[sempre de acordo com a antiga ortografia]

segunda-feira, 21 de maio de 2012

 
 
 
[Transcrição do texto publicado na última edição do Jornal de Sintra, 18.05.12, ainda a propósito da morte de Bernardo Sassetti. Aproveito a oportunidade para propor a audição de HOMENAGEM A MARK LINKOUS, com Bernardo Sassetti - piano, Carlos Barretto -contrabaixo, Alexandre Frazão - bateria, gravado ao vivo na 8ª Festa do Jazz do São Luiz]


Bernardo Sassetti
(1970-2012)


Provenientes de todo o lado, sentidas por todos quantos o conheceram e puderam aceder à sua obra, as reacções à morte bem evidenciam como, além de artista de elevada craveira, Bernardo Sassetti era uma pessoa absolutamente excepcional. De facto, sejam quais forem os ângulos de análise, sempre releva a mais positiva avaliação do homem eminentemente bom e do cidadão impecável.

Desde já aviso que, destas linhas, não esperem colher informação biográfica na medida em que, felizmente, toda a comunicação social tem sido fértil na partilha de elementos afins. De qualquer modo, ao subscrever esta pequena nota, o que me interessa é aproveitar a dolorosa circunstância para reflectir convosco acerca do exemplo de vida que Bernardo Sassetti protagonizou.

Se há coisa grande que dele vai perdurar, pois não tenho dúvida de que seja o exemplo de uma atitude de artista sem barreiras. Contudo, só aparentemente, foi o criador polivalente de que todos falam, cujos artefactos enriqueceram a música, o cinema, a fotografia, lançando pontes à poesia, ao teatro, ao bailado. A isto, que já seria imenso, cumpre acrescentar o desassossegado que se tornou, um lúcido precoce, de uma lucidez bebida nas melhores fontes de informação, também fruto de insaciável cultura universalista.

Tal como aconteceu com os Freitas Branco, Paes e Sassetti, seus parentes mais notáveis, também ao Bernardo coube viver a aventura de uma vida que se fundiu na Arte e com ela se confundiu. No concreto e público viver destas duas últimas décadas, de permanente notoriedade, os seus dias demonstram à saciedade, como nele operou a perfeita e acabada síntese da herança familiar, certeza esta que partilho com directo e geracional conhecimento de causa.

Importa ter bem presente que, como não podia deixar de acontecer, a excepcionalidade do caso Bernardo Sassetti, radicou no bom terreno da família que o viu nascer. Nada disto tem a ver com abundância de bens materiais mas, isso sim, com o propício ambiente que uma família da elite intelectual pode proporcionar aos filhos que estejam vocacionados para trilhar tal caminho. E o Bernardo estava receptivo a tudo o que lhe foi possível colher daquele privilegiado enquadramento familiar e social.

Portanto, além da obra prolixa e compósita, de Bernardo Sassetti , também fica o exemplo da educação que recebeu, exemplo que deveria ser sistematicamente divulgado. É desta fibra, à custa de muito trabalho, disciplina, sacrifício, de imensos riscos, de uma exposição quase desumana perante o outro, que se constrói o artista de excepção, sempre atento aos sinais que só o demiurgo consegue sintonizar e transformar em artefacto. E assim é, até ao fim, como bem demonstrou Sassetti, nesta última surtida, de câmara fotográfica na mão, na incessante procura de um especial instante.

Na certeza da efemeridade, de Bernardo Sassetti , aquele recado vital de permanente busca da contenção. E a luta tenaz por um radical, essencial e existencial silêncio. Que magnífico legado!

http://youtu.be/NiGre38TaTc
 
 
 

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