro grandes motivos para satisfação.

É verdade que se nota trabalho. Mas as coisas foram deixadas em processo de degradação, durante tanto tempo que, actualmente, é um inferno para recuperar seja o que for. Enfim, vamos aguardando e bem atentos.

Em Queluz, bem podia aparecer um grupo de cidadãos que controlasse a situação e que fosse anunciando o que de positivo e negativo vai acontecendo. Não estaria disposto a aventurar-se? Aconselharia que procurasse o apoio da Alagamares, a única associação que, em Sintra, faz trabalho de Defesa e Recuperação do Património.

Melhores saudações,


João Cachado