[sempre de acordo com a antiga ortografia]
quarta-feira, 26 de setembro de 2012
Uma questão de tempo
[texto publicado hoje no facebook]
Tenho a perfeita noção de que, da minha parte, é um atrevimento propor a audição de um documento com as características deste, no efémero, rápido, descartável e superficial suporte como é o facebook. Neste caso, fundamentalmente, coloca-se uma questão de tempo, de dispor de tempo para aceder à obra de Arte.
Para ouvir a Missa de Santa Cecilia de Haydn, é preciso contar com cerca de uma hora e um quarto. Muito poucos são os privilegiados que podem proporcionar-se este tempo. Mas não há duas hipóteses, o deleite é possível mas exigente.
E o Tempo, categoria essencial, o tempo, ingrediente essencial da Música, o indefinível tempo, que exige uma gestão tão sofisticada, é um bem precioso, o mais caro de todos os bens. De facto, não é para todos.
Mas, para os que puderem dar-se a este autêntico luxo, aí tendes, em interpretação de grande sabedoria e gabarito, uma obra soleníssima, de de superior espiritualidade, que, sem dúvida alguma, introduzirá notas muito especiais no vosso dia.
Boa audição!
[Texto publicado na edição de 21 de Setembro de 2012 do 'Jornal de Sintra']
Luta contínua
Apenas o facto de ter estado envolvido, pessoal e directamente, numa série de atitudes de denúncia de situações cujo contexto impunha uma inadiável e inquestionável intervenção cívica, impede que vá esquecendo alguns eventos que, para a maioria dos sintrenses, naturalmente, já fazem parte de um quase longínquo e esfumado passado.
Com o objectivo de ilustrar o que me ocorre partilhar hoje convosco, basta recorrer a lembranças muito vivas, por exemplo, à da luta pela preservação do património que a Volta do Duche representa para munícipes e visitantes, de altíssimo valor real e simbólico, prestes a ser totalmente desvirtuado e destruído, acabando por suscitar uma significativa movimentação cívica, cujo sucesso muito dependeu do modo sistemático como a comunicação social local e nacional cobriu o assunto em altura de campanha eleitoral autárquica.
E já lá vai uma dúzia de anos, desde o momento em que, a menos de um mês das eleições, era preciso mobilizar os cidadãos, através de uma estratégia de comunicação que, não dispondo de quaisquer meios materiais para o efeito, não só conseguiu que os media se interessassem, mas também foi ao encontro de intelectuais de todos os domínios e quadrantes, de professores universitários, de gente das de letras e das artes que, de facto, revelariam uma cumplicidade imprescindível à demonstração de que se estava na iminência de um autêntico crime de lesa cultura.
Muita gente veio para a rua demonstrar como estava contra um projecto de parque de estacionamento tão contundente. Não que não se impusesse resolver o problema do estacionamento das viaturas cujos condutores demandam o centro histórico em pleno coração da sede do concelho. Claro que sim, mas não de acordo com aquele projecto, ainda que subscrito pelo saudoso Fernando Távora, um dos mais notáveis arquitectos portugueses.
E, sem qualquer margem para dúvida, através da sua participação cívica num protesto generalizado, os munícipes demonstravam a todos e, em particular, a quem se candidatava, como era importante estar do seu lado. Eleitores e potenciais eleitos conheciam-se ou reconheceram-se através da acção, numa página de democracia vivida, que nunca será demais recordar. E, nos termos do implícito contrato que ali se jogava, os eleitos cumpriram a promessa, não levando avante um processo que até já estava em adiantada fase de compromissos.
No entanto, de sinal oposto ao deste êxito inequívoco, poderia alinhar uma série de situações em que, malgrado idêntico empenho pessoal, as coisas se passaram num ritmo muito mais lento, como no caso da Parques de Sintra Monte da Lua. Desde o início da sua instalação, quantos anos de contínuo escrutínio, apontando omissões e decisões controversas, foram necessários até à garantia da bonança trazida pela actual administração?
E o peso dos insucessos, sempre na sequência de mais ou menos longos percursos de sistemática actuação de denúncia, de casos absolutamente paradigmáticos e que jamais deveriam ter acontecido? Como a memória é curta, permitam que apenas lembre Seteais, desde o episódio do encerramento do terreiro à destruição do tanque e sua transformação em prosaica casa de máquinas e, do outro lado da estrada, na Quinta do Vale dos Anjos, como se constrói uma grande vivenda, a cota mais alta do que o edifício classificado a umas poucas dezenas de metros.
Pois é, meus amigos, perante a cupidez do individualismo à solta, nem sempre vencem o geral interesse da comunidade nem os superiores valores culturais que urge defender. Assim sendo, quem se envolve nestas lutas – sempre procurando todas as cumplicidades possíveis e desejáveis, posto que se impõe dar o braço a muita gente – também tem de contar com a força da barbárie.
Um merecido reconhecimento, por ocasião da entrega da medalha de ouro do Município de Sintra, a 28 de Setembro na Regaleira
http://reinodeklingsor.blogspot.pt/2012/09/tributo-joao-de-oliveira-cachado.html
Escolher bem
[texto publicado no facebook em 20 de Setembro]
Mesmo nada tendo a ver com a vida do partido da São Caetano à Lapa, como vivemos num Estado Democrático de Direito, sempre que há eleições legislativas, é o Presidente do PSD que teremos de aceitar como Primeiro-Ministro se a maioria dos votos apontar nesse sentido.
Ora bem, perante o descalabro da liderança de Pedro Passos Coelho, muito bom será – e já vai sendo tempo que assim aconteça – que os militantes do PSD aproveitem a oportunidade e percebam como é vital distinguir os reais méritos de quem se perfila como candidato à presidência do seu partido.
Se quaisquer dúvidas subsistissem, esta actual e tão grave crise em que estamos mergulhados, suscitada por tanta incompetência pessoal, em todos os domínios, vem demonstrar aos portugueses, em geral e aos militantes do PSD, em particular, que saber escolher um presidente de partido não é bem a mesma coisa que decidir por este ou aquele detergente.
Fez muito mal o PSD que teve oportunidade mas decidiu não considerar a hipótese de ser liderado por alguém com muito melhores créditos e evidente gabarito. Naturalmente, refiro-me a Paulo Rangel.
Conheci o professor João de
Oliveira Cachado a 17 de Novembro de 2006, quando a ainda jovem Alagamares
entendeu empreender uma campanha pelo restauro do então abandonado Chalé da
Condessa d’Edla, no Parque da Pena. Técnico de educação e pedagogo, ligado
anteriormente também à Escola Profissional de Recuperação do Património de
Sintra, dele pudemos então escutar valiosas informações sobre o trabalho de
campo já executado por essa escola em prol da reabilitação do local, e as suas
ponderadas e fundamentadas palavras denotadoras dum vasto conhecimento das
patologias e carências na recuperação da jóia da coroa, sangrando esfaqueada por
supostos guardiães usurpadores e acossada pela incúria, para muitos
provavelmente “romântica” até.
Desde essa noite, nasceu e
consolidou-se um sentimento de respeito e consideração que nos aproximou civica
e intelectualmente, tendo desde então mantido contactos regulares que se
traduziram no acompanhamento das iniciativas tendentes ao restauro do chalé (e
de que destaco, entre várias, a jornada cívica de 4 de Março de 2008, com a
visita não autorizada de um punhado de sintrenses ao local ainda em ruínas, à
cabeça dos quais se destacou Maria Almira Medina, foto abaixo) e posteriormente
as denúncias em torno da usurpação dos jardins de Seteais durante o período de
obras que afrontou a carta de aforamento de 1801, entre outras causas.
Presença frequente na
imprensa local e na blogosfera, dele se ouviram e ouvem avisadas palavras e
opiniões denunciando ou contestando a perpretação de atentados ou desatenções do
poder em temas como o tanque de Seteais e as construções ali erigidas em zona
sensível, a frustrada aquisição da Quinta do Relógio, o caravanismo selvagem no
Rio do Porto, a falta de legendas explicativas em muitos dos locais simbólicos
de Sintra ou a limpeza e falta de civismo que a consciência de todos convoca,
como cidadãos, munícipes e sintrenses.
Melómano inveterado,
entusiasta militante da Mozartwoche de Salzburgo, que nunca perde, perdendo-se
no perfume inebriante da sua música, pedonal caminheiro dos “seis quilómetros à
hora”, como a si próprio se define, Sintra habitou-se há muito à sua voz
independente, construtiva, e acima de tudo, cidadã, duma estirpe que hoje vai
rareando e nos relembra emocionados um José Alfredo ou um Francisco Costa,
guerreiros da pena e príncipes da palavra, D.Fernando ou o Carvalho da Pena, os
jardineiros de Deus.
No próximo dia 28 de
Setembro, no momento em que a brisa da tarde e um derradeiro ressoar de cascos
de cavalo quebrar o torpor e os silêncios da serra sagrada, regressando à vila,
os homens, finitos e tangíveis, tratarão de se reconciliar exorcizando o
Silêncio e saudando o Homem, momento em que a edilidade de Sintra irá
homenageá-lo na Quinta da Regaleira, num merecido acto simbólico, felizmente
certeiro, no espaço e no tempo. Escreveu ele de si
próprio:
“Sem dar muito pelo
tempo que passa, a verdade é que há cinquenta anos que celebro a música
constantemente, em directo, em Portugal e por essa Europa fora, especialmente,
em Salzburg onde, há muito tempo, fiquei preso, perfeitamente cativo. De facto,
tenho o incrível privilégio e o invejável poder de marcar a agenda da minha vida
a partir dos compromissos musicais.
(…)No meu caso pessoal, não será preciso fazer um grande esforço para perceber como o melómano se confunde com o diletante, com o viajante, e, em certos casos, com o de peregrino, como acontece com Salzburg (tão especialmente, no Inverno, por altura da Mozartwoche) ou Bayreuth, sempre em busca do instantâneo momento em que Arte, Beleza e a centelha do Divino acontecem”.
(…)No meu caso pessoal, não será preciso fazer um grande esforço para perceber como o melómano se confunde com o diletante, com o viajante, e, em certos casos, com o de peregrino, como acontece com Salzburg (tão especialmente, no Inverno, por altura da Mozartwoche) ou Bayreuth, sempre em busca do instantâneo momento em que Arte, Beleza e a centelha do Divino acontecem”.
Como escreveu Oscar Wilde,
“Chamamos Ética ao conjunto de coisas que as pessoas fazem quando todos
estão a olhar. O conjunto de coisas que as pessoas fazem quando ninguém olha ou
repara, chamamos Carácter”.
Parabéns e continue, João
Cachado! Sintra ainda tem Memória!
Conheci o professor João de
Oliveira Cachado a 17 de Novembro de 2006, quando a ainda jovem Alagamares
entendeu empreender uma campanha pelo restauro do então abandonado Chalé da
Condessa d’Edla, no Parque da Pena. Técnico de educação e pedagogo, ligado
anteriormente também à Escola Profissional de Recuperação do Património de
Sintra, dele pudemos então escutar valiosas informações sobre o trabalho de
campo já executado por essa escola em prol da reabilitação do local, e as suas
ponderadas e fundamentadas palavras denotadoras dum vasto conhecimento das
patologias e carências na recuperação da jóia da coroa, sangrando esfaqueada por
supostos guardiães usurpadores e acossada pela incúria, para muitos
provavelmente “romântica” até.
Desde essa noite, nasceu e
consolidou-se um sentimento de respeito e consideração que nos aproximou civica
e intelectualmente, tendo desde então mantido contactos regulares que se
traduziram no acompanhamento das iniciativas tendentes ao restauro do chalé (e
de que destaco, entre várias, a jornada cívica de 4 de Março de 2008, com a
visita não autorizada de um punhado de sintrenses ao local ainda em ruínas, à
cabeça dos quais se destacou Maria Almira Medina, foto abaixo) e posteriormente
as denúncias em torno da usurpação dos jardins de Seteais durante o período de
obras que afrontou a carta de aforamento de 1801, entre outras causas.
Presença frequente na
imprensa local e na blogosfera, dele se ouviram e ouvem avisadas palavras e
opiniões denunciando ou contestando a perpretação de atentados ou desatenções do
poder em temas como o tanque de Seteais e as construções ali erigidas em zona
sensível, a frustrada aquisição da Quinta do Relógio, o caravanismo selvagem no
Rio do Porto, a falta de legendas explicativas em muitos dos locais simbólicos
de Sintra ou a limpeza e falta de civismo que a consciência de todos convoca,
como cidadãos, munícipes e sintrenses.
Melómano inveterado,
entusiasta militante da Mozartwoche de Salzburgo, que nunca perde, perdendo-se
no perfume inebriante da sua música, pedonal caminheiro dos “seis quilómetros à
hora”, como a si próprio se define, Sintra habitou-se há muito à sua voz
independente, construtiva, e acima de tudo, cidadã, duma estirpe que hoje vai
rareando e nos relembra emocionados um José Alfredo ou um Francisco Costa,
guerreiros da pena e príncipes da palavra, D.Fernando ou o Carvalho da Pena, os
jardineiros de Deus.
No próximo dia 28 de
Setembro, no momento em que a brisa da tarde e um derradeiro ressoar de cascos
de cavalo quebrar o torpor e os silêncios da serra sagrada, regressando à vila,
os homens, finitos e tangíveis, tratarão de se reconciliar exorcizando o
Silêncio e saudando o Homem, momento em que a edilidade de Sintra irá
homenageá-lo na Quinta da Regaleira, num merecido acto simbólico, felizmente
certeiro, no espaço e no tempo. Escreveu ele de si
próprio:
“Sem dar muito pelo
tempo que passa, a verdade é que há cinquenta anos que celebro a música
constantemente, em directo, em Portugal e por essa Europa fora, especialmente,
em Salzburg onde, há muito tempo, fiquei preso, perfeitamente cativo. De facto,
tenho o incrível privilégio e o invejável poder de marcar a agenda da minha vida
a partir dos compromissos musicais.
(…)No meu caso pessoal, não será preciso fazer um grande esforço para perceber como o melómano se confunde com o diletante, com o viajante, e, em certos casos, com o de peregrino, como acontece com Salzburg (tão especialmente, no Inverno, por altura da Mozartwoche) ou Bayreuth, sempre em busca do instantâneo momento em que Arte, Beleza e a centelha do Divino acontecem”.
(…)No meu caso pessoal, não será preciso fazer um grande esforço para perceber como o melómano se confunde com o diletante, com o viajante, e, em certos casos, com o de peregrino, como acontece com Salzburg (tão especialmente, no Inverno, por altura da Mozartwoche) ou Bayreuth, sempre em busca do instantâneo momento em que Arte, Beleza e a centelha do Divino acontecem”.
Como escreveu Oscar Wilde,
“Chamamos Ética ao conjunto de coisas que as pessoas fazem quando todos
estão a olhar. O conjunto de coisas que as pessoas fazem quando ninguém olha ou
repara, chamamos Carácter”.
Parabéns e continue, João
Cachado! Sintra ainda tem Memória!
terça-feira, 25 de setembro de 2012
[Texto publicado no 'Jornal de Sintra' em 14 de Setembro de 2012]
12/13, novo ano lectivo
Sob a aparência da regularidade de funcionamento, o Sistema Educativo fechou o ano lectivo anterior, e fervilhando de actividade durante os «meses de defeso» em que as aulas estão suspensas, foi concretizando as últimas operações preparatórias do recomeço da actividade lectiva. Entretanto, como sempre acontece, multiplicaram-se negociações sindicais e, em função dos recursos materiais cada vez mais escassos, as soluções encontradas são cada vez mais contundentes.
E aí estamos, no início de mais um ano lectivo, altura que, invariavelmente, costumamos relacionar com a maioria dos rituais de renovação cíclica, com todos os habituais e positivos sinais de esperança que acolhe e propicia, sempre constituindo momento de particular interesse, em função do muito significativo envolvimento de milhões de cidadãos e mobilização simultânea quer das famílias, pais e encarregados de educação, crianças e jovens estudantes, quer das escolas, professores e de todo o pessoal de apoio educativo.
1.Entre imensas, abordarei apenas três questões. No primeiro ciclo do básico, prosseguindo uma política extremamente controversa, concretizou-se o encerramento de mais de duzentas escolas. Sem entrar em detalhes, convém confirmar que, de modo algum, está provado que tal medida conduza a melhores rendimentos escolares. Só no que respeita à socialização, reparem que, obrigatoriamente, em idade muito precoce, as crianças são transportadas e mantidas, fora das suas pequenas comunidades de origem, durante dias inteiros, privando-se da proximidade da família e da vizinhança, numa altura das suas vidas em que tal factor é determinante e alicerce radical da sua personalidade.
2.Outro aspecto, igualmente nada pacífico, é o da introdução sistemática de momentos de avaliação externa, contribuindo para uma contraproducente hipervalorização das provas de exame e desnecessária perturbação. Tanto quanto consegui entender ao longo de todo o processo que resultou na indução desta solução, os seus objectivos gerais e específicos podem e devem alcançar-se através de outras medidas inerentes à pedagogia, à didáctica e à docimologia(1). A avaliação externa é inequivocamente indispensável mas, como em todos os domínios, sem exagero. Ridículo é, depois do mal feito, que o Ministro Crato se desdobre em declarações de desdramatização dos exames…
3.Muito problemático e sempre desafiante num país com as características do nosso, eis o caso do ensino profissional. Como sabem os meus habituais leitores, trata-se de tema que, por várias vezes, tenho trazido às páginas do Jornal de Sintra, em sucessivas e diferentes abordagens resultantes da minha actividade quer como Técnico Superior do Ministério da Educação quer como docente da Escola Profissional de Recuperação do Património de Sintra.
Parece que, finalmente, pretendendo que o ensino profissional abranja cerca de 50% das opções do Ensino secundário, o Governo teria acordado para esta fundamental vertente do Sistema educativo. No entanto, a forma lamentavelmente atabalhoada como o fez – uns dias mais tarde ainda exponencialmente agravada por uma carga punitiva relativa às vias vocacionais, mais precoces – acabou por gerar a maior confusão.
Por um lado, a ineficácia e a evidente incapacidade de comunicação dos actuais decisores políticos da 5 de Outubro, por outro, a pressa, a ligeireza e a proverbial impreparação dos trabalhadores da comunicação social, eis os ingredientes da mistura explosiva que põe em polvorosa a comunidade em geral, as famílias, os agentes educativos envolvidos e os alunos destinatários das medidas. Urge, de facto, que circule rápida e sistematicamente, toda a informação acerca destes cursos e que, neste contexto, complementarmente, os professores e os estudantes do 3º ciclo do básico possam visitar escolas profissionais, verificando como a opção é pertinente, exigente, eficaz, de grande empregabilidade e nunca vedando o acesso ao Ensino Superior.
A esperança, sempre
Neste início de ano lectivo, continuam a equacionar-se, e à procura de melhores soluções, aspectos importantíssimos como os dos recursos materiais e humanos afectos à designada Escola Inclusa, ao ensino e a aprendizagem dos alunos com necessidades educativas especiais, às específicas necessidades dos alunos provenientes de minorias étnicas, às áreas de enriquecimento curricular e o da lamentável ausência da Música como disciplina curricular dos Ensinos Básico e Secundário. Paralelamente, verificou-se o aumento do número de alunos por turma, a dispensa de um impressionante contingente de professores contratados e, não menos importante, que o Sistema Educativo está a dificultar o acesso às acções de formação do pessoal de apoio educativo.
Cumpre finalizar, não deixando de sublinhar que tudo isto acontece num quadro de referência em que, por via de um criticável economicismo, o enquadramento laboral se agigantou, à escala dos designados mega agrupamentos, onde a participação cívica e a democracia na escola são, cada vez mais, letra morta. Preocupante? Sem dúvida! Todavia, em cada ano que se inicia, a esperança renovada. Assim o determina o olhar expectante da criança que, ainda receosa, passa o portão da escola pela primeira vez.
(1) Docimologia, do grego dokimé, teste. É o estudo sistemático dos exames, em particular do sistema de atribuição de notas e dos comportamentos dos examinadores e examinados.
[João Cachado escreve de acordo com a antiga ortografia]
Mas que xaropada!
[texto publicado no facebook em 16 de Setembro]
Aparentemente, nunca como agora, as práticas médicas e a situação económico-financeira do país foram tratadas, com tamanha afinidade, nos media portugueses.
Com toda a franqueza, acabou-se-me a pachorra para suportar mais comparações, abrir as meninges a tantas metáforas e articular não menor cópia de tão sofisticadas alegorias em catadupa.
É de tal modo avassaladora e prolixa a originalidade de alguns analistas cá da praça que, às tantas, os xaropes colam-se às mais-valias, os antipiréticos acabam a desalavancar os juros da dívida soberana e os supositórios explodem nas emissões de obrigações...
Por favor, tenham dó!
Acordai! Acordai!
[Texto publicado, durante a própria manifestação, no dia 15 de Setembro. Esta seria a canção cantada pelo povo durante a manifestação seguinte, em frente ao Palácio de Belém]
Terá sido preciso tanto, terá sido preciso ser tão desrespeitado para que, finalmente, este povo tivesse erguido a cabeça e afirmado que sente, que é boa gente? Será que acordou? Bem, se aquilo não era o povo, então onde é que está o povo?!
Não é a primeira vez que, aqui mesmo nestas páginas, recorro a este poema de José Gomes Ferrreira. Hoje, por tudo quanto aconteceu por esse Portugal fora, nova e naturalmente se me tornou presente.
Acordai
acordai
homens que dormis
a embalar a dor
dos silêncios vis
vinde no clamor
das almas viris
arrancar a flor
que dorme na raíz
Acordai
acordai
raios e tufões
que dormis no ar
e nas multidões
vinde incendiar
de astros e canções
as pedras do mar
o mundo e os corações
Acordai
acendei
de almas e de sóis
este mar sem cais
nem luz de faróis
e acordai depois
das lutas finais
os nossos heróis
que dormem nos covais
Acordai!
Porém, indissociável da música que o celebrizou, ei-lo, canção heróica de Fernando Lopes Graça, na interpretação do Coro da Academia dos Amadores de Música.
Boa audição!
Terá sido preciso tanto, terá sido preciso ser tão desrespeitado para que, finalmente, este povo tivesse erguido a cabeça e afirmado que sente, que é boa gente? Será que acordou? Bem, se aquilo não era o povo, então onde é que está o povo?!
Não é a primeira vez que, aqui mesmo nestas páginas, recorro a este poema de José Gomes Ferrreira. Hoje, por tudo quanto aconteceu por esse Portugal fora, nova e naturalmente se me tornou presente.
Acordai
acordai
homens que dormis
a embalar a dor
dos silêncios vis
vinde no clamor
das almas viris
arrancar a flor
que dorme na raíz
Acordai
acordai
raios e tufões
que dormis no ar
e nas multidões
vinde incendiar
de astros e canções
as pedras do mar
o mundo e os corações
Acordai
acendei
de almas e de sóis
este mar sem cais
nem luz de faróis
e acordai depois
das lutas finais
os nossos heróis
que dormem nos covais
Acordai!
Porém, indissociável da música que o celebrizou, ei-lo, canção heróica de Fernando Lopes Graça, na interpretação do Coro da Academia dos Amadores de Música.
Boa audição!
Nunca nos vimos assim!
Perante a evolução dos acontecimentos e, nomeadamente, do alarme social desencadeado pelas intervenções, totalmente desadequadas, do Primeiro Ministro e do Ministro de Estado e das Finanças, ignorando as decisões do Tribunal Constitucional e mascarando os seus pressupostos, parece-me que tal subversão, impõe a necessidade de convocação do Conselho de Estado por parte do Presidente da Repúbica.
(escrevi este texto uns bons dias antes de o PR anunciar, de facto, a convocação do Conselho de Estado...)
E os ricos, Senhor?
[texto publicado no facebook em 11 de Setembro]
Está o país numa enorme expectativa, ansioso por conhecer a componente do Orçamento do Estado para 2013 correspondente à quota parte dos contribuintes que, até ao momento, com a complacência do próprio Governo, se têm furtado às medidas de austeridade que, tão drasticamente, estão atingido os trabalhadores por conta de outrem.
Tão canhestra foi a sua comunicação ao país que, agora, a única safa de Passos Coelho seria demonstrar, a toda uma comunidade ainda em estado de choque e perfeitamente escandalizada, que fez o anúncio que fez, precisamente naqueles termos e daquele modo, no sentido de encostar à parede os mais ricos e poderosos para, uns dias depois, lhes poder anunciar que acabou o regabofe.
Reparem como as coisas se conjugam. Só agora, com toda a visibilidade, depois de todos os comentadores terem libertado a bílis que tão elevada dose de ofensa produziu, após tão flagrante e nacional reacção de repulsa, é que o Primeiro Ministro estaria razoavelmente confortável para anunciar as mais duras medidas sobre os ricos e poderosos…
Seria muito bom se assim acontecesse mas, infelizmente, trata-se de cenário perfeitamente fantasioso. Entretanto, neste enquadramento, como fantasiar ainda não paga imposto, deixem-me especular quanto à hipótese de que teria chegado o momento de saber com que percentagem dos seus rendimentos, para debelar a crise, contribuiriam os capitalistas que jogam nas bolsas, conseguindo imaculadas e nunca tributadas mais-valias. Ah, fosse assim e teria chegado o momento de ajustar as primeiras contas com tais pessoas…
Pois até conviria que pudessem estar a sujeitar-se ao tratamento de que nunca deveriam ter escapado aqueles e outros visados que desviaram milhares de milhões para paraísos fiscais, financiando sabe-se lá que sujos negócios, e que acabaram por beneficiar de perdões fiscais e amnistias por crimes passíveis de penas até oito anos de prisão, através de uma manobra do fisco que acabou por «lavar» dinheiro tão suspeito.
Já bastaria de fantasia se, enfim, prestes a abandonar reino tão virtual, não deixássemos de conjecturar que, num verdadeiro Estado Democrático de Direito – e não num país em que os decisores políticos aspiram ao figurino da república das bananas, regime que mais convém às suas venais aspirações – tais desejos poderiam mesmo concretizar-se com a maior naturalidade…
Regressemos pois à crua realidade. Sem qualquer hipótese de sermos surpreendidos, mais dia menos dia, veremos que solução encontrou Passos Coelho para «compensar» a iniquidade que perpetrou e anunciou no passado dia 7. Saberemos que esforço vai ele pedir aos que mais podem, querem e mandam em Portugal. Tem autoridade democrática para o fazer, em tempo oportuno, devendo actuar de acordo com os princípios da igualdade e da proporcionalidade.
Apesar de habituado a mandar os princípios constitucionais às urtigas, determina a decência que o Primeiro Ministro apresente medidas que não o descredibilizem ainda mais. Uma vez atingido o limite da incompetência, muito bom seria que não ofendesse mais a nossa inteligência e, enquanto detentor máximo do poder executivo, que não afrontasse o poder judicial representado, ao mais alto nível, pelo Tribunal Constitucional.
[Texto publicado na última edição do 'Jornal de Sintra', 7 de Setembro de 2012]
Sintra,
legendas no património
De acordo com informação que obtive de boa fonte, será necessário consultar estatísticas de há quatorze anos, altura da Expo 98, para encontrar números análogos e tão gratificantes de visitas de turistas a Sintra análogos com os que estão a acontecer neste ano da graça de 2012. Em tempo de crise tão séria, eis uma notícia extremamente positiva para uma terra cujo perfil de vocação turística é indesmentível.
Precisamente a propósito desta primeira constatação, é de turismo que hoje me ocupo, aliás, como tantas e tantas vezes tenho feito, sempre com o objectivo de avançar com mais uma ou outra sugestão que, uma vez concretizadas, poderão melhorar situações objecto de reparo. E, de facto, como prova cabal do que acabo de escrever, socorrer-me-ei de um artigo que subscrevi há mais de sete anos, publicado nestas páginas do Jornal de Sintra, mais precisamente, na rubrica «Conselho Adiado», em 15 de Abril de 2005.
“Um turismo às claras…” era o título da peça que, entre outras preocupações, maior insistência fazia sobre a absoluta e vital obrigação de veicular toda a informação que é suposto fornecer a quem nos visita, acerca dos bens patrimoniais de inequívoco interesse que, felizmente, em Sintra, não faltam e se deparam a cada passo, instantânea e muito sinteticamente, com a maior eficácia. É a este propósito que reclamo a pertinência do título, uma vez que tal atitude equivale à «legendagem» do património.
Para que não me alongue, passarei já a citar: “(…) Consideremos, por exemplo, três casos paradigmáticos e contíguos: a Quinta da Regaleira, a Quinta do Relógio e o esplêndido monumento vivo que é aquele sobreiro mesmo à beira da estrada, à direita de quem, poucos metros adiante vai iniciar a subida da rampa. Nada, absolutamente nenhuma informação ali existe que esclareça o passante quanto à singularidade dos três manifestos de património.
No pelouro do turismo da autarquia, se confrontados com esta realidade, os responsáveis replicariam que o visitante, turista nacional ou estrangeiro, passa pela delegação do Turismo local onde é apetrechado de folhetos, de mapas e cumulado com documentação de todo o tipo, que lhe facilitará as deslocações, o respectivo esclarecimento. (…)
O mínimo que poderíamos ripostar é que uma coisa não invalida a outra. Pois sim senhor, não só todo o suporte documental de papel impresso mas também a informação que, in loco, deve estar disponível, através de placa ou painel informativo, de reduzidas dimensões, legível à curta distância de cerca de um metro, contendo apenas meia dúzia de frases imprescindíveis à localização da peça no tempo e no espaço, dando conta de qualquer episódio de interesse relevante.
Quanto aos exemplos em referência, cada edifício disporia de uma placa informando sobre a estética revivalista romântica da sua arquitectura, esclarecendo acerca dos proprietários iniciais promotores da construção, dos artistas envolvidos, das curiosidades mais notáveis tais como toda a simbologia maçónica da Regaleira, ou o facto histórico de D. Carlos e D. Amélia terem passado a lua de mel na Quinta do Relógio. A propósito da árvore, para além das referências botânicas identificativas da espécie, importaria divulgar os escritores que a ela se referiram.
Mais casos? Porque não Seteais, a pouca distância? Chegados ao portão de acesso, há placas que identificam o Palácio de Seteais apenas como hotel de luxo de determinada (…) Ali deveria existir informação acerca deste palácio do século XVIII, dos jardins de acesso livre e gratuito, do miradouro do qual se avista uma das mais impressionantes paisagens de Portugal, daquele arco de triunfo e o acontecimento ali celebrado, etc, etc. (…)”
Esta é matéria aliciante mas, como se pode verificar, que nada evidencia de particularmente inovador. Legendar o património, ou seja, disponibilizar uma placa que funcione como «cartão de identidade» da peça patrimonial é coisa perfeitamente corriqueira em todas as comunidades cujos responsáveis pelo turismo e património cultural há muito se renderam a esta prática tão simples mas tão eficaz de divulgação da sua riqueza.
Permitam que continue a citar o que então escrevi porque, infelizmente, as palavras que se seguem não perderam oportunidade.
Circuitos e sugestões
“(…) Outro exemplo, entre tantos referenciáveis. Em pleno coração do centro histórico, justificar-se-ia a existência de informação acerca da zona da Judiaria junto ao arco que lhe dá acesso, à esquerda de quem sobe a rua, a caminho da Periquita. E, em sentido contrário, outra placa ou painel referenciando a Rua do Açougue, remota reminiscência do as-soq árabe, mesmo sob a esplanada do Café Paris. Estas, apenas duas das etapas de passagem de um circuito medieval de Sintra, a promover com outros motivos do maior interesse.
Como não lembrar, igualmente, entre tantas que poderíamos citar, noutra zona da sede do concelho, as obras dos Arquitectos Norte Júnior, Adães Bermudes, Raul Lino, sem qualquer identificação? Naturalmente, a informação a disponibilizar, ainda que significativamente reduzida, obedeceria sempre a um mesmo modelo padrão de painel-placa, talvez com a aposição de um pequeno símbolo cromático, identificador de certo circuito (medieval, romântico, queiroziano ou outros) em coerente articulação com a que aparece nos folhetos turísticos, tanto em termos do estilo informativo como no aspecto gráfico.
Será difícil pôr em marcha semelhante plano de identificação e divulgação de todos os lugares de interesse de Sintra? Será difícil de entender que este tipo de informação é, pelo menos, tão essencial como o dos folhetos e mapas distribuídos pelo Turismo? Não se perceberá que esta também é uma forma de promover a auto-estima dos residentes menos esclarecidos, possibilitando-lhes uma informação sucinta e rápida sobre um património que os forasteiros procuram por razões nem sempre compreensíveis? Muito trabalho? Mas tão aliciante, tão útil, urgente e necessário!”
Acabo de citar. Passados sete anos, não teria trazido, novamente, este assunto à baila se não me parecesse que as medidas sugeridas continuam pertinentes e, mesmo em tempo de crise tão grave, igualmente, por se tratar de um investimento não muito significativo, de inequívoco e positivo retorno. Cada vez mais, com mais turistas, impõe-se uma cada vez mais eficaz atitude de divulgação dos bens que nos são mais caros.
A concluir, até ouso alvitrar o envolvimento da Escola Profissional de Recuperação do Património de Sintra que, além das competências trabalhadas nas disciplinas de Português e de História, dispõe de meios afins da concretização de tal projecto, para concepção das placas de identificação, por exemplo, nas especialidades de Azulejaria e Metais se, por suportes azulejares ou metálicos, se optasse para tal efeito.
[João Cachado escreve de acordo com a antiga ortografia]
Mozart,
Sinfonia No. 24
Sinfonia No. 24
Continuo hoje a introdução muito sumária da obra sinfónica completa de Mozart que havia
interrompido no passado dia 9 do corrente.
Datada de Salzburg, 3 de Outubro de 1773, esta “Sinfonia em Si bemol Maior, KV 182” terá continuado a merecer grande apreço do próprio compositor na última década da sua vida. Assim somos levados a concluir se tivermos em consideração uma carta dirigida ao pai pedindo que lhe enviasse, precisamente esta obra (juntamente com outras) com o objectivo de a utilizar em concertos em Viena.
Orquestrada para 2 oboés, 2 trompas e cordas, tem três andamentos, 1.’Allegro spiritoso’, com a presença predominante do designado ritmo ’lombardo’, 2.’Andantino grazioso’, uma simples ’cantilena’ e 3.’Allegro’ final, muito palpitante, quase uma giga, autêntica opera buffa do princípio ao fim.
Jaap Ter Linden dirige a Mozart Akademie Amsterdam.
Boa audição!
Mozart,
Sinfonia No. 23
Sinfonia No. 23
[publicado no facebook em 9 de Setembro]
Aqui temos nós a Sinfonia em Ré Maior KV. 181, seguindo o modelo da Abertura em três andamentos que, desta vez, são tocados sem qualquer pausa.
Orquestrada para 2 oboés, 2 trompas, 2 trompetes e cordas, o seu inicial 'Allegro spirituoso'
[4/4]não pode estar mais de acordo com a designação, com um brilho evidente que conduz a um ‘Andantino grazioso’ [3/8], absolutamente notável, mais parecendo uma miniatura de concerto para oboé, ao estilo «siciliano», cheio de melodia, em contraste com o início agitado. O andamento final é um Rondó, qual dança jovial, que se precipita num conclusivo ‘Presto assai’ [2/4].
Desta vez, a gravação que vos proponho tem uma particularidade muito pessoal - embora já muitas vezes o mesmo facto tenha acontecido - já que, reportando-se a uma interpretação pela Orquestra do Mozarteum de Salzburg, durante a Mozartwoche de 2002, eu próprio assisti ao concerto. Dirige Ton Koopman e, de facto, é inexcedível.
Boa audição!
Desta vez, a gravação que vos proponho tem uma particularidade muito pessoal - embora já muitas vezes o mesmo facto tenha acontecido - já que, reportando-se a uma interpretação pela Orquestra do Mozarteum de Salzburg, durante a Mozartwoche de 2002, eu próprio assisti ao concerto. Dirige Ton Koopman e, de facto, é inexcedível.
Boa audição!
Mozart,
Sinfonia No. 22
Sinfonia No. 22
[publicado em 7 de Setembro no facebook]
A” Sinfonia em Dó Maior KV 162”, ao contrário das duas precedentes, regressa ao figurino italianizante da denominada Abertura a três andamentos, no caso vertente, ‘Allegro’, ‘Andantino grazioso’ e ‘Presto assai’. Embora Ludwig von Köchel tenha datado a obra de Abril de 1773, a verdade é que a data do manuscrito é ilegível.
Trata-se de uma peça muito simples, com pouco mais de oito minutos de duração, orquestrada para 2 oboés, 2 trompas, dois trompetes e cordas, que mantém o ar festivo da sinfonia precedente em Ré Maior bem como aquele particular ambiente de algumas das contemporâneas Serenatas mozartianas cuja interpretação acontecia ao ar livre.
Interpretação a cargo da Mozart Akademie Amsterdam, Jaap Ter Linden dirigindo.
Boa audição!
Mozart,
Sinfonia No. 21
Sinfonia No. 21
[publicado no facebook em 6 de Setembro]
Prossigamos com a apresentação, por ordem cronológica, das sinfonias de Mozart. Apenas uma pequena nota introdutória acerca desta “Sinfonia em Lá Maior KV 134”, terminada em Agosto de 1772, um mês apenas após a precedente. Interessante reparar em indícios reveladores das influências a que o compositor era sensível.
Por exemplo, o ‘Allegro’ inicial é monotemático, muito Haydniano, com uma coda de dezoito compassos antes da melodia de abertura do ‘Andante’, lembrando Gluck. Segue-se um’ Menuetto/Trio’ antecedendo um dançante ‘Allegro’ final, composto de acordo com os cânones da forma sonata.
Continuamos com a Mozart Akademie Amsterdam sob a direcção de Jaap Ter Linden.
Boa audição!
terça-feira, 4 de setembro de 2012
Mozart,
Sinfonia No. 20
Sinfonia No. 20
AT: Texto publicado no facebook em 3 de Setembro
Eis a Sinfonia em Ré Maior KV. 133, escrita e Julho de 1772. Logo a abrir, veja-se como estamos no melhor «pendor festivo» de Mozart , com aqueles ornatos nos timbales e nos sopros, num primeiro andamento ‘Allegro’ que, até este momento da sua produção sinfónica, é um dos mais desenvolvidos, com mais de sete minutos de duração.
Vale a pena fazer um pouco de análise deste 'Allegro'. No compasso de 4/4, foi composto de acordo com o cânone da forma sonata, com um notável desvio da recapitulação, qual imagem reflectida da exposição. Ou seja, a recapitulação começa com o segundo tema, esperando Mozart mesmo até ao último momento para apresentar o regresso ao primeiro tema. Para o efeito, primeiramente, traz o tema docemente nas cordas para, seguidamente, repetir ainda com as cordas mas secundadas pelos trompetes.
O andamento lento, é um ‘Andante’ bipartido, em Lá Maior, no compasso de 2/4, orquestrado para cordas que acolhem uma flauta solista. O terceiro é um ‘Menuetto’ típico, em tempo rápido, a contrastar com uma secção ‘Trio’, particularmente notável pelo seu contraponto. A peça terminará com um enérgico ‘Allegro’, num compasso de 12/8, que parece precipitar-se e não querer parar até à conclusão altamente excitante e prazenteira.
Voltamos às gravações da Mozart Akademie Amsterdam, sob a competente direcção de Jaap Ter Linden.
Boa audição!
Mozart,
Sinfonia No. 19
Sinfonia No. 19
AT: Texto publicado no facebook em 29 de Agosto
A “Sinfonia em Mi bemol Maior KV 132”, composta em Julho de 1772, foi orquestrada para dois oboés, quatro trompas (tal como a precedente) e as habituais cordas. Ao contrário do que possa parecer, a obra tem mesmo e só quatro andamentos - 1. Allegro, 2. Andante, 3. Menuetto/Trio e 4. Allegro – e não cinco, como parece nesta gravação, em que, aos 18´ e 10´´ está registado aquele que era o segundo andamento original da sinfonia, que Mozart substituiu, vá-se lá saber porquê. É tão raramente tocado que decidi aqui mantê-lo para vosso acesso.
Façam o favor de tomar atenção ao tema com que o compositor abre o primeiro andamento, que voltará a utilizar, doze anos mais tarde, no seu concerto para piano no. 22 (KV. 482, datado de Viena, 16 de Dezembro de 1785, precisamente na mesma tonalidade). Temos uma exposição curta, sem repetição, com o desenvolvimento focado em novo material.
A atenta observação do autógrafo permitiu concluir que as marcações de tempo nos andamentos seguintes foram registadas pela mão de Leopold Mozart. A terminar a sinfonia, a solução recorrente de um rondó à francesa em sete partes.
Infelizmente, não disponho de referências da gravação.
Boa audição!
Mozart - Symphony No. 19 in E flat, K. 132 [complete]
Mozart,
Sinfonia No. 18
Sinfonia No. 18
AT: Texto publicado no facebook em 28 de Agosto
A “Sinfonia em Fá Maior, KV. 130” é a última do grupo de três, datadas de Salzburg, Maio de 1772, que temos vindo a abordar nos últimos dias. Desta vez, o compositor volta à estrutura de quatro andamentos – 1.Allegro, 2.Andantino grazioso, 3.Menuetto/Trio e 4.Allegro molto – e, na orquestração, além de quatro trompas e das habituais cordas, pela primeira vez, não contempla oboés na orquestração, substituindo-os por flautas.
Como terão reparado as trompas estão a dobrar. De facto, Mozart propõe um segundo par, tanto no Allegro inicial como no Andantino seguinte o que, na realidade, é muito raro na sua obra.
Ainda uma chamada de atenção para a gravação. Reparem que se trata de uma excelente interpretação, da Academy of Ancient Music sob a direcção de Christopher Hogwood.
Boa audição!
A “Sinfonia em Fá Maior, KV. 130” é a última do grupo de três, datadas de Salzburg, Maio de 1772, que temos vindo a abordar nos últimos dias. Desta vez, o compositor volta à estrutura de quatro andamentos – 1.Allegro, 2.Andantino grazioso, 3.Menuetto/Trio e 4.Allegro molto – e, na orquestração, além de quatro trompas e das habituais cordas, pela primeira vez, não contempla oboés na orquestração, substituindo-os por flautas.
Como terão reparado as trompas estão a dobrar. De facto, Mozart propõe um segundo par, tanto no Allegro inicial como no Andantino seguinte o que, na realidade, é muito raro na sua obra.
Ainda uma chamada de atenção para a gravação. Reparem que se trata de uma excelente interpretação, da Academy of Ancient Music sob a direcção de Christopher Hogwood.
Boa audição!
[II]
Mozart,
Sonata para Piano, em Ré Maior, KV. 576
Mozart,
Sonata para Piano, em Ré Maior, KV. 576
AT: Texto publicado no facebook em 27 de Agosto
Ontem, se bem se lembram, ao propor-vos a audição da "Sinfonia No. 17, em Sol Maior, KV. 129" de Mozart, chamava a vossa atenção para o facto de o seu último andamento, 'Allegro' se iniciar com um tema que, bastante mais tarde, no ano de 1789, o compositor utilizaria no início da sua ”Sonata para Piano, em Ré Maior, KV. 576”.
Ouçam novamente o início do ‘Allegro’ da Sinfonia e, depois de terem verificado o que se passa em relação ao ‘Divertimento’ , constante da mensagem precedente [I], verifiquem como, no início da ‘Sonata’, o material temático é precisamente idêntico.
Como já tenho assinalado, é o que, por parte de Mozart, é o que se pode designar como boa gestão de conteúdos...
Inexcedível, a interpretação é de Mitsuko Uchida.
Boa audição!
[I]
Mozart,
Divertimento KV. 205
Mozart,
Divertimento KV. 205
AT: Texto publicado em 27 de Agosto
Ontem, se bem se lembram, ao propor-vos a audição da "Sinfonia
No. 17, em Sol Maior, KV. 129" de Mozart, chamava a vossa atenção para o facto de o seu último andamento, 'Allegro' se iniciar com um tema que, no ano seguinte (1773), o compositor utilizaria no trio de um ’Menuetto’ do ”Divertimento KV. 205” e, ainda, bastante mais tarde, em 1789, no início da sua ”Sonata para o compositor KV. 576”.
No que respeita ao Divertimento, eis a prova inequívoca de que, de facto, assim acontece. Infelizmente, não disponho das coordenadas da gravação. Já de seguida, em [II], apresentarei o outro documento.
Boa audição!
Ontem, se bem se lembram, ao propor-vos a audição da "Sinfonia
No. 17, em Sol Maior, KV. 129" de Mozart, chamava a vossa atenção para o facto de o seu último andamento, 'Allegro' se iniciar com um tema que, no ano seguinte (1773), o compositor utilizaria no trio de um ’Menuetto’ do ”Divertimento KV. 205” e, ainda, bastante mais tarde, em 1789, no início da sua ”Sonata para o compositor KV. 576”.
No que respeita ao Divertimento, eis a prova inequívoca de que, de facto, assim acontece. Infelizmente, não disponho das coordenadas da gravação. Já de seguida, em [II], apresentarei o outro documento.
Boa audição!
Mozart,
Sinfonia No. 17. KV 129
Sinfonia No. 17. KV 129
AT: texto publicado no facebook em 26 de Agosto
Datada de Salzburg, Maio de 1772, esta ”Sinfonia, em Sol Maior, KV 129”, tal como a precedente, obedece a uma estrutura italianizante de três andamentos – 1.Allegro, 2.Andante e 3.Allegro – e a uma distribuição instrumental também idêntica, portanto, as habituais cordas, 2 trompas e 2 oboés.
Será interessante considerar que o último segmento da sinfonia, um pequeno andamento cuja duração não chega a três minutos, começa com um floreado de trompa que, terei oportunidade de vos demonstrar, é idêntico a um que Mozart utilizaria no ano seguinte, interpretado por trompas, como trio de um ’Menuetto’ do ”Divertimento KV. 205” e, ainda, bastante mais tarde, em 1789, no início da sua ”Sonata para Piano KV. 576”
Reparem que, de acordo com o esquema da forma sonata, embora o andamento consista de duas secções repetidas, no momento em que reaparece a tónica, o tema de abertura é apenas aflorado sem que a recapitulação alguma vez aconteça. E, por outro lado, até pode considerar-se que este Finale não passa de um menuetto que degenerou numa jiga.
Assim sendo, portanto, se estivermos na presença de um final à laia de jiga, então tenhamos em consideração que se trata de solução análoga à que o compositor afirmará aplicar-se ao Finale de um dos actos de ”Die Entführung aus dem Serail” que, segundo as suas próprias palavras ”(...) deve ser muito rápido, devendo fazer uma grande algazarra no fim... quanto mais barulho melhor – quanto mais curto melhor – de tal modo que o público não arrefeça antes do momento de aplaudir”.
Não há dúvida que «tinha a escola toda»... Como proposta de interpretação, a habitual Mozart Akademie Amsterdam dirigida por Jaap Ter Linden.
Boa audição!
Mozart,
Sinfonia No. 16
Sinfonia No. 16
AT: Texto publicado no facebook em 25 de Agosto
Eis a Sinfonia em Dó Maior, KV. 128, mais uma das que Mozart compõe em Salzburg, em 1772, no período imediatamente posterior às duas viagens a Itália, propondo a orquestração distribuída pelas habituais cordas, oboés e trompas, em que parece querer libertar-se do espartilho de influências transalpinas das aberturas da ópera italiana, mas indo ao encontro do figurino dos três andamentos.
Não será difícil confirmar como, de algum modo, o primeiro andamento, ‘Allegro maestoso’, soa a Carl Philip Emmanuel Bach e evoca soluções caras aos compositores de Mannheim. Quanto ao ‘Andante grazioso’, só para cordas, ´não passa de uma dança, mais especificamente, de uma gavotte, cujas secção A emoldura uma secção B, levemente contrastante com a sua própria variação.
Deliberadamente evitando a forma de um ‘menuetto’ – aliás presente numa série de precedentes sinfonias estruturadas em quatro andamentos – Mozart dirige-se directamente para o conclusivo ‘Allegro’ que assume os contornos de um fogoso rondó, evidenciando uma melodia inicial graciosa que, subsequentemente, abre caminho para material menos tranquilo que ameaça dominar o andamento.
Mais uma vez, a interpretação a cargo da Mozart Akademie Amsterdam sob a direcção de Jaap Ter Linden.
Boa audição!
Não será difícil confirmar como, de algum modo, o primeiro andamento, ‘Allegro maestoso’, soa a Carl Philip Emmanuel Bach e evoca soluções caras aos compositores de Mannheim. Quanto ao ‘Andante grazioso’, só para cordas, ´não passa de uma dança, mais especificamente, de uma gavotte, cujas secção A emoldura uma secção B, levemente contrastante com a sua própria variação.
Deliberadamente evitando a forma de um ‘menuetto’ – aliás presente numa série de precedentes sinfonias estruturadas em quatro andamentos – Mozart dirige-se directamente para o conclusivo ‘Allegro’ que assume os contornos de um fogoso rondó, evidenciando uma melodia inicial graciosa que, subsequentemente, abre caminho para material menos tranquilo que ameaça dominar o andamento.
Mais uma vez, a interpretação a cargo da Mozart Akademie Amsterdam sob a direcção de Jaap Ter Linden.
Boa audição!
Um homem e uma mulher…
AT: Texto publicado no facebook em 25 de Agosto
É inegável que, no cômputo geral da sua actividade política, Francisco Louçã averba muito mais momentos de êxito do que de insucesso. De qualquer modo, como qualquer mortal, o ainda coordenador do Bloco de Esquerda tem protagonizado alguns episódios menos positivos para o seu currículo de líder de um partido que, em 1999, tendo começado com uma representação parlamentar de dois deputados, dez anos passados, ultrapassava o PCP, alcançando dezasseis representantes do povo no hemiciclo.
Entre as atitudes mais censuráveis que lhe têm sido apontadas, avulta a acusação de se ter aliado à direita para derrubar o PEC IV e a resolução de não ter negociado directamente com a troika, cuja avaliação por parte do seu potencial eleitorado, tão significativa terá sido que – parcialmente, é certo, mas em articulação com outros factores potenciadores do resultado em questão – contribuiria, nas últimas eleições legislativas, para a perda de metade da bancada, reduzindo a oito os mandatos no Parlamento.
Mais recentemente, gerando a maior controvérsia, eis que avançou com a sua proposta de liderança bicéfala do partido, especificamente a partilhar por um homem e uma mulher. A primeira e anedótica conotação que a coisa logo me sugeriu foi aquela pirosice do filme do Lelouche “Un homme et une femme”, que antes do Maio de 68, fez as delícias das sopeiras europeias.., Mais seriamente, como exige a situação, o modelo de tal liderança parece-me bizarro quando não susceptível de gerar confusões evitáveis.
Esta é daquelas ideias que, por analogia com a das quotas, tentam impor, à força, a presença das mulheres na vida política, como se elas não tivessem argumentos bastantes para, quando quiserem, através da qualidade do seu empenho e trabalho, acabarem por fazerem vencer a solução que mais lhes convém. Aliás, ao contrário do que a proposta de Louçã pretende, arrisca-se a suscitar reacções menos convenientes entre a camada mais esclarecida do eleitorado da esquerda que, discretamente, isso sim, luta por atenuar as diferenças de género em todas as instâncias e, principalmente, na vida político-partidária.
Não assumir que a bicefalia de uma tal liderança, tão reveladoramente forçada – tão, tão imposta que até se permitiu indicar quem seriam os seus substitutos!... – é coisa demasiado incauta e, como está a verificar-se, só pode gerar anticorpos, inclusive, no próprio partido. Ou muito me engano ou esta é outra das propostas menos felizes de Louçã. Se fosse avante, resultaria numa mais que previsível inoperacionalidade e, cumulativamente, ainda mais razões forneceria àqueles que consideram pretender o BE jamais afirmar-se como força partidária credível para alternar em soluções de governação.
De qualquer modo, a concretizar-se, tenho a impressão de que, em vez do grupo parlamentar actual, que já cabe numa carrinha das grandes, muito rapidamente, o BE voltará aos primórdios, bastando-lhe uma moto para as deslocações…
E, a propósito de dislates, finalmente, deixem que brinque um pouco propondo-vos a tal xaropada do Lelouch, através do tema musical do referido filme. Para que conste, os anos sessenta também tiveram deslizes que tais...
http://youtu.be/2bYBn5VJ-ko
Quem tem medo
dos cursos profissionais?
AT: Texto publicado no facebook em 23 de Agosto
dos cursos profissionais?
AT: Texto publicado no facebook em 23 de Agosto
[Conclusão do texto precedente. Tenha-se em consideração que o artigo original foi publicado no ‘Jornal de Sintra’, razão bastante para que tivesse aconselhado os leitores a determinada atitude de visita a uma escola do concelho de Sintra que conheço especialmente bem]
II.
Convite irrecusável
Para quem ainda possa alimentar qualquer animosidade contra os cursos profissionais do Ensino Secundário - cujo maior pecado, pasme-se, é possibilitarem o acesso imediato ao mercado de trabalho!... – aconselho vivamente, com a maior pertinência, com a maior seriedade, que vá assistir às provas públicas finais a que são submetidos os alunos desses cursos. É um convite aos pais e encarregados de educação, aos professores, aos jovens estudantes, que formulo com a prévia ponta de ironia que resulta de saber como vai ficar surpreendido quem aceitar a sugestão.
Assistir à apresentação de uma PAP (Prova de Aptidão Profissional) constitui o assumido privilégio de perceber como é possível dar a volta a um Sistema de Ensino anquilosado, viciado por dezenas e dezenas de anos de más práticas, relutante à mudança e à inovação pedagógica. Permitam-me um aparte para vos lembrar que são da mesma massa os jovens que, terminado um curso profissional – ao contrário dos seus colegas dos ditos cursos «normais» - demonstram o domínio de um saber-fazer específico que lhes abre a porta ao trabalho imediato, com uma taxa de empregabilidade superior a oitenta por cento! São da mesma massa, têm sucesso mas o seu exemplo não é divulgado. Porque será?
Aceitem o convite. Vão. Vão assistir à apresentação das PAP. No nosso concelho, têm a sorte de poder fazê-lo com os alunos finalistas de uma das Escolas Profissionais de maior sucesso a nível nacional. Trata-se da Escola Profissional de Recuperação do Património de Sintra, sedeada na Freguesia da Terrugem, no contexto de um invejável complexo de estruturas culturais que também abrange o Museu de Arqueologia de São Miguel, em Odrinhas, ambos organicamente dependentes do município de Sintra através da SintraQuorum, a empresa municipal que, igualmente, gere o Centro Cultural Olga Cadaval.
A prova real
A EPRPS ministra cursos de recuperação de Património Edificado - nas especialidades de azulejaria, cantaria, estuque, madeiras, metais, pintura mural – e de Gestão e Recuperação de Espaços Verdes. É apenas um entre os muitos casos que, felizmente, bem conheço. Se a ele recorro é, tão somente, porque acontece neste concelho adiado que, para mal dos nossos pecados, nem sequer sabe promover devidamente os seus próprios casos de excelência.
Certamente, gostarão de assistir à apresentação de trabalhos sofisticados pelos alunos finalistas que disponibilizam, esclarecem e defendem os seus relatórios escritos, auxiliados pelos meios informáticos mais adequados e operacionais, perante um júri alargado de membros que, para além de professores da Escola, inclui representantes de entidades públicas e privadas relacionadas com as especialidades de profissionalização adquirida bem como dos potenciais empregadores.
Não são raros os testemunhos de professores do Ensino Superior, que integraram júris de PAP deste estabelecimento de ensino, afirmando a sua surpresa perante a alta qualidade dos trabalhos em presença, com características perfeitamente universitárias. Como não ficar escandalizado com a opinião de autênticos terroristas que propalam a falsa ideia de que estes são cursos para gente desprovida de capacidade, uma espécie de segunda oportunidade para mentecaptos?
Quem tem medo dos cursos profissionais? Sem dúvida, a mesma gente que ajuda a manter a situação testemunhada pelos números inicialmente apresentados. Pois bem, ou acontece a mudança, se invertem os índices e o país é capaz de preparar a juventude para os desafios de profissões cuja habilitação não implica a passagem pela universidade ou, então, permanece este estado de inconsciência militante, que leva a comunidade a ter de sustentar dezenas de milhar de licenciados desqualificados, infelizes, improdutivos.
É uma lástima, sem dúvida, mas evitável.
Cursos profissionais
At: Texto publicado no facebook em 22 de Agosto
Entre Maio e Junho de 2006, portanto, há cerca de seis anos, publiquei no ‘Jornal de Sintra’ alguns artigos acerca de um assunto cuja pertinência, precisamente a partir de hoje, veio ocupar as primeiras páginas dos órgãos de comunicação social. Prende-se a matéria com a declaração do Prof. Nuno Crato, Ministro da Educação e Ciência, relativa ao projecto de promover a inscrição, no ensino profissional, de cerca de 50% dos alunos que terminam o 9º ano de escolaridade.
Tratando-se de uma questão que, entre mais algumas, me preocupou bastante como Técnico de Educação e professor, durante mais de trinta anos, não posso deixar de lamentar que praticamente nada se tenha avançado desde fins da década de setenta do século passado. Por isso, não admira que os artigos sobre o assunto se mantenham actuais e pertinentes.
Nestes termos, gostaria de partilhar convosco as referidas reflexões. Oxalá nelas encontrem algum préstimo e, eventualmente, que possam suscitar mais uma oportunidade de debate. Como se trata de uma série, numerá-los-ei com o objectivo de poderem lhes poderem aceder, em qualquer altura, sempre com um guia da ordem por que foram publicados.
- / - / - / - / - / - / - / - / - /
I.
Quem tem medo
dos cursos profissionais?
Basta olhar para o quadro estatístico seguinte para, de imediato, perceber como Portugal é um país com o futuro comprometido. Trata-se de números recentes, referentes ao ano lectivo de 2004/05, recolhidos e publicados pelo GIASE (Gabinete de Informação e Avaliação do Sistema Educativo) do próprio Ministério da Educação:
Percentagem dos alunos matriculados, no Ensino Secundário, por tipologias de formação:
Ensino Regular: 70,8%
Ensino Recorrente: 18,7%
Ensino Profissional: 9,6%
Outro Ensino Profissional: 0,2%
Ensino Artístico Especializado (regime integrado): 0,7%
Maioritária e tão expressivamente que não pode deixar de causar tremenda preocupação, os jovens portugueses matriculam-se em modalidades do Ensino Secundário que apenas os habilitam a prosseguir estudos no Ensino Superior, não chegando a dez por cento o total da procura de cursos profissionais que habilitam à imediata inserção no mercado do trabalho. No conjunto de países da União Europeia em que o nosso se integra e fazendo parte da zona de moeda única, não há situação tão aflitiva que se lhe possa comparar.
As faces da moeda
Por um lado, em termos gerais, não há empreendedor que decida montar uma unidade comercial, industrial ou do sector dos serviços, moderna e competitiva, que não encontre a maior dificuldade no recrutamento de mão de obra jovem, devidamente habilitada, aberta à mudança, capaz de responder aos reptos constantemente lançados pela competitividade, no quadro de uma globalização cujos contornos, causas e consequências ainda muito mal são equacionados.
Em contrapartida, por outro, ano após ano, tanto as Escolas Secundárias como a universidade e o politécnico vão devolvendo à comunidade um desproporcionado conjunto de cidadãos – cerca de quarenta por cento dos candidatos - que, tendo começado a frequentar os níveis de ensino em referência, os abandonam sem qualquer habilitação que, minimamente, permita uma adequada integração no mercado de trabalho.
Tão grave ou ainda mais do que esta situação de abandono, sem qualquer qualificação, é a daqueles que, pura e simplesmente, não encontram colocação no mercado de trabalho embora tenham conseguido terminar a sua licenciatura. Nesta situação, Portugal tem mais de quarenta mil jovens licenciados, desempregados, à procura do primeiro emprego.
A miragem do «dr»
Na ânsia da obtenção de um «dê erre» a qualquer preço ou, melhor, mediante um preço que confira estatuto social, nem os jovens nem as famílias perceberam que estavam a hipotecar o futuro pela miragem do horizonte do sucesso através de um canudo entendido como lâmpada de Aladino… Na realidade, hoje em dia, o ambicionado canudo não abre as portas que outrora franqueava e, não raro, transformou-se num peso morto e apenas mero símbolo das renúncias e sacrifícios a que a sua obtenção obrigou.
Entretanto, em consequência desta distorção, não existe a mão de obra qualificada que a escolaridade de doze anos deveria ter produzido se, na sequência dos nove anos de Ensino Básico, muitos jovens tivessem enveredado pelas modalidades do Ensino Secundário com vertente profissional que permitem imediato acesso ao mercado de trabalho sem jamais comprometer o acesso ao Ensino Superior.
Ora bem, uma das maneiras de assegurar que o nosso seja, cada vez menos, um concelho adiado passa pela capacidade de mobilização para o esclarecimento junto das famílias dos jovens que, neste momento, estão a terminar o 9º ano de escolaridade, ajudando-as a constituírem-se como defensoras da alternativa da modalidade de Ensino Secundário que mais convém tanto aos jovens educandos como ao concelho e ao país.
Informar é o caminho
Assim sendo, impõe-se não admitir que haja sequer uma escola onde um qualquer professor ou funcionário administrativo, por manifesta ignorância ou má fé, se permita fazer passar a ideia, perante alunos e famílias, de que um curso profissional é apenas uma modalidade destinada aos estudantes que não conseguem ter sucesso nos cursos considerados normais.
Os tais cursos normais, do Ensino Regular, estão a montante de situações extremamente preocupantes, discutíveis e controversas. E de tal modo assim é, que se impõe a promoção de reuniões e sessões de informação através das quais todos os intervenientes adquiram os instrumentos adequados à tomada da melhor decisão quanto à modalidade de ensino mais acertada a cada caso em análise.
Há que ter em consideração um facto absolutamente determinante e decisivo para quem, de todo em todo, apesar de pensar num facilitado ingresso no mercado do trabalho, entre os dezoito e os vinte anos, não pretende perder de vista a hipótese de continuar a estudar: é que qualquer das quatro modalidades de Ensino Secundário – cursos Cientifico-Humanísticos, Tecnológicos, Artísticos Especializados, Profissionais – permite o prosseguimento de estudos no Ensino Superior.
De qualquer modo, urge alterar drasticamente a situação de frequência do Ensino Secundário, privilegiando, indiscutivelmente, as propostas profissionalizantes. Para o efeito, há todo um trabalho a desenvolver entre a Escola e a Família, entre professores e representantes das associações de pais, um sério esclarecimento junto dos alunos. Se não há tempo a perder, porque não vemos nós as escolas básicas de 2º e 3º ciclos promovendo tal trabalho de sistemática informação?
Entre Maio e Junho de 2006, portanto, há cerca de seis anos, publiquei no ‘Jornal de Sintra’ alguns artigos acerca de um assunto cuja pertinência, precisamente a partir de hoje, veio ocupar as primeiras páginas dos órgãos de comunicação social. Prende-se a matéria com a declaração do Prof. Nuno Crato, Ministro da Educação e Ciência, relativa ao projecto de promover a inscrição, no ensino profissional, de cerca de 50% dos alunos que terminam o 9º ano de escolaridade.
Tratando-se de uma questão que, entre mais algumas, me preocupou bastante como Técnico de Educação e professor, durante mais de trinta anos, não posso deixar de lamentar que praticamente nada se tenha avançado desde fins da década de setenta do século passado. Por isso, não admira que os artigos sobre o assunto se mantenham actuais e pertinentes.
Nestes termos, gostaria de partilhar convosco as referidas reflexões. Oxalá nelas encontrem algum préstimo e, eventualmente, que possam suscitar mais uma oportunidade de debate. Como se trata de uma série, numerá-los-ei com o objectivo de poderem lhes poderem aceder, em qualquer altura, sempre com um guia da ordem por que foram publicados.
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I.
Quem tem medo
dos cursos profissionais?
Basta olhar para o quadro estatístico seguinte para, de imediato, perceber como Portugal é um país com o futuro comprometido. Trata-se de números recentes, referentes ao ano lectivo de 2004/05, recolhidos e publicados pelo GIASE (Gabinete de Informação e Avaliação do Sistema Educativo) do próprio Ministério da Educação:
Percentagem dos alunos matriculados, no Ensino Secundário, por tipologias de formação:
Ensino Regular: 70,8%
Ensino Recorrente: 18,7%
Ensino Profissional: 9,6%
Outro Ensino Profissional: 0,2%
Ensino Artístico Especializado (regime integrado): 0,7%
Maioritária e tão expressivamente que não pode deixar de causar tremenda preocupação, os jovens portugueses matriculam-se em modalidades do Ensino Secundário que apenas os habilitam a prosseguir estudos no Ensino Superior, não chegando a dez por cento o total da procura de cursos profissionais que habilitam à imediata inserção no mercado do trabalho. No conjunto de países da União Europeia em que o nosso se integra e fazendo parte da zona de moeda única, não há situação tão aflitiva que se lhe possa comparar.
As faces da moeda
Por um lado, em termos gerais, não há empreendedor que decida montar uma unidade comercial, industrial ou do sector dos serviços, moderna e competitiva, que não encontre a maior dificuldade no recrutamento de mão de obra jovem, devidamente habilitada, aberta à mudança, capaz de responder aos reptos constantemente lançados pela competitividade, no quadro de uma globalização cujos contornos, causas e consequências ainda muito mal são equacionados.
Em contrapartida, por outro, ano após ano, tanto as Escolas Secundárias como a universidade e o politécnico vão devolvendo à comunidade um desproporcionado conjunto de cidadãos – cerca de quarenta por cento dos candidatos - que, tendo começado a frequentar os níveis de ensino em referência, os abandonam sem qualquer habilitação que, minimamente, permita uma adequada integração no mercado de trabalho.
Tão grave ou ainda mais do que esta situação de abandono, sem qualquer qualificação, é a daqueles que, pura e simplesmente, não encontram colocação no mercado de trabalho embora tenham conseguido terminar a sua licenciatura. Nesta situação, Portugal tem mais de quarenta mil jovens licenciados, desempregados, à procura do primeiro emprego.
A miragem do «dr»
Na ânsia da obtenção de um «dê erre» a qualquer preço ou, melhor, mediante um preço que confira estatuto social, nem os jovens nem as famílias perceberam que estavam a hipotecar o futuro pela miragem do horizonte do sucesso através de um canudo entendido como lâmpada de Aladino… Na realidade, hoje em dia, o ambicionado canudo não abre as portas que outrora franqueava e, não raro, transformou-se num peso morto e apenas mero símbolo das renúncias e sacrifícios a que a sua obtenção obrigou.
Entretanto, em consequência desta distorção, não existe a mão de obra qualificada que a escolaridade de doze anos deveria ter produzido se, na sequência dos nove anos de Ensino Básico, muitos jovens tivessem enveredado pelas modalidades do Ensino Secundário com vertente profissional que permitem imediato acesso ao mercado de trabalho sem jamais comprometer o acesso ao Ensino Superior.
Ora bem, uma das maneiras de assegurar que o nosso seja, cada vez menos, um concelho adiado passa pela capacidade de mobilização para o esclarecimento junto das famílias dos jovens que, neste momento, estão a terminar o 9º ano de escolaridade, ajudando-as a constituírem-se como defensoras da alternativa da modalidade de Ensino Secundário que mais convém tanto aos jovens educandos como ao concelho e ao país.
Informar é o caminho
Assim sendo, impõe-se não admitir que haja sequer uma escola onde um qualquer professor ou funcionário administrativo, por manifesta ignorância ou má fé, se permita fazer passar a ideia, perante alunos e famílias, de que um curso profissional é apenas uma modalidade destinada aos estudantes que não conseguem ter sucesso nos cursos considerados normais.
Os tais cursos normais, do Ensino Regular, estão a montante de situações extremamente preocupantes, discutíveis e controversas. E de tal modo assim é, que se impõe a promoção de reuniões e sessões de informação através das quais todos os intervenientes adquiram os instrumentos adequados à tomada da melhor decisão quanto à modalidade de ensino mais acertada a cada caso em análise.
Há que ter em consideração um facto absolutamente determinante e decisivo para quem, de todo em todo, apesar de pensar num facilitado ingresso no mercado do trabalho, entre os dezoito e os vinte anos, não pretende perder de vista a hipótese de continuar a estudar: é que qualquer das quatro modalidades de Ensino Secundário – cursos Cientifico-Humanísticos, Tecnológicos, Artísticos Especializados, Profissionais – permite o prosseguimento de estudos no Ensino Superior.
De qualquer modo, urge alterar drasticamente a situação de frequência do Ensino Secundário, privilegiando, indiscutivelmente, as propostas profissionalizantes. Para o efeito, há todo um trabalho a desenvolver entre a Escola e a Família, entre professores e representantes das associações de pais, um sério esclarecimento junto dos alunos. Se não há tempo a perder, porque não vemos nós as escolas básicas de 2º e 3º ciclos promovendo tal trabalho de sistemática informação?
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