[sempre de acordo com a antiga ortografia]

domingo, 31 de janeiro de 2016




Um escrito de sempre e para sempre

[publicado no facebook em 29.01.2016]

Porque todos os anos, além da demanda da melhor música, aqui também venho «em peregrinação» espiritual, aos mesmos sítios onde, há tanto tempo, entre outros, igualmente me prendem os laços da Fé, natural será que haja muita coincidência nas situações que se repetem.

Em 2016, devido ao descanso que devo dar à vista, defendo-me da escrita de peças longas como a que passo a transcrever, aqui produzida há três anos. Não altero uma vírgula. Tem tudo a ver com as minhas estadas em Salzburg e com a coincidência de ideias com o meu Irmão Mozart quanto ao nosso mental enquadramento perante a Fé e a tríada da Augusta Ordem que nos pede obediência aos sagrados princípios da Liberdade, Igualdade e Fraternidade.

E, naturalmente, uma absoluta coincidência acerca da maneira de encarar a Morte. Tudo se passa na cripta da Catedral de Salzburg onde tenho ido nestes últimos dias. Que lugar!
 
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Mozartwoche, 2013
cripta da Catedral de de Salzburg


“(…) Mors stupebit et natura,
cum resurget creatura,...

judicanti responsura.


Recordare, Jesu pie,
quod sum causa tuæ viæ:
ne me perdas illa die. (…)”


Catedral de Salzburg. Quantas e quantas vezes, ao longo de tantos anos, tenho descido a esta cripta para, durante uns momentos, me recolher na capela circular, muito pequena, em cuja parede, junto ao tecto, e a toda a volta, estão gravadas aquelas que são algumas das mais impressivas palavras do ‘Dies irae’ que bem deviam estar presentes no espírito de todos os crentes cristãos!...

De facto, está no subsolo do grande templo que a aparente (ou manifesta?...) megalomania do Príncipe Arcebispo Wolf Dietrich pretendia fosse maior do que São Pedro de Roma. Na realidade, a capela da cripta ocupa um espaço físico. Porém, nos momentos em que ali estou, deixa de ser um lugar na cidade e da cidade, antes fica um espaço sem amarras, que já não tem coordenadas concretas.

Mors stupebit et natura,
cum resurget creatura,
judicanti responsura.


Recordare, Jesu pie,
quod sum causa tuæ viæ:
ne me perdas illa die.


Para ler estas palavras, a toda a volta desta capela, sou obrigado a rodar, a assumir o eixo do movimento helicoidal que daqui me liberta de quaisquer amarras para ascender ao Infinito. Deixo, para já, a sempre difícil tarefa do registo escrito dos momentos em que a Fé manda mais que tudo, voltando ao ‘Dies Irae’.

Na maior parte dos casos – e, nesses especiais momentos, articulando com alguns dos temas musicais mais célebres e belos -aquela mensagem só evidencia todo o esplendor escatológico, quando ouvida e entendida como suporte textual do Requiem de Mozart ou de Verdi, para não referir outros não tão célebres mas, igualmente belíssimos, como os de Fauré, Britten ou Penderecki.

Ontem mesmo aqui se celebrou o nascimento de Mozart. Eu lembrei a morte de Verdi. Nascimento e morte, tanto dos génios, como foram aqueles compositores, como de nós, cristãos, homens comuns que somos, constituem apenas os primeiro e segundo termos ou momentos de uma tríade que continua noutra plataforma de vida. Aliás, é neste preciso sentido que só podemos concordar com Amadé, católico e maçon, quando, extremamente inspirado, em carta dirigida ao pai, Leopold Mozart, qualificou “(…) a Morte como a nossa melhor amiga (…)”.

Muita gente se espanta com o clima de exuberante esperança da Missa de Requiem de Mozart. Para já, importa não esquecer tratar-se de uma Missa. É uma Missa, escrita por um genial compositor católico que, no fim de vida breve, acolhe a Morte, precisamente, como a melhor amiga que lhe abria a porta da Eternidade. Tal como ele, católico e maçon, tenho o privilégio de crer profundamente nesta verdade, privilégio que se conjuga com a frequência da Arte, Arte que tão próxima está do divino.

Naturalmente, universal como é, o objecto de Arte, não carece do atributo da Fé para que qualquer mortal aceda à sua essência. No entanto, julgo que, no caso da Música Sacra, composta por sinceros, veementes e grandes crentes, como foram Mozart, Bach, ou Poulenc, uma sintonia outra acontecerá quando os destinatários das obras, os ouvintes, também estiverem animados pela mesma Fé que presidiu à concepção da peça.

É evidente que só poderia terminar de uma maneira, ou seja, propor-vos a audição do momento do ‘Dies irae’ do Requiem de Mozart composto a partir das duas primeiras estrofes do texto latino, a seguir apresentadas, enquanto que as transcritas na capela da cripta da catedral de Salzburg se referem às quarta e nona.
1
Dies iræ! dies illa
Solvet sæclum in favilla
Teste David cum Sibylla!

2
Quantus tremor est futurus,
quando judex est venturus,
cuncta stricte discussurus!


Trata-se de uma gravação ao vivo, na catedral de Sto. Estêvão, em Viena, no dia 15 de Setembro de 1991, por ocasião do 200º aniversário da morte de Mozart, Orquestra Filarmónica de Viena dirigida pelo saudoso Sir Georg Solti, Coro da Ópera Estatal de Viena e solistas Arleen Auger, cecilia Bartoli, Vinson Cole e René Pape. [seguem duas gravações, a primeira só do ‘Dies irae’ e a segunda da obra completa.]

Boa audição!


http://youtu.be/qZTd9jXQLMU
http://youtu.be/x2XcmaiaqAY
 
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06:13 Requiem 16:18 Dies irae 18:24 Tuba mirum 21:31 Rex tremendae 23:36 Recordare 28:41 Confutatis 31:02 Lacrymosa 45:00 Domine Jesu 48:52 Hostias…
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