Sintra em compras polémicas (I)
Na página 22 da sua edição de hoje e em pequena peça assinada por Luís Galrão, o Diário de Notícias dá conta da Surpresa com compra de quinta degradada* em que faz um excerto da minha opinião sobre a intenção da Câmara Municipal de Sintra de adquirir a Quinta do Relógio.
Naturalmente, porque se trata de uma notícia muito sucinta, não pôde entrar no detalhe do texto que tinha remetido àquele jornalista. Todavia, como este blogue não padece das limitações da comunicação social escrita, passo a partilhar convosco aquilo que, neste momento, me parece conveniente. Não é que, por acaso, até nem saiba mais. Todavia, para já, é o que se me oferece. Fica desde já a promessa de voltar à liça a propósito desta matéria, consoante formos sendo informados da evolução do negócio em perspectiva.
Tanto quanto estou informado, a Câmara municipal de Sintra apresentou uma proposta de aquisições que se me afigura como encadeada mistura de alhos com bugalhos, numa tentativa de subtrair ao nosso entendimento que reais razões subjazem à estratégia de, num mesmo documento, incluir a compra de equipamentos afins de diferentes sectores, num montante tão significativo que muito bem pressuporia a afectação de propostas individualizadas.
Se, actualmente, como se afirma, estará longe de esgotada a capacidade de endividamento da Câmara; se, como é previsível, durante este mandato, se impõe concretizar obras e proceder a aquisições extremamente pertinentes, inequivocamente necessárias à melhoria de qualidade de vida dos cidadãos munícipes, então cumpre não comprometer essa capacidade de endividamento com operações polémicas e, nalguns casos perfeitamente evitáveis, porque sendo tal capacidade finita, na actual circunstância das finanças locais e nacionais ainda com mais cautelas se deve actuar.
No que respeita à vertente afecta ao sector da Educação e Desporto (terreno e edifícios onde funciona a Escola Básica nº 1 do Cacém e Complexo Desportivo de Fitares, faria uma chamada de atenção para a necessidade de melhor circunstanciar as razões a montante desta tomada de posição, nomeadamente, através da apresentação de um detalhe dos custos havidos:
- desde o início do regime de aluguer até à actualidade;
- estado actual das instalações e informação de pormenor quanto a eventuais obras a concretizar, no curto e médio prazos, para que o erário municipal não seja, intempestivamente, confrontado com a necessidade de despesas de manutenção, restauro e reparação, ao fim e ao cabo, provavelmente previsíveis, mas ainda não quantificadas. Com que intenção isto se passa é que cumpriria esclarecer.
Portanto, muito cuidado terá de se registar quanto à necessidade de perceber tudo quanto é prévio, no passado recente, exigindo que a EDUCA demonstre e circunstancie, o mais detalhadamente possível, a transparência da proposta, evidenciando como, em nome dos munícipes, tudo foi e continuará sendo feito no sentido de não restarem quaisquer dúvidas sobre a inevitabilidade da aquisição.
Aliás, neste contexto, julgo que deveriam ser, não só auscultados mas, inclusive, também envolvidos nesta fase de pré-decisão, os representantes da comunidade educativa em questão, na respectiva Assembleia de Escola. Os pais e encarregados de educação, os agentes económicos locais, a Junta de Freguesia, a paróquia, etc, têm uma palavra a dizer e, diria mesmo que, se ainda o não tiver sido feito, deveria ser aproveitada a oportunidade para marcar a diferença e ser pedagógico relativamente a situações análogas.
Quinta do Relógio
Quanto à aquisição da Quinta do Relógio, julgo que será de manifestar as maiores, as mais evidentes reservas. Desde logo, e, num pequeno parêntesis, chamaria a atenção para o facto de, no preâmbulo, se fazer referência a um desenho da autoria de Clémentine Brélaz, que nada tem a ver com a Quinta na actualidade – já que se reporta a um recanto da propriedade e edifício inidentificável devido a alterações de monta – naturalmente, sem qualquer relação com a estrutura principal, de pendor romântico, com motivos afins de ambiente arabizante.
Fecho o parêntesis e continuo. Tenha-se em consideração que o edifício principal carece de obras, cujo montante não tenho a menor possibilidade de quantificar, que sempre será extremamente significativo. Portanto, aos quase sete milhões da aquisição, não sei quanto mais haveria a considerar para a sofisticada operação de restauro, a concretizar em campanha sempre demorada. Desconheço a disponibilidade financeira dos actuais proprietários que, na realidade, se têm limitado a prolongar uma situação de estaleiro preventivo de maior degradação e decadência.
Por outro lado, nada se adianta - em relação a uma aquisição tão significativa para o erário municipal - quanto às iniciativas que a Câmara preveria ali concretizar no futuro. Há uma vaguíssima alusão à possibilidade de articulação com a Quinta da Regaleira e nada mais. É pouco, meu Deus, manifestamente pouco, para quem se apresta a gastar seis milhões e oitocentos mil euros na aquisição, para quem desconhece ou, pelo menos, não informa quanto será obrigado a gastar em obras e ainda tem de pagar não sei quantos mais milhões por um serviço de dívida que se prevê a quinze anos.
Anedoticamente, quase poderíamos ser levados a pensar que a Câmara espera, isso sim, aproveitar o espaço envolvente e disponível para parque de estacionamento, aliás, no contexto do que anunciou tencionar fazer, no interior da própria Quinta da Regaleira, para acolher cerca de trinta viaturas. Sempre ficava com espaço para mais umas dezenas...
Volto à informação, constante da própria proposta, nos termos da qual não está esgotada a capacidade de endividamento da autarquia. Pois, muito bem. Por se revelarem tão frágeis e destituídas de senso de gestão as razões que conduziriam à aquisição em apreço – no âmbito de um programa cultural que, inequivocamente, determinasse tão avultado investimento – então, em minha opinião, importaria privilegiar outra frente de actuação.
Dever-se-ia, isso sim, procurar investir tais verbas na tentativa de resolução de problemas que, tão causticamente, têm minado a qualidade de vida dos munícipes e dos forasteiros que procuram e têm direito a um usufruto escorreito, normal, actualizado, civicamente inatacável dos bens culturais de Sintra, usufruto esse altamente comprometido, por exemplo, devido à inexistência dos parques dissuasores de estacionamento nos pontos estratégicos das três freguesias da sede do concelho.
Esta, sim, é uma obra absolutamente inadiável. Assim como, por exemplo, a resolução dos gritantes problemas de recuperação de edifícios em pleno centro histórico, edifícios que, mesmo na vigência do actual dispositivo legal, já poderiam ter sido objecto de intervenção, assim houvesse vontade política nesse sentido, já que, aparentemente, não teriam faltado verbas provenientes da vizinha zona de jogo. E, na mesma crítica zona do centro histórico, ainda a concretização das obras de saneamento básico, cuja falta é um escândalo inominável e, espero que devidamente avaliável pela delegação de peritos da UNESCO que, nesta semana, permanece em Sintra.
O que não falta são obras onde aplicar tantos milhões que, tão benemeritamente se pretende despender com a aquisição da Quinta do Relógio. Esta propriedade, ao contrário do que acontecia na altura em que o executivo de Edite Estrela decidiu adquirir a Quinta da Regaleira, não pressupõe intervenção idêntica.
Julgo que será de deixar funcionar o mercado no sentido de que uma entidade, à altura do empreendimento, se posicione adequadamente e, por parte da autarquia, sempre com o cuidado de que os propósitos dos futuros proprietários não colidam com os interesses da comunidade.
Aliás, muito estranha se me afigura esta pressa aquisitiva quando, por exemplo, a Câmara Municipal de Sintra tem demonstrado tanta ineficácia na gestão de outro bem patrimonial de inestimável recorte cultural e tão importante como a Quinta de Ribafria. Acontece que, nitidamente, não tem unhas para aquela guitarra... Parece impossível que, não satisfeito com as provas de prático abandono deste património, o executivo autárquico venha agora tentar comprar a Quinta do Relógio, sem um inequívoco programa que sustente e viabilize tal intenção.
Enfim, por aqui me fico, sabendo já que, com os votos favoráveis da Coligação Mais Sintra, acolitada pela providencial abstenção da CDU, foi aberta a porta para a hipotética viabilização do negócio. Espero bem que os senhores vereadores da oposição afectos ao Partido Socialista, se bem que vencidos no seu voto contra, não se fiquem por aqui. Há imenso trabalho pela frente no sentido de demonstrar que as aquisições em questão, nomeadamente a da Quinta do Relógio, são altamente polémicas e dificilmente defensáveis como de insofismável interesse para enquadramento no património municipal.
* título do artigo
6 comentários:
Caro Senhor, mais uma vêz o encontro na 1ª linha deste combate que é o da defesa do património sintrense. Louvável tem sido a sua acção e desde já os meus sinceros agradecimentos. E em jeito de agradecimento procuro aqui contribuir com mais alguma informação sobre esse enorme atentado,a aquisição por parte da autarquia da Quinta do Relógio.Necessidade do espaço para a dinâmica cultural é como o Sr. muito bem referiu, é no minimo anedoctico. Palco para mais um fiasco como foi o colóquio das tendas filosofais destinado a umas quantas bestas que se dizem iluminadas? Mais outro fiasco como o da Ribafria? NÃO! NADA DISSO! Aquilo é um jeitasso a alguém! Vejamos, a Quinta do Relógio está em obras há pelo menos 9 anos, por dentro o edifício está totalmente desvirtuado da sua forma original. Existem hoje 2 novos pisos abaixo do nivél do chão, pretendiam os actuais proprietários fazer uma garage.As obras estão ainda hoje muito longe do seu fim. Quem é que as vai terminar, a CMS? Claro! Por isso, património só na fachada! Também será aqui util dizer que a Quinta do Relogio está para venda na consequência de um divórcio e que não há nada como ter a ajuda de amigos influentes em horas de necessidade. Contribuir para aliviar o problema do estacionamento no centro histórico? È de mentecapto! O Problema do estacionamento só se resolve na períferia! Olhem para outros países europeus e para as soluções por lá tomadas. Se quem tem estas ideias de génio, até nem é de todo parvo, só podemos ter o entendimento destes fenómenos que tanto afectam a nossa Sintra, naquela prática que por cá ganhou raizes e que aqui já referi. O jeitasso das negociatas!
È desesperante!
Miguel Geraldes
Meu caro João Cachado,
Permita que coloque, aqui, uma questão prévia: Salvo opinião contrária dos interessados, é preciso que, por todo este concelho, se conheçam os nomes de quantos colaboraram nesta aprovação, porque se é certo que a Proposta é levada pelo Presidente da Autarquia, não podem deixar de ter responsabilidades sobre uma matéria que pode endividar os munícipes em mais uns anos, além dos que já sabemos. Isto de ficar em Acta é pouco...
Estes actos, curiosamente, têm um sinal contrário àquele que envolveu o mecenato ligado ao eléctrico e que sem ele as reparações necessárias não seriam feitas. Parece que faltava dinheiro.
Sabe-se que o dinheiro do Jogo (pelo menos que se veja) não tem sido aplicado na recuperação do Centro Histórico.
É estranha, pois, a galopante vontade em adquirir bens - a Câmara não é mecenas, não é verdade? - cujo estado, destino futuro e custos associados à sua recuperação são desconhecidos.
No caso do Complexo de Fitares, existem duas componentes: Edifícios e Equipamentos. Os edifícios certamente com manutenção a cargo dos proprietários e os equipamentos (face à renda paga) a cargo de quem? Na verdade parece que os equipamentos não estão operativos, com funcionamento a partir de 2001, isto é, elevada taxa de utilização que se reflecte em desvalorização por uso.
NA PROPOSTA QUE FOI APRESENTADA, NÃO CONSTA A SEPARAÇÃO ENTRE VALORES DE EDIFÍCIOS E DE EQUIPAMENTOS, PARA MELHOR SE PODER AFERIR DAS RESPECTIVAS VALORIZAÇÕES.
Será que a Câmara vai adquiri-los e depois substituí-los? Bem, o segredo até pode ser a alma do negócio. Mas por lá não há, ao que se julga saber, poços de petróleo ou algum Posto de Combustível que faça brotar milhões.
Façamos uma extrapolação:
Admitamos,para efeitos de estudo académico, que a renda paga ao longo destes anos possa ter sido com um valor médio mensal próximo dos 30.000 euros. Nesta perspectiva, em 9 anos, já foram pagos mais de 3milhões de euros. Talvez ainda se possam acrescentar custos extra (p.ex. seguros).
Depois, devemos saber das razões que motivaram o encerramento das instalações (há mais de um ano) e, em consequência, a suspensão das actividades que eram oferecidas aos utentes.
Há pois uma penumbra na relação custo/benefício que deve ficar muito limpa, melhor dizendo, ser completamente eliminada para que a confiança na vida autárquica se mantenha e se evitem referências a generalizações.
Tenho a certeza de que os seus textos e os comentários que aparecem são lidos na Câmara de Sintra. A contribuição dos postes de ontem e de hoje para a defesa dos interesses desta terra é do maior valor. O que o Cachado, o Castelo, Miguel Geraldes e Margarida Paulos escreveram ontem e hoje são créditos a vosso favor. Em dois dias fiquei a saber uma data de coisas que andam para aí escondidas. Vocês destapam essas verdades que se ocutma debaixo das mentiras e das hipocrisias habituais nas reuniões da Câmara. Vai continuar assim até um dia. Até que esta gente seja apeada dos poleiros onde afinal os pusemos através do voto.
A todos, muito obrigada.
Helena Santos
Caro João Cachado
Ainda que telegraficamente, não quero deixar de partilhar consigo e com os seus leitores a minha visão acerca da compra da Quinta do Relógio — que se baseia quase exclusivamente naquilo que através da blogosfera me foi chegando. Assim, a opinião ora expendida baseia-se num conhecimento superficial dos dossiers em apreço e é passível de alteração à luz de novos dados que, entretanto, venha a averiguar.
É um facto que os dinheiros públicos devem ser bem empregues e que há que investir em função de projectos com alguma consistência. Abundam em Sintra os exemplos de aquisições dispendiosas que não se traduziram em mais-valias de monta para a oferta cultural concelhia. Aos muitos exemplos por si referidos, acrescentaria ainda um Chalet Sasseti ou outros casos quejandos. Contudo, sabemos por que experiências traumáticas tem passado a nossa amada terra, no que toca à gestão privada, ou em parcerias entre Estado e particulares, de bens ou espaços de inequívoca relevância patrimonial. A esse título, são bem eloquentes as recentes peripécias vividas em Seteais (e imediações...) ou a terrível saga de Monserrate na fase pós-Cook. São lições que Sintra jamais poderá esquecer, que dizem bem da importância do predomínio da gestão pública, ainda que negligente ou pouco esclarecida, sobre o empreitadorismo que assola os últimos redutos da Sempre Noiva. No caso da Quinta do Relógio, ainda há coisa de meses havia alertado o por si citado Luís Galrão para a situação ali vivida, em mail do domínio privado, mas que em parte aqui transcrevo:
A Quinta do Relógio é uma «propriedade histórica, situada bem no coração da área classificada como Património da Humanidade, mesmo à frente da Quinta da Regaleira. Depois de muitos anos ao abandono, foi adquirida por uma família estrangeira, radicada em Sintra, e tiveram início obras de recuperação, entretanto suspensas. Neste momento, o palacete e toda a propriedade estão convertidos numa espécie de estaleiro abandonado, sem que se vislumbre uma saída para o impasse a que se chegou. Se esta situação se arrastar por muito mais tempo, ali nascerá outra Gandarinha, outro Netto ou outro Bristol, só para citar os casos mais conhecidos, mas bem à frente de um dos pontos mais visitados de Sintra.»
Face a tal cenário, foi com certa estranheza que tomei conhecimento das reservas manifestadas por tanta gente grada das lides sintrenses relativamente à anunciada intenção de compra pela Câmara de Sintra.
Claro que me parece inaceitável a possibilidade de se utilizar o parque da Quinta para estacionamento. Claro que a quantia me parece elevada. Mas que dizer do actual estado de degradação de uma das propriedades mais emblemáticas de Sintra, ninho de D. Carlos e D. Amélia em lua-de-mel, à sombra daquela sobreira dos fetos de beckfordiana memória?
O notório défice cultural e paisagístico que tem (des)norteado a gestão do tão alardeado Património da Humanidade não é menos preocupante que o das contas públicas, que assola o país em geral.
Qual pesará mais na balança dos séculos?
Sem alinhar pelo diapasão do "bola para a frente que depois logo se vê", não posso, também, deixar de saudar a intenção da edilidade de adquirir um bem para mim e para tantos mais valioso do que muitos empreendimentos que suscitam tantas ou ainda mais dúvidas.
Fica o desabafo.
António Lourenço
Então e os acessos a Sintra, a melhoria das redes viárias? Já viram como se circula ali na Av. das Forças Armadas ao fim da tarde? Não se circula! E querem estes vigaristas endividar mais a camara para comprar um palacete que já não o é! Li, recentemente a lista do governo que enuncia os novos hospistais a construir, o hospital de Sintra nem nas entrelinhas! A grande tragédia de Sintra é terem nos tomado por saloios iletrados e por isso vamos sendo assim vitimas destes "city slickers".
José Pedroso
The present owners bought quinta do relogio as complete ruin which has nothing left inside after fire and neglect of many decades years before acquire by present owner. accept the outside facade. Millions have been spend by present owner to reinforce the structure and restore other buildings and making most glorious garden in whole of Sintra. millions spent by ownners in the careful professional high degree restoration by best professional expert hire. easy to criticise but any one know big time needed for historic restoration work was stop as city municipality announce purchase. now owner decide to start work soon as purchase keep delay once completed the owner plan to make the palace pride of Sintra as owner in love with Sintra. I am associated with restoration work so I know. surely people in sintra get chance to enjoy quinta do relogio in its glory in future.
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