Vinte e cinco de Abril,
à moda de Sintra
Convém continuar a lembrar aos menos atentos que os jardins de Seteais permanecem encerrados. Invocando o pretexto da segurança, durante o período de obras de recuperação do interior do palácio, o grupo Espírito Santo, concessionário da exploração hoteleira, decidiu intempestiva e unilateralmente, vedar a entrada num espaço cuja manutenção, como terreiro de público usufruto, tem custado interessantes lutas ao povo de Sintra, desde os primeiros anos do século dezanove, portanto, há cerca de duzentos anos.
Seteais, a saga continua
Ninguém desconhece que as tais razões de segurança constituem esfarrapada desculpa para a perpetração de um acto arbitrário que ofende a comunidade. Só o habilidoso hoteleiro, habituado a manobras congéneres de encerramento daquele recinto, se poderia permitir apresentar o facto consumado em questão. Na realidade, é impossível demonstrar a incompatibilidade da concretização de obras, no interior do palácio, com o acesso de visitantes ao belveder, através de um corredor delimitado, sem qualquer risco para as pessoas.
Está à vista que o grupo Espírito Santo resolveu mandar areia para os olhos dos sintrenses. Também é visível que, apesar da poeira levantada, quem nos deveria representar na rápida resolução desta causa, parece não sentir o incómodo. Ou, na melhor das hipóteses, se sente, de facto não consegue pôr cobro a tão irregular situação. O que é lamentável num Estado Democrático de Direito. Há mais de três meses que deixou de ser possível entrar em Seteais, há mais de um mês que o Vereador da Cultura informou ter avocado o assunto pessoalmente e nada acontece que, a respeito do caso, nos satisfaça.
Comemorar o Vinte e Cinco de Abril, em Sintra, poderia ter coincidido, real e simbolicamente com a resolução do assunto. Se assim tivesse acontecido, teríamos um espaço que é livre, devolvido à liberdade de ali poder acontecer o gozo da beleza que, por exemplo, Eça de Queiroz registou em inesquecível página de Os Maias. Caramba! É tempo mais que suficiente. Só a inoperância dos serviços camarários, a falta de sentido de oportunidade, justificam que não haja correspondência ao nosso direito à indignação.
O que sucede, em termos de comemoração da efeméride, é um desanimador contraponto, mais afim do vinte e quatro de Abril. Como se preciso fosse ir buscá-lo a uma qualquer gaveta do esquecimento… Pois não senhor. Basta passar a Regaleira e subir um pouco mais para que cada um se confronte com o cenário, aparentemente do tempo da outra senhora.
Lá estão, lá continuam os portões encerrados, o aviso com o pretexto da segurança, as alamedas laterais, e inclusive, sem qualquer necessidade, um canto do relvado, transformados em estaleiro da iniquidade, porque um conhecido e poderoso abusador assim resolveu.
(continua)
* Nos últimos anos, por diversas vezes, o mesmo e actual concessionário vedou o acesso ao terreiro, por ocasião de eventos que obrigaram à instalação de pesadas estruturas metálicas, resultando em danos que o relvado acusou, de acordo com o que a imprensa regional divulgou.
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