O (in)evitável fim da tabela…
Quando, nestas páginas de Notas Diárias, me refiro aos preocupantes níveis de analfabetismo pleno, analfabetismo funcional e à iliteracia no nosso país, faço-o com a permanente intenção de que sejam conjugados e articulados com os evidentes manifestos das incorrectas e condenáveis práticas quotidianas dos cidadãos que, naturalmente, são consequência do estado de coisas reflectido pelas mais insuspeitas estatísticas.
Alguém duvidará de que há uma subtil relação entre aqueles índices e o facto de acontecer entre nós o maior fosso europeu na distribuição da riqueza, a maior diferença entre os salários dos administradores e o mínimo nacional, uma preocupante fraude fiscal, economia paralela descontrolada, fabulosos lucros da banca, corrupção galopante atentados contra o ambiente, caos urbanístico e, infelizmente, mais, muito mais?
Em Portugal que, invariavelmente, não consegue descolar do fim da tabela, devia pontificar o maior pudor em falar de excelência ou de ilhas de excelência, na medida em que tais noções apenas funcionam relativamente às nações que, há mais ou menos tempo, resolveram as questões que permanecem no nosso quadro da vergonha.
Não é preciso ir mais longe do que a Espanha para mencionar um país – que, não esqueçamos, já é a oitava potência económica mundial! – para lembrar que aí já se atingiu o patamar de uma normalidade económico-financeira e social que, sendo motivo para natural orgulho, até justifica uma alta auto-estima. Por estas e por outras é que, em Espanha, se pode falar em excelência, em ilhas de excelência e que, em Portugal, apenas se pode falar de excepções que confirmam a regra.
Mas as crianças, senhor…
Mais uma vez, confirmando a regra, aí está o relatório que a União Europeia hoje vai divulgar, afirmando que Portugal se encontra entre os piores oito países em que se registam níveis mais elevados de pobreza nas crianças, uma em cada cinco, portanto, vinte por cento (correspondendo à média geral nacional, que inclui todos os cidadãos independentemente da idade).
No que respeita ao factor escolaridade dos pais, afirma-se ser o pior nível de desqualificação da União Europeia, em que quase 70% das crianças portuguesas vivem com pais que não terminaram o secundário. Reparem que a média Europeia é de 16%! Tão ou ainda mais preocupante o facto de o risco de pobreza ter aumentado de 23 para 24% entre 2004 e 2005.
Recolocaria, com outros parâmetros, mas afins, a pergunta do segundo parágrafo: alguém duvida que estas marcas de terceiro mundo se relacionam com os resultados da intempérie da semana passada? Se forem pela negativa, o melhor é acenderem uma velinha, a ver se lhes concede maior lucidez...
Claro que é possível dar a volta a isto. Não com os óculos cor de rosa dos senhores primeiro e demais ministros, que vão passar por estas notícias como cão por vinha vindimada. Pudera! Suas Excelências governam outra realidade, como se este fosse um país da média europeia, ou que, como a Espanha, já tivesse ultrapassado tal fasquia.
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