[sempre de acordo com a antiga ortografia]
sábado, 30 de julho de 2011
A propósito dos
instantâneos da Estefânea (2)
Não há dúvida de que o meu texto inicial funcionou como alfobre de excelentes contributos que me merecem os maiores encómios. Assim dá gosto registar a denúncia, sabendo como seguidores atentos nos escrutinam, sempre alerta e aguardando por uma oportunidade de acrescentar a sua opinião que mais não é do que a cidadania a funcionar.
Ah, como eu gostaria que os autarcas, destinatários últimos destas mensagens, as tivessem na devida consideração! É que são tão pertnentes, tão sinceras, tão cheias de vontade de colaborar, que seria lamentável não aproveitar. Os mais velhos de nós, depois de muitos anos de luta, lá vamos tendo este lenitivo de esperança, atentos ao interesse da geração que nos segue. Não fosse isto e a coisa seria muito pior.
Hoje, passo a transcrever outro comentário do meu amigo Ricardo Duarte, um dos poucos jovens militantes do património de Sintra que, pelas suas esclarecidas intervenções cívicas, nos dá algum sossego quanto à continuidade da defesa das nossas causas no futuro. É um homem dos correios de Sintra, que todos nós conhecemos, gentilíssimo, prestes a licenciar-se em História da Arte na Faculdade de Letras da Universidade Clássica de Lisboa.
Aí tendes o que se lhe oferece.
"Pego no seu último ponto para dar uma achega àquilo que tem sido a actuação deplorável da Policia Municipal em Sintra nos últimos tempos, a qual acabo por presenciar diariamente. Num País que se encontra a “saque”, são esses senhores mais uns intérpretes dos roubos que constantemente são infligidos aos cidadãos.
Caso paradigmático dessa atitude é o que vem vindo a ocorrer na Rua Francisco dos Santos (rua que sobe do largo do Morais para São Pedro). Ora, descobriu a PM o filão que é o bloqueamento de veículos nessa artéria, não só porque os moradores aí estacionam a sua viatura há dezenas de anos, bem como os utentes da clínica de fisioterapia (na maioria idosos) e da delegação do ACT ali bem próximas.
Sempre foi norma o estacionamento efectuar-se em cima do passeio, em virtude das características da artéria e também porque de “passeio” só existe o nome uma vez que a calçada se encontra ocupada pelas árvores e sempre esburacada o que obriga os peões a caminharem pelo alcatrão. Até a GNR já reconheceu que a melhor solução é mesmo o estacionamento no passeio, bem encostado ao muro da Quinta dos Lagos.
Como tal, é ver todos os dias por volta da mesma hora (11 da manhã) os agentes da PM, a bloquear e autuar diversas viaturas de uma só vez. De nada vale o argumento de que a GNR aconselha aquela prática, pois de outra forma as viaturas ficam no meio da faixa de rodagem, porque os rigorosos agentes “não são a GNR”…
Não só esta atitude confirma a total falta de sintonia entre autoridades como configura situação de má fé. Foi-me já confirmado por um agente da PM amigo que os próprios têm “valores diários de referência” para terem em mente no que toca a coimas. Uma maneira airosa de lhes chamar OBJECTIVOS.
Outras situações semelhantes se passam noutras artérias da Estefânia. Se por um lado a selvajaria existe e deve ser condenada, por outro a angariação de receita promove a multa gratuita em locais muitas das vezes escondidos e que pouco ou nada prejudicam o quotidiano sintrense.
Tudo isto com o beneplácito da Câmara que, apesar de já alertada por alguns comerciantes no que respeita a soluções, continua impávida e (bastante) serena. Compreensível se pensarmos que a receita “roubada” é dividida em três partes: uma para a entidade autuante, outra para o Estado e a última para o Município respectivo…
Ricardo Duarte"
sexta-feira, 29 de julho de 2011
A propósito dos
instantâneos da Estefânea (1)
Assinado por JAC, recebi o seguinte comentário que muito agradeço. Pela sua pertinência e valor das sugestões, passo a transcrevê-lo na sua totalidade:
" Todos estes problemas relatados têm a ver com falta de civismo e planeamento da nossa Vila.Tem de se criar estacionamento onde é possível. Sempre que implique problemas de circulação dos peões (todo o tipo de peões) ou aos veículos de emergência esse estacionamento não pode existir, tem de ser colocada sinalização correcta e fiscalizar.
O Turismo é das poucas coisas que o nosso país ainda tem de bom para vender. O Ministro da Economia fala de sermos a Florida da Europa. Seria bom mas o trabalho que há para fazer em termos de planeamento e civismo é monumental, absolutamente monumental. De uma vez por todas temos de pensar que no que tem de funcionar para uma pessoa que se desloca de cadeira de rodas é bom para todos.
Todos gostaríamos de levar um bebé ou criança a passear por Sintra, todos seremos um dia mais velhos… Temos de investir em bons transportes públicos, cómodos para todos os tipos de públicos, acessíveis, com percursos e horários bem planeados.
Continuamos a querer meter o Rossio na Betesga. Tem de se criar vários espaços de estacionamento fora da Vila e fazer ligações ao Centro Histórico apenas por transportes públicos. Os únicos veículos que poderiam circular no Centro Histórico seriam apenas os de moradores e comerciantes e mesmos esses já são muitos.
Se calhar os comerciantes acham que tal ideia os vai fazer perder clientes. Estão tão errados... Eu e muitas pessoas iriam muitas mais vezes à Vila de Sintra e aos seus monumentos se houvesse a possibilidade de se respirar ar puro (e não poluição provocada por veículos automóveis) de levar um carrinho de bebé, se não tivessem que se aborrecer com o transito e com as dificuldades de estacionar...
Se fossem apenas usufruir de um bom passeio pela magnifica paisagem cultural sem terem de se chatear, gastar imenso dinheiro em gasolina e estacionamento, poderiam certamente ficar lá mais que 30 minutos e gastar dinheiro noutro tipo de artigos como por exemplo os que vendem os comerciantes nos Centros Históricos...?????
JAC"
instantâneos da Estefânea (1)
Assinado por JAC, recebi o seguinte comentário que muito agradeço. Pela sua pertinência e valor das sugestões, passo a transcrevê-lo na sua totalidade:
" Todos estes problemas relatados têm a ver com falta de civismo e planeamento da nossa Vila.Tem de se criar estacionamento onde é possível. Sempre que implique problemas de circulação dos peões (todo o tipo de peões) ou aos veículos de emergência esse estacionamento não pode existir, tem de ser colocada sinalização correcta e fiscalizar.
O Turismo é das poucas coisas que o nosso país ainda tem de bom para vender. O Ministro da Economia fala de sermos a Florida da Europa. Seria bom mas o trabalho que há para fazer em termos de planeamento e civismo é monumental, absolutamente monumental. De uma vez por todas temos de pensar que no que tem de funcionar para uma pessoa que se desloca de cadeira de rodas é bom para todos.
Todos gostaríamos de levar um bebé ou criança a passear por Sintra, todos seremos um dia mais velhos… Temos de investir em bons transportes públicos, cómodos para todos os tipos de públicos, acessíveis, com percursos e horários bem planeados.
Continuamos a querer meter o Rossio na Betesga. Tem de se criar vários espaços de estacionamento fora da Vila e fazer ligações ao Centro Histórico apenas por transportes públicos. Os únicos veículos que poderiam circular no Centro Histórico seriam apenas os de moradores e comerciantes e mesmos esses já são muitos.
Se calhar os comerciantes acham que tal ideia os vai fazer perder clientes. Estão tão errados... Eu e muitas pessoas iriam muitas mais vezes à Vila de Sintra e aos seus monumentos se houvesse a possibilidade de se respirar ar puro (e não poluição provocada por veículos automóveis) de levar um carrinho de bebé, se não tivessem que se aborrecer com o transito e com as dificuldades de estacionar...
Se fossem apenas usufruir de um bom passeio pela magnifica paisagem cultural sem terem de se chatear, gastar imenso dinheiro em gasolina e estacionamento, poderiam certamente ficar lá mais que 30 minutos e gastar dinheiro noutro tipo de artigos como por exemplo os que vendem os comerciantes nos Centros Históricos...?????
JAC"
quarta-feira, 27 de julho de 2011
Estefânea de Sintra,
três instantâneos
1.
Muito grávida, a jovem mamã empurrava um carrinho de bebé. Vinda da Segurança Social, ia pelo passeio da direita e estava prestes a entrar na zona da Correnteza, agora ocupada com a feira do livro. Acorri, quando, vendo-a hesitante quanto à decisão a tomar, me apercebi de que não haveria alternativa à ocupação da faixa de rodagem. Ajudei a atravessar a rua e a tomar o passeio do lado oposto, recomendando-lhe a melhor solução. Agradeceu e cada um seguiu o seu caminho.
Mais uns metros e, olhando eu para trás, verifiquei que, afinal, a senhora estava novamente em apuros. Desta vez, tive de correr porque circulavam muitos automóveis. Não havia nada a fazer. Deixámos passar os carros e tomámos a faixa de rodagem até poder atravessar e prosseguir através do corredor livre entre as barracas da feira.
Claro que a ninguém da organização do certame cultural ocorreu que estava a agravar as normais – já péssimas e perigosas – condições a que, em Sintra, estão sujeitos os cidadãos acompanhantes de crianças.
2.
Havia um problema de rotura de um cano de água no prédio da Rua Câmara Pestana onde está instalada a Conservatória do Registo Predial. Quando cheguei ao local, o desconchavo não podia ser mais sintomático. Duas viaturas dos SMAS estavam estacionadas sobre o passeio adjacente ao muro da antiga oficina e vivenda devoluta. Eram sete os funcionários à porta do prédio ainda que apenas dois estivessem mesmo a trabalhar.
Entretanto, proveniente do primeiro quarteirão da mesma rua, aproximara-se um cego com o seu cão guia. Muito naturalmente, pretendia prosseguir pelo passeio, precisamente o mesmo que, intempestivamente e, à trouxe-mouxe, fora ocupado pelos carros dos serviços municipais. Muito simpaticamente - já repararam como são simpáticos os lusos prevaricadores? - o oitavo funcionário dos SMAS ia tentando orientar o cego.
Claro que havia alternativa correcta e civilizada para o estacionamento selvagem protagonizado pelo pessoal da Câmara Municipal de Sintra. Claro que o cão guia, treinado em Bordéus e recém-chegado, só agora começou a perceber que fora exportado para uma latitude pouco recomendável…
3.
Rua Adriano Júlio Coelho, até há poucos dias, zona de estacionamento no sentido ascendente, contígua ao passeio de acesso à garagem da EPMES. Já não me lembro do número total dos automóveis bloqueados naquela tarde do dia 19 do corrente, em que a Polícia Municipal decidiu manifestar a quanto pode montar uma voraz razia.
Resido na zona há mais de quarenta anos e, portanto, há tempo bastante para saber como os portadores do respectivo cartão de residente, bem como os condutores em geral, munidos do bilhete liquidado no parquímetro instalado perto da escada da igreja de São Miguel, têm estacionado e continuam a estacionar os automóveis junto àquele passeio. [Atenção, cumpre referir que se trata de uma rua que começa junto ao Centro Cultural Olga Cadaval
para terminar, sem saída, ao fundo do Bairro das Flores. Repito, rua sem saída...].
Pois a verdade é que, sem qualquer sinalização adequada – quanto mais não fosse, pelo menos, análoga à do estacionamento proibido, visível logo acima, na mencionada Rua Câmara Pestana, no troço em que se circula nos dois sentidos – a Polícia Municipal decidiu protagonizar uma atitude que, de modo algum, posso aplaudir.
Não deve haver quem, como eu, tanto tenha incentivado a PM à actuação firme contra qualquer das formas de tolerância que tanto tem contribuído para o prejuízo da nossa qualidade de vida em Sintra. Claro que, desta vez, não posso fazê-lo. Claro que se impõe avisar e instalar a sinalização relativa à proibição que terá passado a vigorar. Assim não acontecendo, apenas se trata de uma reles operação de caça à multa.
PS:
Contudo, não me passa pela cabeça que, em nome dos munícipes, a autoridade cívica e democrática, também dependente do próprio Presidente da Câmara Municipal de Sintra, incorra em atitude tão controversa. Há que fazer as coisas bem feitinhas…
quarta-feira, 20 de julho de 2011
Na Escola
valores e condições de trabalho
Mais uma vez, estive nas ilhas de São Miguel, Terceira e Pico, para discutir problemas que se relacionam com os dois pares de conceitos de Cidadania e Participação, Autoridade e Disciplina, durante duas semanas, com colegas do sector da Educação, domínio em que tais questões se evidenciam com especial pertinência. À partida, no contexto de uma opção pessoal que me leva a participar em iniciativas congéneres, em regime de voluntariado, esta deslocação aos Açores constituía oportunidade imperdível para, directamente, me aperceber como ali se conjugam aqueles conceitos.
Tenha-se em consideração que, em qualquer comunidade escolar, seja qual for a latitude do Estado Democrático de Direito em que estiver inserida, cidadania e participação são conceitos indissociáveis, cujo exercício e proveito se articulam, de modo sistémico, com a prática da autoridade democrática, na exigência do cumprimento da disciplina, sem a qual é impossível a boa condução dos trabalhos. No entanto, aquela que parece uma pacífica formulação, suscita intermináveis ponderações.
Na realidade, torna-se cada vez mais complexo conjugar as ideias do exercício da própria autoridade democrática e da exigência do cumprimento da disciplina na Escola. Isto porque, no binómio ensino/aprendizagem, convém não esquecer, ao longo de décadas, se tem privilegiado a vertente lúdica. Em termos mais pessoais, apesar da boa companhia de cúmplices de grande qualidade, a minha luta, nos últimos trinta anos, tem-se concentrado na tentativa de contrariar aquela perspectiva que é matriz de propostas cujas infelizes consequências estão bem à vista.
De alcance muito limitado têm sido os esforços de pedagogos e técnicos de Educação, sociólogos, etc, no sentido da consciencializar todos os intervenientes do processo educativo – professores, pessoal de apoio educativo, alunos, pais e encarregados de educação – acerca da necessidade de, não só recuperar algumas práticas pedagógicas, mas também viver atitudes comportamentais afins do restabelecimento da autoridade e da disciplina na escola democrática, erradamente conotadas com a possibilidade de desencadearem pretensos traumas nos alunos.
Tal como no continente, também por lá, os agentes qualificados de Educação enfrentam sérias dificuldades quando, na tentativa da valorização dos conceitos e valores em apreço, pretendem exigir o cumprimento dos deveres plasmados nos Regulamento Interno da escola e Estatuto do Aluno. Não afirmaria que prevalece mas, antes, que se evidencia uma preocupante atitude de confusão entre autoridade democrática e autoritarismo.
O resultado mais perverso desta situação é a prevalência de um certo laxismo, muito coincidente com aquilo que, sistematicamente, na esteira de Jorge Sampaio, tenho designado como uma perniciosa cultura de desleixo, minando os próprios alicerces da sociedade democrática. É essa cultura que, infeliz mas continuadamente, vai desgastando o profissionalismo de agentes educativos que, de modo algum, podem contemporizar com ela.
Portanto, muito, muito trabalho a fazer. Assim no-lo exigem os cidadãos contribuintes que, confiando nas ilimitadas capacidades da escola, continuam a entregar-lhe o seu mais precioso bem. O grande objectivo, para os seus filhos e educandos – tantas vezes tão mal conduzidos, no seio de famílias cheias de problemas, inseridas num quadro de referências socioculturais obedientes a modelos incompatíveis com os valores que todos afirmam pretender cultivar – é o de que, à saída do Sistema Educativo, tenhamos cidadãos de corpo inteiro.
De qualquer modo, de acordo com uma abordagem abrangente e integrada dos desafios que se colocam à escola, não tenho a mínima dúvida de que, como instituição, ela só mudará quando, em geral, a comunidade também decidir mudar. Enquanto tal não acontecer, não podemos esperar muito mais do que evitar incorrer em erros demasiado grosseiros. Apenas isso, embora com a necessidade da urgente aquisição de uma lucidez que tem faltado aos decisores políticos e que os cidadãos não têm sabido controlar porque não funciona a cidadania activa.
Para bem funcionar, como transmissora de valores que aparecem colados à aquisição dos conhecimentos – e com a autoridade que detém, proveniente do mandato democrático que a determina – a Escola democrática tem de saber exigir o cumprimento da disciplina. E, finalmente, de uma vez por todas, ou os cidadãos assumem a convicção que afirmam partilhar, ou seja, a de que a Educação é, fundamentalmente, a transmissão de valores e, eles próprios, passam a viver esses valores, ou, então, o melhor é continuarem a afivelar a máscara com que, ao longo de décadas, tão inconvenientemente, têm decidido ocultar a face. É tão simples como isto…
valores e condições de trabalho
Mais uma vez, estive nas ilhas de São Miguel, Terceira e Pico, para discutir problemas que se relacionam com os dois pares de conceitos de Cidadania e Participação, Autoridade e Disciplina, durante duas semanas, com colegas do sector da Educação, domínio em que tais questões se evidenciam com especial pertinência. À partida, no contexto de uma opção pessoal que me leva a participar em iniciativas congéneres, em regime de voluntariado, esta deslocação aos Açores constituía oportunidade imperdível para, directamente, me aperceber como ali se conjugam aqueles conceitos.
Tenha-se em consideração que, em qualquer comunidade escolar, seja qual for a latitude do Estado Democrático de Direito em que estiver inserida, cidadania e participação são conceitos indissociáveis, cujo exercício e proveito se articulam, de modo sistémico, com a prática da autoridade democrática, na exigência do cumprimento da disciplina, sem a qual é impossível a boa condução dos trabalhos. No entanto, aquela que parece uma pacífica formulação, suscita intermináveis ponderações.
Na realidade, torna-se cada vez mais complexo conjugar as ideias do exercício da própria autoridade democrática e da exigência do cumprimento da disciplina na Escola. Isto porque, no binómio ensino/aprendizagem, convém não esquecer, ao longo de décadas, se tem privilegiado a vertente lúdica. Em termos mais pessoais, apesar da boa companhia de cúmplices de grande qualidade, a minha luta, nos últimos trinta anos, tem-se concentrado na tentativa de contrariar aquela perspectiva que é matriz de propostas cujas infelizes consequências estão bem à vista.
De alcance muito limitado têm sido os esforços de pedagogos e técnicos de Educação, sociólogos, etc, no sentido da consciencializar todos os intervenientes do processo educativo – professores, pessoal de apoio educativo, alunos, pais e encarregados de educação – acerca da necessidade de, não só recuperar algumas práticas pedagógicas, mas também viver atitudes comportamentais afins do restabelecimento da autoridade e da disciplina na escola democrática, erradamente conotadas com a possibilidade de desencadearem pretensos traumas nos alunos.
Tal como no continente, também por lá, os agentes qualificados de Educação enfrentam sérias dificuldades quando, na tentativa da valorização dos conceitos e valores em apreço, pretendem exigir o cumprimento dos deveres plasmados nos Regulamento Interno da escola e Estatuto do Aluno. Não afirmaria que prevalece mas, antes, que se evidencia uma preocupante atitude de confusão entre autoridade democrática e autoritarismo.
O resultado mais perverso desta situação é a prevalência de um certo laxismo, muito coincidente com aquilo que, sistematicamente, na esteira de Jorge Sampaio, tenho designado como uma perniciosa cultura de desleixo, minando os próprios alicerces da sociedade democrática. É essa cultura que, infeliz mas continuadamente, vai desgastando o profissionalismo de agentes educativos que, de modo algum, podem contemporizar com ela.
Portanto, muito, muito trabalho a fazer. Assim no-lo exigem os cidadãos contribuintes que, confiando nas ilimitadas capacidades da escola, continuam a entregar-lhe o seu mais precioso bem. O grande objectivo, para os seus filhos e educandos – tantas vezes tão mal conduzidos, no seio de famílias cheias de problemas, inseridas num quadro de referências socioculturais obedientes a modelos incompatíveis com os valores que todos afirmam pretender cultivar – é o de que, à saída do Sistema Educativo, tenhamos cidadãos de corpo inteiro.
De qualquer modo, de acordo com uma abordagem abrangente e integrada dos desafios que se colocam à escola, não tenho a mínima dúvida de que, como instituição, ela só mudará quando, em geral, a comunidade também decidir mudar. Enquanto tal não acontecer, não podemos esperar muito mais do que evitar incorrer em erros demasiado grosseiros. Apenas isso, embora com a necessidade da urgente aquisição de uma lucidez que tem faltado aos decisores políticos e que os cidadãos não têm sabido controlar porque não funciona a cidadania activa.
Para bem funcionar, como transmissora de valores que aparecem colados à aquisição dos conhecimentos – e com a autoridade que detém, proveniente do mandato democrático que a determina – a Escola democrática tem de saber exigir o cumprimento da disciplina. E, finalmente, de uma vez por todas, ou os cidadãos assumem a convicção que afirmam partilhar, ou seja, a de que a Educação é, fundamentalmente, a transmissão de valores e, eles próprios, passam a viver esses valores, ou, então, o melhor é continuarem a afivelar a máscara com que, ao longo de décadas, tão inconvenientemente, têm decidido ocultar a face. É tão simples como isto…
terça-feira, 12 de julho de 2011
O Carmo e a Trindade global
É tão evidente que escuso de sublinhar. De facto, recentemente, agigantaram-se de tal modo os factores negativos, endógenos e exógenos, condicionantes da situação da economia e das finanças nacionais que podem cair o Carmo e a Trindade pois, muito dificilmente, algum facto de incidência mais local, nos desviará a atenção do que está a acontecer, todos os dias, afectando decisiva e tão negativamente os nossos recursos.
Portanto, ultimamente, por mais relevante que, em Sintra, algo possa parecer evidenciar-se, nada se tem afigurado suficientemente decisivo e mobilizador que me desvie do foco em que tenho incidido as baterias. Não é que até não tivesse com que muito me entreter com os conventos do Carmo e da Trindade cá da terra, se quisesse enveredar por caminhos desviantes deste contexto político macro… Porém, perante uma tão grande e labiríntica floresta de enganos, não quero deixar-me apanhar por uma qualquer e insignificante arvorezita sintrense.
Deixemos Sintra em seu aparente remanso porque outros valores mais altos nos desassossegam. A coisa é seríssima. Este último episódio da classificação atribuída pela Moody’s à economia portuguesa, que suscitou inusitados manifestos de patriotismo nacional e europeu, emitidos por todos os quadrantes do espectro político-partidário, não passa de mais uma etapa da pressão geral sobre o Euro em que Portugal até nem é o insignificante peão que possa parecer. E, a demonstrar que assim não é, considerem-se as causas e consequências do ataque que, vindo da outra margem do Atlântico, é mais global do que, tão somente, aparenta a vertente americana.
Não se trata do cantinho lusitano, ao qual se imporia uma reacção isolada. Ainda não é desta vez que, por outro lado, poderemos assistir ao desenhar de uma estratégia conjunta e integrada das economias periféricas. Não, muito mais preocupante, é Bruxelas que não consegue contrariar as manobras predatórias das empresas de rating, através de um inequívoco manifesto da vontade geral europeia de não deixar cair qualquer dos países membros da zona Euro.
Ainda a propósito, não deixa de ser curiosa a nítida preferência dos sitiantes pelo caso irlandês – a que não serão alheios os factores do enorme e decisivo peso da comunidade irlandesa nos Estados Unidos e, apesar de se tratar de uma economia igualmente da periferia, da sua residual e importante componente anglo-saxónica – em detrimento da vertente greco-latina dos outros infelizes sitiados.
Ver-se-á, o que poderá mudar na estratégia europeia, agora que é iminente o contágio às economias italiana e espanhola. De qualquer modo, seja qual for a evolução, são de fascínio absoluto estes dias que temos o privilégio de viver. O desafio é enorme. Embora as comunidades nacional e internacional estejam tão falhas de autênticos estadistas entre os seus líderes, a resposta não deveria gorar as expectativas. É que, raramente, a própria democracia e a paz estiveram tão dependentes da lucidez dos decisores políticos.
PS:
Ah, é verdade, a manobra de boicote ao site da Moody’s não podia soar a maior infantilidade. Então cabe na cabeça de alguém anunciar, urbi et orbe com a antecedência de vários dias, um movimento como o que era proposto, concedendo ao inimigo todo o tempo para contrariar a mínima hipótese de sucesso? Mas que destempero!... Mas que ingenuidade!...
domingo, 10 de julho de 2011
Bancarrota
Não era preciso ser adivinho para perceber o que aí vinha. Só quem não quis saber ou andava muito distraído, agora se admira com a estratégia das agências de rating. Se quiserem ter a paciência de ler, venho lembrar-vos dois textos que aqui publiquei, em 25 e 30 de Abril de 2010, sim senhores, há mais de um ano, onde poderão encontrar mais matéria afim. Escrevam a palavra -bancarrota- no rectângulo do canto superior esquerdo e logo acederão.
Não era preciso ser adivinho para perceber o que aí vinha. Só quem não quis saber ou andava muito distraído, agora se admira com a estratégia das agências de rating. Se quiserem ter a paciência de ler, venho lembrar-vos dois textos que aqui publiquei, em 25 e 30 de Abril de 2010, sim senhores, há mais de um ano, onde poderão encontrar mais matéria afim. Escrevam a palavra -bancarrota- no rectângulo do canto superior esquerdo e logo acederão.
domingo, 3 de julho de 2011
Nas escolas,
questões de limpeza
Pretendo referir-me à escola de um futuro que já é hoje, outra solução me não resta do que propor a urgente mudança do paradigma de cultura comportamental dos seus intervenientes em alguns dos contextos que, quotidianamente, se vivem em cada comunidade escolar. Para efeito da demonstração que me ocorre partilhar convosco, deixem que vos convide a pensarem, tão somente, na questão da manutenção da limpeza das instalações escolares, assunto que, parecendo pacífico, tanta controvérsia costuma gerar.
Actualmente, quando as funções afins da limpeza não são adjudicadas e atribuídas a uma empresa da especialidade, é aos assistentes operacionais que estão cometidas. Sem qualquer ponta de sofisma, cumpre perguntar porque razão assim é se, na maioria das situações, não é este pessoal de apoio educativo que, invariavelmente, mais contribui para o acumular da sujidade ao longo de cada jornada de trabalho…
Se, de facto, muito naturalmente, no âmbito das actividades desenvolvidas nos diferentes espaços de cada escola, são alunos e professores que mais sujam as instalações, como não encarar a possibilidade de os envolver na tarefa de recuperação da higiene? Pois, se assim acontece no sistema educativo de países que, geralmente, todos consideramos mais desenvolvidos, que motivo poderá levar a que não nos sintamos sequer inclinados a copiar o exemplo?
Não estou absolutamente certo de que algum atavismo, bem como a manutenção e reprodução de algumas práticas ancestrais, bastem para justificar a manutenção de um statu quo gerador de contundência bem conhecida de quem tem em mãos ou se debruça sobre este assunto. Todavia, não tenho a mínima dúvida de que uma radical mudança de atitude, ela própria entendida como altamente propícia à aquisição de hábitos e à adopção de práticas mais civilizadas, poderão inscrever-se na própria cultura escolar, devidamente plasmadas quer no Regulamento da escola quer no Estatuto do Aluno.
Filhos e enteados
Se, além do que actualmente só é solicitado ao pessoal não docente, também professores e alunos forem responsabilizados pela preservação da higiene na escola ao longo do dia – aliás, como, repito, sucede noutras países europeus – é o próprio processo educativo que sairá altamente beneficiado e inequivocamente dignificado.
Na abordagem deste assunto, entendamo-nos de uma vez por todas. De facto, na escola, a limpeza só não será uma tarefa laboral considerada degradante se for partilhada por todos os actores da comunidade escolar. Ainda que bem sabido, não nos esqueçamos que, entre nós, essa incumbência só afecta uma única categoria de trabalhadores da Educação, precisamente a daqueles cujo vencimento é tão diminuto que, em média, se cifra em valores rondando 20% do ordenado médio de um docente. Aliás, para mim, continua a ser mistério insondável como – sempre tão pressurosos na defesa dos seus interesses – conseguem os professores, no mesmo local de trabalho, e tão pacificamente ,conviver com uma discrepância tão injusta e escandalosa…
Sendo inadmissível que, numa escola, o leque salarial distancie docentes e não docentes de maneira tão flagrante, o fenómeno começa a ser mais entendível se, para o efeito da sua interpretação, intervier este decisivo factor de desconsideração e desqualificação social conotado com baixas exigências salariais. Por outro lado, até um passado relativamente recente, neste contexto do pessoal não docente, nomeadamente os antigos contínuos, hoje em dia abrangidos pela designação de assistentes operacionais, os baixos níveis de escolaridade eram uma constante.
Porém, a situação actual é tão radicalmente diferente e, nalguns casos tão oposta, que é frequente encontrar muitos destes funcionários já com o 12º ano, ou universitários e, inclusive, significativa quantidade de licenciados. Como a evolução das mentalidades é lentíssima e, igualmente determinante, a inércia quanto à aceitação das consequências da mudança, esta gente continua sendo encarada, perversamente, como criados de baixo estrato, fundamentalmente, como reflexo da assunção de tarefas consideradas desqualificadas – já que se alia a noção de função desqualificada a salário baixo – mantendo um estatuto ainda tão coincidente com o do designado pessoal menor vigente em tempos de desagradável memória. Mudaram os tempos mas as cabeças...
Tão simples
Quadro tão negativo pode ser modificado, tão rapidamente quanto pretendamos agir, com vantagens inequívocas para o Sistema Educativo em geral e para as comunidades escolares e educativas em particular. Afunilemos ainda mais a questão da limpeza na escola e, tão somente, detenhamo-nos no caso das salas de aula. Basta que que cada uma seja dotada de um adequado kit de limpeza – por exemplo, constituído por balde, serradura, vassouras de cabo comprido e de mão, panos, etc – à disposição de professores e alunos que, ao longo do dia, forem ocupando aquele espaço em actividades lectivas, cumprindo a norma regulamentar de deixarem aquele espaço nas condições de limpeza em que se encontrava à primeira hora da sua utilização.
Antes de abandonarem a sala onde estiveram a trabalhar, docentes e discentes passarão a verificar se alguma coisa não está conforme com o regulamento, actuando no respeito pelo que estiver determinado neste domínio e que não pode ser substancialmente diferente do que, tão sumariamente, se enuncia nestas linhas. Naturalmente, durante o dia, nas escolas de maior dimensão, a empresa encarregada do serviço de limpeza, manterá alguém adstrito à higiene das instalações sanitárias, corredores e átrios.
Não desconheço e, pelo contrário, muito me congratulo pela existência de casos em que esta já é uma prática vigente. Mas também não desconheço que se trata de casos excepcionais. Impõe-se a generalização. Só ela permitirá libertar para tarefas de inequívoca assistência educativa, todo um contingente de pessoal, que vai diminuir, embora cada vez mais qualificado, com apreciáveis níveis de escolarização, que passa por acções de formação afins das competências inerentes à sua relação preferencial com as crianças e jovens.
Mudança muito educativa
Importa ter sempre em consideração que os pais e encarregados de educação entregam à Escola os seus filhos e educandos, na presunção de que os trabalhadores da Educação, portanto, docentes e não docentes, ali exercendo a sua actividade, dedicam aos alunos o melhor do seu saber residual e capacidades humanas para rendibilização máxima do capital mais sofisticado do qual depende o futuro do país. Será com bons olhos que estes contribuintes verificarão que aqueles funcionários passarão a dedicar toda a sua atenção, exclusivamente, às necessidades dos estudantes.
Esta proposta, que não envolve quaisquer custos suplementares, suscita, isso sim, a significativa melhoria de atitudes interactivas dos corpos docente, discente e não docente, que não podem deixar de se repercutir no rendimento do trabalho de todos. Só assim, definitivamente, se ultrapassará um quadro actual de referências nada abonatórias de uma escola que, cada vez mais, tem de se adequar aos exigentes desafios socioculturais que, a todo o momento, evoluem. E, muito naturalmente, num futuro tão próximo quanto desejável e possível, os vencimentos dos assistentes operacionais poderão corresponder aos níveis de dignificação que as suas tarefas pressupõem.
Futuramente, a exemplo do que já acontece no espaço alargado da União Europeia em que nos integramos, o contingente de trabalhadores da Educação adstritos à assistência educativa vai baixar de modo notório e irreversível nas escolas dos ensinos básico e secundário. Os poucos que ficarem articularão as suas funções e actividades com os colegas docentes. Previsível e naturalmente, o rácio assistente operacional/quantidade de alunos vai alterar-se dramaticamente sem que a evidência da redução signifique baixa de nível do serviço prestado mas, isso sim, a necessidade de diferentes perspectivas no enquadramento da gestão desse pessoal, cada vez mais escasso, cada vez mais qualificado.
Finalmente, como não poderão deixar de comigo concluir, é em tempo de austeridade que tudo isto se impõe com a maior pertinência. Portanto, agora!
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