[facebook, 14.12.2014]
[Transcrição do texto que subscrevi para publicação na edição de Dezembro de 2014 da Revista "Tempo Livre" da FUNDAÇÂO INATEL, no âmbito da minha colaboração mensal na rubrica 'Língua Nossa'. A revista está publicada 'on line' e em suporte papel, com a tiragem de 89.000 exemplares. A vossa compreensão para a circunstância de o facebook não assumir os recursos gráficos do original.]
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Erros de acentuação
João Cachado*
Hoje, o adjectivo ‘pudico’ e o substantivo ‘rubrica’, duas palavras bem conhecidas, cuja acentuação tem dado pano para mangas, atingindo fama sem proveito já que, a existir, este pressuporia a correcção do seu emprego quotidiano, quer no registo escrito quer no oral e, de facto, infelizmente, como tal não acontece, os erros são frequentíssimos.
‘Pudico’ significando que tem pudor, recato ou vergonha, é palavra grave. Se recorrermos ao étimo latino ‘pudicus’, verificaremos que a penúltima sílaba é longa, razão pela qual aí deverá recair acento, porquanto, na passagem do Latim para o Português se respeita a acentuação de origem.
Então, que razão justificará a sua errada transformação numa esdrúxula? Na verdade, nada o sustenta. Aliás, apenas quando, na origem, a penúltima sílaba é breve, como em ‘publicus’, haverá recuo do acento para a antepenúltima sílaba, resultando na esdrúxula ‘público’. É um caso deveras interessante perante o qual, inclusive, a nível dos verbetes dos dicionários, ficamos algo surpresos.
O Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, da Academia das Ciências de Lisboa [Verbo ed., Lisboa, 2001], regista as duas formas, grave e esdrúxula, sem qualquer referência a questões de uso correcto, exemplificando com frases em que a palavra é sempre esdrúxula. Já o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa [Círculo de Leitores ed., Lisboa, 2003], apesar de também registar as duas formas, fá-lo muito sumariamente em relação à esdrúxula, indicando ser menos correcta mas mais usual do que a grave.
Em conclusão, embora menos generalizada, mesmo a nível ortográfico, a forma correcta é ‘pudico’. Exactamente análogo é o caso de ‘rubrica’, que tem origem no substantivo latino ‘rubrica’, também com vogal longa na penúltima sílaba. Remotamente, o seu significado remete-nos para a cor vermelha, articulando com ‘terra vermelha, giz vermelho, títulos escritos a vermelho’. Da mesma origem são outras palavras portuguesas como ‘rubro’, ‘rubor’, ‘ruborizar’, ‘enrubescer’.
Entretanto, a evolução semântica aponta para assinatura abreviada, nota, anotação, indicação, tema, título. Diga-se e escreva-se ‘rubrica’ com acento na penúltima sílaba.
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[O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.]
*Licenciado em Filologia Germânica pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, actualmente aposentado, foi professor, técnico superior e dirigente, nos Ministérios da Educação e dos Negócios Estrangeiros. É autor de materiais didácticos para o Ensino de Português no estrangeiro.
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Erros de acentuação
João Cachado*
Hoje, o adjectivo ‘pudico’ e o substantivo ‘rubrica’, duas palavras bem conhecidas, cuja acentuação tem dado pano para mangas, atingindo fama sem proveito já que, a existir, este pressuporia a correcção do seu emprego quotidiano, quer no registo escrito quer no oral e, de facto, infelizmente, como tal não acontece, os erros são frequentíssimos.
‘Pudico’ significando que tem pudor, recato ou vergonha, é palavra grave. Se recorrermos ao étimo latino ‘pudicus’, verificaremos que a penúltima sílaba é longa, razão pela qual aí deverá recair acento, porquanto, na passagem do Latim para o Português se respeita a acentuação de origem.
Então, que razão justificará a sua errada transformação numa esdrúxula? Na verdade, nada o sustenta. Aliás, apenas quando, na origem, a penúltima sílaba é breve, como em ‘publicus’, haverá recuo do acento para a antepenúltima sílaba, resultando na esdrúxula ‘público’. É um caso deveras interessante perante o qual, inclusive, a nível dos verbetes dos dicionários, ficamos algo surpresos.
O Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, da Academia das Ciências de Lisboa [Verbo ed., Lisboa, 2001], regista as duas formas, grave e esdrúxula, sem qualquer referência a questões de uso correcto, exemplificando com frases em que a palavra é sempre esdrúxula. Já o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa [Círculo de Leitores ed., Lisboa, 2003], apesar de também registar as duas formas, fá-lo muito sumariamente em relação à esdrúxula, indicando ser menos correcta mas mais usual do que a grave.
Em conclusão, embora menos generalizada, mesmo a nível ortográfico, a forma correcta é ‘pudico’. Exactamente análogo é o caso de ‘rubrica’, que tem origem no substantivo latino ‘rubrica’, também com vogal longa na penúltima sílaba. Remotamente, o seu significado remete-nos para a cor vermelha, articulando com ‘terra vermelha, giz vermelho, títulos escritos a vermelho’. Da mesma origem são outras palavras portuguesas como ‘rubro’, ‘rubor’, ‘ruborizar’, ‘enrubescer’.
Entretanto, a evolução semântica aponta para assinatura abreviada, nota, anotação, indicação, tema, título. Diga-se e escreva-se ‘rubrica’ com acento na penúltima sílaba.
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[O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.]
*Licenciado em Filologia Germânica pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, actualmente aposentado, foi professor, técnico superior e dirigente, nos Ministérios da Educação e dos Negócios Estrangeiros. É autor de materiais didácticos para o Ensino de Português no estrangeiro.
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