[sempre de acordo com a antiga ortografia]

segunda-feira, 11 de maio de 2009

Seteais no JS *

No passado dia primeiro de Maio, e pela pena de Idalina Grácio, sua actual directora, publica o Jornal de Sintra, ocupando toda a página cinco, um artigo profusamente ilustrado com fotografias (seis) e curto texto, em tom jubiloso e laudatório, adequado à reabertura do Palácio Hotel de Seteais, no dia 17 de Abril.

Todavia, perante o discurso noticioso e seu complementar dispositivo imagético, o esporádico leitor daquela edição jamais imaginaria que, através da minha colaboração semanal, o JS se pronunciou, tão veemente e frequentemente, contra duas circunstâncias que marcaram o longo período, de mais de um ano, de recuperação das instalações.

Primeiramente, o encerramento do terreiro cujo acesso é público, sob o esfarrapado mas flagrantemente desmentido pretexto das condições de segurança a acautelar. Com o aval do IGESPAR, chegou o concessionário ao ponto de invocar a abertura de valas que inviabilizariam a permanência de pessoas no relvado. Porém, tal obra jamais seria concretizada.

Impedir o acesso – atitude que, sublinhe-se, a Câmara Municipal, inicialmente, não estava disposta a contemporizar, mas que acabou por ceder – ofendeu os cidadãos em geral, prejudicando o trabalho de estudantes e professores em particular, e até do próprio Presidente da Junta de São Martinho, no pleno e documentado exercício das suas funções.

Em segundo lugar, lembro o gravíssimo atentado da destruição do tanque, amplamente denunciado através de órgãos da imprensa de âmbito nacional e regional, nomeadamente pelo JS, para além das reclamações remetidas aos Presidente da CMS, Ministro da Cultura, IGESPAR, e UNESCO em Lisboa e Paris.


Chamaria ainda a vossa atenção para um curioso pormenor da foto que Idalina Grácio destacou para o centro gráfico da referida página do seu jornal. A única pessoa que enfia as mãos nos bolsos é o Ministro, ex-empregado de Ricardo Espírito Santo, concessionário da exploração hoteleira de Seteais. Olhem que talvez valha a pena fazer o breve esforço de interpretação do flagrante à-vontade de Manuel Pinho.


Por último, fique bem claro que apenas a verdade norteou os meus textos sobre o assunto. E, caros leitores do Jornal de Sintra, queiramos ou não, tudo quanto se publica, fica para memória futura. Tão certo como dois mais dois serem quatro, chegará o dia em que, também através destas páginas, se saberá onde parava a dignidade, nos conturbados dias sintrenses da primeira década do século vinte e um.


* publicado no Jornal de Sintra em 8 de Maio de 2009


Nota de esclarecimento

Na realidade, não apreciei a ligeireza do artigo de Idalina Grácio. E, acreditem, se assim acontece, não é tanto pela circunstância de estar envolvido como autor das recentes denúncias. Considero que, de modo algum, o tal tom da notícia seria incompatível com uma naturalíssima, ainda que breve, alusão a um passado tão próximo. Foi uma opção que, seja como for, suscita mais do que uma interpretação.

Como princípio geral, relativamente a determinado acontecimento que originou grande controvérsia, a minha opinião vai no sentido de que o jornalista não pode perder a oportunidade de, explicitamente, o referir. Por isso escrevi o artigo. Através de correio electrónico, Idalina Grácio reagiu, dando-me a entender que os meus artigos, de colaboração no Jornal de Sintra, a propósito do assunto, tinham tido o seu tempo e que, no caso vertente, o importante era dar conta da festa de reabertura.

Claro que foi pior a emenda… Então, a directora do Jornal de Sintra, se bem que relatando um ambiente de festa, não encontra maneira de fazer uma alusão que teria a maior pertinência? Se, na sua qualidade de jornalista, directora e administradora, assim considerou que deveria escrever e subscrever, lá terá as suas razões.

Como, no Jornal de Sintra, órgão de imprensa regional onde escrevo desde a década de setenta, continuo a reconhecer um hebdomadário sem compromissos locais, permito-me permanecer fiel aos princípios perante os quais os leitores me têm dado prova de apreço, ao longo de centenas de páginas, sempre no âmbito da intervenção cultural, quer nos domínios de crítica musical ou, de modo integrado, sistémico e brangente, da defesa do património, através de artigos de opinião e crónicas de diversa índole.

Por não pretender alimentar qualquer polémica com Idalina Grácio, nas páginas do Jornal de Sintra, decidi transferir o assunto para este suporte electrónico, dando oportunidade, aos habituais leitores do sintradoavesso, em directo e em cima da ocasião, de expressarem a sua opinião.

13 comentários:

Anónimo disse...

Caro Amigo Dr. João cachado,

Parece que sou o primeiro a intervir sobre o assunto. São privilégios dos reformados. Se estivesse no activo a esta hora não podia ler e escrever no swu blogue.
Eu compreendo as suas razões mas também compreendo as razões da directora do Jornal de Sintra que não pode ter a independência do Dr. João Cachado. Senão a Câmara e os comerciantes não lhe davam publicidade. Mas a destruição do tanque de Seteais não pode ser esquecida. Ainda ontem lá passei e parei para ver bem aquela vergonha. Por favor não pare.
Um abraço do

Artur Sá

Flora Dinis disse...

Parabéns por estes texts muito bem escritos.
Agora percebi porque é que o Jornal de Sintra onde o Dr Cachado enchia páginas inteiras só lhe dá uma coluna para escrever.
Muitos cumprimentos
Flora D. (Banzão)

Sintra do avesso disse...

Cara Flora Dinis,

Aproveito a oportunidade da resposta ao seu comentário para esclarecer que, quando a minha colaboração semanal no Jornal de Sintra deixou de revestir a antiga forma de artigo, habitualmente ilustrado com fotografia, e passou a ocupar esta sexta coluna vertical, de página ímpar, deveria eu ter explicado aos leitores que, de facto, a redução é real mas não tão patente que, à primeira vista, tenham uma ideia aproximada da diferença de quantidade dos textos anteriores e actuais.

Como os computadores dispõem de tal ferramenta, é possível esclarecer que, em média, estes meus escritos da 6ª Coluna, têm cerca de dois mil quinhentos e quarenta caracteres, distribuídos por sete ou oito parágrafos, num total de mais ou menos quatrocentas palavras, ocupando entre de quarenta e cinco e cinquenta linhas de uma folha A4. Portanto, como facilmente concluirá, não é tão pouco como poderia parecer.

Impõe-se esta explicação na medida em que, a Flora e não poucos leitores me têm perguntado, quer por escrito quer pessoalmente, porque razão o Jornal de Sintra tinha reduzido a minha colaboração a tão diminuto espaço. Ora bem, como se têm repetido os episódios em que semelhante questão se vem colocando, ficam a saber que, de modo algum, a direcção do jornal me impôs qualquer restrição.

Fui eu quem propôs o formato. E, para que conste, também fui eu quem sugeriu o grisé de fundo. Naturalmente, como ainda não se descobriu a maneira de meter o Rossio na Rua da Betesga, para que no diminuto espaço tanta prosa coubesse, o que se reduziu foi o tamanho dos caracteres que, consoante o estado da vista de cada um, determina o melhor ajustamento dos óculos e, nuns casos o afastamento, noutros a aproximação folha do jornal.

Só isto. Tão somente isto.

Também lhe agradeço as suas palavras acerca da qualidade do português. É, na verdade, uma preocupação dominante por estas bandas.

As melhores saudações do

João Cachado

Helena F. disse...

Caro João Cachado,

Somos duas professoras do secundário. Lemos com atenção os seus artigos, sempre de grande franqueza e civismo. Até damos o seu exemplo aos nossos alunos.
A Flora Dinis sugeriu que você está a pagar o preço da independência. Conyinue. Sintra precisa de mais vozes como a sua. Bem haja,

Helena e Rosário

Heitor Pontes disse...

Através do Jornal de Sintra, o património cultural como Seteais, tem no Dr João Cachado o defensor mais autorizado. Percebo o que sente por Idalina Grácio não escrever uma linha sobre o fecho do recinto ou destruição do tanque. Mas Artur Rosa tem razão. Estragava a festa e a Câmara tirava-lhe a publicidade. São compromissos que se compreendem. Também concordo que há maneira de escrever sobre as coisas sem criar inimizade. Mas é preciso saber.
Cumprimentos

Heitor Pontes

Rui Soares disse...

É curioso que a directora do Jornal de Sintra teve a atitude que o João Cachado apontou quando está a comemorar 75 anos. Tenho muita pena mas o Jornal de Sintra está muito ultrapassado. A minha mãe era assinante e quando morreu em 1990 deixei acabar a assinatura. Às vezes pego no jornal e confirmo que a qualidade é muito má em relação ao tempo da direcção do Sr. Medina e da filha. Não me admira nada que se passem estas coisas no Jornal de Sintra. Mas faz pena porque já foi um bom jornal. Tenho quase setenta anos e posso fazer as comparações.
Cumprimento
Rui Soares

Fernando Castelo disse...

Meu caro João Cachado,

Lendo as intervenções dos estimados Artur Sá e Heitor Pontes, devo manifestar algum desacordo perante interesses em jogo.

Não admito que a Câmara, qualquer dos seus autarcas ou serviços, incluíndo os de imprensa, tome medidas discriminatórias para com um jornal, nomeadamente "cortar" com publicidade, pelo facto de apresentar realidades diferentes ou críticas à mesma.

Se isso acontecesse, mais dia menos dia apareceria às claras, sendo uma grande bronca e susceptível de comprometer ganhos eleitorais. É certo que não vemos notícias críticas nas grandes circulações jornalísticas, mas as razões serão outras.

Estou até numa de admitir que os autarcas em gestão eleitoral, prefeririam o jornalismo independente e firme, com críticas construtivas e bem ordenadas, mobilizador e incentivador da leitura por largos sectores. Aí sim, a publicidade ficaria garantida, até para atenuar o noticiado.

Portanto, não se colocando a questão de pressões para-oficiais, reservo-me na meditação de certos destaques e enaltecimentos, de que Seteais é o último episódio.

Enquanto isto, não se fala de Vale dos Anjos, nos dinheiros do Jogo para aplicar no Centro Histórico, nas Casas Embrulhadas da Volta do Duche, na Cinelândia, nas Ciclovias, no Hospital, nos Parques periféricos, nos transportes públicos e tanta coisa mais.

Sem mais

Sintra do avesso disse...

Meu Caro Fernando Castelo,

Há coincidências que chegam a ser perturbadoras. No momento em que ia responder a Artur Sá e Heitor Pontes, e, precisamente nos termos do comentário do Fernando Castelo, eis que chega a sua mensagem a «tirar-me a palavra da boca»...

Na realidade - agora respondendo a si e aos estimados Sá e Pontes - custa muito a admitir que a CMS pudesse incorrer na prática que os nossos amigos dão a entender. Mal de nós, se estivéssemos confrontados com autarcas tão primários e, tão sabujamente, capazes de dar o flanco de maneira tão anti-democrática. E também não me passa pela cabeça que a Idalina Grácio se autocensurasse, na presunção de que, desse modo, não incomodaria a autarquia, para melhor se habilitar à publicidade paga de que carece para a sobrevivência do jornal.

Enfim, este espaço está, por enquanto, reservado aos comentários acerca do texto ontem publicado, com um enfoque especial sobre uma notícia a propósito de Seteais. De qualquer modo, estou como o meu amigo. Não posso deixar de pensar em tudo quanto, de algum modo, está conotado com a matéria em questão, nomeadamente, o que aponta no último parágrafo da sua mensagem.

Um abraço

João Cachado

Júlia Elisa Palha disse...

Estimado Senhor Dr. João Cachado
Temos muita coisa em comum e,entre elas,o gosto por outras linguagens, que por vezes a simbiose nos enquadra tão bem nos sentimentos.
Nietzsche dizia que só Aqueles que sabem sentir 'Isto não está bem' é que conseguem melhorar as coisas:"Eine Verbesserung erfindet nur der, Welcher zu fühlen weiss:'Dies ist nicht gut'.

Nesta altura, felicito-o pela coragem dos seus textos.

No tema em apreço (que me levou a pedir ao meu marido para me deixar ler o Jornal de Sintra)confesso que não conheço a jornalista que escreveu o artigo sobre Seteais. Dou pois a opinião suportando a idéia de se tratar de uma jovem ainda a dar os primeiros passos nessa tão digna profissão onde conheci Fernando Cascais, Goulart Machado, José Goulão e tantos outros que a minha memória neste momento não recorda para minha tristeza.
Acredite que nunca vi que algum deles se suportasse em fotos para encher uma página de jornal,eles tão rigorosos na gestão do espaço e sempre cheios de material a desenvolver,como diziam.
O Jornal de Sintra tem uma longa história a defender e não será desta forma que os leitores aparecerão, porque as notícias regionais são muitas e,numa página como aquela que, diga-se o que se disser, serviu os interesses dos que lá constavam, há um notório exagero.Não terá sido por mal da jornalista que, certamente ao longo da vida, irá fazer muito melhor, mas não deixará de merecer os devidos reparos.Até porque devia haver uma certa contenção na conversão do evento em estrela cintilante do nosso território.
Bem haja e os melhores cumprimentos

V. Igrejas Pedro disse...

Caro Cachado,

A independência é uma coisa muito bonita mas muito cara. Faça o mesmo que o Fernando Castelo e procure o «Cidade Viva» ou outro jornal qualquer para publicar os seus belos artigos e deixe de dar nozes a quem não tem dentes.

V. Igrejas Pedro

Campos Faria disse...

Para mim o mais grave é o facto de a autora do artigo do jornal de Sintra sobre a reabertura do hotel ser a própria directora do jornal que também é administradora. Não me parece regular.

Campos Faria

Sintra do avesso disse...

Minha Cara Dra Elisa Palha,

O seu texto é um verdadeiro conforto para quem, como eu e, felizmente, outros comentaristas deste blogue, tanto apreciamos a escrita cuidadosa, no repeito da gramática da língua, disciplinadora insubstituível de todos os devaneios que queiramos expressar de viva voz, lançar ao papel ou a estes suportes virtuais aos quais, mais ou menos relutantemente, acabámos por render-nos.

Como sabe, este blogue não tem imagens e não as tem por minha expressa vontade. Fácil seria introduzi-las. Até eu, que sei muito pouco de informática, conseguiria fazê-lo. E, como não sou completamente destituído de sentido estético, provavelmente, não me sairia particularmente mal. Mas, de facto, decidi que assim fosse, precisamente, para dar lugar a que textos como o seu aqui pudessem chegar.

Ao ler a sua citação de Nietzsche, logo me ocorreu, a propósito dos conceitos de aperfeiçoamento e de melhoria, uma catadupa de imagens sonoras de Richard Wagner - amigo-irmão do filósofo que os caminhos da vida acabaram de afastar tão violenta e dolorosamente - para, imediatamente, me sugerir a audição do epílogo de Parsifal, sempre um privilégio de aperfeiçoamento do ouvinte, remetendo-o para os territórios da suprema Beleza, que tão perto fica do divino. É o que farei logo que termine estas palavras.

Quanto ao Jornal de Sintra e ao artigo em apreço, mais não posso do que remeter à jornalista-directora-administradora o curiosso comentário da Sra. Dra. Júlia Palha. Como calcula - porque a minha 6ª Coluna, também no Jornal de Sintra, vai no mesmo sentido - não posso estar mais de acordo consigo. Talvez a Dra. Idalina Grácio queira responder-lhe, neste espaço que ela sabe estar à disposição, para a troca de impressões que tão viva tem sido.

Agradeço-lhe muito a sua disponibilidade para o comentário que aqui nos trouxe, para geral benefício de todos.

Melhores saudações do

João Cachado

Anónimo disse...

Este episódio do artigo da directora do jornal de Sintra sobre a reabertura do Hotel de Seteais só serviu para chamuscar a sua imagem duma ilustre desconhecida que também acumula as funções de jornalista e de administradora. Se há alguém que mantem a dignidade de sempre é o Dr. João Cachado que toda agente sabe quem é.

Ernesto Silva Soares