[sempre de acordo com a antiga ortografia]

terça-feira, 9 de setembro de 2008

Afinal,
o programa continua...

Não voltaria à questão focada no último texto não se tivesse dado o caso, precisamente hoje, ao atravessar novamente a Correnteza, de ter escutado o comentário de dois sujeitos a propósito da sujidade do local. Não me contive e meti conversa. De visita a Cascais e Sintra, dois amigos, homens de meia idade, oriundos da Régua, deram conta da sua impressão sobre a falta de cuidado que encontraram nesta terra onde ambos já não vinham há mais de vinte anos.

Dizia um deles que, em Portugal, infelizmente, está habituado a cenas destas um pouco por todo o lado. Mas não estava à espera de deparar com tanto desleixo em Sintra onde, por ser local classificado pela Unesco, seria de esperar mais atenção. Estes dois homens, que iam juntar-se ao resto da família para almoço em Cascais, estão ainda a trabalhar em Inglaterra, em Coventry. Habituaram-se ao asseio e, diziam, têm dificuldade em aceitar que, no seu país, num local tão bonito, se continue a abandalhar desta maneira. E lá nos despedimos com palavras de circunstância já que não era o momento para falar daquilo que, agora, passo a fazer convosco.

Posso confirmar, porque todos os dias palmilho quilómetros por estes caminhos, que há diligentes cantoneiros de limpeza a trabalhar. Vejo-os a varrer. É verdade. Mas, santo Deus, não basta. Urge lavar, utilizando os meios mais expeditos. Estou farto de chamar a atenção para a situação. Há muito tempo que o faço sem qualquer resultado. Se, na realidade, a Câmara delegou a competência da tarefa numa empresa municipal, não deixa de manter a responsabilidade pela manutenção da higiene pública.

Na zona em questão, pelo menos há uns quatro anos, a limpeza das ruas era assegurada, por subcontrato, a uma firma com sede em Lisboa. Em 2004, ao denunciar idêntica situação, nada me surpreendeu que tivesse esbarrado num muro de irresponsabilidade, protagonizado por entidades que, em cascata, descartavam as suas culpas no cartório. Ou seja, em primeiro lugar, a Câmara que remetia para a HPEM e, depois, a empresa municipal na tal adjudicatária.

Exemplar e elucidativo? Sem dúvida, tanto mais que, na sequência do triplo ricochete, a última entidade referida acusava-me de apenas pretender atingir a Câmara de Sintra, servindo-me da matéria em apreço como arma de arremesso… Passou-se comigo, a propósito de um artigo publicado no Jornal de Sintra em 26.11.04.

A verdade é que, actualmente, o quadro permanece. Há contentores a transbordar, lixo espalhado, por exemplo, em plena Heliodoro Salgado e, de vez em quando, junto à paroquial de São Martinho, é o que se sabe. São cenas indesmentíveis, perfeitamente inadmissíveis em qualquer lugar e, portanto, sem necessidade de invocar as particulares características de Sintra para justificar a intervenção a que temos direito.

De qualquer modo, sendo questão que, estou em crer, afectará a maioria dos sintrenses residentes nestes lugares, apenas uma lamentável mas compreensível resignação justificará que não sejam mais visíveis e audíveis os sintomas de descontentamento. Acontece que os fregueses e munícipes estão resignados, baixaram os braços perante tanto manifesto de incúria. Deixaram de acreditar em qualquer hipótese de mudança, entregando-se à desgraçada inevitabilidade do resultado de tanta incompetência e desinteresse.

E não me venham com o estafado argumento de que isto é descrença inconsequente, negativismo paralizante e não sei que mais. Basta que apareçam evidentes sinais de mudança para que deixemos de dizer e escrever coisas que tais. A menos que os habituais desleixados militantes estejam na expectativa de que, esgotados por tanta luta e denúncia, acabemos por fazer o jeitinho e passemos a usar os óculos cor de rosa com que os responsáveis (?!) mascaram a sua descarada insuficiência...

3 comentários:

Anónimo disse...

...os os aconselhados "óculos verdes" que nos levem a escrever coisas a que chamam positivas. Esta foi a última "recomendação" com que fui brindado, exactamente de onde menos esperava. Mas adiante. A grande questão que se poderá colocar neste enorme concelho é como saber gerir o seu território heterogéneo, sem que daí resultem perdas significativas para alguns e exagerar nos benefícios para outros. Com isto se pretende dizer que se numa larga fatia do território se vão buscar os impostos (directos e indirectos) há direitos a usufrutos sociais, não devendo servir para manter algumas vaidades pessoais em zonas de mais restrita disponibilidade financeira.

Quem se desloque por algumas freguesias, rurais ou urbanas, recolhe mais indicadores de falta de higiéne pública, ausência de espaços para a prática de desportos, maus transportes rodoviários ou alheamento pelas vertentes culturais do que motivos de satisfação pelo bem-estar.

Na própria Vila de Sintra o que conhecemos por Centro Histórico aproxima-se mais de uma alcunha do que de incontroversa realidade. Temos de ser claros na avaliação, porque aos políticos de serviço serão certamente gratas algumas pinceladas que ponham o quadro dourado, por parte de quem tenha tudo bem tratadinho ao pé da porta, mas não saliente o que tem de pouco apetecível a degradação de edifícios, o lixo fora de contentores, até camiões TIR a fazer inversão de marcha em pleno largo da República, junto ao Palácio Nacional.

Haverá por esse mundo fora um centro histórico com estas características? Tão mal tratado? Tão indiferentemente visto pelos responsáveis?

Esta situação levará, muito compreensivelmente, a que as populações distantes (e pagantes), pelas sucessivas acções de desligamento, venham a reclamar a separação do concelho segundo os seus interesses locais.

Nessa altura, não haverá estudos estratégicos que valham, nem palavreado que lance um véu sobre a indiferença e alheamento de que temos sido vítimas, um pouco por todo o lado.

Sintra do avesso disse...

Fernando Castelo, Caro amigo,


Claro que não posso estar mais de acordo consigo.

Como sabe, há pequenas atitudes, de gestão quotidiana, que poderiam alterar a feição absolutamente deprimente do quadro que se nos depara, cada dia que passa, ao percorrermos - a pé, sublinho, a pé - as ruas, os passeios, as calçadas, cantos e recantos tão descuidados desta sede do concelho.
Tais atitudes fazem parte de uma «gestão micro», indispensável à qualidade de vida dos cidadãos que habitam os lugares e daqueles que os visitam.

Todavia, para além desta dimensão de pequena escala, há um intervenção outra, de nível macro, que se inscreve no quadro da intervenção estratégica que compete não ao gestor "tout court" mas, isso sim, ao decisor político, de quem os cidadãos esperam as medidas que competem ao Estado. Se quiser, é neste patamar, que se encontram - ou dele estão ausentes - aqueles que se consideram estadistas.

É ao nível desta plataforma, de Estado, que seria de esperar a decisão de uma profícua gestão do território que, por exemplo, ao nível do concelho de Sintra, viesse ao encontro daquilo que tantos de nós já concluímos. Ou seja, de que se revela inequivocamente necessário cindir este mastodonte ingovernável, em duas ou três unidades coerentes, que permitam uma governança adequada, atempada, próxima dos munícipes. Para o bem de todos, inclusive e especialmente, para aqueles que julgam estar mais bem defendidos à espalda de um concelho actualmente inqualificável.

Como sabe, uma tal «mexida» bule com interesses enormes. Por isso, embora com a razão do nosso lado, há que, lucidamente, continuar a apostar na divulgação da ideia mas sem que esqueçamos a mediocridade, a falta de preparação da classe política que, provinciana, arrivista, ignorante, continuamos a consentir nos governe.

Um abraço do

João Cachado

Anónimo disse...

A propósito deste texto apetece-me acrescentar que moro numa das principais artérias da zona Património Mundial, sim porque a zona Património Mundial não é só o centro da vila, fazem parte também os Bairros da Estefânea, São Pedro, Portela e alguma parte de Lourel, embora estes 2 ultimos com diferentes caracteristicas, e nessa mesma rua o lixo é recolhido dia sim, dia não, na melhor das hipóteses. Nada já me espanta porque nasci em Sintra, trabalho em Sintra e vivo em Sintra. Também a minha actividade profissional permite-me conhecer com detalhe toda a Sintra. É óbvio também que a Sintra Património Mundial tem 2 tratamentos diferentes, no centro da vila ainda se tenta disfarçar alguma coisa para a imagem não ser tão má mas os outros bairros são completamente alheados do que é ser Património Mundial o que leva ao surgimento de questões como estas que a todos nos chocam. Lembro-me de uma situação que se passou no ano passado. Estava o Presidente da C.M.S. na esplanada do Hotel Central e surgiu um pedinte a abordar os clientes. O Presidente dirigiu-se ao pedinte e disse mais ao menos com estas palavras: "Isto aqui não é sitio para pedir, vai lá para cima para ao pé da Praça, fora daqui". Isto é o mais representativo da mentalidade dominante. Felizmente costumo fazer 1 ou 2 viagens por ano e digo: Nunca vi nada assim. Também pessoas estrangeiras que me visitam ou que vou conhecendo ficam estupefactas. Uma vez para de alguma forma resumir o que aqui se passa contei a um casal de espanhóis a história da visita do pessoal da UNESCO a Sintra em que foram levados ao Convento dos Capuchos num dia de chuva ao fim da tarde quando já anoitecia para não se aperceberem totalmente do que ali estava. Penso que esta história foi publicada pela Sra. Isabel Stilwell num nosso jornal. Eles riram e perceberam a mentalidade....