[sempre de acordo com a antiga ortografia]

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Acção directa

"(…) Porque a pressão exercida sobre mim constituiu uma violência psicológica insuportável, porque não vislumbrei outra alternativa para preservar o meu nome, exerci acção directa e, irreflectidamente, tomei posse de dois equipamentos de gravação digital, os quais hoje estão apensos à providência cautelar que corre termos no Tribunal Cível de Lisboa.

(…)Procurei assim afirmar e fazer valer os meus direitos, uma vez que nunca tendo sido acusado nem julgado por nenhum tribunal, não aceitarei ser agora julgado por jornalistas deste tipo (…)”

Estas são palavras constantes da declaração do Senhor Deputado Ricardo Rodrigues, ontem à tarde no Parlamento. Era a patética e frustrada tentativa de pública justificação da sua lamentável atitude durante a entrevista que estava concedendo aos jornalistas da revista Sábado.

Tudo porque acabava de ser confrontado com o seu patrocínio, como advogado, a Débora Raposo, em 2008 condenada por burla e falsificação de documentos, num caso que defraudou em vários milhões de Euros a Caixa Geral de Depósitos de Vila Franca do Campo, na ilha de S. Miguel, em que ele próprio chegou a ser arguido, mas não acusado.


A sua demissão de Secretário Regional da Agricultura do Governo Regional dos Açores, em 2003 – na sequência de boatos, com repercussão pública, que o ligavam a um escândalo de pedofilia no arquipélago – terá sido o assunto que levaria o Senhor Deputado a levantar-se e a sair da sala, não sem que, previamente, tivesse subtraído dois gravadores de cima da mesa.

Confrontado com a incomodidade de atitudes do seu passado insular que, infelizmente para si, ainda não se sumiram nem estão esquecidas na bruma dos dias, o Senhor Deputado não esteve à altura da situação. A verdade é que o Senhor Deputado esqueceu que funções exerce, em delegação do poder que muitos cidadãos nele depositaram para, ao mais alto nível, honrar a República.

O profissional da Política que o Senhor Deputado é, portou-se muito mal. Pior não seria possível. Ficou, por exemplo, ao baixíssimo nível do profissional do futebol que, não aguentando a pressão da ofensa verbal de um adversário, desata ao murro e pontapé, esquecendo que o relvado é um tabuleiro de desporto onde a escola do fair play é inequívoca e determinante.

Agiu o Senhor Deputado como um garoto inconsequente que, apanhado em flagrante deslize, tenta esquivar-se, de qualquer maneira, sem perceber que só agrava a situação. Agiu, afinal, como a aluna do Carolina Micaelis – lembram-se? – que, em desespero de causa, agrediu a incompetente professora que tinha deixado que o conflito evoluísse a nível insustentável.

Perdeu a cabeça, dirão alguns benevolentes companheiros do Partido. Pois é, mas um Senhor Deputado eleito, naquele contexto, jamais poderia protagonizar tão lamentável episódio. Não pode reagir a quente, não pode perder a cabeça. Nem mesmo um qualquer cidadão anónimo, aqui na rua, pode assim reagir, exercendo acção directa e irreflectida. Quanto mais, um Senhor Deputado, ali, dentro das solenes paredes do Parlamento de São Bento.


Não menos lamentável, acrescente-se, a atitude do líder parlamentar da bancada que – acompanhado por outros Senhores Deputados, todos de semblante patibular – desculpabilizaria aquilo que, de todo em todo, jamais seria desculpável.

No entanto, sempre optimista, ouso esperar que, por fim, impere o bom senso. Talvez acabemos por ser beneficiados por um comportamento que honre e dignifique o Estado Democrático de Direito que, tão ligeiramente, ouvimos apregoar sem grande convicção e muito menores consequências.

7 comentários:

Anónimo disse...

Sr. João Cachado,
Escreve tão bem, é tão bem informado, candidate-se à presidência da Câmara. É de si que precisamos. Não fique atrás de um blog, assim, não dá trabalho nenhum.
Margarida

Heitor Real disse...

O Dr Cachado não mencionou que o senhor deputado era sócio da tal Débora e que abriu uma conta num paraíso fiscal. A maior ironia é que é o deputado do PS mais destacado para os casos referentes à justiça...

Heitor Real

Anónimo disse...

A única coisa honesta que podia fazer era suspender o mandato e demitir-se.
Conceição

J.P. Gonçalves disse...

Pegando nas palavras do utilizador Margarida, porque não um movimento de cidadãos em Sintra que concorra ás eleições autárquicas com pessoas capazes de fazer algo de útil pelo concelho?
Seria sempre difícil eleger alguém mas, pelo que vejo, pessoas capazes ainda há várias por aqui. É pena as eleições locais serem sempre partidarizadas e é pena também a maioria da população votar no seu partido do costume sem se preocupar com o que foi ou não foi feito pelo concelho.
Por este Blog e por outros que por vezes consulto tenho a certeza de que há quem possa fazer mais e melhor por Sintra.

Anónimo disse...

Eu vi e ouvi: o lider parlamentar do PS classificou
Ricardo Rodrigues como um dos deputados mais competentes da Assembleia da República.
Em vez de lhe abrir a porta da rua. Não se acredita que os políticos portugueses tenham nível tão baixo...
Fernanda Rito

Heitor Real disse...

Comentário para "Margarida":

O comentário de Margarida de ontem faz lembrar as observações aos críticos de cinema (que na opinião de muita gente que não servem para nada...) e que para serem úteis deviam era ser realizadores...
Precisávamos que muito mais munícipes fossem tão críticos como o João Cachado, denunciando o que está mal e doa a quem doer como ele faz.

Heitor Real

Anónimo disse...

De vez em quando, faço comentários aos posts do Dr João Cachado, pessoa cuja amizade muito prezo e por quem nutro uma admiração muito especial;às vezes assino só, como Margarida, outras, Margarida Paulos.Hoje encontrei aqui dois comentários assinados por alguém de nome Margarida e quero avisar que nenhum deles é de minha autoria, alguém está a «brincar» fazendo o que eu fazia, sem qualquer intenção.

Margarida Mota Paulos