Conversa cruzada
De facto, não podia ter sido mais azarada a minha queda daquela manhã de 23 de Março que resultou na fractura do peróneo da perna esquerda. Além de pressupor a intervenção cirúrgica, a imobilização e um processo de recuperação, no âmbito do qual a prolongada fase de sessões de fisioterapia só ontem começou, não podia ter acontecido em altura menos propícia para um inveterado wagneriano que, há anos, andava a sonhar com a comemoração da grande e redonda efeméride.
Para este 2013, em que se celebra o duplo centenário do nascimento de Richard Wagner, tinha eu preparado, durante o mês de Agosto, estadas em Leipzig – cidade berço do compositor e com tantas referências musicais, por exemplo, relativas a Bach e Mendelssohn, à Gewandhaus, etc – e, naturalmente, em Bayreuth, onde assistiria à nova produção do Ring e a récitas de Tannhäuser e de Der fliegende Holländer. Enfim, de acordo com conselho médico, não tive outro remédio senão desistir de programa tão aliciante.
Claro é que tal desistência implica num grande desgosto. Mas, contra factos… E, ontem mesmo, de conversa com um amigo acerca do assunto, quando me referi a Bayreuth, pediu-me ele que o esclarecesse sobre o projecto da Ópera dos Margraves que, tinha ouvido dizer, era do Bibiena, o mesmo arquitecto da Ópera do Tejo, edifício que ruiu com o Terramoto de 1755.
Esclareci e aproveito a circunstância para partilhar a informação já que não é a primeira nem a segunda vez que me colocam a dúvida ou afirmam a certeza da coincidência de autoria. Pois, não senhor, os projectos foram concebidos por diferentes artistas da distinta e famosa dinastia de arquitectos cujo apelido deriva do topónimo, nos arredores de Florença.
Em Bayreuth, só a arquitectura interior da Ópera dos Margraves é da autoria de Giuseppe Galli da Bibiena (1696–1757), e de Carlo Galli da Bibiena (1728–1787) já que o projecto do edifício, esse é do arquitecto francês Joseph Saint-Pierre (1709-1754). Quanto à Ópera do Tejo, foi Giovanni Carlo Sicini Bibiena (1717-1760) o autor, que veio mesmo a falecer em Lisboa, cidade onde assinou outros projectos, como o da igreja da Memória (onde foi sepultado o Marquês de Pombal), o Teatro do Forte ou Teatro do Salão dos Embaixadores no Palácio da Ribeira e do Teatro da Quinta de Cima ou Teatro da Ajuda. Igualmente foi responsável pela Real Barraca da Ajuda e da sua Capela Real.
A propósito da Ópera do Tejo, não gostaria de perder a oportunidade para lembrar que foi com Alessandro nell’ Indie, com libreto de Pietro Metastasio, e cenários do próprio Bibiena, ópera do napolitano David Perez (1711-1778), em Portugal contratado pelo Rei D. José, que o soberbo edifício foi inaugurado em 31 de Março de 1755.
O elenco era um dos mais brilhantes que se podia ter reunido em toda a Europa e a produção de tal modo monumental que os militares macedónios eram figurados por um destacamento de tropas de cavalaria e o cavalo de Alexandre, Bucéfalo, evoluía em alta escola ao som de marcha especialmente composta pelo compositor.
A finalizar, um excerto da referida ópera, colhida num concerto da Orquestra Metropolitana de Lisboa em 2005 e gravado pela Antena 2. O documento vídeo é interessante já que pretende reproduzir virtualmente o edifício em apreço.
Boa audição!
http://youtu.be/PtK-0bcXipo
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