[sempre de acordo com a antiga ortografia]

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Reconstrução?


Há precisamente quinze dias, como estarão recordados, trouxe às páginas do Jornal de Sintra um artigo subordinado ao título Seteais, polémica no Vale dos Anjos. Referia-me à construção de uma habitação na quinta do outro lado da estrada do mítico terreiro verde – que permanece mas podia não estar encerrado – também a poucos metros de uma inqualificável casa de máquinas, edificada sobre os muros de um tanque.

Quem tenha vindo a acompanhar as minhas constantes chamadas de atenção acerca do que está a acontecer em Seteais, compreenderá a preocupação. Perante factos que, apesar da vontade geral, se vão consumando tristemente, espero que, quanto mais não seja, o episódio da Quinta do Vale dos Anjos conduza à reflexão de que, como tantos outros sítios em Sintra, Seteais não é um qualquer lugar.

A verdade, infelizmente, é que a sequência de desconchavos, que atentam contra o espírito do lugar, se sucedem a um ritmo galopante, ao arrepio dos compromissos contraídos perante a classificação de Sintra como Paisagem Cultural da Humanidade. É por isso que, ao abordar o caso da construção da habitação em apreço, o faço em articulação com os outros casos, portanto, como mais uma peça do puzzle cujo enquadramento é idêntico.

Começaria por evidenciar que, como uma coisa destas não pode fazer-se às escondidas, qualquer pessoa pode confirmar estas palavras. Basta predispor-se a subir o curto caminho lateral, indicado pelo letreiro Rampa da Pena que, até há pouco tempo, era um dos trilhos preferidos dos adeptos de BTT. Por causa das obras, de tal modo estreitou a tosca vereda que a circulação se tornou praticamente impossível.

À guisa de sumaríssimo resumo, lembraria que, desde o efectivo início das obras, foram removidas muito significativas quantidades de terras e transferidas para junto dos muros que bordejam a Rua Barbosa du Bocage, atingindo proporções inusitadas, num afã de escavadoras, camions, betoneiras bem à vista de qualquer passante.

De facto, não é fácil o entendimento de tão ostensiva movimentação de milhares de metros cúbicos de terreno. E tanto assim é que o próprio regulamento desta Área de Protecção Parcial 1, refere explicitamente ser ”(…) interdita qualquer alteração no relevo e a remoção da camada superficial do solo arável.” Mas, enfim, esclareça e explicite quem pode e deve fazê-lo.

Um estranho Aviso


De todo em todo, o que eu não esperava é que desaparecesse o Aviso que, relativamente perto da esquina, ali se mantivera até à passada quarta-feira, dia em que o jornal Público, em artigo de Luís Filipe Sebastião, trouxe o assunto à consideração de uma audiência, naturalmente, bem mais vasta que a do JS.

A verdade é que, relacionada ou não com os factos que inicialmente relatei, confirmados pelo Público – notícia enriquecida por uma caixa onde era recolhido o testemunho de um assessor do Engº Pais do Amaral alusivo a um aparente desfasamento de áreas – o Aviso foi removido para ser reposto no dia seguinte, devidamente (?!) rectificado. Sim senhor, leram bem, o Aviso foi alterado e, valha-nos isso, colocado em posição bem mais conveniente à consulta, mais perto do portão improvisado na Barbosa du Bocage.

(continua)


Publicado no Jornal de Sintra, 31.10.2008

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Mas os animais, Senhor...


Pelos motivos que imediatamente compreenderão através da leitura do texto que se segue, resolvi transcrever a carta de Laura Miranda que me chegou através de chamada de atenção da minha amiga Dra. Cristina Ferreira, grande militante dos direitos dos animais.

Diz-se que o estado de evolução de um país, afinal de qualquer comunidade, está espelhado no modo como trata os animais. Como se ainda fosse preciso demonstrar ou lembrar, Como se verifica, Sintra não está nada bem posicionada...


A propósito, gostaria de recomendar uma visita ao canil municipal do Seixal onde um dedicado grupo de voluntários ajuda a autarquia a resolver problemas da comunidade em benefício dos animais, nossos amigos. Não estou a sugerir-vos uma deslocação a Londres ou Copenhague. Neste caso, é só atravessar o rio para depararem com uma situação verdadeiramente exemplar...


Agora, a transcrição do documento:


"Exmo. Senhor Presidente da Câmara Municipal de Sintra

Venho por este meio apresentar a minha indignação relativamente ao canil municipal de Sintra.

Sempre que consegui arranjar donos definitivos conscienciosos e retirei animais do "vosso" canil municipal, deparei com situações chocantes: um canil minúsculo, húmido, frio, onde se vê a agonia dos animais no corredor para a morte.

Não sei se o Sr. Presidente já visitou as instalações mas, se o fez, de certeza terá constatado o sofrimento dos animais e quão deprimente o espaço é.

Os animais não têm as mínimas condições, estão em jaulas minúsculas onde quase não se conseguem mexer nem deitar, em cima dos próprios dejectos, jaulas húmidas e frias propícias a que os animais rapidamente fiquem doentes!

Seria tão fácil faze-los felizes!

Construindo um canil municipal, onde todo os animais fossem castrados/esterlizadas, com tratadores e veterinário permanente; (...)

Onde os munícipes gostassem de ir adoptar um animal e fosse um exemplo de cidadania;

Acredito que seria também um exemplo para as pessoas tratarem bem os animais e não os abandonarem!

Onde só fossem efectuadas adopções responsaveis e definitivas com o respectivo chip!

Aberto ao fim de semana!

O problema não passa só pelo canil mas, infelizmente, também muito pelas pessoas irresponsáveis que abandonam os animais e que não são, de alguma forma, "punidas" por tal acto.

Não seria motivo de orgulho para Sintra ter um canil municipal que seria exemplo para o resto do país e Europa?;

Sendo Sintra património mundial, não o deveria tentar ser em todos os aspectos? (...)

Com os melhores cumprimentos,

Laura Miranda"


2 comentários:

Unknown disse...

Espero que brevemente possamos dizer que Sintra tb é um exemplo.
Obg
Cristina

Sintra do avesso disse...

Minha cara Cristina,

Entre os meus amigos e conhecidos, tu és a pessoa que eu mais identifico como paradigma do militante dos direitos dos animais, em particular dos animais de companhia.

Imagino o que para ti será teres ficado a saber desta vergonha que é o canil municipal de Sintra.

Como sabes, vou muito à minha querida Áustria, onde conheço gente muito dedicada à causa do bem estar dos animais. Mas aquilo é outro mundo...

Aqui em Sintra, cuja situação do canil municipal, na verdade, não conheço directamente, estamos a anos luz do que se passa em Salzburg, Viena, Linz ou Graaz, cidades a todos os títulos absolutamente exemplares neste domínio.

Aliás, em Sintra - que muita gente em Portugal considera ser lugar de excepção - não é apenas no canil da Câmara que acontecem vergonhas como a descrita na carta que Laura Miranda dirigiu ao Senhor Presidente Fernando Seara.

Ao contrário do que muitas pessoas pensam, Sintra - a Vila de Sintra e as suas freguesias com identidade sintrense (não considero sintrenses os horrorosos subúrbios da capital que fazem parte do concelho de Sintra...) - têm uma qualidade de vida muito baixa que, naturalmente, também se reflecte no modo como os animais são tratados.

A qualidade de vida de uma comunidade analisa-se transversalmente, integradamente, sistemicamente, tendo em consideração as interdependências locais, afins dos vários sistemas em presença, do social ao educativo, do económico ao cultural e ao de saúde, por exemplo.

As designadas «ilhas de excelência» são entidades abstrusas, só convenientes aos discursos dos politiqueiros... Assim sendo, um tecido comunitário com qualidade de vida - como alguns portugueses julgam que Sintra tem - não pode apresentar nódoas negras, sejam elas de que natureza forem, como a do canil municipal que, para além de revelar uma geracional incompetência, anda à mistura com a mais desenfreada desumanidade, constituindo-se igualmente como preocupante caso de saúde pública que a ninguém parece incomodar.

Minha querida Cristina,

Acompanha e divulga a situação à medida das tuas possibilidades. Aparece por cá. Se quiseres visitar o canil e te deixarem entrar - olha que esta é uma terra onde nem um autarca, cidadão eleito, entra onde pretende (vd. texto ontem publicado neste blogue...) - traz máquina fotográfica, câmara video, gravador, tudo quanto possa ajudar-te a testemunhar a situação de tal instalação em pleno século vinte e um, numa terra cujo território está parcialmente classificado pela UNESCO como Paisagem Cultural da Humanidade.

Que paradoxo, não é? Envia esses testemunhos para as organizações internacionais que lidam com os direitos dos animais. Envergonha esta gente que chegou a um ponto de despudor perfeitamente inadmissível.

Lamento não poder ser mais útil. No que respeita este caso de Sintra, tens o meu blogue à disposição para o que for preciso. E conta também com alguns dos meus amigos que, como são amigos das pessoas, também são amigos dos animais...

Um grande beijo e a muita admiração do

João Cachado