[sempre de acordo com a antiga ortografia]
quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008
Tudo a meter água…
Depois de uma noite e madrugada de intempérie, não foi mesmo nada bonito verificar como as consequências ultrapassaram aquilo que, normalmente, é previsível em metrópoles consideradas civilizadas. Inundações subsequentes à ocorrência de excepcional pluviosidade, é verdade que acontecem por todo o lado. A atestá-lo, aí estão os canais de televisão, em cima do acontecimento, trazendo-nos a casa, cada dia que passa, as imagens de tais eventos, provenientes de todos os continentes.
No entanto, apesar da frequência com que acolhem tais notícias, os espectadores ainda conseguem discernir acerca das substanciais diferenças que tais reportagens registam, sendo levados a concluir que as grandes enxurradas, as grandes derrocadas de muros e barreiras, portanto, as situações mais gritantes, cenário de menores ou maiores tragédias, se verificam nas latitudes tropicais, normalmente a Sul, em sacrificados países da África, América do Sul e da Ásia.
Salvo raras e conhecidas excepções, na Europa central e ocidental, numa boa parte dos Estados Unidos da América e Canadá, aquelas cenas dificilmente aparecem nos ecrãs.
Ora bem, a maior parte das imagens que todos vimos, captadas pelas câmaras na área metropolitana de Lisboa, denunciam uma realidade, salpicada de terceiro mundo, cuja aparência é a melhor avaliação do lamentável estado de desenvolvimento deste desgraçado país.
Por mais que os governos tentem, não conseguem esconder que, a montante desta e doutras congéneres e cíclicas (1967, 1983) tragédias, há lamentáveis práticas – certamente também de corrupção - que deram origem à construção em leito de cheia, à sistemática impermeabilização de terrenos, à falta de planeamento urbanístico, ao desrespeito das normas vigentes, ao facilitismo, a uma famigerada e perniciosa cultura do desleixo cujas consequências andavam por ali misturadas, envolvidas nas lamas e estercos que os planos das reportagens nos devolviam.
Certas áreas de Belas, de Camarate e de Sacavém, de Trajouce ou Manique de Baixo, subúrbios horrorosos, cilício à cintura de Sintra, de Loures ou de Cascais, são meros exemplos de como há manchas de perfeito terceiro mundo que sucessivos governos vão tentando esconder. Pois é, tentam, embora não valha a pena. É gato escondido…
Nós, que cá vivemos, outro remédio não temos, senão a obrigação de suportar os efeitos de tanto analfabetismo, das incríveis percentagens de iliteracia que explicam o comportamento de um incalculável número de habilidosos, instalados em todas as instâncias, privadas e públicas, até nas governamentais, mesmo ao mais alto nível.
Mas, para vergonha nossa, por exemplo, em Bruxelas, Viena, Paris ou Londres, bem se conhece e reconhece a singularidade desta mixórdia à portuguesa, da tal piolheira de que falava o Senhor Don Carlos de Bragança, como fruto da declarada incompetência de uma classe política incapaz de resolver, geração após geração, os problemas que, isso sim, são habituais em países como o Brasil, a Venezuela ou Filipinas e que enquadram as favelas do Rio de Janeiro, de Caracas ou de Manila.
PS:
Aliás, num aparte final, lembraria que a chacota e falta de respeito de que os portugueses são alvo frequente, não só nas conversas de café e de clube, mas também nas chancelarias das grandes capitais europeias, é que justificam a sobranceria com que os media ingleses se permitiram tratar a Polícia Judiciária Portuguesa, a propósito do caso da miúda raptada. E, afinal, até parece que tinham razão…
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