[sempre de acordo com a antiga ortografia]

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Desilusão
sem nome próprio


"(...) Como foi possível estar ao lado de um político cujo cartão de visita era o futebol e agora estamos a ver que nada fez? (...) Desculpe pela opinião mas deve sentir-se muito mal ao ponto de se desmarcar (...) Ilda Canavarro, 15.12.2010"

Há dois dias, o comentário de uma antiga aluna, em epígrafe, acabou por determinar a necessidade de esclarecer o assunto nele implícito que, de vez em quando, tem sido suscitado por outras pessoas. Ora vamos lá ver se consigo ser suficientemente claro e tão conciso que não caia na tentação de me alargar em considerações que, apesar de relacionadas, nada acrescentariam ao cerne da questão.


Terei de recuar uma década. Sem mais delongas, passaria a recordar como foram penosos os últimos tempos do mandato de Edite Estrela. Em manifesta estratégia eleitoralista, a então Presidente da Câmara deixou-se enredar em casos tão controversos como, nomeadamente, a construção do parque de estacionamento subterrâneo na Volta do Duche, a inauguração apressada e atabalhoada das instalações inacabadas do Centro Cultural Olga Cadaval, ou as obras na Heliodoro Salgado.

Estas situações contribuíram para a pesada herança que a edil acabaria por legar aos munícipes, com uma carga de significativa e patente baixa da sua qualidade de vida. Por exemplo, só no coração de Sintra, a atestar quanto afirmo, ficou a flagrante descaracterização do bairro da Estefânea, castigado pelo funeral do comércio local e por um horroroso e desgastante labirinto de trânsito, pela falta de estacionamento que, já no seu teu tempo, impunha, isso sim, a opção pela estratégica instalação de parques de estacionamento periféricos.

Não era fácil nem cómodo lutar contra problemas que acabaram mediatizados, adquirindo uma notoriedade nacional na imprensa e na comunicação social audiovisual. De modo muito discreto – porque sempre detestei saliência pessoal de qualquer ordem – entreguei o protagonismo a quem o soube aproveitar, mas sem enjeitar a coordenação do movimento cívico que, com base na contestação à concretização da construção do projecto na Volta do Duche, constituiu uma plataforma de luta de cidadãos apartidários e independentes, preparados para outros voos.

Mãos à nova obra

Tudo isto há dez anos. Era o dealbar do século XXI e Sintra estava exausta, na ponta final do percurso de uma gestão muito polémica do município. Muito mal rodeada por uma equipa impreparada para os desafios dos gigantescos retalhos da manta que se transformou em subúrbio da capital, desgastada por um acumular de episódios em que fora posta em causa, Edite Estrela iria passar o testemunho a um Fernando Seara que aparece num momento absolutamente crucial.

Em face do quadro em referência, difícil não é entender que, enquanto munícipe interventivo, eu estava aberto ao acolhimento, não de qualquer messiânico salvador do concelho mas, muito naturalmente, de alguém disposto a concretizar um projecto atento ao envolvimento de todos quantos, dispostos ao compromisso cívico, ansiavam por prestar uma colaboração profícua e desinteressada.

Naquela altura, de facto e objectivamente, Fernando Seara não desiludiu. Logo nos primeiros tempos do seu mandato, sustentado no seu saber de homem de Direito, habituado a reflectir sobre a constitucionalidade das instituições, pôs o dedo na ferida das empresas municipais, atitude que me animou sobremaneira já que, completamente perplexo e impotente, tinha eu assistido à génese de tais monstros tão ávidos de recursos.

Uma esperança a galope

Inesperadamente e com o maior desassombro, eis que o próprio Presidente vinha pôr em causa aquilo que, já na altura, eu considerava tão pernicioso como uma porta aberta a todas as manobras de agilização de pessoas e bens. Sossegou-me. Com a sua pública tomada de posição, confirmou a minha razão contra a existência das empresas municipais. Eu tinha razão e o Presidente tinha uma actuação afim. Para mim, era quase um alvoroço.

Na mesma altura, ou pouco tempo depois, cumprindo a promessa eleitoral que, não esqueçamos, fora compromisso de todos as forças partidárias concorrentes às eleições, Fernando Seara põe termo ao processo da construção do mencionado parque de estacionamento subterrâneo. Sei que, em face do adiantamento das negociações do anterior executivo, a coisa não foi nada fácil e, pelo contrário, revestiu aspectos até bastante sofisticados para evitar situações de prolongado contencioso.

Entretanto, no mesmo contexto do estacionamento e, aparentemente, sensível à necessidade de, em termos definitivos, tratar da questão na sede do concelho, o Presidente ia reunindo com alguns membros do Movimento Cívico de Sintra, entre os quais me incluía, ouvindo e concordando com as sugestões que continuo a subscrever, no sentido da instalação dos parques periféricos e requalificação de pequenas bolsas nas freguesias de São Pedro, São Martinho e Santa Maria.

Uma outra frente de actuação passou pelo discretíssimo desinteresse pelo projecto Sintralândia que, se bem se lembram, constituía o mais tenebroso plano de instalação de um parque temático, na zona da Granja do Marquês, que conduziria à destruição de duzentos hectares de boa terra agrícola, outra herança da anterior presidente da Câmara, que chegou ao ponto de subscrever um protocolo afim com o então Ministro da Defesa.

Ao impedir que o projecto se concretizasse, num momento em que uma grande empresa multinacional, especialista em tais empreendimentos, jogava tudo em vários tabuleiros, Fernando Seara enfrentou interesses avultadíssimos de toda a ordem, prestando a Sintra um serviço que a maior parte da população ainda desconhece. Esteve à altura, ignorando os cantos de sereia de cinco mil postos de trabalho que aquela disneylandia local iria promover, numa inominável lógica de destruição e de abastardamento de valores locais que nunca será excessivo sublinhar.

Porém, ainda que já tão significativos, não acabam por aqui os créditos iniciais de Fernando Seara e, paradoxal mas compreensivelmente, as razões que, em simultâneo, subjazem à desilusão que a sua gestão acabou por suscitar.

(continua)


10 comentários:

David Santos disse...

Está visto que o Dr. João Cachado (um homem de esquerda...) tem um problema porque esteve próximo do presidente da Câmara que é do PSD. Compreendo a sua necessidade de justificação porque é um homem digno que deu crédito a um político que não o merecia. Não há quem desconheça a desilusão que o Seara foi para Sintra. O que aconteceu com o Dr. Cachado aconteceu com muita gente em Sintra. O Seara começou menos mal mas está cada vez pior e deve acabar muito mal para prejuizo desta terra.
David Santos

Luísa Soares disse...

Julgo que o Seara não merece tanta justificação. O João Cachado está a perder tempo com quem não tem respeitado os interesses dos sintrenses. Passe adiante
para outra matéria. Luísa Soares

Carlos Silkvestre disse...

Sigo a linha dos comentários anteriores: faça o favor de não se preocupar com o presidente da Câmara. Assim, o Dr. Cachado ainda está a elogiar. Deixa de se compreender afinal qual é a sua posição. Se está contra, acabou-se e todos compreendem. Quem lê o seu blogue não precisa de mais esclarecimentos. Boas festas,
Carlos Silvestre

Anónimo disse...

Colega Cachado,
A minha opinião vai em sentido oposto. Penso que o Cachado
está a recordar factos de interesse que ajudam a perceber o engano em que caímos, pelos menos os que tiveram a esperança de que Seara era diferente. Eu também não alinho à direita e iludi-me com este homem. Acompanhar o Cachado nesta explicação é um caminho
de lucidez. Obrigada, Fernanda Branco

césar Vale disse...

A Edite Estrela foi fazendo umas coisas com muitas asneiras pelo meio. O Fernando Seara só faz asneiras por todo o lado.
Diz o Cachado que no princípio etc e tal. Já dizia o meu avô que no
princípio todas as vassouras varrem bem.
César Vale

Fernando Castelo disse...

Meu caro João Cachado,

Salvo melhor opinião,esta sua abordagem é muito positiva, porque existiram razões para se apoiar (pelo prometido e esperado) a candidatura em apreciação, apesar de contrária às nossas opções políticas.

Entendo as sugestões aqui feitas por Luisa Soares e Carlos Silvestre, mas não se pode passar uma esponja tão facilmente sobre toda uma prática política.

Na realidade, fomos ingénuos por não termos vislumbrado que uma campanha muitas vezes assente no "careca do benfica" não garantiria o desenvolvimento harmonioso do concelho e uma melhor qualidade de vida às suas gentes.

Para nossa vergonha, até as ligações clubistas justificaram que um advogado deixasse de representar as famílias de duas senhoras que morreram em Belas.

Em vez de caminharmos para o futuro, passámos a assistir à informação selectiva, nitidamente promocional, com contornos dignos da maior atenção por parte dos media.

A galeria de imagens é fornecida a uma cadência ritmada, enquanto muita gente ainda não percebeu para onde é a corrida e a táctica utilizada.

Estamos perante um "case study" a ter em conta, avaliando-se alguns indicadores sobre ambições, para as quais o sistemático aparecimento público é incontornável.

Anónimo disse...

Mas apesar de tudo,os sintrenses deixaram-se enganar uma 2ª vez e até lhe deram maioria absoluta!é muita ingenuidade!E estão a deixar-se levar pelas falinhas mansas do ambicioso vice-presidente,tudo justificado pela conjuntura política nacional.é isto que continuamos a querer para Sintra?
Margarida Mota

Anónimo disse...

O ambicioso vice-presidente deve ter ido à bruxa ver se o Madaíl não se candidata (a condição para o Seara avançar para a federação do futebol) porque assim é a sorte grande deste professoreco de Mafra que foge de voltar à sua escola como o diabo da Cruz. PFH

Duarte Nunes disse...

O Seara tem tanta sorte que ainda tem pessoas como o João Cachado com problemas em atacá-lo e que mesmo a criticar ainda o defendem.
Duarte Nunes

Carlos Sousa disse...

Caro Dr. Cachado,
Continuar? Para quê? Está tudo mais que percebido. Toda a trafulhice em Sintra sabemos que vem dos Paços do Concelho. Gabo-lhe a paciência, Dr. Cachado ao gastar com semelhante prenda as suas prendas. Boas Festas,
Carlos Sousa