Nem mesmo de graça?
Mais uma vez, na edição do passado dia
11, o Jornal de Sintra lembrava que,
todos os domingos de manhã, os munícipes sintrenses gozam da vantagem de entrada
gratuita nos monumentos, parques e jardins sob administração da Parques de
Sintra Monte da Lua (PSML). Desde logo me tendo congratulado com a atitude de
divulgação, aproveitaria agora o ensejo do registo para partilhar algumas
considerações que me surgem a propósito.
Primeiramente, para que conste, cumpre
dar conta de um conflito de interesse.
É que, cá por casa, somos sistemáticos beneficiários do regime dominical de
acesso livre a lugares tão especiais como o Parque e Palácio da Pena, os
jardins e palacete de Monserrate, Castelo dos Mouros, Capuchos, Palácio de
Queluz, Palácio da Vila…
E fazemo-lo com duplo proveito, por um
lado, para inquestionável enriquecimento espiritual, por outro, nada
despiciendo nestes difíceis tempos de mínguas de toda a ordem, resultando na bem
material e manifesta poupança de umas centenas de euros por ano porque, de
facto, lá vamos com bastante frequência.
Pois bem, precisamente durante as manhãs
de domingo em que, com a família e amigos, temos aproveitado a oportunidade do
acesso gratuito, fui-me apercebendo de que, se vantagens tão evidentes podem
ser partilhadas por todos os munícipes, afinal, aparente e empiricamente,
poucos serão aqueles que o fazem.
Contudo, não passava de uma pessoal e
difusa impressão. Valeria a pena investir na demonstração cabal que só a
pertinência dos números pode avalizar? Seria possível chegar a alguma conclusão
e, a partir da mesma, promover alguma estratégia de motivação para o
aproveitamento mais generalizado das visitas gratuitas?
Números inequívocos
Porque a resposta só poderia ser
afirmativa, tendo procurado e colhido os dados imprescindíveis, imediatamente, avanço
para a estatística. Relativamente à quantidade de visitantes dos espaços sob
gestão da PSML, durante o ano de 2013, os números estão disponíveis em fontes
distintas, tais como a própria PSML e Direcção Geral do Património Cultural.
Começarei por apresentar resultados globais, desagregados pelas duas entidades
em referência.
Assim, os parques e monumentos sob
gestão da DGPC registaram um total de 2.563.059 visitas e os da PSML 1.705.724.
Destas últimas, cerca de 90% equivaliam a estrangeiros. É a
partir desta primeira premissa que poderei prosseguir até à informação mais
esmiuçada que interessa pôr em comum.
Estamos
em posição de concluir que apenas 10% dos visitantes dos parques e monumentos
da PSML, grosso modo 170.000, eram de
nacionalidade portuguesa, podendo acrescentar que, nos termos do quadro
seguinte, dentre estes visitantes nacionais, apenas 22.642, ou seja, uma
percentagem geral de 13,3 %, correspondia a munícipes de Sintra que
aproveitaram o regime de entrada gratuita.
Parque/Monumento
|
Número de visitantes munícipes em 2013
|
Parque e
Palácio Pena
|
6.792 - média*130/domingo
|
Sintra (Palácio
da Vila)
|
2.009 - »
38/ »
|
Palácio de Queluz
|
3.301 - »
63/ »
|
Castelo dos Mouros
|
3.539 - » 68/ »
|
Conv. Capuchos
|
1.288 - »
24/ »
|
Monserrate
|
4.003 - »
76/ »
|
Chalet da
Condessa
|
1.710 - » 32/ »
|
TOTAL
|
22.642 -
» 431/
»
|
*média aproximada,
por defeito
O caso da Pena
merece algum destaque. Tendo recebido um total de 787.163 visitantes, é o monumento
mais visitado do país, ultrapassando o Mosteiro dos Jerónimos (que registou
722.758). Se aplicarmos a mesma taxa de 10%, 78.700 eram de nacionalidade
portuguesa, 6.792 dos quais munícipes sintrenses visitantes dominicais e, neste
caso, numa percentagem de 8,6 %, menor do que a geral acima referida.
Contra a desinformação
Sendo
ainda possível fazer outras contas a partir dos números supra, nenhuns dos seus
resultados, contudo, contradirão a
irrefutavelmente baixa quantidade de
cidadãos residentes no concelho de Sintra que aproveitam a nítida vantagem de
que desfrutam. Na realidade concreta dos números, aquela minha impressão correspondia a uma situação cujos
contornos são bem claros.
Ora
bem, perante desafios tão fascinantes, porque não aparecem os munícipes nestes
lugares, num dia como o domingo, em que tudo lhes é favorável? Ou muito me
engano ou, haverá por aí muita
informação corrompida e, eventualmente, até vozes apostadas em baralhar e
desinformar potenciais interessados, acabando por prejudicar quem desejam
proteger…
Assim
sendo, vítimas de tal paradoxo, não será de admirar que muitas pessoas desistam
de visitar aqueles locais, ignorando as condições vantajosas de que podem beneficiar.
Ou seja, leram, ouviram dizer que é tudo
muito caro e quedam-se numa inércia que lhes é totalmente nociva.
Uns
parágrafos acima, referia eu que o conhecimento dos números poderia conduzir a
uma estratégia de remediação da situação que, além dos excelentes materiais de
divulgação da PSML, nomeadamente, o site tão
apelativo, pudesse contribuir para ainda levar mais longe a informação em
apreço.
Porque
há muitos cidadãos que não acedem à internet e, igualmente, tendo em conta o
elevadíssimo nível de iliteracia que os atinge, parece-me impor-se a
necessidade de intermediar as mensagens através das associações culturais,
recreativas e desportivas, procurando o concurso dos párocos, para o efeito
recorrendo, por exemplo, a simples cartazes, bem concebidos, elucidativos, com
mensagens curtas e incisivas.
Num
concelho com as características socioculturais do nosso, ainda há muito lugar
para media congéneres. Urge
sensibilizar os pais, avós e outros adultos de referência das crianças e
jovens. Alguns deles, convenientemente esclarecidos, poderão tomar a atitude
que mais os favorece neste domínio.
Claro
que, com os pés bem assentes na terra, bem sabemos que sempre haverá quem não
esteja minimamente interessado em visitar tais lugares. Têm as suas
alternativas? Pois muito bem. Esses, malgrado a melhor vontade dos proponentes,
infelizmente, jamais reclamarão pela possibilidade de qualquer modalidade de
acesso gratuito.
Estatuto sólido e credível
Naturalmente,
vem a propósito considerar que a Parques de Sintra Monte da Lua, não recebe um
cêntimo do Orçamento Geral do Estado. Assim sendo, apesar de se tratar de uma
entidade à qual portugueses em geral e sintrenses em particular tanto devem,
nada custa aos contribuintes! Num país onde, infelizmente, tanta razão de
queixa existe e subsiste no domínio do património público visitável, é um
privilégio imenso poder contar com uma entidade que, em Sintra, é absolutamente
modelar.
A sua única fonte de receita é a resultante das cobranças da bilheteira.
E, com tais proventos - como todos sabemos e, por isso, tanto nos orgulhamos –
mantém, impecavelmente, todos os monumentos, parques e jardins, promovendo
iniciativas de lazer de recorte cultural do mais alto gabarito, além de
sustentar campanhas de obras de preservação e recuperação do património natural
e edificado ao seu cuidado, com uma tal qualidade, que vem recebendo os mais
notáveis prémios internacionais e um inequívoco reconhecimento geral.
Ao abordar esta questão, não raro, me dizem que, aos domingos, em vez de
visitarem o Chalé da Condessa ou o Palácio da Pena, Monserrate, Queluz etc,
muitos munícipes preferem outros destinos. Naturalmente. Muito bem. Farão o que
e como entenderem. Apenas se espera que esses mesmos não se queixem de falta de
oportunidade de acesso, afinal, nas melhores condições possíveis, ou seja,
totalmente grátis.