Sintra
SOB A ÉGIDE DA SENHORA MARQUESA DE CADAVAL
[Transcrição do texto publicado na edição do dia 13 de Junho do 'Jornal de Sintra' em cujo site está disponível, com uma foto da Senhora Marquesa.]
Sob
a égide da Senhora Marquesa de Cadaval
Ainda o Festival de Sintra cuja programação
detalhada tive oportunidade de partilhar convosco na última edição deste
jornal. De algum modo, se hoje volto ao assunto, faço-o com um diferente
objectivo ao qual, como verificarão, dificilmente me poderia subtrair.
O regresso tem a ver com as justíssimas referências ouvidas
no MU.SA à Senhora Marquesa de Cadaval, inicial e principal mentora desta prestigiada
iniciativa cultural, que também patrocinou ao longo de várias décadas, para
benefício de sucessivas gerações de melómanos.
De tal forma a sua figura se tornou indissociável do
Festival que bem pode falar-se de uma omnipresença que, tão significativamente,
se mantém mesmo depois de nos ter deixado em 1996 e, em especial, em vésperas de celebrar o meio século de
edições já no próximo ano. Ora bem, a partir deste momento, vão permitir que
introduza uma vertente pessoal.
Senhora
Marquesa de Cadaval, meu mito
Além de balizarem um tempo de contemporaneidade da
vida musical portuguesa, estas também são datas que fazem parte da minha cronologia pessoal. Comecei a frequentar
as primeiras edições do Festival de Sintra, ainda criança, de calções. E cá
estava a Senhora Marquesa de Cadaval. Pela mesma altura, sempre pela mão de meu
pai, também em Lisboa, via a Senhora Dona Olga nos recitais e concertos, fossem
os do Ciclo de Cultura Musical ou do Festival Gulbenkian e outros, quando, nos
anos cinquenta, fui iniciado no gozo da boa música, ao vivo, nos auditórios.
Nessa época, para mim, a Senhora Marquesa já era um
mito. E tão impressivo como alguns dos grandes músicos russos que ela própria
se empenhou em trazer a Portugal num período em que isso não era nada fácil. Estou a vê-la, por exemplo, no Coliseu,
quando cá veio o David Oistrakh, há 54 anos, interpretar o Concerto para
Violino em Ré Maior de Beethven, com a Orquestra da Emissora, sob a direcção do
Maestro Pedro Freitas Branco, seu grande amigo…
Totalmente fascinado pela sua personalidade, a coisa mais natural deste mundo acabaria
por suceder muitos anos mais tarde quando, com Mário João Machado na produção,
João Santa Clara na realização, me envolvi na concretização do projecto Marquesa de Cadaval, uma vida de cultura,
o filme biográfico de que somos autores João Pereira Bastos e eu próprio.*
Para o efeito, entrevistámos amigos, como Maria de
Jesus Barroso Soares, Jorge Sampaio, João Paes, Nella Maissa, Maria Germana
Tânger, Luís Pereira Leal ou Luís Santos Ferro – este último como uma
colaboração de grande destaque – bem como grandes artistas que beneficiaram do
seu desinteressado mecenato, como Daniel Barenboim, Stefan Kovacevitch, Nelson
Freire ou Olga Prats.
Não tem descrição o que, a nível pessoal, aprendi e
partilhei. De seu admirador desde criança, posso dizer, sem qualquer ponta de
presunção, que passei à condição de membro do círculo dos seus mais afectos, portanto, daqueles que, por
todos os meios ao alcance, não perdem oportunidade para lhe honrar a memória e
divulgar a sua tão importante como discreta obra.
Por tudo isto, não admira que, na passada
sexta-feira, durante a referida sessão de apresentação, além do júbilo, também muito
me tivesse emocionado com as informais e tocantes alusões à Senhora Marquesa de
Cadaval e à Quinta da Piedade, por parte quer do Prof. Adriano Jordão, actual
Director Artístico do Festival quer do Presidente da Câmara Dr. Basílio Horta,
quando se dirigiam a Teresa, Condessa de Schönborn-Wiesentheid, neta da ilustre
patrona do contíguo Centro Cultural.
Pública
promessa
Mantendo-me, tal como indica o título, sob a égide
da Senhora Marquesa, confesso que estava à espera das palavras que ouvi de
louvor ao trabalho de um seu grande e bom amigo pessoal, o Dr. Luís Pereira
Leal que, durante cerca de trinta anos, foi competentíssimo Director Artístico
do Festival de Sintra. A ele devemos, tanto em tempo de maior desafogo
financeiro como no das recentes dificuldades, a vinda a Sintra dos mais consagrados
intérpretes e de jovens valores do universo da música. Estou certo de que, a
breve trecho, a CMS não perderá a oportunidade de concretizar a homenagem que é
devida.
Finalmente, uma promessa que tem foros de
compromisso público do maior realce. Com a satisfação que se lhe adivinha por
poder concretizar tão auspicioso anúncio, o senhor Presidente da Câmara,
informou e, perante a insistência de Adriano Jordão, confirmou que, em 2015,
por ocasião da sua quinquagésima edição, o Festival de Sintra vai ter meios
especiais para poder apresentar uma programação digna de Salzburg!... Nem mais
nem menos!
Enfim, com os «descontos» que se me impõem perante a
tão generosa hipérbole do Dr. Basílio Horta, eu que, há tantos anos, tão bem
conheço a esplêndida oferta de Salzburg, adivinho, nas suas palavras, isso sim,
um empenho digno da jubilar efeméride e da memória de quem foi a grande
impulsionadora do mais sofisticado produto cultural de Sintra.
*O documento
biográfico, com cerca de uma hora de duração, foi apresentado pela primeira vez
no Centro Cultural Olga Cadaval, em 17 de Janeiro de 2014, por ocasião do
aniversário natalício da Senhora Marquesa de Cadaval, já depois de ter sido
adquirido pela RTP que assegurou os direitos exclusivos de teledifusão nacional
e internacional pelo período de cinco anos. Logo que possível estará disponível
no mercado uma versão em DVD.
[João Cachado escreve de acordo com a antiga
ortografia]
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