[sempre de acordo com a antiga ortografia]

quarta-feira, 2 de julho de 2014



No dia de entrada no Panteão


Deixem que, neste dia, lembre palavras da filha da escritora, Maria Andresen, minha colega e contemporânea da Faculdade de Letras. Afirmou ela fazer mais sentido que a trasladação aconteça a 2 de julho e não a 25 de Abril - como chegou a ser falado.

Assim entendeu, tendo em conta até que "(...) neste momento se recusa a presença dos militares do 25 de abril [na Assem
bleia da República]. Mais vale a minha mãe estar fora disso, das comemorações (...). Ela esteve sempre ao lado das pessoas exploradas, e das lutas pelos direitos humanos. Numa altura destas em que se sacrifica tanto as pessoas é importante evocá-la". Fim de citação.

Considero Catarina Eufémia um dos poemas em que Sophia mais e melhor exprime como, a montante das palavras de sua filha, havia mesmo poesia militante da causa da Liberdade.

Luminoso, ei-lo, grande, belo, medularmente enraizado na nossa cultura mediterrânica de causas tão comoventes, justas e sublimes.

Catarina Eufémia

O primeiro tema da reflexão grega é a justiça
E eu penso nesse instante em que ficaste exposta
Estavas grávida porém não recuaste
Porque a tua lição é esta: fazer frente

Pois não deste homem por ti
E não ficaste em casa a cozinhar intrigas
Segundo o antiquíssimo método oblíquo das mulheres
Nem usaste de manobra ou de calúnia
E não serviste apenas para chorar os mortos

Tinha chegado o tempo
Em que era preciso que alguém não recuasse
E a terra bebeu um sangue duas vezes puro
Porque eras a mulher e não somente a fêmea
Eras a inocência frontal que não recua
Antígona poisou a sua mão sobre o teu ombro no instante em que morreste
E a busca da justiça continua

Sophia de Mello Breyner Andersen

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