[sempre de acordo com a antiga ortografia]
quarta-feira, 2 de setembro de 2009
Incorrecções & omissões...
Muita coisa se tem dito e escrito em relação às deficiências de expressão dos políticos. Neste domínio, quem tenha o mínimo de sensibilidade quanto à qualidade dos discursos individuais, desde os simples anónimos aos cidadãos mais conhecidos, encontra um manancial inesgotável de matéria de análise que, aliás, pode proporcionar interessantíssimas surpresas.
Vem isto a propósito de, apenas em vinte e quatro horas, todos termos sido brindados com incorrecções verbais proferidas pelo ainda primeiro ministro e, igualmente, pela sua adversária, dirigente do maior partido da oposição.
Anteontem, José Sócrates inventou um verbo [caricaturizar]. Por seu lado, Manuela Ferreira Leite disse rebeliamos, ao pretender conjugar o verbo reflexo rebelar-se, na primeira pessoa do plural do presente do indicativo ou, já não me recordo do contexto, talvez do presente do conjuntivo, sucedendo que, em ambas as circunstâncias, a senhora sempre erraria.
Aparentemente, em relação às pobres mensagens que um e outro têm transmitido, dali não virá mal pior. Então, perguntar-se-á, se ao debitarem as vulgaridades habituais, tanto faz que sejam mais ou menos correctos. Sem grande margem para erro, julgo, apesar de tudo, que a correcção faz toda a diferença. Como qualquer falante, também esta gente está obrigada ao respeito das regras gramaticais, independentemente do conteúdo da comunicação.
Muitas podem ser as razões que estão a montante destes lapsos dos protagonistas da tão desqualificada classe de dirigentes políticos portugueses. Desde o berço em que nasceram, às pessoas que foram importantes na sua educação, aos companheiros e amigos com quem se relacionam, imensos são os factores circunstanciais que determinam a forma como cada um se expressa.
Sem pretender pôr à prova as minhas capacidades divinatórias, permitir-me-ia, no entanto, supor que algo problemática será a sua relação com a leitura, tanto a nível da quantidade como da qualidade. Esta gente lê pouco ensaio, ficção, poesia ou não lê mesmo, senão as parangonas dos jornais e as notícias mastigadas pelos assessores de imprensa. E, quanto muito, alinhavam umas citações de certos pensadores que, tantas vezes, à trouxe-mouxe, mas para causarem boa impressão, introduzem nos seus discursos. E lá se vão safando.
Por outro lado, como não sabem gerir o tempo de que dispõem em função do consumo de bens culturais, praticamente não vão ao cinema, nem teatro, nem ao ballet ou às salas de concerto, nem à ópera, nem a exposições. Em suma, a exemplo da generalidade dos cidadãos que lhe entregou o poder através do voto, a maioria da classe política, pura e simplesmente, não tem vida cultural. Claro que ninguém deve admirar-se se o investimento no sector da Cultura é tão inexpressivo. Pudera!
Claro que, subsequentemente, bem lhes podemos detectar a vacuidade, a falta de substância das propostas e, ainda por cima, incorrecções como as apontadas e outras, umas vezes mais e outras menos graves. Sabem os leitores que não exagero ou a generalizo maldosamente, embora apenas me tivesse reportado aos dois partidos do designado centrão. É mesmo assim. Infelizmente e para nossa desgraça…
A terminar, só gostaria de vos lembrar duas anedotas, relativas a dois ex-primeiros ministros que, com maior ou menor notoriedade, continuam a andar por aí, e que bem corroboram o que venho de escrever. Não me digam que já se esqueceram de um, cujo currículo insere a descoberta dos concertos para violino de Chopin e do outro, para quem o número de cantos de Os Lusíadas continuava a ser uma incógnita…
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3 comentários:
Caro Dr. cachado,
Olhe que mesmo localmente temos uns cromos muito interessantes. O póprio Dr. Cachado já referiu um vereador que diz «pusi-o» em vez de pu-lo. Até o presidente da Câmara raras vezes se percebe o que quer dizer com uma data de «palavras caras» que põe umas adiante das outras sem grande ligação.
Rocha Neves
Os países desenvolvidos já chegaram há muito tempo à conclusão de que a cultura não é um ornamento e por isso investem de acordo. Enquanto Portugal for este quintal de apagada e vil tristeza, a cultura será secundária. Sempre. Os gregos consomem mais quatro vezes bens culturais que os portugueses. Sabiam?
Rosário Novo
Prof. João Cachado e colega,
Admiro-me de não ter escrito acerca daquele exercício de caça ao erro que aprendi consigo, era eu um professor a dar os primeiros passos, numa das acções de formação em que o Cachado foi formador do Ministério da Educação, a partir de videos onde tinha gravado entrevistas concedidas por certos políticos. Lembro-me muito bem que nos fartámos de rir com os erros da Manuela Ferreira Leite que, naquele tempo era ministra da Educação.
Leva muito tempo a mudar as coisas e são cada vez mais os factores que se opõem à mudança. A classe política essa mantém ou piora os defeitos que já lhes detectávamos há vinte anos. Um abraço
Lemos Narciso
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