[sempre de acordo com a antiga ortografia]

segunda-feira, 21 de maio de 2012

 
 
D. Fernando II,
a Pena e a infelicidade de Portugal
 

(texto inicialmente publicado no facebook em 9 do corrente)


Anteontem, num início de espessa tarde de chuva certa e miúda, depois de passar a entrada principal do Parque, lá segui ao encontro do meu amigo Arq. António Nunes Pereira, Director do Pa...
lácio da Pena. Vencendo a íngreme vereda em direcção ao Picadeiro, apesar de tão singular beleza à minha volta, não conseguia libertar-me de recentes preocupações que a situação do país coloca.

Naturalmente, lembrei-me do senhor D. Fernando. Conheço de cor as palavras de uma carta para Ernesto de Coburg na qual, mais uma vez, repetia a sua visão da pátria adoptiva como país infeliz com todas as possibilidades para a felicidade: "(…) É pena que Portugal, criado verdadeiramente pelo céu para ser unicamente feliz, não chegue a compreender quão salutar lhe seria, nestes tempos, um pouco de sentido prático. Portugal com bom senso poderia ser tão feliz (…)".

Passados uns cinco minutos, chegado ao pátio de entrada, o Arq. Nunes Pereira esperava-me à porta. Subimos até ao seu gabinete e, de um momento para o outro, mal nos sentávamos, eis que Richard Wagner, Parsifal, Kundry, o Votan Viajante, D. Fernando e a Condessa d’Edla, Gwineth Jones, Birgit Nilsson, Waltraud Meier, Götz Friedrich, Peter Stein, José Augusto França, Abbado, Rattle, Karajan, Petrenko se nos juntavam para uma boa hora de turbilhão de conversa em que trabalho e a melomania diletante e muito, muito wagneriana de ambos se mesclaram em dose qb.

À saída, ainda com o mesmo ambiente daquelas chuvosas tardes de serra primaveril, D. Fernando voltava a insinuar-se. Doutra carta “(…) Sintra é de facto um sítio magnífico, que não se deixa comparar facilmente com outras regiões. A minha querida Pena é, conforme o meu critério, a coroa da região sintrense. Ainda ontem passámos lá uma das tardes mais maravilhosas que se podem imaginar e regressámos a casa ao luar. Não existe algo de mais belo do que uma das tardes locais, porque a luz é quase sempre serenamente bela e todas as coisas se mostram numa nitidez muito especial (…)”

De regresso, por ali abaixo, o país continuava no desassossego do costume. Enfim, tal como há centenas de anos… Pois, se bem se lembram, a famosa ‘piolheira’, a ‘choldra ingovernável’ e quejandas avaliações de tão ilustres e reais pessoas… Porém, completamente tomado pela melopeia da passarada que, tal como eu, adora a boa chuvinha certa, densa e miúda, nem dei pelos quilómetros até casa onde, mal chegado, logo me pus à procura das cartas de D. Fernando para vos poder citar o excerto do parágrafo anterior.

Seguidamente, com um bom copo de Colares por companhia, recolhi-me ao II Acto de “Parsifal”. Socorro-me da gravação ao vivo do Festival de Bayreuth de 1985 que presenciei. Ouço a Kundry de Waltraud Meier, o Parsifal de Peter Hofmann, a orquestra do festival dirigida por James Levine e, subitamente, garanto-vos, estava na Pena outra vez. E, tal como Richard Strauss, quando ali esteve, aquele era mesmo o jardim de Klingsor e lá em cima, o castelo do dito cujo…

Em minha casa, em Sintra, outra vez o subido privilégio da Pena. É o que me vale…

E, como não podia deixar de ser, aí têm um pequeno excerto do II Acto de "Parsifal". A Kundry é a mesma Waltraud Meier.

Boa audição!

http://youtu.be/dlGSGSTf43c

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