[sempre de acordo com a antiga ortografia]
quarta-feira, 24 de dezembro de 2008
Natal
Outra fosse a atitude da Junta de Freguesia de São Pedro e de outra índole seria o apoio à Associação de Reformados da Abrunheira. Para que tenham uma ideia de como funcionam as coisas quanto ao interesse daquela autarquia relativamente àqueles seus fregueses mais idosos, tenham em consideração a história que se segue.
Recentemente, a referida associação promoveu uma actividade que implicou o transporte de um grupo de associados ao aeroporto da Portela. Contactada a Junta de Freguesia, não era possível assegurar a deslocação na própria camionete, comprometida que estava para as deslocações da equipa de futebol do 1º de Dezembro. Enfim, a deslocação em questão acabou por ter de se efectuar na camionete de outra Junta de Freguesia do concelho.
Imaginam que a Junta teve o topete de apresentar a factura dos dois serviços? Na nossa ingenuidade, coisa que tal nem nos passaria pela cabeça. Pois é mas, pelos vistos passou pela iluminada cabeça do Senhor presidente da Junta que deve ter confundido a condição de freguês com a de cliente de uma qualquer entidade comercial…
Cabe pormenorizar que o Senhor Presidente da Junta de Freguesia de São Pedro também é Presidente da 1º de Dezembro. Para além de fazer uso praticamente exclusivo da camionete para as deslocações da equipa, circunstância suficientemente esclarecedora, este senhor também é dado a outros retumbantes projectos sempre a favor do futebol local.
É o caso do famoso teleférico que – não me digam já se esqueceram – partiria do estádio directinho à Pena, projecto anunciado no Diário de Notícias, à revelia do Presidente Seara que, tendo calado, consentiu no despautério. Certamente que, pouco dado a questões de transporte, o Presidente da Junta e, cumulativamente, do futebol local, confundiu teleférico com funicular… São confusões atrás de confusões.
Contraponto
Tenha-se presente que, ao longo de três anos, a associação foi bafejada pela Junta com a fabulosa verba de 400 Euros… Isto, para bom entendedor, significa marginalização. E não há época natalícia que nos pudesse levar à utilização de qualquer eufemismo. Felizmente, no entanto, a Abrunheira e, no caso vertente, a Associação dos Reformados, pode contar com a boa vontade de outras entidades.
Trata-se de empresas ali sedeadas que, não deixando de liquidar os seus impostos, se permitem acudir a necessidades destes fregueses mais idosos e carenciados. Sem alarde, sem qualquer enquadramento comercial, sem a mínima estratégia empresarial o Feira Nova, por exemplo – sei que a Puratos também o faz – dispensou tudo o que foi necessário para poder concretizar-se o tradicional bodo de Natal àqueles reformados.
Olhem, eu acho isto bonito, um gesto perfeitamente exemplar. Tenho a certeza de que estou a quebrar a descrição da intenção, mas não resisto a partilhar convosco o nome da pessoa que, tão simpaticamente, com espírito natalício, assim decidiu. Chama-se Carlos Carmo, é o director do Feira Nova e, como se depreende, é boa gente. Exemplar, diria eu.
sexta-feira, 19 de dezembro de 2008
O banquete da asneira
Não falta muito para que passe um ano sobre a data do intempestivo encerramento do terreiro de Seteais. Apesar da muita tinta que continua a fazer correr, a situação mantém-se lamentavelmente inalterada.
Inicialmente, se bem estão recordados, até o próprio Vereador da Cultura da Câmara Municipal de Sintra se mostrou disposto a repor o acesso livre ao local. Com a devida vénia, passo a reproduzir parte de um artigo publicado pelo Jornal da Região de 1 de Abril, com referência à precedente sessão da Assembleia Municipal de Sintra, durante a qual eu próprio intervim acerca do assunto:
“(…) O vereador da Cultura, Luís Patrício, adiantou ao JR que já dispõe de um dossiê, elaborado por juristas e técnicos da área do património, «que aponta no sentido de que aquele espaço não pode ser vedado ao público, é um espaço de domínio público». Com base nesse parecer, o município vai diligenciar, junto do Grupo Espírito Santo (Hotéis Tivoli, que explora a unidade hoteleira instalada no palácio, no sentido da reabertura imediata do espaço. «As obras não são nos jardins, mas sim no palácio, é uma questão de colocar uma vedação», acentua o autarca, que não vê razões para serem invocados argumentos de segurança para o encerramento dos jardins do monumento nacional (…)”. *
Pouco depois, afinal, o município acabaria por se render perante uns esfarrapados argumentos de segurança, invocados pelo concessionário hoteleiro Espírito Santo, ainda que apresentados sob chancela do Igespar. Havia necessidade de abrir umas famigeradas valas, incompatíveis com as visitas. Lembram-se?
Placidamente, o município remeteu-se a um comprometedor silêncio. O costume, pois claro. Por outro lado, tão inconformados como eu, muitos cidadãos iam dando os sinais que a Alagamares se encarregou de dar pública expressão, inclusive através de uma conferência de imprensa.
Os cidadãos pretendiam o simples acesso ao centro do terreiro, apenas para contemplação da paisagem circundante e, em especial, do Palácio da Pena, no cimo do monte, acompanhando a leitura da magnífica descrição de Eça de Queirós, em Os Maias.
Pois, não senhor, ninguém se comoveu. O relvado manteve-se inacessível. Em simultâneo, destruía-se o tanque, iniciava-se a designada reconstrução da habitação da Quinta do Vale dos Anjos e era impedia o acesso ao local do Presidente da Junta de Freguesia de São Martinho… Concentração de asneiras? Não, desgraçadamente, mais do mesmo. Não, infelizmente, Sintra nas mãos de democraticamente eleitos incompetentes.
Então e as valetas, prestes a serem abertas e atravessando o mítico e simbólico terreiro de Seteais? Então o perigo dos buracos onde cairiam as criancinhas todas das escolas? Pois, até agora, nem uma vala ou valeta para amostra...Todavia, teimosamente, o hoteleiro concessionário levou a sua avante, arrastando consigo alguns organismos do poder central e o executivo municipal. Não há dúvida: quer, pode e manda!
Entretanto, depois de tantos meses de ofensa aos cidadãos e à memória de quantos se têm batido pela vigência do regime de público acesso aos jardins, os portões vão continuar fechados. Um dia virá, em que a conveniência de Sua Excelência o concessionário, ditará a reabertura do terreiro que, muito provavelmente, até coincidirá com a reabertura do hotel.
Nessa data, eventual e igualmente aproveitada para pôr em evidência a iluminada ilusão de um espelho de água que o Igespar escandalosamente sancionou – encimando a casa das máquinas a que o ingénuo tanque deu lugar – aparecerão todos os actores desta farsa, lambuzando-se e bebericando no banquete do banqueiro Espírito Santo, obsequiados por tanta prova de bacoco e militante companheirismo. É um fartar vilanagem…
*entre «», palavras do vereador
Não falta muito para que passe um ano sobre a data do intempestivo encerramento do terreiro de Seteais. Apesar da muita tinta que continua a fazer correr, a situação mantém-se lamentavelmente inalterada.
Inicialmente, se bem estão recordados, até o próprio Vereador da Cultura da Câmara Municipal de Sintra se mostrou disposto a repor o acesso livre ao local. Com a devida vénia, passo a reproduzir parte de um artigo publicado pelo Jornal da Região de 1 de Abril, com referência à precedente sessão da Assembleia Municipal de Sintra, durante a qual eu próprio intervim acerca do assunto:
“(…) O vereador da Cultura, Luís Patrício, adiantou ao JR que já dispõe de um dossiê, elaborado por juristas e técnicos da área do património, «que aponta no sentido de que aquele espaço não pode ser vedado ao público, é um espaço de domínio público». Com base nesse parecer, o município vai diligenciar, junto do Grupo Espírito Santo (Hotéis Tivoli, que explora a unidade hoteleira instalada no palácio, no sentido da reabertura imediata do espaço. «As obras não são nos jardins, mas sim no palácio, é uma questão de colocar uma vedação», acentua o autarca, que não vê razões para serem invocados argumentos de segurança para o encerramento dos jardins do monumento nacional (…)”. *
Pouco depois, afinal, o município acabaria por se render perante uns esfarrapados argumentos de segurança, invocados pelo concessionário hoteleiro Espírito Santo, ainda que apresentados sob chancela do Igespar. Havia necessidade de abrir umas famigeradas valas, incompatíveis com as visitas. Lembram-se?
Placidamente, o município remeteu-se a um comprometedor silêncio. O costume, pois claro. Por outro lado, tão inconformados como eu, muitos cidadãos iam dando os sinais que a Alagamares se encarregou de dar pública expressão, inclusive através de uma conferência de imprensa.
Os cidadãos pretendiam o simples acesso ao centro do terreiro, apenas para contemplação da paisagem circundante e, em especial, do Palácio da Pena, no cimo do monte, acompanhando a leitura da magnífica descrição de Eça de Queirós, em Os Maias.
Pois, não senhor, ninguém se comoveu. O relvado manteve-se inacessível. Em simultâneo, destruía-se o tanque, iniciava-se a designada reconstrução da habitação da Quinta do Vale dos Anjos e era impedia o acesso ao local do Presidente da Junta de Freguesia de São Martinho… Concentração de asneiras? Não, desgraçadamente, mais do mesmo. Não, infelizmente, Sintra nas mãos de democraticamente eleitos incompetentes.
Então e as valetas, prestes a serem abertas e atravessando o mítico e simbólico terreiro de Seteais? Então o perigo dos buracos onde cairiam as criancinhas todas das escolas? Pois, até agora, nem uma vala ou valeta para amostra...Todavia, teimosamente, o hoteleiro concessionário levou a sua avante, arrastando consigo alguns organismos do poder central e o executivo municipal. Não há dúvida: quer, pode e manda!
Entretanto, depois de tantos meses de ofensa aos cidadãos e à memória de quantos se têm batido pela vigência do regime de público acesso aos jardins, os portões vão continuar fechados. Um dia virá, em que a conveniência de Sua Excelência o concessionário, ditará a reabertura do terreiro que, muito provavelmente, até coincidirá com a reabertura do hotel.
Nessa data, eventual e igualmente aproveitada para pôr em evidência a iluminada ilusão de um espelho de água que o Igespar escandalosamente sancionou – encimando a casa das máquinas a que o ingénuo tanque deu lugar – aparecerão todos os actores desta farsa, lambuzando-se e bebericando no banquete do banqueiro Espírito Santo, obsequiados por tanta prova de bacoco e militante companheirismo. É um fartar vilanagem…
*entre «», palavras do vereador
quarta-feira, 17 de dezembro de 2008
Para memória futura
Eis o texto de uma moção apresentada pelo Bloco de Esquerda em sessão da Assembleia Municipal, aprovada por unanimidade.
Recuperação da antiga Cadeia Comarcã
A Câmara de Sintra iniciou um conjunto de obras de reabilitação da antiga Cadeia Comarcã, edifício contemporâneo da Sede do Município que acolhe, há mais de 25 anos, o grupo 93 de Sintra, da Associação de Escoteiros de Portugal.
No plano da intervenção, está prevista a colocação de uma vedação que separa os terrenos da sede dos escoteiros do estacionamento adjacente, anunciando-se também a reabilitação da fachada do edifício.
Considerando
- A importância da intervenção da antiga cadeia comarcã para garantir a conservação deste edifício emblemático e a segurança dos e das jovens que, semanalmente, fazem uso do seu espaço.
- Que as obras agora iniciadas são importantes mas precisam de ser acompanhadas por uma intervenção estrutural, de modo a garantir o fim das infiltrações que põem em causa a estabilidade do centenário edifício.
- O papel fundamental que este edifício tem no trabalho desenvolvido em prol da Juventude em Sintra pelo grupo 93 da Associação de Escoteiros de Portugal.
- O acordo de cedência do espaço por 50 anos, firmado em 1984 pela Câmara e pelo Grupo 93.
Considerando ainda
- Os esforços desenvolvidos por várias gerações de jovens sintrenses para a conservação e dignificação do espaço da antiga cadeia comarcã;
- As comemorações, em 2009, dos 75 anos daquela instituição juvenil.
A Assembleia Municipal de Sintra, reunida a 16 de Dezembro de 2008, delibera, por proposta do Bloco de Esquerda:
1- Saudar a Câmara pelo início das obras na antiga Cadeia Comarcã, iniciativa que dignifica o património edificado e a memória de Sintra.
2- Recomendar à Câmara de Sintra que alargue o âmbito das obras a realizar, promovendo uma intervenção de fundo no edifício de modo a garantir o fim das infiltrações que põem em causa o seu equilíbrio estrutural.
3- Enviar a presente deliberação à Chefia do Grupo 93 de Sintra, saudando esta instituição pelo seu papel incontornável na formação e dinamização da juventude sintrense.
Sintra, 16 de Dezembro de 2008
Não posso estar mais de acordo com a iniciativa do BE. Este edifício precisa de uma intervenção como a proposta. Em Sintra, a Defesa do Património passa inequivocamente por uma especial atenção à prisão comarcã traçada por Adães Bermudes.
Às razões e considerandos aduzidos pelo BE, acrescentaria ainda que, no fim da décade de 80, houve gente a bater-se no sentido de que o edifício não tivesse o destino que lhe fora marcado pelo então Presidente da Câmara João Justino, que aprovou um projecto bem à altura do seu analfabetismo funcional.
Na altura, enquanto professor da Escola Profissional de Recuperação do Património de Sintra, que dava os seus primeiros passos, estive envolvido com um grupo de alunos nessa luta que suscitou um grande interesse na comunidade, um sucesso que, naturalmente, faz parte da história daquela casa.
Oxalá tais factos possam vir a constar de informação a colocar em local bem visível. Os bons exemplos devem ser contados com orgulho. Se o caso não ficar lapidarmente registado, esta mesma comunidade sintrense acabará por esquecer como, afinal, valeu a pena contrariar a vontade do edil.
E, a propósito, algo de idêntico, um digno memorial deveria ser erguido na própria Volta do Duche, um local cuja defesa suscitou um movimento cívico que tanto nos mobilizou. Mas, se entrarmos numa de memoriais, então teremos que colocar outro na Granja, lembrando o famigerado caso da Sintralândia.
E, assim, vamos ganhando fôlego e ânimo para a borrasca que se avizinha das bandas do Sabugo...
Eis o texto de uma moção apresentada pelo Bloco de Esquerda em sessão da Assembleia Municipal, aprovada por unanimidade.
Recuperação da antiga Cadeia Comarcã
A Câmara de Sintra iniciou um conjunto de obras de reabilitação da antiga Cadeia Comarcã, edifício contemporâneo da Sede do Município que acolhe, há mais de 25 anos, o grupo 93 de Sintra, da Associação de Escoteiros de Portugal.
No plano da intervenção, está prevista a colocação de uma vedação que separa os terrenos da sede dos escoteiros do estacionamento adjacente, anunciando-se também a reabilitação da fachada do edifício.
Considerando
- A importância da intervenção da antiga cadeia comarcã para garantir a conservação deste edifício emblemático e a segurança dos e das jovens que, semanalmente, fazem uso do seu espaço.
- Que as obras agora iniciadas são importantes mas precisam de ser acompanhadas por uma intervenção estrutural, de modo a garantir o fim das infiltrações que põem em causa a estabilidade do centenário edifício.
- O papel fundamental que este edifício tem no trabalho desenvolvido em prol da Juventude em Sintra pelo grupo 93 da Associação de Escoteiros de Portugal.
- O acordo de cedência do espaço por 50 anos, firmado em 1984 pela Câmara e pelo Grupo 93.
Considerando ainda
- Os esforços desenvolvidos por várias gerações de jovens sintrenses para a conservação e dignificação do espaço da antiga cadeia comarcã;
- As comemorações, em 2009, dos 75 anos daquela instituição juvenil.
A Assembleia Municipal de Sintra, reunida a 16 de Dezembro de 2008, delibera, por proposta do Bloco de Esquerda:
1- Saudar a Câmara pelo início das obras na antiga Cadeia Comarcã, iniciativa que dignifica o património edificado e a memória de Sintra.
2- Recomendar à Câmara de Sintra que alargue o âmbito das obras a realizar, promovendo uma intervenção de fundo no edifício de modo a garantir o fim das infiltrações que põem em causa o seu equilíbrio estrutural.
3- Enviar a presente deliberação à Chefia do Grupo 93 de Sintra, saudando esta instituição pelo seu papel incontornável na formação e dinamização da juventude sintrense.
Sintra, 16 de Dezembro de 2008
Não posso estar mais de acordo com a iniciativa do BE. Este edifício precisa de uma intervenção como a proposta. Em Sintra, a Defesa do Património passa inequivocamente por uma especial atenção à prisão comarcã traçada por Adães Bermudes.
Às razões e considerandos aduzidos pelo BE, acrescentaria ainda que, no fim da décade de 80, houve gente a bater-se no sentido de que o edifício não tivesse o destino que lhe fora marcado pelo então Presidente da Câmara João Justino, que aprovou um projecto bem à altura do seu analfabetismo funcional.
Na altura, enquanto professor da Escola Profissional de Recuperação do Património de Sintra, que dava os seus primeiros passos, estive envolvido com um grupo de alunos nessa luta que suscitou um grande interesse na comunidade, um sucesso que, naturalmente, faz parte da história daquela casa.
Oxalá tais factos possam vir a constar de informação a colocar em local bem visível. Os bons exemplos devem ser contados com orgulho. Se o caso não ficar lapidarmente registado, esta mesma comunidade sintrense acabará por esquecer como, afinal, valeu a pena contrariar a vontade do edil.
E, a propósito, algo de idêntico, um digno memorial deveria ser erguido na própria Volta do Duche, um local cuja defesa suscitou um movimento cívico que tanto nos mobilizou. Mas, se entrarmos numa de memoriais, então teremos que colocar outro na Granja, lembrando o famigerado caso da Sintralândia.
E, assim, vamos ganhando fôlego e ânimo para a borrasca que se avizinha das bandas do Sabugo...
segunda-feira, 15 de dezembro de 2008
Monserrate,
castigo do sucesso (Parte II)
(conclusão)
Feitiço do estuque
Só quem não conhece, se surpreenderá que, a propósito de Monserrate, não hesite eu no uso desta palavra feitiço tão carregada de sentido. A bem escrever, neste caso, forçoso é utilizar o plural já que muitos são os feitiços. E, caro leitor, naturalmente, o do estuque, na verdade fascinante, agiganta-se de modo inequívoco, ao transpor qualquer das portas de acesso ao famoso palacete.
Os estuques do tecto da principal sala de entrada foram dos que, ao longo de várias décadas, mais se ressentiram com a criminosa incúria. Fragilizaram-se, degradaram-se ao ponto de se desfazerem em fragmentos, bem concretos, à mistura com a abstracta vergonha – embora a culpa não devesse morrer solteira… – de se ter autorizado tão grave atentado.
Situação irremediável? Há quem pense, e eu sou dos que o afirmam, que só para a morte não há remédio. No entanto, em determinados casos, como o dos perdidos estuques do tecto em causa, havendo remédio, ele teria de passar por pessoas absolutamente providenciais. E Monserrate, na realidade, só podia contar com a intervenção da maior autoridade nacional neste domínio.
Claro que é Mestre José Clemente do Rosário, um grande senhor que, para além de executar ele próprio, como quando esteve ao serviço do prestigiado Instituto José de Figueiredo e, a exemplo do que está a acontecer com este tecto, também ensina a sua arte há precisamente quarenta anos, tanto como formador do Instituto de Emprego como na Escola Profissional de Recuperação do Património de Sintra.
Mestre Rosário tem intervindo nos mais sofisticados locais como, por exemplo, o Convento de Cristo em Tomar mas considera que Monserrate é mesmo o grande desafio.
“Estou metido num autêntico quebra-cabeças que, literalmente, me tem tirado horas e horas de sono. Acordo, a meio da noite, a pensar como resolver alguns dos problemas. A peça estava irreconhecível, com muitas lacunas. Embora tivessem guardado os fragmentos, não existiam os suficientes. Por isso a recomposição foi um puzzle incrível, um desgaste mas, como se vê, está quase pronto".
O que, no seu dizer, está quase pronto, é uma placa onde ‘tudo funciona’ sem que, afinal, se perceba como todos aqueles lindíssimos motivos composicionais não eram senão aniquilados, mortos fragmentos, um aparente lixo, até que a sua mão lhes tocou, restituindo vida, viço e feitiço, reabilitando-os para a fase que se seguirá, ou seja, a da feitura do molde que dará origem à definitiva peça que irá reocupar o nobre lugar de origem.
Qualquer leigo se apercebe da inteligência, da capacidade de decisão indispensáveis aos riscos que corre um homem com o saber e experiência de Mestre Rosário, ao aceitar um desafio deste calibre. Tal como a Arq. Luísa Cortesão, também ele sublinha como, no fim da intervenção, haverá a possibilidade de verificar onde, efectivamente, se interveio, não mascarando a realidade.
Ainda bem. Monserrate bem merece poder contar com este homem que tem formado sucessivas fornadas de artesãos. Provavelmente, Mestre Rosário terá a possibilidade de continuar a intervir, com alguns dos seus ex-alunos, neste edifício que, só na vertente dos estuques, tem trabalho para cerca de dois anos, pensando numa pequena equipa de quatro ou cinco artesãos.
Entretanto, os cães podem continuar a ladrar que, como sempre, a caravana, vai continuar a passar…
sexta-feira, 12 de dezembro de 2008
Monserrate,
castigo do sucesso?
(Parte II)
Na primeira parte do artigo publicado no passado dia 20 de Novembro, se bem se lembram, ficou no ar aquela dúvida relativa às razões que justificariam o facto de Monserrate ter deixado de contar com transporte público turístico. Ora bem, como era previsível, não houve quem tenha saído à liça para esclarecer a nossa perplexidade. Enfim, pelo menos, até ao momento…
Assim sendo, poderá vingar a hipótese da invejazita de alguém, particularmente incomodado com o sucesso da equipa do Prof. Lamas. Daria imensa vontade de rir, não fosse o caso de resultar em disparatada vingança que cria inegáveis prejuízos. Aliás, como ninguém lucra com tão baixa estratégia, estaremos perante mais um caso da tão afamada e rematada estupidez local.
Adiante. Em Monserrate, continuarei a partilhar convosco mais algumas notas sobre a campanha de restauro em curso no edifício. Depois de tanto abandono, foi sustida a criminosa degradação de que José Alfredo dava conta através das palavras que dele citei. Justo é lembrar que, mal Serra Lopes, de péssima memória,* deixou a administração da Monte da Lua, logo se iniciou a regeneração que, agora, já não pode parar.
Singular biblioteca
Da biblioteca, falou a Arq. Luísa Cortesão, com o pormenor e interesse que a recuperação da sala lhe merece, através da intervenção em curso, absolutamente modelar, que compreende todas as vertentes em presença, dos estuques, à pintura, ao papel de parede, ao mobiliário, estruturas de madeira e cantaria. Por manifesta falta de espaço para entrar em fascinantes pormenores, apenas concedo à minha interlocutora uma breve explicitação.
“Por exemplo, esta sala (biblioteca) apresentava um friso de papel de parede tipo flock paper (papel de veludo) que, em virtude do avançado estado de degradação, não é susceptível de conservação. Assim, vai ser substituído por uma cópia fiel que respeita a fabricação tradicional. Mas vamos conservar uma amostra do original para exposição museológica.
Por outro lado, o papel decorativo, em imitação de madeira, que revestia o tecto, estava de tal modo degradado que não houve alternativa. Tem de ser substituído. No entanto, o novo papel será executado com técnicas e materiais absolutamente semelhantes ao original. E, na altura de reaplicar, será deixada uma janela com o papel preexistente”.
Por estes pequenos detalhes, desde logo se percebe estarmos em presença de uma verdadeira responsável, não daqueles que costumo grafar a itálico ou com aspas… Podemos confiar no modo como ali se pratica a recuperação do património, portanto, no respeito pela verdade dos indícios que se encontram, na permanente necessidade de os preservar para o futuro, já que cada peça é suposto contar a história da passagem do tempo e de como o tempo por ela passou.
(continua)
………………………………………
* A propósito, quando teremos o privilégio de conhecer o resultado das sindicâncias várias, das devassas do Ministério Público à gestão do biólogo que, durante anos sucessivos, têm impedido o Senhor Presidente da Câmara de responder aos meus sistemáticos pedidos de esclarecimento? Ou alguém pensa que a coisa está esquecida?
quinta-feira, 11 de dezembro de 2008
Bons caminhos...
Ontem, perante a notícia do lançamento da auto-estrada para Bragança - onde e quando é que eu já ouvi e vi anunciar a mesma ou semelhante coisa? - mais uma vez, não consegui deixar de lembrar duas situações que com ela estão relacionadas.
Vamos por ordem cronológica. A primeira envolve o Dr. Emílio Rui Vilar que, sabiamente, soube afastar-se da vida partidária, em tempo oportuníssimo, não se deixando emporcalhar com uma classe política que está muito, muito abaixo do seu nível. Aliás, por alguma coisa, convenhamos, o Rui Vilar, já há uma série de anos é Presidente da Fundação Calouste Gulbenkian, enquanto seus amigos e conhecidos não passam de ministros de sucessivos e desacreditados governos deste pobre país.
Há muitos anos, quando ele próprio desempenhou cargos governativos, em especial, como Ministro dos Transportes e Comunicações do I Governo Cinstitucional (1976-78) Rui Vilar ousou afirmar que Portugal não precisava de auto-estradas mas, isso sim, de uma bem concebida rede de boas vias rápidas. Naturalmente, logo se fizeram ouvir as vozes daqueles que perspectivavam a oportunidade de excelentes negócios, através de obras de maior vulto e de maior envolvimento de capitais públicos que sempre dão umas boas comissões...
Em segundo lugar, recordo o famigerado IP4. Desde que foi inaugurado, já ceifou a vida a 250 pessoas, gerando incontáveis prejuízos materiais e morais. No fim de um ano de abertura ao tráfego, ouvi eu o então director da Junta Autónoma das Estradas afirmar que, efectivamente, em vez daquela, podia ter sido construída uma estrada mais segura, técnica e perfeitamente possível. Mas os custos de construção seriam muito mais elevados...
Ou seja, construiu-se uma estrada daquelas, perigosíssima, poupando nos custos, independentemente das consequências, mesmo que tivessem significado vidas perdidas, outras destroçadase o inevitável cortejo de efeitos colaterais. A isto chama-se crime. Na verdade, o crime tem muitos contornos, inclusive estes, de uma obra púbica que foi concretizada, sabendo de antemão que os conhecidos e nefastos efeitos não se fariam esperar.
Sabem quem era o Ministro das Obras Públicas de então? Nem mais nem menos do que o Engº Ferreira do Amaral que, mais tarde, até foi candidato à Presidência da República. Passou por uma campanha eleitoral sem que ninguém, adversários políticos, jornalistas, o tivesse confrontado com a responsabilidade implícita no despautério do IP4.
Ontem o primeiro ministro Pinto de Sousa gritava que construir a auto-estrada para Bragança era poupar vidas. Continua a não haver quem possa contestar que não é preciso construir auto-estradas para poupar vidas. Basta construir e manter - sublinho o aspecto da manutenção - boas estradas nacionais e vias rápidas. A receita não é original. Veja-se o bem conhecido caso da Irlanda.
Claro que nada disto constitui motivo de riso. Pelo contrário. Todavia, adivinho que, no seu gabinete da Av. de Berna, Rui Vilar não deixará de sorrir... Este homem, sabem, é daqueles que tem pinta de grande estadista. É um homem profundamente informado e culto, capaz de liderar uma equipa de administradores de uma grande Fundação, perspectivando o modo de enquadrar e vencer os desafios do futuro.
Pinto de Sousa, pelo contrário, embora primeiro-ministro, só é estadista porque ocupa funções de Estado. Fundamental e essencialmente, dele não guardará o país marca que se veja. Permaneerá, estou certo, não a marca, antes a imagem que mais se articula com a daquele bem típico caso de engenheiro assumindo a total responsabilidade pela concepção dos lindos projectos, na Beira profunda, que a comunicação social se encarregou de divulgar.
Ontem, perante a notícia do lançamento da auto-estrada para Bragança - onde e quando é que eu já ouvi e vi anunciar a mesma ou semelhante coisa? - mais uma vez, não consegui deixar de lembrar duas situações que com ela estão relacionadas.
Vamos por ordem cronológica. A primeira envolve o Dr. Emílio Rui Vilar que, sabiamente, soube afastar-se da vida partidária, em tempo oportuníssimo, não se deixando emporcalhar com uma classe política que está muito, muito abaixo do seu nível. Aliás, por alguma coisa, convenhamos, o Rui Vilar, já há uma série de anos é Presidente da Fundação Calouste Gulbenkian, enquanto seus amigos e conhecidos não passam de ministros de sucessivos e desacreditados governos deste pobre país.
Há muitos anos, quando ele próprio desempenhou cargos governativos, em especial, como Ministro dos Transportes e Comunicações do I Governo Cinstitucional (1976-78) Rui Vilar ousou afirmar que Portugal não precisava de auto-estradas mas, isso sim, de uma bem concebida rede de boas vias rápidas. Naturalmente, logo se fizeram ouvir as vozes daqueles que perspectivavam a oportunidade de excelentes negócios, através de obras de maior vulto e de maior envolvimento de capitais públicos que sempre dão umas boas comissões...
Em segundo lugar, recordo o famigerado IP4. Desde que foi inaugurado, já ceifou a vida a 250 pessoas, gerando incontáveis prejuízos materiais e morais. No fim de um ano de abertura ao tráfego, ouvi eu o então director da Junta Autónoma das Estradas afirmar que, efectivamente, em vez daquela, podia ter sido construída uma estrada mais segura, técnica e perfeitamente possível. Mas os custos de construção seriam muito mais elevados...
Ou seja, construiu-se uma estrada daquelas, perigosíssima, poupando nos custos, independentemente das consequências, mesmo que tivessem significado vidas perdidas, outras destroçadase o inevitável cortejo de efeitos colaterais. A isto chama-se crime. Na verdade, o crime tem muitos contornos, inclusive estes, de uma obra púbica que foi concretizada, sabendo de antemão que os conhecidos e nefastos efeitos não se fariam esperar.
Sabem quem era o Ministro das Obras Públicas de então? Nem mais nem menos do que o Engº Ferreira do Amaral que, mais tarde, até foi candidato à Presidência da República. Passou por uma campanha eleitoral sem que ninguém, adversários políticos, jornalistas, o tivesse confrontado com a responsabilidade implícita no despautério do IP4.
Ontem o primeiro ministro Pinto de Sousa gritava que construir a auto-estrada para Bragança era poupar vidas. Continua a não haver quem possa contestar que não é preciso construir auto-estradas para poupar vidas. Basta construir e manter - sublinho o aspecto da manutenção - boas estradas nacionais e vias rápidas. A receita não é original. Veja-se o bem conhecido caso da Irlanda.
Claro que nada disto constitui motivo de riso. Pelo contrário. Todavia, adivinho que, no seu gabinete da Av. de Berna, Rui Vilar não deixará de sorrir... Este homem, sabem, é daqueles que tem pinta de grande estadista. É um homem profundamente informado e culto, capaz de liderar uma equipa de administradores de uma grande Fundação, perspectivando o modo de enquadrar e vencer os desafios do futuro.
Pinto de Sousa, pelo contrário, embora primeiro-ministro, só é estadista porque ocupa funções de Estado. Fundamental e essencialmente, dele não guardará o país marca que se veja. Permaneerá, estou certo, não a marca, antes a imagem que mais se articula com a daquele bem típico caso de engenheiro assumindo a total responsabilidade pela concepção dos lindos projectos, na Beira profunda, que a comunicação social se encarregou de divulgar.
terça-feira, 9 de dezembro de 2008
Cartão de visita
Se qualquer dúvida existisse quanto à falta de pudor dos designados responsáveis sintrenses, bastaria passar pela Volta do Duche e olhar o que se passa, à quota baixa, junto ao parque de estacionamento do Rio do Porto.
Os painéis da autoria do pintor Leonel Moura, ali colocados e inaugurados no dia de São Pedro, no ano de 2005, não foram assumidos como serviço de tapa-vergonhas das arruinadas casas cujas fachadas cobriram. Todavia, de facto, por mais que, na altura, o Vereador Cardoso Martins dissesse em contrário, foi exactamente esse o objectivo.
Claro que as casas continuam cada vez mais arruinadas. Naturalmente, os próprios painéis também já se degradaram. Por mais que, tanto eu como o Pedro Macieira, chamemos a atenção para o desconchavo, os senhores autarcas permitem-se dar esta nota de terceiro mundo como cartão de visita. Mas há mais testemunhos, nas Escadinhas do Hospital, ou ainda, por exemplo, na massacrada Rua da Pendôa.
Qualquer dia passam mesmo a constituir o novo ex-libris de Sintra. E, diga-se de passagem, muito a propósito, pois tais senhores já trataram de assumir um modo de ser e de estar muito próprio. Ou seja, tal como as donas de casa badalhocas, que deitam o pó para debaixo dos tapetes, os edis sintrenses, mascaram a fachada dos prédios, dando a entender que é uma atitude artística performativa.
Piois é, gato escondido... Não contentes, coitados, ainda se permitem continuar a reforçar a estratégia na quadra natalícia, atirando mais poeira para os olhos do povo, à mistura com umas centenas de milhar de lâmpadas que, não esquecem, são de baixo consumo.
Por mim, continuo a invocar São Judas Tadeu. Para os casos desesperados não há melhor. Sabem, é o advogado dos impossíveis...
quinta-feira, 4 de dezembro de 2008
Mais poeira para os olhos?
Miguel Carretas, da CDU:
“Não estaremos a permitir um projecto de construção imobiliária a cavalo de um Projecto de Potencial Interesse Nacional (PIN) apoiado pela Câmara para que possa ser adquirido direito de construção? A Media Capital irá adquirir 50 hectares por um valor simbólico de 1000 euros, mas a área em questão é maior. Trata-se de um terreno de cerca de 200 hectares, 50 deles em reserva ecológica e agrícola, e é esse nesse espaço que se pretende instalar a Cidade do Cinema, um projecto PIN. O protocolo celebrado com a autarquia pressupõe uma candidatura aos projectos PIN e a elaboração de um Plano de Pormenor, condições sem as quais o projecto poderá não avançar. Quando este plano tiver de ser aprovado por esta assembleia, vamos assistir a uma chantagem política, porque quem votar contra será acusado de não querer desenvolvimento para Sintra”.
Fernando Seara, Presidente da Câmara Municipal de Sintra:
Nenhuma questão respeitante à Cidade do Cinema será desenvolvida sem vir à Câmara e à Assembleia Municipal. Não permitirei que em alguns casos seja aprovado o PIN e qualquer operação urbanística e noutros não seja, na margem norte ou na margem sul, no Algarve ou no Litoral Centro. Se cumprir as regras, será aprovado e os outros mecanismos terão que ser aprovados pela Assembleia Municipal”.
[última reunião da Assembleia Municipal de Sintra]
Hoje, dia 4 de Dezembro, não se fala noutra coisa. Uma das mais controversas situações é, naturalmente, a que se prende com a hipótese de concretizar um projecto com esta escala e características em área classificada como reserva ecológica nacional. É inconcebível a ligeireza com que uma autarquia, cujo executivo se reclama de prudente e lúcido, se permite avançar para uma polémica deste calibre.
Que o território deste concelho é dos mais apetecíveis a nível nacional e internacional, para a promoção de negociatas de alto nível, já nós sabemos há muito tempo. Se bem recordados estão, ainda no consulado de Edite Estrela, coisa parecida nos bateu à porta. A famiigerada Sintralândia, que foi dada como facto consumado, também chegou a ser protocolada e tudo o mais.
Dessa vez os signatários eram mais institucionais, ou seja, a Câmara Municipal de Sintra e o Ministério da Defesa já que os terrenos, também classificados, eram pertença da Força Aérea. O grande promotor era uma multinacional, a Cameron International, que ficou a ver navios porque, espantem-se, o Prof. Fernando Seara, muito discreta e eficazmente, acabou com qualquer hipótese de concretizar o negócio de um parque fantasia de duvidosos contornos.
Agora, o mesmo edil, não considera qualquer inconveniente em patrocinar a Cinelândia. Enfim, para quem não está disposto a admitir dualidade de critérios, é algo caricato... Igualmente, não deixa de ser curioso que, em ambas as circunstâncias, se tenha invocado o grande argumento dos postos de trabalho que se geram. Sabem que mais? Se, para gerar postos de trabalho, uma comunidade se dispõe a dar de barato valores tão especiais como os que estão em causa, então não passa de nítida forma de abastardamento, de claro aviltamento.
Se a Sintralândia foi ontem, hoje são o Pego e a Cinelândia. Por extensão de abrangência, também o hospital que não aparece, ou a universidade que se vê por um canudo. E ainda os desmandos na zona de Seteais, a desgraça do centro histórico - criminosamente a caír aos bocados quando, diz-se insistentemente, podia estar a ser beneficiado com verbas provenientes do jogo - o estacionamento que não se resolve nem se vislumbra...
Não acham mesmo que o crédito para este negócio já se esgotou? Não acham mesmo que, para este peditório... Não basta de poeira para os olhos?
Miguel Carretas, da CDU:
“Não estaremos a permitir um projecto de construção imobiliária a cavalo de um Projecto de Potencial Interesse Nacional (PIN) apoiado pela Câmara para que possa ser adquirido direito de construção? A Media Capital irá adquirir 50 hectares por um valor simbólico de 1000 euros, mas a área em questão é maior. Trata-se de um terreno de cerca de 200 hectares, 50 deles em reserva ecológica e agrícola, e é esse nesse espaço que se pretende instalar a Cidade do Cinema, um projecto PIN. O protocolo celebrado com a autarquia pressupõe uma candidatura aos projectos PIN e a elaboração de um Plano de Pormenor, condições sem as quais o projecto poderá não avançar. Quando este plano tiver de ser aprovado por esta assembleia, vamos assistir a uma chantagem política, porque quem votar contra será acusado de não querer desenvolvimento para Sintra”.
Fernando Seara, Presidente da Câmara Municipal de Sintra:
Nenhuma questão respeitante à Cidade do Cinema será desenvolvida sem vir à Câmara e à Assembleia Municipal. Não permitirei que em alguns casos seja aprovado o PIN e qualquer operação urbanística e noutros não seja, na margem norte ou na margem sul, no Algarve ou no Litoral Centro. Se cumprir as regras, será aprovado e os outros mecanismos terão que ser aprovados pela Assembleia Municipal”.
[última reunião da Assembleia Municipal de Sintra]
Hoje, dia 4 de Dezembro, não se fala noutra coisa. Uma das mais controversas situações é, naturalmente, a que se prende com a hipótese de concretizar um projecto com esta escala e características em área classificada como reserva ecológica nacional. É inconcebível a ligeireza com que uma autarquia, cujo executivo se reclama de prudente e lúcido, se permite avançar para uma polémica deste calibre.
Que o território deste concelho é dos mais apetecíveis a nível nacional e internacional, para a promoção de negociatas de alto nível, já nós sabemos há muito tempo. Se bem recordados estão, ainda no consulado de Edite Estrela, coisa parecida nos bateu à porta. A famiigerada Sintralândia, que foi dada como facto consumado, também chegou a ser protocolada e tudo o mais.
Dessa vez os signatários eram mais institucionais, ou seja, a Câmara Municipal de Sintra e o Ministério da Defesa já que os terrenos, também classificados, eram pertença da Força Aérea. O grande promotor era uma multinacional, a Cameron International, que ficou a ver navios porque, espantem-se, o Prof. Fernando Seara, muito discreta e eficazmente, acabou com qualquer hipótese de concretizar o negócio de um parque fantasia de duvidosos contornos.
Agora, o mesmo edil, não considera qualquer inconveniente em patrocinar a Cinelândia. Enfim, para quem não está disposto a admitir dualidade de critérios, é algo caricato... Igualmente, não deixa de ser curioso que, em ambas as circunstâncias, se tenha invocado o grande argumento dos postos de trabalho que se geram. Sabem que mais? Se, para gerar postos de trabalho, uma comunidade se dispõe a dar de barato valores tão especiais como os que estão em causa, então não passa de nítida forma de abastardamento, de claro aviltamento.
Se a Sintralândia foi ontem, hoje são o Pego e a Cinelândia. Por extensão de abrangência, também o hospital que não aparece, ou a universidade que se vê por um canudo. E ainda os desmandos na zona de Seteais, a desgraça do centro histórico - criminosamente a caír aos bocados quando, diz-se insistentemente, podia estar a ser beneficiado com verbas provenientes do jogo - o estacionamento que não se resolve nem se vislumbra...
Não acham mesmo que o crédito para este negócio já se esgotou? Não acham mesmo que, para este peditório... Não basta de poeira para os olhos?
terça-feira, 2 de dezembro de 2008
Criminoso esquecimento
No dia 18 de Novembro passado, faz hoje precisamente quinze dias, sugeri-vos um passeio em direcção ao sofisticado gozo deste especial Outono de Sintra. Escrevi que não era preciso ir muito longe para alcançar tal privilégio. Tratava-se de partir dos Pizões, passar pela Regaleira, descer a Trindade Coelho bem como o Caminho dos Frades e, diante da Quinta dos Alfinetes, voltar imediatamente à esquerda para entrar no Caminho dos Castanhais.
Hoje, pedir-vos-ia para repetirem e, uma vez aqui chegados, perceberem como eram justas e ajustadas as minhas palavras. Escrevia eu que estariam a entrar numa esquecida zona de Sintra. É verdade, esquecidos caminhos estes, embora a poucos metros do centro histórico. Mas, como espantar-se o caminhante? Então o próprio casco da mais nobre Sintra não está esquecido há décadas?
Aqui, para bom entendedor, esquecimento significa incúria. Significa cultura do desleixo de que fala Jorge Sampaio, com a sua voz de autorizado sintrense que, tal como tantos de nós, conheceu esta terra em muito melhores dias. É cruel termos de recuar dezenas de anos para vislumbrar o que era um lugar limpo e com carácter, igual a tantos outros, nacionais e estrangeiros que, apesar do progresso, não se descaracterizaram, não se degradaram e estão cada vez em melhor estado.
Mas voltemos ao Caminho dos Castanhais. Bastou ter chovido um pouco para ficar praticamente intransitável. Se ainda não tiverem feito o percurso, verão que aquilo é um bocado de terra batida, outro de empedrado e ainda pedaço de irregularíssima calçada, borrifada de umas gotas de alcatrão, antes de voltar à esquerda, a caminho das Escadinhas da Pendoa, com aquela obra embargada, nas trazeiras do Tivoli.
Um caminho que podia ser um sossego, entre belíssimas quintas (certo é que meio abandonadas...) está transformado em inqualificável desgosto. Em terra batida? Pois, sim senhor, não haveria qualquer problema desde que bem concebido, com valetas e sarjetas, para que não se transformasse naquele lamaçal que encontrarão se lá passarem.
Todavia, continua belíssimo o passeio. Sintra resiste. Até a estes responsáveis que a História da terra recordará como coveiros do desassossego, Sintra resiste. Sintra está doída, cheia de imerecidas feridas e ofensas. Um dia virá em que tudo isto vai alterar. Preciso é que passe o tempo.
Em Portugal, outros sinais nos ajudam a compreender como o subdesenvolvimento, o atraso, o analfabetismo e a iliteracia estão a montante destes quadros de miséria. Sim, não tenhamos dúvida, o Caminho dos Castanhais é algo que, noutros países europeus, em terra classificada como Paisagem Cultural, seria perfeitamente impensável. Por isso o apelido de quadro de miséria sem que me sinta a usar qualquer hipérbole.
Pensem noutros sinais, escrevia eu, por exemplo, como em terras de forte emigração, os filhos e netos dos que construiram aquelas inqualificáveis casas, hoje delas se envergonham... Também em Sintra, um dia virá em que os vindouros se envergonharão de um passado - que, para desdita nossa é o tempo presente - durante o qual autarcas, técnicos e os cidadãos em geral se deram ao luxo de tão mal tratar este lugar de eleição.
Sabem quem, nesse futuro, será recordado como a voz do desassossego? Indiscutivelmente, José Alfredo da Costa Azevedo, que não ficou a dever, fosse a quem fosse, a bofetada que se impunha. A mim e a vós apenas se impõe que sejamos dignos da voz sintrense desse bom homem.
No dia 18 de Novembro passado, faz hoje precisamente quinze dias, sugeri-vos um passeio em direcção ao sofisticado gozo deste especial Outono de Sintra. Escrevi que não era preciso ir muito longe para alcançar tal privilégio. Tratava-se de partir dos Pizões, passar pela Regaleira, descer a Trindade Coelho bem como o Caminho dos Frades e, diante da Quinta dos Alfinetes, voltar imediatamente à esquerda para entrar no Caminho dos Castanhais.
Hoje, pedir-vos-ia para repetirem e, uma vez aqui chegados, perceberem como eram justas e ajustadas as minhas palavras. Escrevia eu que estariam a entrar numa esquecida zona de Sintra. É verdade, esquecidos caminhos estes, embora a poucos metros do centro histórico. Mas, como espantar-se o caminhante? Então o próprio casco da mais nobre Sintra não está esquecido há décadas?
Aqui, para bom entendedor, esquecimento significa incúria. Significa cultura do desleixo de que fala Jorge Sampaio, com a sua voz de autorizado sintrense que, tal como tantos de nós, conheceu esta terra em muito melhores dias. É cruel termos de recuar dezenas de anos para vislumbrar o que era um lugar limpo e com carácter, igual a tantos outros, nacionais e estrangeiros que, apesar do progresso, não se descaracterizaram, não se degradaram e estão cada vez em melhor estado.
Mas voltemos ao Caminho dos Castanhais. Bastou ter chovido um pouco para ficar praticamente intransitável. Se ainda não tiverem feito o percurso, verão que aquilo é um bocado de terra batida, outro de empedrado e ainda pedaço de irregularíssima calçada, borrifada de umas gotas de alcatrão, antes de voltar à esquerda, a caminho das Escadinhas da Pendoa, com aquela obra embargada, nas trazeiras do Tivoli.
Um caminho que podia ser um sossego, entre belíssimas quintas (certo é que meio abandonadas...) está transformado em inqualificável desgosto. Em terra batida? Pois, sim senhor, não haveria qualquer problema desde que bem concebido, com valetas e sarjetas, para que não se transformasse naquele lamaçal que encontrarão se lá passarem.
Todavia, continua belíssimo o passeio. Sintra resiste. Até a estes responsáveis que a História da terra recordará como coveiros do desassossego, Sintra resiste. Sintra está doída, cheia de imerecidas feridas e ofensas. Um dia virá em que tudo isto vai alterar. Preciso é que passe o tempo.
Em Portugal, outros sinais nos ajudam a compreender como o subdesenvolvimento, o atraso, o analfabetismo e a iliteracia estão a montante destes quadros de miséria. Sim, não tenhamos dúvida, o Caminho dos Castanhais é algo que, noutros países europeus, em terra classificada como Paisagem Cultural, seria perfeitamente impensável. Por isso o apelido de quadro de miséria sem que me sinta a usar qualquer hipérbole.
Pensem noutros sinais, escrevia eu, por exemplo, como em terras de forte emigração, os filhos e netos dos que construiram aquelas inqualificáveis casas, hoje delas se envergonham... Também em Sintra, um dia virá em que os vindouros se envergonharão de um passado - que, para desdita nossa é o tempo presente - durante o qual autarcas, técnicos e os cidadãos em geral se deram ao luxo de tão mal tratar este lugar de eleição.
Sabem quem, nesse futuro, será recordado como a voz do desassossego? Indiscutivelmente, José Alfredo da Costa Azevedo, que não ficou a dever, fosse a quem fosse, a bofetada que se impunha. A mim e a vós apenas se impõe que sejamos dignos da voz sintrense desse bom homem.
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