[sempre de acordo com a antiga ortografia]

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Bons caminhos...


Ontem, perante a notícia do lançamento da auto-estrada para Bragança - onde e quando é que eu já ouvi e vi anunciar a mesma ou semelhante coisa? - mais uma vez, não consegui deixar de lembrar duas situações que com ela estão relacionadas.

Vamos por ordem cronológica. A primeira envolve o Dr. Emílio Rui Vilar que, sabiamente, soube afastar-se da vida partidária, em tempo oportuníssimo, não se deixando emporcalhar com uma classe política que está muito, muito abaixo do seu nível. Aliás, por alguma coisa, convenhamos, o Rui Vilar, já há uma série de anos é Presidente da Fundação Calouste Gulbenkian, enquanto seus amigos e conhecidos não passam de ministros de sucessivos e desacreditados governos deste pobre país.

Há muitos anos, quando ele próprio desempenhou cargos governativos, em especial, como Ministro dos Transportes e Comunicações do I Governo Cinstitucional (1976-78) Rui Vilar ousou afirmar que Portugal não precisava de auto-estradas mas, isso sim, de uma bem concebida rede de boas vias rápidas. Naturalmente, logo se fizeram ouvir as vozes daqueles que perspectivavam a oportunidade de excelentes negócios, através de obras de maior vulto e de maior envolvimento de capitais públicos que sempre dão umas boas comissões...

Em segundo lugar, recordo o famigerado IP4. Desde que foi inaugurado, já ceifou a vida a 250 pessoas, gerando incontáveis prejuízos materiais e morais. No fim de um ano de abertura ao tráfego, ouvi eu o então director da Junta Autónoma das Estradas afirmar que, efectivamente, em vez daquela, podia ter sido construída uma estrada mais segura, técnica e perfeitamente possível. Mas os custos de construção seriam muito mais elevados...

Ou seja, construiu-se uma estrada daquelas, perigosíssima, poupando nos custos, independentemente das consequências, mesmo que tivessem significado vidas perdidas, outras destroçadase o inevitável cortejo de efeitos colaterais. A isto chama-se crime. Na verdade, o crime tem muitos contornos, inclusive estes, de uma obra púbica que foi concretizada, sabendo de antemão que os conhecidos e nefastos efeitos não se fariam esperar.

Sabem quem era o Ministro das Obras Públicas de então? Nem mais nem menos do que o Engº Ferreira do Amaral que, mais tarde, até foi candidato à Presidência da República. Passou por uma campanha eleitoral sem que ninguém, adversários políticos, jornalistas, o tivesse confrontado com a responsabilidade implícita no despautério do IP4.

Ontem o primeiro ministro Pinto de Sousa gritava que construir a auto-estrada para Bragança era poupar vidas. Continua a não haver quem possa contestar que não é preciso construir auto-estradas para poupar vidas. Basta construir e manter - sublinho o aspecto da manutenção - boas estradas nacionais e vias rápidas. A receita não é original. Veja-se o bem conhecido caso da Irlanda.

Claro que nada disto constitui motivo de riso. Pelo contrário. Todavia, adivinho que, no seu gabinete da Av. de Berna, Rui Vilar não deixará de sorrir... Este homem, sabem, é daqueles que tem pinta de grande estadista. É um homem profundamente informado e culto, capaz de liderar uma equipa de administradores de uma grande Fundação, perspectivando o modo de enquadrar e vencer os desafios do futuro.

Pinto de Sousa, pelo contrário, embora primeiro-ministro, só é estadista porque ocupa funções de Estado. Fundamental e essencialmente, dele não guardará o país marca que se veja. Permaneerá, estou certo, não a marca, antes a imagem que mais se articula com a daquele bem típico caso de engenheiro assumindo a total responsabilidade pela concepção dos lindos projectos, na Beira profunda, que a comunicação social se encarregou de divulgar.




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