Património de Sintra,
divulgar a identidade[Transcrição do artigo publicado na edição do dia 19 de Dezembro de 2014 no 'Jornal de Sintra'. Trata-se de uma questão à qual, mais especialmente, há dez anos a esta parte, tenho dispensado alguma atenção.
Recentemente, revelando uma sensibilidade que já me parecia pouco provável, a Câmara Municipal de Sintra está a interessar-se pelo assunto, tendo-me solicitado a colaboração que estou a prestar na justa medida das minhas limitadas possibilidades.
A vossa compreensão para o facto de não poder dispor dos recursos gráficos do original publicado no JS que, aliás, para todos os efeitos, poderão consultar no 'site' respectivo]
Património de Sintra,
divulgar a identidade
É perfeitamente e comum e
geralmente aceite a estafada ideia de que Sintra é terra com uma vocação
turística indesmentível. Pois admitamos que assim seja: beleza paisagística,
património natural e edificado, gastronomia, cultura local e outros pertinentes
atributos, na realidade, tudo parece concorrer no sentido de não pôr em causa a
referida noção.
No entanto, se tivermos em
consideração, por exemplo, o modo displicente como nos permitimos mostrar e
apresentar Sintra a quem a visita, logo se instala a dúvida, não em relação à
tal vocação mas, isso sim, quanto a estar à altura dos desafios colocados por
esta pródiga e soberba terra.
Introdução tão geral autorizaria
um infindável número de abordagens, desde a incapacidade de obstar ao desleixo
e estado de abandono a que estão votados tantos edifícios em pleno centro
histórico, até à inércia letárgica que tem inviabilizado o ataque aos problemas
do estacionamento, a gestão dos fluxos de tráfego (indutores, alguns, do
encerramento de determinadas vias à circulação de viaturas automóveis que não
as prioritárias) a imposição de um regime civilizado de cargas e descargas,
etc, etc.
Vão permitir um parêntesis para lembrar que ninguém poderá afirmar que tais questões têm sido alheias às nossas preocupações. Pelo contrário, têmo-las partilhado com os leitores ao longo dos anos, jamais nos subtraindo a qualquer contributo, estritamente motivados pelo desejo de animar o debate que tais problemas sempre suscitam.
É nesta linha de actuação,
portanto, meramente de serviço cívico,
que hoje nos debruçamos sobre o parapeito da janela que Sintra abre aos
visitantes, deixando que espreitem o que de mais interessante tem para oferecer
à curiosidade de quem se desloca, por vezes, de tão longe, e, não raro,
permanecendo tão pouco tempo.
Não temos a veleidade de vir
propor algo de original já que nos baseamos em exemplos conhecidos, apenas
trazendo à colação práticas comuns a outros destinos que, tal como Sintra, são
geralmente aceites como turisticamente vocacionados. Indo directamente ao cerne
do problema, tudo isto para introduzir uma questão absolutamente vital à
actividade turística, qual seja, em tempo oportuno, muito sinteticamente, com a
maior eficácia, a necessidade de transmitir toda a informação que é suposto
fornecer acerca de determinado local.
Simples? Sabemos que não é coisa
simples de concretizar, pressupondo o envolvimento de uma equipa que, para além
do historiador, divulgador cultural, contará ainda com peritos de comunicação,
tradução, semiótica, etc. Provavelmente, se pensarmos em casos concretos,
facilitada ficará a tarefa que nos propusemos concretizar nestas linhas da
rubrica de um concelho adiado que,
quem nos dera, oxalá não se perpetue.
Um lugar, três casos…
Consideremos três casos contíguos
e paradigmáticos: a Quinta da Regaleira, a Quinta do Relógio e o esplêndido
monumento vivo que é aquele sobreiro, mesmo à beira da estrada, à direita de
quem, poucos metros adiante vai iniciar a subida da rampa. Nada, absolutamente
nenhuma informação ali existe que esclareça o passante quanto à singularidade
das três peças de património.
Falta, claro que falta, toda a
informação que, in loco, deve estar
disponível, em reduzidas dimensões, legível à curta distância de cerca de um
metro, contendo apenas meia dúzia de frases imprescindíveis à localização da
peça no tempo e no espaço, dando conta de qualquer episódio de interesse
relevante.
Quanto aos exemplos em
referência, cada edifício disporia de uma placa ou pequeno painel, informando
sobre a estética revivalista romântica da sua arquitectura, esclarecendo acerca
dos proprietários iniciais promotores da construção, dos artistas envolvidos,
das curiosidades mais notáveis, tais como toda a simbologia maçónica da
Regaleira, ou o facto histórico de D. Carlos e D. Amélia terem passado a lua de
mel na Quinta do Relógio. A propósito da árvore, além das referências botânicas
identificativas da espécie, importaria mencionar os escritores que ali se
detiveram e a especial relação que a referida rainha com ela estabeleceu.
Circuitos
Em pleno coração do centro
histórico, justificar-se-ia a existência de informação acerca da zona da
Judiaria junto ao arco de acesso, à esquerda de quem sobe a rua a caminho da Piriquita.
E, em sentido contrário, outra placa ou painel referenciando a Rua do Açougue,
remota reminiscência do as-soq árabe,
mesmo sob a esplanada do Café Paris. Estas, apenas duas das etapas de passagem
de um circuito medieval de Sintra a promover com outros motivos do maior
interesse.
Como não lembrar, igualmente,
entre tantas que poderíamos citar, noutra zona da sede do concelho, as obras de
Norte Júnior, Adães Bermudes, Raul Lino, ainda sem qualquer identificação? Naturalmente,
a informação a disponibilizar, ainda que significativamente reduzida,
obedeceria sempre a um mesmo modelo padrão de painel-placa, talvez com a
aposição de um pequeno símbolo cromático, identificador de certo circuito - medieval,
romântico, queiroziano ou outros - em coerente articulação com a que aparece
nos folhetos turísticos, tanto em termos do estilo informativo como no aspecto
gráfico.
Será difícil pôr em marcha
semelhante plano de identificação e divulgação de todos os lugares de interesse
de Sintra? Será difícil de entender que este tipo de informação é, pelo menos,
tão essencial como o dos folhetos e mapas distribuídos pelo Turismo? Muito
trabalho? Mas tão aliciante, tão útil, urgente e necessário!
Recentes evoluções
Com ligeiras alterações, os parágrafos que acabam de ler
fazem parte de um artigo que subscrevi, subordinado ao título “Um turismo às
claras”, publicado pelo Jornal de Sintra em 15 de Abril de 2005. Escusado seria
acrescentar que o conteúdo não suscitou qualquer reacção por parte da
autarquia. No entanto, tal circunstância não me desmotivaria quanto à
pertinência das propostas em apreço, já que é inequívoco o seu evidente
propósito de divulgação do património, uma preocupação que me anima desde que,
na década de setenta, comecei a militar nestas causas.
Por isso, nas redes sociais, continuei a abordar o assunto
com bastante frequência, ou seja, sempre que se me afigurou pertinente e a
propósito. E, neste mesmo jornal, nunca desistindo da ideia, uns anos mais
tarde, mais precisamente, em 7 de Setembro de 2012 e 8 de Novembro de 2013,
respectivamente, através dos textos “Sintra, legendas no património” e
“Património de Sintra, da necessidade de bilhete de identidade”, fui insistindo
na esperança de que um destinatário mais
receptivo acabasse por se render à evidência…
Neste contexto da persistência, apenas me resta confirmar
que água mole… Há uns meses, Rui Pereira, Vice-Presidente da Câmara Municipal
de Sintra, punha-me ao corrente da sua decisão de acolher as sugestões
constantes dos artigos aludidos. Com natural regozijo e, na justa medida
das minhas possibilidades, não poderia ter ficado mais receptivo ao desafio que
me lançou de colaborar com os serviços culturais da CMS com vista à efectiva
realização do projecto.
Pois bem, foi com esse objectivo que, há poucos dias, no
Roseiral, troquei impressões com os técnicos a quem foi cometida a tarefa da
concretização. Como poderão calcular, haverá que equacionar uma extensa série
de itens, que se perspectivam em enquadramentos muito variados, desde a
concepção dos textos, em Português e Inglês, às dimensões das placas, ao design
a observar, aos padrões estéticos, aos caracteres a utilizar, cromatismo,
suportes, materiais, etc.
Na ocasião fiquei a saber que, na mesma placa, também
passaremos a contar com uma outra vertente absolutamente aliciante e, de facto,
já disponível em relação ao património afecto à Parques de Sintra Monte da Lua.
Portanto, em perfeita sintonia com a actual disponibilidade e de acordo com a
procura das franjas de público mais despertas e sensíveis à tecnologia mais
avançada no campo da partilha da informação, os serviços culturais vão
privilegiar a introdução dos designados QRCodes na concepção global do projecto
em questão.
Em Inglês, a sigla QR significa ‘Quick Response’. Na realidade, bem
podemos afirmar que se trata, isso sim, de uma ‘resposta instantânea’. Ao
aproximar o smartphone da placa, o utilizador poderá receber todas as
informações que estiverem armazenadas edisponíveis no momento, acerca do bem
patrimonial em questão. Ao passo que a informação escrita, a disponibilizar
através da placa, será muito sucinta mas definitiva, já no que respeita ao QR, ela
pode ser modificada conforme as conveniências.
Como podem verificar, belíssimas notícias que, a
concretizarem-se num prazo razoável, passarão a beneficiar todos os públicos
interessados, desde o tradicional àquele que não dispensa os suportes tecnológicos mais
avançados. Actualmente, a PSML já utiliza um modelo. A ex-Junta de Freguesia de
São Pedro Penaferrim utilizou outro, muito operacional, para identificação do
designado ‘Roteiro Medieval’. É tempo de analisar e de fazer opções.
Não tenho a mais pequena dúvida de que há todas as condições
para fazer um trabalho decente.
1 comentário:
Excelentes notícias!
Até parece mentira que algo de tão significativo, interessante, útil, e até moderno e com tecnologia digital, já esteja em marcha.
Não fora o senhor dizer e eu não ia acreditar.
Parabéns, obrigado.
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