quarta-feira, 24 de dezembro de 2008
Natal
Outra fosse a atitude da Junta de Freguesia de São Pedro e de outra índole seria o apoio à Associação de Reformados da Abrunheira. Para que tenham uma ideia de como funcionam as coisas quanto ao interesse daquela autarquia relativamente àqueles seus fregueses mais idosos, tenham em consideração a história que se segue.
Recentemente, a referida associação promoveu uma actividade que implicou o transporte de um grupo de associados ao aeroporto da Portela. Contactada a Junta de Freguesia, não era possível assegurar a deslocação na própria camionete, comprometida que estava para as deslocações da equipa de futebol do 1º de Dezembro. Enfim, a deslocação em questão acabou por ter de se efectuar na camionete de outra Junta de Freguesia do concelho.
Imaginam que a Junta teve o topete de apresentar a factura dos dois serviços? Na nossa ingenuidade, coisa que tal nem nos passaria pela cabeça. Pois é mas, pelos vistos passou pela iluminada cabeça do Senhor presidente da Junta que deve ter confundido a condição de freguês com a de cliente de uma qualquer entidade comercial…
Cabe pormenorizar que o Senhor Presidente da Junta de Freguesia de São Pedro também é Presidente da 1º de Dezembro. Para além de fazer uso praticamente exclusivo da camionete para as deslocações da equipa, circunstância suficientemente esclarecedora, este senhor também é dado a outros retumbantes projectos sempre a favor do futebol local.
É o caso do famoso teleférico que – não me digam já se esqueceram – partiria do estádio directinho à Pena, projecto anunciado no Diário de Notícias, à revelia do Presidente Seara que, tendo calado, consentiu no despautério. Certamente que, pouco dado a questões de transporte, o Presidente da Junta e, cumulativamente, do futebol local, confundiu teleférico com funicular… São confusões atrás de confusões.
Contraponto
Tenha-se presente que, ao longo de três anos, a associação foi bafejada pela Junta com a fabulosa verba de 400 Euros… Isto, para bom entendedor, significa marginalização. E não há época natalícia que nos pudesse levar à utilização de qualquer eufemismo. Felizmente, no entanto, a Abrunheira e, no caso vertente, a Associação dos Reformados, pode contar com a boa vontade de outras entidades.
Trata-se de empresas ali sedeadas que, não deixando de liquidar os seus impostos, se permitem acudir a necessidades destes fregueses mais idosos e carenciados. Sem alarde, sem qualquer enquadramento comercial, sem a mínima estratégia empresarial o Feira Nova, por exemplo – sei que a Puratos também o faz – dispensou tudo o que foi necessário para poder concretizar-se o tradicional bodo de Natal àqueles reformados.
Olhem, eu acho isto bonito, um gesto perfeitamente exemplar. Tenho a certeza de que estou a quebrar a descrição da intenção, mas não resisto a partilhar convosco o nome da pessoa que, tão simpaticamente, com espírito natalício, assim decidiu. Chama-se Carlos Carmo, é o director do Feira Nova e, como se depreende, é boa gente. Exemplar, diria eu.
sexta-feira, 19 de dezembro de 2008
Não falta muito para que passe um ano sobre a data do intempestivo encerramento do terreiro de Seteais. Apesar da muita tinta que continua a fazer correr, a situação mantém-se lamentavelmente inalterada.
Inicialmente, se bem estão recordados, até o próprio Vereador da Cultura da Câmara Municipal de Sintra se mostrou disposto a repor o acesso livre ao local. Com a devida vénia, passo a reproduzir parte de um artigo publicado pelo Jornal da Região de 1 de Abril, com referência à precedente sessão da Assembleia Municipal de Sintra, durante a qual eu próprio intervim acerca do assunto:
“(…) O vereador da Cultura, Luís Patrício, adiantou ao JR que já dispõe de um dossiê, elaborado por juristas e técnicos da área do património, «que aponta no sentido de que aquele espaço não pode ser vedado ao público, é um espaço de domínio público». Com base nesse parecer, o município vai diligenciar, junto do Grupo Espírito Santo (Hotéis Tivoli, que explora a unidade hoteleira instalada no palácio, no sentido da reabertura imediata do espaço. «As obras não são nos jardins, mas sim no palácio, é uma questão de colocar uma vedação», acentua o autarca, que não vê razões para serem invocados argumentos de segurança para o encerramento dos jardins do monumento nacional (…)”. *
Pouco depois, afinal, o município acabaria por se render perante uns esfarrapados argumentos de segurança, invocados pelo concessionário hoteleiro Espírito Santo, ainda que apresentados sob chancela do Igespar. Havia necessidade de abrir umas famigeradas valas, incompatíveis com as visitas. Lembram-se?
Placidamente, o município remeteu-se a um comprometedor silêncio. O costume, pois claro. Por outro lado, tão inconformados como eu, muitos cidadãos iam dando os sinais que a Alagamares se encarregou de dar pública expressão, inclusive através de uma conferência de imprensa.
Os cidadãos pretendiam o simples acesso ao centro do terreiro, apenas para contemplação da paisagem circundante e, em especial, do Palácio da Pena, no cimo do monte, acompanhando a leitura da magnífica descrição de Eça de Queirós, em Os Maias.
Pois, não senhor, ninguém se comoveu. O relvado manteve-se inacessível. Em simultâneo, destruía-se o tanque, iniciava-se a designada reconstrução da habitação da Quinta do Vale dos Anjos e era impedia o acesso ao local do Presidente da Junta de Freguesia de São Martinho… Concentração de asneiras? Não, desgraçadamente, mais do mesmo. Não, infelizmente, Sintra nas mãos de democraticamente eleitos incompetentes.
Então e as valetas, prestes a serem abertas e atravessando o mítico e simbólico terreiro de Seteais? Então o perigo dos buracos onde cairiam as criancinhas todas das escolas? Pois, até agora, nem uma vala ou valeta para amostra...Todavia, teimosamente, o hoteleiro concessionário levou a sua avante, arrastando consigo alguns organismos do poder central e o executivo municipal. Não há dúvida: quer, pode e manda!
Entretanto, depois de tantos meses de ofensa aos cidadãos e à memória de quantos se têm batido pela vigência do regime de público acesso aos jardins, os portões vão continuar fechados. Um dia virá, em que a conveniência de Sua Excelência o concessionário, ditará a reabertura do terreiro que, muito provavelmente, até coincidirá com a reabertura do hotel.
Nessa data, eventual e igualmente aproveitada para pôr em evidência a iluminada ilusão de um espelho de água que o Igespar escandalosamente sancionou – encimando a casa das máquinas a que o ingénuo tanque deu lugar – aparecerão todos os actores desta farsa, lambuzando-se e bebericando no banquete do banqueiro Espírito Santo, obsequiados por tanta prova de bacoco e militante companheirismo. É um fartar vilanagem…
*entre «», palavras do vereador
quarta-feira, 17 de dezembro de 2008
Eis o texto de uma moção apresentada pelo Bloco de Esquerda em sessão da Assembleia Municipal, aprovada por unanimidade.
Recuperação da antiga Cadeia Comarcã
A Câmara de Sintra iniciou um conjunto de obras de reabilitação da antiga Cadeia Comarcã, edifício contemporâneo da Sede do Município que acolhe, há mais de 25 anos, o grupo 93 de Sintra, da Associação de Escoteiros de Portugal.
No plano da intervenção, está prevista a colocação de uma vedação que separa os terrenos da sede dos escoteiros do estacionamento adjacente, anunciando-se também a reabilitação da fachada do edifício.
Considerando
- A importância da intervenção da antiga cadeia comarcã para garantir a conservação deste edifício emblemático e a segurança dos e das jovens que, semanalmente, fazem uso do seu espaço.
- Que as obras agora iniciadas são importantes mas precisam de ser acompanhadas por uma intervenção estrutural, de modo a garantir o fim das infiltrações que põem em causa a estabilidade do centenário edifício.
- O papel fundamental que este edifício tem no trabalho desenvolvido em prol da Juventude em Sintra pelo grupo 93 da Associação de Escoteiros de Portugal.
- O acordo de cedência do espaço por 50 anos, firmado em 1984 pela Câmara e pelo Grupo 93.
Considerando ainda
- Os esforços desenvolvidos por várias gerações de jovens sintrenses para a conservação e dignificação do espaço da antiga cadeia comarcã;
- As comemorações, em 2009, dos 75 anos daquela instituição juvenil.
A Assembleia Municipal de Sintra, reunida a 16 de Dezembro de 2008, delibera, por proposta do Bloco de Esquerda:
1- Saudar a Câmara pelo início das obras na antiga Cadeia Comarcã, iniciativa que dignifica o património edificado e a memória de Sintra.
2- Recomendar à Câmara de Sintra que alargue o âmbito das obras a realizar, promovendo uma intervenção de fundo no edifício de modo a garantir o fim das infiltrações que põem em causa o seu equilíbrio estrutural.
3- Enviar a presente deliberação à Chefia do Grupo 93 de Sintra, saudando esta instituição pelo seu papel incontornável na formação e dinamização da juventude sintrense.
Sintra, 16 de Dezembro de 2008
Não posso estar mais de acordo com a iniciativa do BE. Este edifício precisa de uma intervenção como a proposta. Em Sintra, a Defesa do Património passa inequivocamente por uma especial atenção à prisão comarcã traçada por Adães Bermudes.
Às razões e considerandos aduzidos pelo BE, acrescentaria ainda que, no fim da décade de 80, houve gente a bater-se no sentido de que o edifício não tivesse o destino que lhe fora marcado pelo então Presidente da Câmara João Justino, que aprovou um projecto bem à altura do seu analfabetismo funcional.
Na altura, enquanto professor da Escola Profissional de Recuperação do Património de Sintra, que dava os seus primeiros passos, estive envolvido com um grupo de alunos nessa luta que suscitou um grande interesse na comunidade, um sucesso que, naturalmente, faz parte da história daquela casa.
Oxalá tais factos possam vir a constar de informação a colocar em local bem visível. Os bons exemplos devem ser contados com orgulho. Se o caso não ficar lapidarmente registado, esta mesma comunidade sintrense acabará por esquecer como, afinal, valeu a pena contrariar a vontade do edil.
E, a propósito, algo de idêntico, um digno memorial deveria ser erguido na própria Volta do Duche, um local cuja defesa suscitou um movimento cívico que tanto nos mobilizou. Mas, se entrarmos numa de memoriais, então teremos que colocar outro na Granja, lembrando o famigerado caso da Sintralândia.
E, assim, vamos ganhando fôlego e ânimo para a borrasca que se avizinha das bandas do Sabugo...
segunda-feira, 15 de dezembro de 2008
Monserrate,
castigo do sucesso (Parte II)
(conclusão)
Feitiço do estuque
Só quem não conhece, se surpreenderá que, a propósito de Monserrate, não hesite eu no uso desta palavra feitiço tão carregada de sentido. A bem escrever, neste caso, forçoso é utilizar o plural já que muitos são os feitiços. E, caro leitor, naturalmente, o do estuque, na verdade fascinante, agiganta-se de modo inequívoco, ao transpor qualquer das portas de acesso ao famoso palacete.
Os estuques do tecto da principal sala de entrada foram dos que, ao longo de várias décadas, mais se ressentiram com a criminosa incúria. Fragilizaram-se, degradaram-se ao ponto de se desfazerem em fragmentos, bem concretos, à mistura com a abstracta vergonha – embora a culpa não devesse morrer solteira… – de se ter autorizado tão grave atentado.
Situação irremediável? Há quem pense, e eu sou dos que o afirmam, que só para a morte não há remédio. No entanto, em determinados casos, como o dos perdidos estuques do tecto em causa, havendo remédio, ele teria de passar por pessoas absolutamente providenciais. E Monserrate, na realidade, só podia contar com a intervenção da maior autoridade nacional neste domínio.
Claro que é Mestre José Clemente do Rosário, um grande senhor que, para além de executar ele próprio, como quando esteve ao serviço do prestigiado Instituto José de Figueiredo e, a exemplo do que está a acontecer com este tecto, também ensina a sua arte há precisamente quarenta anos, tanto como formador do Instituto de Emprego como na Escola Profissional de Recuperação do Património de Sintra.
Mestre Rosário tem intervindo nos mais sofisticados locais como, por exemplo, o Convento de Cristo em Tomar mas considera que Monserrate é mesmo o grande desafio.
“Estou metido num autêntico quebra-cabeças que, literalmente, me tem tirado horas e horas de sono. Acordo, a meio da noite, a pensar como resolver alguns dos problemas. A peça estava irreconhecível, com muitas lacunas. Embora tivessem guardado os fragmentos, não existiam os suficientes. Por isso a recomposição foi um puzzle incrível, um desgaste mas, como se vê, está quase pronto".
O que, no seu dizer, está quase pronto, é uma placa onde ‘tudo funciona’ sem que, afinal, se perceba como todos aqueles lindíssimos motivos composicionais não eram senão aniquilados, mortos fragmentos, um aparente lixo, até que a sua mão lhes tocou, restituindo vida, viço e feitiço, reabilitando-os para a fase que se seguirá, ou seja, a da feitura do molde que dará origem à definitiva peça que irá reocupar o nobre lugar de origem.
Qualquer leigo se apercebe da inteligência, da capacidade de decisão indispensáveis aos riscos que corre um homem com o saber e experiência de Mestre Rosário, ao aceitar um desafio deste calibre. Tal como a Arq. Luísa Cortesão, também ele sublinha como, no fim da intervenção, haverá a possibilidade de verificar onde, efectivamente, se interveio, não mascarando a realidade.
Ainda bem. Monserrate bem merece poder contar com este homem que tem formado sucessivas fornadas de artesãos. Provavelmente, Mestre Rosário terá a possibilidade de continuar a intervir, com alguns dos seus ex-alunos, neste edifício que, só na vertente dos estuques, tem trabalho para cerca de dois anos, pensando numa pequena equipa de quatro ou cinco artesãos.
Entretanto, os cães podem continuar a ladrar que, como sempre, a caravana, vai continuar a passar…
sexta-feira, 12 de dezembro de 2008
Monserrate,
castigo do sucesso?
(Parte II)
Na primeira parte do artigo publicado no passado dia 20 de Novembro, se bem se lembram, ficou no ar aquela dúvida relativa às razões que justificariam o facto de Monserrate ter deixado de contar com transporte público turístico. Ora bem, como era previsível, não houve quem tenha saído à liça para esclarecer a nossa perplexidade. Enfim, pelo menos, até ao momento…
Assim sendo, poderá vingar a hipótese da invejazita de alguém, particularmente incomodado com o sucesso da equipa do Prof. Lamas. Daria imensa vontade de rir, não fosse o caso de resultar em disparatada vingança que cria inegáveis prejuízos. Aliás, como ninguém lucra com tão baixa estratégia, estaremos perante mais um caso da tão afamada e rematada estupidez local.
Adiante. Em Monserrate, continuarei a partilhar convosco mais algumas notas sobre a campanha de restauro em curso no edifício. Depois de tanto abandono, foi sustida a criminosa degradação de que José Alfredo dava conta através das palavras que dele citei. Justo é lembrar que, mal Serra Lopes, de péssima memória,* deixou a administração da Monte da Lua, logo se iniciou a regeneração que, agora, já não pode parar.
Singular biblioteca
Da biblioteca, falou a Arq. Luísa Cortesão, com o pormenor e interesse que a recuperação da sala lhe merece, através da intervenção em curso, absolutamente modelar, que compreende todas as vertentes em presença, dos estuques, à pintura, ao papel de parede, ao mobiliário, estruturas de madeira e cantaria. Por manifesta falta de espaço para entrar em fascinantes pormenores, apenas concedo à minha interlocutora uma breve explicitação.
“Por exemplo, esta sala (biblioteca) apresentava um friso de papel de parede tipo flock paper (papel de veludo) que, em virtude do avançado estado de degradação, não é susceptível de conservação. Assim, vai ser substituído por uma cópia fiel que respeita a fabricação tradicional. Mas vamos conservar uma amostra do original para exposição museológica.
Por outro lado, o papel decorativo, em imitação de madeira, que revestia o tecto, estava de tal modo degradado que não houve alternativa. Tem de ser substituído. No entanto, o novo papel será executado com técnicas e materiais absolutamente semelhantes ao original. E, na altura de reaplicar, será deixada uma janela com o papel preexistente”.
Por estes pequenos detalhes, desde logo se percebe estarmos em presença de uma verdadeira responsável, não daqueles que costumo grafar a itálico ou com aspas… Podemos confiar no modo como ali se pratica a recuperação do património, portanto, no respeito pela verdade dos indícios que se encontram, na permanente necessidade de os preservar para o futuro, já que cada peça é suposto contar a história da passagem do tempo e de como o tempo por ela passou.
(continua)
………………………………………
* A propósito, quando teremos o privilégio de conhecer o resultado das sindicâncias várias, das devassas do Ministério Público à gestão do biólogo que, durante anos sucessivos, têm impedido o Senhor Presidente da Câmara de responder aos meus sistemáticos pedidos de esclarecimento? Ou alguém pensa que a coisa está esquecida?
quinta-feira, 11 de dezembro de 2008
Ontem, perante a notícia do lançamento da auto-estrada para Bragança - onde e quando é que eu já ouvi e vi anunciar a mesma ou semelhante coisa? - mais uma vez, não consegui deixar de lembrar duas situações que com ela estão relacionadas.
Vamos por ordem cronológica. A primeira envolve o Dr. Emílio Rui Vilar que, sabiamente, soube afastar-se da vida partidária, em tempo oportuníssimo, não se deixando emporcalhar com uma classe política que está muito, muito abaixo do seu nível. Aliás, por alguma coisa, convenhamos, o Rui Vilar, já há uma série de anos é Presidente da Fundação Calouste Gulbenkian, enquanto seus amigos e conhecidos não passam de ministros de sucessivos e desacreditados governos deste pobre país.
Há muitos anos, quando ele próprio desempenhou cargos governativos, em especial, como Ministro dos Transportes e Comunicações do I Governo Cinstitucional (1976-78) Rui Vilar ousou afirmar que Portugal não precisava de auto-estradas mas, isso sim, de uma bem concebida rede de boas vias rápidas. Naturalmente, logo se fizeram ouvir as vozes daqueles que perspectivavam a oportunidade de excelentes negócios, através de obras de maior vulto e de maior envolvimento de capitais públicos que sempre dão umas boas comissões...
Em segundo lugar, recordo o famigerado IP4. Desde que foi inaugurado, já ceifou a vida a 250 pessoas, gerando incontáveis prejuízos materiais e morais. No fim de um ano de abertura ao tráfego, ouvi eu o então director da Junta Autónoma das Estradas afirmar que, efectivamente, em vez daquela, podia ter sido construída uma estrada mais segura, técnica e perfeitamente possível. Mas os custos de construção seriam muito mais elevados...
Ou seja, construiu-se uma estrada daquelas, perigosíssima, poupando nos custos, independentemente das consequências, mesmo que tivessem significado vidas perdidas, outras destroçadase o inevitável cortejo de efeitos colaterais. A isto chama-se crime. Na verdade, o crime tem muitos contornos, inclusive estes, de uma obra púbica que foi concretizada, sabendo de antemão que os conhecidos e nefastos efeitos não se fariam esperar.
Sabem quem era o Ministro das Obras Públicas de então? Nem mais nem menos do que o Engº Ferreira do Amaral que, mais tarde, até foi candidato à Presidência da República. Passou por uma campanha eleitoral sem que ninguém, adversários políticos, jornalistas, o tivesse confrontado com a responsabilidade implícita no despautério do IP4.
Ontem o primeiro ministro Pinto de Sousa gritava que construir a auto-estrada para Bragança era poupar vidas. Continua a não haver quem possa contestar que não é preciso construir auto-estradas para poupar vidas. Basta construir e manter - sublinho o aspecto da manutenção - boas estradas nacionais e vias rápidas. A receita não é original. Veja-se o bem conhecido caso da Irlanda.
Claro que nada disto constitui motivo de riso. Pelo contrário. Todavia, adivinho que, no seu gabinete da Av. de Berna, Rui Vilar não deixará de sorrir... Este homem, sabem, é daqueles que tem pinta de grande estadista. É um homem profundamente informado e culto, capaz de liderar uma equipa de administradores de uma grande Fundação, perspectivando o modo de enquadrar e vencer os desafios do futuro.
Pinto de Sousa, pelo contrário, embora primeiro-ministro, só é estadista porque ocupa funções de Estado. Fundamental e essencialmente, dele não guardará o país marca que se veja. Permaneerá, estou certo, não a marca, antes a imagem que mais se articula com a daquele bem típico caso de engenheiro assumindo a total responsabilidade pela concepção dos lindos projectos, na Beira profunda, que a comunicação social se encarregou de divulgar.
terça-feira, 9 de dezembro de 2008
Cartão de visita
Se qualquer dúvida existisse quanto à falta de pudor dos designados responsáveis sintrenses, bastaria passar pela Volta do Duche e olhar o que se passa, à quota baixa, junto ao parque de estacionamento do Rio do Porto.
Os painéis da autoria do pintor Leonel Moura, ali colocados e inaugurados no dia de São Pedro, no ano de 2005, não foram assumidos como serviço de tapa-vergonhas das arruinadas casas cujas fachadas cobriram. Todavia, de facto, por mais que, na altura, o Vereador Cardoso Martins dissesse em contrário, foi exactamente esse o objectivo.
Claro que as casas continuam cada vez mais arruinadas. Naturalmente, os próprios painéis também já se degradaram. Por mais que, tanto eu como o Pedro Macieira, chamemos a atenção para o desconchavo, os senhores autarcas permitem-se dar esta nota de terceiro mundo como cartão de visita. Mas há mais testemunhos, nas Escadinhas do Hospital, ou ainda, por exemplo, na massacrada Rua da Pendôa.
Qualquer dia passam mesmo a constituir o novo ex-libris de Sintra. E, diga-se de passagem, muito a propósito, pois tais senhores já trataram de assumir um modo de ser e de estar muito próprio. Ou seja, tal como as donas de casa badalhocas, que deitam o pó para debaixo dos tapetes, os edis sintrenses, mascaram a fachada dos prédios, dando a entender que é uma atitude artística performativa.
Piois é, gato escondido... Não contentes, coitados, ainda se permitem continuar a reforçar a estratégia na quadra natalícia, atirando mais poeira para os olhos do povo, à mistura com umas centenas de milhar de lâmpadas que, não esquecem, são de baixo consumo.
Por mim, continuo a invocar São Judas Tadeu. Para os casos desesperados não há melhor. Sabem, é o advogado dos impossíveis...
quinta-feira, 4 de dezembro de 2008
Miguel Carretas, da CDU:
“Não estaremos a permitir um projecto de construção imobiliária a cavalo de um Projecto de Potencial Interesse Nacional (PIN) apoiado pela Câmara para que possa ser adquirido direito de construção? A Media Capital irá adquirir 50 hectares por um valor simbólico de 1000 euros, mas a área em questão é maior. Trata-se de um terreno de cerca de 200 hectares, 50 deles em reserva ecológica e agrícola, e é esse nesse espaço que se pretende instalar a Cidade do Cinema, um projecto PIN. O protocolo celebrado com a autarquia pressupõe uma candidatura aos projectos PIN e a elaboração de um Plano de Pormenor, condições sem as quais o projecto poderá não avançar. Quando este plano tiver de ser aprovado por esta assembleia, vamos assistir a uma chantagem política, porque quem votar contra será acusado de não querer desenvolvimento para Sintra”.
Fernando Seara, Presidente da Câmara Municipal de Sintra:
Nenhuma questão respeitante à Cidade do Cinema será desenvolvida sem vir à Câmara e à Assembleia Municipal. Não permitirei que em alguns casos seja aprovado o PIN e qualquer operação urbanística e noutros não seja, na margem norte ou na margem sul, no Algarve ou no Litoral Centro. Se cumprir as regras, será aprovado e os outros mecanismos terão que ser aprovados pela Assembleia Municipal”.
[última reunião da Assembleia Municipal de Sintra]
Hoje, dia 4 de Dezembro, não se fala noutra coisa. Uma das mais controversas situações é, naturalmente, a que se prende com a hipótese de concretizar um projecto com esta escala e características em área classificada como reserva ecológica nacional. É inconcebível a ligeireza com que uma autarquia, cujo executivo se reclama de prudente e lúcido, se permite avançar para uma polémica deste calibre.
Que o território deste concelho é dos mais apetecíveis a nível nacional e internacional, para a promoção de negociatas de alto nível, já nós sabemos há muito tempo. Se bem recordados estão, ainda no consulado de Edite Estrela, coisa parecida nos bateu à porta. A famiigerada Sintralândia, que foi dada como facto consumado, também chegou a ser protocolada e tudo o mais.
Dessa vez os signatários eram mais institucionais, ou seja, a Câmara Municipal de Sintra e o Ministério da Defesa já que os terrenos, também classificados, eram pertença da Força Aérea. O grande promotor era uma multinacional, a Cameron International, que ficou a ver navios porque, espantem-se, o Prof. Fernando Seara, muito discreta e eficazmente, acabou com qualquer hipótese de concretizar o negócio de um parque fantasia de duvidosos contornos.
Agora, o mesmo edil, não considera qualquer inconveniente em patrocinar a Cinelândia. Enfim, para quem não está disposto a admitir dualidade de critérios, é algo caricato... Igualmente, não deixa de ser curioso que, em ambas as circunstâncias, se tenha invocado o grande argumento dos postos de trabalho que se geram. Sabem que mais? Se, para gerar postos de trabalho, uma comunidade se dispõe a dar de barato valores tão especiais como os que estão em causa, então não passa de nítida forma de abastardamento, de claro aviltamento.
Se a Sintralândia foi ontem, hoje são o Pego e a Cinelândia. Por extensão de abrangência, também o hospital que não aparece, ou a universidade que se vê por um canudo. E ainda os desmandos na zona de Seteais, a desgraça do centro histórico - criminosamente a caír aos bocados quando, diz-se insistentemente, podia estar a ser beneficiado com verbas provenientes do jogo - o estacionamento que não se resolve nem se vislumbra...
Não acham mesmo que o crédito para este negócio já se esgotou? Não acham mesmo que, para este peditório... Não basta de poeira para os olhos?
terça-feira, 2 de dezembro de 2008
No dia 18 de Novembro passado, faz hoje precisamente quinze dias, sugeri-vos um passeio em direcção ao sofisticado gozo deste especial Outono de Sintra. Escrevi que não era preciso ir muito longe para alcançar tal privilégio. Tratava-se de partir dos Pizões, passar pela Regaleira, descer a Trindade Coelho bem como o Caminho dos Frades e, diante da Quinta dos Alfinetes, voltar imediatamente à esquerda para entrar no Caminho dos Castanhais.
Hoje, pedir-vos-ia para repetirem e, uma vez aqui chegados, perceberem como eram justas e ajustadas as minhas palavras. Escrevia eu que estariam a entrar numa esquecida zona de Sintra. É verdade, esquecidos caminhos estes, embora a poucos metros do centro histórico. Mas, como espantar-se o caminhante? Então o próprio casco da mais nobre Sintra não está esquecido há décadas?
Aqui, para bom entendedor, esquecimento significa incúria. Significa cultura do desleixo de que fala Jorge Sampaio, com a sua voz de autorizado sintrense que, tal como tantos de nós, conheceu esta terra em muito melhores dias. É cruel termos de recuar dezenas de anos para vislumbrar o que era um lugar limpo e com carácter, igual a tantos outros, nacionais e estrangeiros que, apesar do progresso, não se descaracterizaram, não se degradaram e estão cada vez em melhor estado.
Mas voltemos ao Caminho dos Castanhais. Bastou ter chovido um pouco para ficar praticamente intransitável. Se ainda não tiverem feito o percurso, verão que aquilo é um bocado de terra batida, outro de empedrado e ainda pedaço de irregularíssima calçada, borrifada de umas gotas de alcatrão, antes de voltar à esquerda, a caminho das Escadinhas da Pendoa, com aquela obra embargada, nas trazeiras do Tivoli.
Um caminho que podia ser um sossego, entre belíssimas quintas (certo é que meio abandonadas...) está transformado em inqualificável desgosto. Em terra batida? Pois, sim senhor, não haveria qualquer problema desde que bem concebido, com valetas e sarjetas, para que não se transformasse naquele lamaçal que encontrarão se lá passarem.
Todavia, continua belíssimo o passeio. Sintra resiste. Até a estes responsáveis que a História da terra recordará como coveiros do desassossego, Sintra resiste. Sintra está doída, cheia de imerecidas feridas e ofensas. Um dia virá em que tudo isto vai alterar. Preciso é que passe o tempo.
Em Portugal, outros sinais nos ajudam a compreender como o subdesenvolvimento, o atraso, o analfabetismo e a iliteracia estão a montante destes quadros de miséria. Sim, não tenhamos dúvida, o Caminho dos Castanhais é algo que, noutros países europeus, em terra classificada como Paisagem Cultural, seria perfeitamente impensável. Por isso o apelido de quadro de miséria sem que me sinta a usar qualquer hipérbole.
Pensem noutros sinais, escrevia eu, por exemplo, como em terras de forte emigração, os filhos e netos dos que construiram aquelas inqualificáveis casas, hoje delas se envergonham... Também em Sintra, um dia virá em que os vindouros se envergonharão de um passado - que, para desdita nossa é o tempo presente - durante o qual autarcas, técnicos e os cidadãos em geral se deram ao luxo de tão mal tratar este lugar de eleição.
Sabem quem, nesse futuro, será recordado como a voz do desassossego? Indiscutivelmente, José Alfredo da Costa Azevedo, que não ficou a dever, fosse a quem fosse, a bofetada que se impunha. A mim e a vós apenas se impõe que sejamos dignos da voz sintrense desse bom homem.
sexta-feira, 28 de novembro de 2008
A desilusão dos senadores
Em Sintra, aliás, como em todo o país, neste ano lectivo, está a acontecer um fenómeno deveras preocupante em relação à aposentação de professores dos ensinos básico e secundário. Neste especial período do fim das suas carreiras, sem entrar em pormenores de perfil mais técnico, convém considerar, basicamente, as duas soluções pelas quais estão a optar.
Num primeiro caso estarão todos os professores que, atingindo um mínimo de trinta e três anos de serviço e sessenta e um e meio de idade, aproveitam recente dispositivo legal que lhes concede a possibilidade de uma saída tão rápida quanto possível, sem qualquer penalização de ordem pecuniária, ainda que, de acordo com as novas disposições relativas a aposentação, o Sistema Educativo com eles deveria contar, consoante os casos individuais, durante mais um, dois, três anos.
Poderiam manter-se por mais uns tempos, não é? Pois é. Em condições normais, provavelmente, assim aconteceria. Reparem que, portanto, numa altura de fim de carreira, em que alunos e colegas ainda tanto poderiam beneficiar da sua experiência e dedicação, cortam abrupta, tantas vezes dolorosamente, com uma actividade profissional docente e lectiva que muita abnegação sempre lhes exigiu ao longo de dezenas de anos.
É toda uma cultura de Escola, uma cultura de seniores que não passa, um capital que a comunidade escolar, a comunidade educativa e o Sistema Educativo se dão ao luxo de perder, deixando sair, amargurada, uma série de pessoas que estiveram ao serviço das crianças e dos jovens, cumprindo o que deles esperavam os contribuintes em geral, pais e encarregados de educação em particular.
Não fosse isto suficientemente significativo, ainda se permitem abdicar da conveniência de auferirem um montante de reforma um pouco mais elevado. Dão de barato um dinheiro que, inevitavelmente, lhes faltará num tempo em que nem um Cêntimo se pode desperdiçar. Tudo isto é certo e pertinente. Todavia, invariavelmente, perderam o ânimo.
Em segundo lugar, ainda mais preocupante, é a situação dos colegas que, não tendo reunido as condições mínimas, quer de idade quer do tempo de serviço, decidem abandonar a Escola, com sérias penalizações pecuniárias que, em conhecidos casos de estabelecimentos de ensino, em Sintra, atingem cortes de cerca de vinte por cento. Mas ainda haverá quem se espante perante o que está a acontecer?
Perante uma política educativa sem norte, conduzida por uma equipa ministerial impreparada, sem visão sistémica do complicadíssimo universo que era suposto saber gerir, todos os profissionais da Educação, os professores em especial, foram confrontados com medidas que não podiam tê-los causticado em mais larga medida. Esta equipa de governantes que ocupou a 5 de Outubro em 2005 e, não esqueçamos, também o primeiro ministro, máximo responsável pelo desconchavo – bem podem gabar-se de terem forçado a barra até ao limite máximo.
Assim sendo, em ambas as aludidas situações, há muitos professores que, em Sintra, vão ficando disponíveis para atitudes outras em relação à Escola, à Educação e ao ensino. Vão constituindo, juntamente com aqueles que os precederam em anos recentes, um contingente de senadores que muito bom seria para a comunidade poder contar.
Ora bem. É aqui que entra a minha sugestão ao Senhor Vereador da Câmara Municipal de Sintra com o pelouro da Educação. Porque não constituir, segundo condições a definir, um Senado Escolar, informal órgão consultivo da autarquia, integrando os experientes mestres educadores interessados numa tal iniciativa? Porque não aproveitar a nível local, aquilo que o poder central ousa desperdiçar?
quinta-feira, 27 de novembro de 2008
algumas perguntas
Se, por um lado, ninguém duvida que o caso do Banco Português de Negócios ainda vai dar muito que falar, por outro e para já, alguns comentadores se interrogam quanto à pressa que houve em consumar uma solução de nacionalização da instituição bancária em apuros, como se esta fosse a única alternativa à proposta apresentada ao Governo pelo Dr. Miguel Cadilhe.
Certamente que os peritos se pronunciarão acerca desta e doutras pertinentes questões cujo sofisticado perfil técnico deveria suscitar ao cidadão comum a prudente reserva em relação a comentários, mais ou menos alinhavados, ao correr da desagradável sensação de ver sair-lhe do bolso uma grossa maquia, comterão portado como pessoas de bem.
Enfim, sendo inegável que a nacionalização do BPN é um facto irreversível, ao ignorante e pagante, inescapável contribuinte, apenas resta a possibilidade de colocar uma ou outra inocente pergunta, sem a preocupação do enquadramento técnico, nas suas vertentes económica, financeira ou jurídica.
Nestes termos, uma primeira interrogação. Muito eu gostaria de saber quanto dinheiro se teria poupado aos cofres públicos se o inefável Dr Vitor Constâncio tivesse actuado, a tempo e horas, conforme dele seria de esperar, na qualidade de supervisor da banca portuguesa, ou seja, uma das poucas competências que lhe resta depois da entrada do país na 'zona euro'.
Por mais que se apresente, quer ao Parlamento quer aos media, encolhendo os ombros e com aquela capa de santo de pau carunchoso que ningém convence, faz a figura tristíssima de alguém que não cumpriu o dever e que prevaricou por palavras, actos e omissões. Tão simples como isto. Dobrado é o escândalo por ser tão principescamente pago, há tantos anos, para tão medíocre prestação de serviço.
Seguida e finalmente, porque não se limita a intervenção do Estado à garantia das verbas que anónimos cidadãos, por esse país fora confiaram a pessoas cuja duvidosa honestidade está sendo sujeita à tardia devassa do Ministério Público? É que, para além do anónimo depositante, ninguém deveria merecer esta consideração de segurança. Os accionistas? Não, de modo algum. Resolveram investir no BPN? Pois fizeram um mau, um péssimo negócio. Que aguentem com as consequências!
Estarei a pensar mal? Parece que não. Tanto mais que, agora, no caso do Banco Privado Português, o inefável governador do Banco de Portugal e o medíocre (classificação do Financial Times) Ministro das Finanças consideram que não se lhe deve acudir porque a actividade da instituição em apreço se articula com especulação na Bolsa. Então como é? Num caso vai acudir-se aos interesses dios accionistas, a coberto da figura da nacionalização e, no outro descartam-se?
Concordando com a segunda posição, como entender a primeira?
quarta-feira, 26 de novembro de 2008
Poderia escrever acerca de uma série de disparates que, quotidianamente, não nos concedem tréguas, engrossando o caudal da matéria sintrense, no registo menos agradável. Por exemplo, continuam os casos do Pego e do designado teleférico para a Pena que, só esses, davam pano para mnangas. Hoje, porém, resolvi intervalar. C'os diabos, também tenho direito...
Não é que tenha muita fé mas bem gostaria que, à momentânea interrupção que proponho, também pudessem corresponder, por parte dos habituais responsáveis, uns momentos de pausa na sua permanente reincidência na asneira.
Não fosse muita ousadia, quase imploraria que os contumazes e relapsos políticos, técnicos, decisores em geral, procurassem um retiro espiritual estratégico, em demanda da lucidez que, cada vez mais, e, tão notoriamente, lhes vai minguando.
De motu proprio seria perfeitamente imprevisível. No entanto, algum dos serviços, entretanto mais agilizados - como tanto gostam de se qualificar - talvez ainda disponha de verba para um qualquer outsorcing que enquadre tão flagrante necessidade de arejamento e de lucidez.
No caso de tal medida não se revelar possível e praticável, e, já que comecei a pisar o terreno da audácia, por aqui continuaria, perguntando se, com o advento natalício, apesar da crise, não haveria por aí um mecenas interessado no patrocínio dessa tão saudável atitude de recolhimento. Grande misericórdia seria, e de alcance inequivocamente favorável.
«Isto» em Sintra chegou a um tal ponto que só vai com orações ao Altíssimo ou, na Sua indisponibilidade, pelo menos, ao mais alto nível. Como Ele deve andar atarefadíssimo, com os pedidos da Rodrigues, do Pinho, já para não falar no Pinto de Sousa, solicitemos a intercessão da Senhora de Fátima que, embora a pouco mais de uns escassos cem quilómetros, tem desprotegido esta terra de maneira confrangedora.
Enfim, Coitada, até se percebe o Seu desinteresse perante uma gente a quem concedeu tanta oportunidade. Mas, por maiores que tenham sido as ocasiões perdidas e os pecados cometidos, a Sua Infinita Misericórdia de Mãe, não permitirá que permaneçamos, neste vale de lágrimas, como desprotegidos rebentos.
Ainda se lembram que comecei por confessar a minha pouca fé? Depois de umas poucas linhas de prosa bastarda, vejam lá no que caí! É o desespero, está visto. Das frustres tentativas de intervenção cívica, já passei a indirecta invocação à Virgem. Está bonito! Espero que me ajudem a não ensandecer...
segunda-feira, 24 de novembro de 2008
renascida fenix
Eis a transcrição parcial de um artigo do DN do passado dia 18 do corrente:
«PROJECTO PARA O PARQUE SINTRA-CASCAIS SEM PIN
Promotor vai voltar a apresentar pedido de licenciamento
Um mega projecto turístico com quase mil camas no Parque Natural de Sintra-Cascais (PNSC), entre as praias Grande e da Adraga, foi candidato a Potencial Interesse Nacional (PIN) e retirado no dia 3, em véspera do chumbo do Ministério do Ambiente. O promotor do mega projecto turístico, o grupo Vila Galé, disse que vai entregar "em breve" um pedido de licenciamento do empreendimento na Câmara de Sintra.
“O processo está pronto e vai ser entregue na câmara que fará a consulta às várias entidades", afirmou Jorge Rebelo de Almeida, gerente do grupo hoteleiro Vila Galé e promotor do projecto juntamente com a família Antunes, a proprietária dos 55 hectares destinados ao empreendimento, 13 dos quais para construção. (…)
O empreendimento projectado para o PNSC inclui um hotel de apartamentos, 70 moradias, piscinas, restaurantes, um centro de congressos e um SPA, a construir em área da Rede Natura e também protegida pela directiva habitats (aves) e pelo plano de ordenamento do parque e plano da orla costeira (que proíbe a construção junto à costa).
Fonte da Câmara de Sintra disse que "o projecto está parado" e que não deu ainda entrada nos serviços outro, reformulado, para a zona.
O histórico deste projecto turístico remonta aos anos 70, quando um inglês e um alemão começaram a comprar os primeiros pequenos terrenos no Pego, Colares, junto ao mar, conseguindo juntar ao longo dos anos numa única propriedade mais de 50 hectares. A família Antunes comprou o terreno no final da década de 90 com a expectativa de construir um empreendimento turístico, que estava já previsto no Plano de Desenvolvimento Municipal (PDM).
Em 2004, a construção do empreendimento motivou a constituição de um movimento cívico de defesa do PNSC que estuda agora formas de travar nos tribunais nacionais e comunitários o avanço daquele que consideram um grave atentado ambiental. Também a promotora admite lutar em tribunal.» (Lusa)
Sem mais comentários, que a notícia é perfeitamente eloquente, apenas acrescentaria que muito gostaria de não me enganar se, por analogia com situações anteriores, tudo não se conjugasse para que a CMS dê a sua aprovação lá para a semana anterior ao Natal.
Se assim não vier a acontecer, cá estarei para dar a mão à palmatória. Mas, está claro, já com o Novo ano a decorrer que, nestas coisas, preciso é não nos precipitarmos aos primeiros sinais…
De qualquer modo, acreditem, o que eu queria mesmo era não ter de dar razão a um querido amigo que, a propósito deste negócio, ontem mesmo me dizia:
- Isto não é mais do que uma urbanização para venda de moradias a setenta privilegiados. O resto é música…
domingo, 23 de novembro de 2008
Se ontem escrevia que nada tinha a acrescentar ou a retirar a um texto que havia publicado há cerca de um ano sobre as luminárias de Natal, hoje, pelo contrário, tenho mais coisas a dizer.
Não deixa de ser interessante é que, também há um ano, me tinha visto na circunstância de fazer o mesmo que agora e, precisamente, por idêntico motivo, ou seja, a ocorrência de cortes de corrente, em consequência da sobrecarga ou de deficiente manipulação das instalações ad hoc que os Castro de Espinho por aí penduraram, sem o desejável controlo da autarquia.
Acontece que, na passada noite, só aqui na zona da Estefânea, ficámos às escuras por duas vezes, durante períodos mais ou menos longos. Para além da agressão estética nocturna e diurna, ainda nos sujeitamos a tão desagradável resultado que, não raro, como sabem, tem nefastos efeitos na maquinaria electrodoméstica e equipamento informático.
Naturalmente, logo enviei uma mensagem à Câmara Municipal de Sintra solicitando medidas adequadas. Como em tudo o mais, o resultado deve ser o mesmo que no ano passado. Pode bem o munícipe protestar que é para o lado que melhor dormem. Infelizmente, é o que a casa gasta, enfim, a instalada e proverbial cultura do desleixo...
Por isso, estou certo de que continuarão os cortes. Neste, como em todos os demais casos, suposto é que sigamos só os bons exemplos. Ao lembrar a atitude de Eça de Queirós, a propósito daquele episódio da carta que remeteu ao Director da Companhia das Águas, também me apetece perguntar ao luminoso responsável por este sintrense despautério, o que decidirá ele pôr a jeito para o correspondente corte...
sábado, 22 de novembro de 2008
Não tenho uma palavra a acrescentar ou a suprimir ao texto que, há sensivelmente um ano, escrevi acerca do assunto das iluminações natalícias.
Em Sintra - note-se em Sintra, já que o mesmo não direi de outros lugares nacionais e estrangeiros - as iluminárias estão para as ruas, praças e edifícios da terra como o lixo da casa de cada um estaria debaixo dos tapetes em vez de ir para o caixote.
Diz-se que à noite todos os gatos são pardos. Mesmo assim, mesmo no escuro, ainda há quem queira fazer tapar o Sol com a peneira...
Luminárias
Quando chega esta altura do ano, já que não temos outro remédio senão aguentar com as iluminações natalícias, muito gostaríamos de ver uma decoração discreta, adequada às características desta terra, com um mínimo de sofisticação e de bom gosto. Infelizmente, mais uma vez, assim não acontece.
Desde já vos diria que, muito dificilmente poderei aceitar que sejam desperdiçadas verbas de um orçamento, cada vez mais mitigado, em efémeras luminárias que nem às ingénuas criancinhas de colo conseguem agradar. Naturalmente, preferiria ver a autarquia declaradamente preocupada, por exemplo, com a instalação de iluminação permanente, no designado parque de estacionamento do edifício do Urbanismo que, nas noites de eventos no Centro Cultural Olga Cadaval, permitiria arrumar muito automóvel. Enfim, outra seriedade…
Quem conhece lugares congéneres onde, sazonalmente, os enfeites urbanos constituem indispensável motivo de atracção, percebe perfeitamente que me refiro à necessidade de não abastardar ou, sequer, prejudicar locais particularmente interessantes das aldeias, vilas ou cidades e, pelo contrário, tudo fazer no sentido de melhorar o aspecto habitual.
Estes propósitos costumam andar de braço dado com o objectivo de animação comercial, numa altura do ano em que se prevê uma maior disponibilidade das famílias. Assim sendo, seria de esperar que, neste domínio das decorações natalícias, se actuasse com particular cuidado já que ninguém pretenderá obter o efeito perverso de desagradar e afugentar seja quem for.
Quem será o artista?
No ano corrente, é bem menor a quantidade das iluminações de Natal, na Estefânea e, em especial, no eixo da Heliodoro Salgado. E fico-me por aqui para não me incomodar demasiado. Em termos estéticos, portanto, quanto à qualidade, pode falar-se num inqualificável ciclo de horrores que nenhum detestável lugar mereceria, nem mesmo aquela artéria que se tornou no pavor a que ainda não nos habituámos.
Comecemos com a fonte cibernética, junto a Nunes Carvalho que, há semanas, ostenta aquela armação desconforme, que só podia articular-se com a horrorosa grelha das festas felizes… Que cinismo! Mas, continuando, então o que dizer da zona pedestre onde, para além dos pendurados adornos, cujas formas e cromatismo não têm gosto nem desgosto, colocaram no pavimento outra armação metálica, qual foguete helicoidal que parece pretender simbolizar uma árvore de Natal?
Muito gostaríamos de saber quem é, nos competentes serviços camarários, o artista que encomenda e despacha favoravelmente a instalação destas luminárias, transformando certas zonas de Sintra numa espécie de inconcebível arraial minhoto. No meio de tudo isto, quem fica a rir-se são os tais Irmãos Castro, que lá vão fazendo o seu negócio. Se lhes encomendassem coisa de jeito, certamente que saberiam produzi-la… Toda a gente vê a capacidade de concretização, a logística e a eficácia da empresa. Só lhes falta é interlocutor à altura...
quinta-feira, 20 de novembro de 2008
Monserrate,
castigo do sucesso? (I Parte)
Um dia destes, um colega e amigo de Viseu, que se deslocara durante três dias a Lisboa, ao pretender aproveitar o intervalo de certa manhã que, inesperadamente, ocorrera num seminário em que estava a participar, resolveu vir a Sintra, expressamente para visitar as obras de restauro em curso no Palácio de Monserrate.
Lembrava-se ele de ter eu dito que, chegando a Sintra, mesmo que não estivesse para o acompanhar, sempre havia um transporte público para Monserrate, ou seja, aquele comboio turístico que, julgava eu, era coisa adquirida e para manter durante muitos anos e bons. De facto, nas minhas andanças diárias, cruzava-me constantemente com o veículo – até já saudando o condutor – não me passando pela cabeça que acabaria tão rapidamente.
Resumindo, que já vai longa a história, não teve outro remédio o meu amigo senão chamar um táxi para se deslocar até ao palácio e regressar à estação da CP, já que escasso era o seu tempo disponível. Naturalmente, algum objectivo eu tenho ao contar o episódio, que não podia ter acabado melhor, com o homem satisfeitíssimo com o que viu.
Assim é. De facto, há um propósito que rematará a história se alguém me explicar que castigo estarão a expiar a Parques de Sintra Monte da Lua – Monserrate, em particular – para, assim tão acintosamente, lhes terem cortado a possibilidade de serem demandados por visitantes em transporte público. Pergunta simples mas, adivinho, resposta um pouco mais complexa.
Sucesso & Inveja
Ou eu muito me engano ou anda por aqui a reles invejazita do costume. Aliás, a partir do momento em que a empresa, nas mãos do actual Conselho de Administração, apagou o rasto de má memória, deixado pelo consulado do biólogo Serra Lopes, e passou a ser um caso de flagrante sucesso, logo começaram a surgir umas vozes muito preocupadas…
Primeiramente, aqui d’el rei, que estavam a fazer escandalosas clareiras, no âmbito das limpezas florestais. Depois, acabaram por sossegar, rendendo-se à evidência de um trabalho, que está a prosseguir de acordo com um plano meticuloso, realizado por profissionais que se sujeitam ao sério escrutínio dos cidadãos, perante quem se têm disponibilizado para as explicações que se impõem.
Agora é o problema do transporte para Monserrate, com a autarquia, sócia da empresa, cedendo às exigências de um transportador que, afinal, acaba por não concretizar a carreira que reivindicava, com isso prejudicando os potenciais passageiros e as naturais expectativas da PSML. Não acham esquisito? E não acham que é tanto mais esquisito quanto está em execução um dos mais ambiciosos e criteriosos planos de recuperação do património de que há memória em Sintra?
Vem a propósito lembrar as amarguradas palavras de José Alfredo da Costa Azevedo, por exemplo, no fim de todo um capítulo dedicado a Monserrate, a propósito da degradação galopante que ali se verificava há dezenas de anos “(…) E aqui tens, leitor amigo, tudo quanto sei contar a respeito daquilo que foi uma das mais lindas propriedades de Sintra e que hoje, tristemente, em poder do estado, está num abandono vergonhoso, tanto a quinta como o palácio (…) Tem esta história, como Vêem , um final muito triste. Mas a história tem que ser feita com verdade. E, neste caso, não temo qualquer desmentido. É uma vergonha? Mas é mesmo assim!...”*
Hoje em dia, a equipa do Prof. Engº António Ressano Garcia Lamas, inverteu todo este quadro de desgraça. Não só quanto a Monserrate, mas também em relação aos outros lugares afectos à PSML – em particular, com uma especial referência para todo o conjunto da Pena – dá gosto, enquanto munícipe, poder ir acompanhando tão interessante campanha de reabilitação, depois de décadas de descrença em que tudo já parecia irremediável.
Uma campanha alegre
Tenho ido a Monserrate sempre que pretendo inteirar-me do que vai acontecendo. Qualquer dos membros do Conselho de Administração, para além do Presidente, os Drs. Manuel Baptista e João Lacerda Tavares, se têm disponibilizado à partilha da informação, com o prazer que neles se adivinha, uma vez que tudo é consistente, verificável através da obra que, inequívoca e paulatinamente, se vai concretizando.
O mesmo acontece com os técnicos, em particular aqueles com quem mais tenho contado, casos do Engº Jaime Ferreira e Arq. Luísa Cortesão ou Dra. Ana Margarida Oliveira Martins, senhores de um entusiasmo contagiante. Como o paraíso não mora por estas terreais paragens, também toda esta boa gente tem os seus pequenos e grandes problemas de operação. Todavia, como o projecto é deveras mobilizador, vão-se vencendo as etapas, com os resultados visíveis que a comunidade pode aquilatar quando, tal como eu, assim o pretender.
Comecei hoje. Continuarei lembrando o exemplo do José Alfredo que devia constituir referência máxima na actuação de qualquer autarca sintrense. Hoje, repito, em sua memória, o franco elogio à actual Monte da Lua. Infelizmente, não é atitude que possa replicar. Ditoso, porém, seria eu se pudesse enaltecer a acção de alguém capaz de colmatar as misérias que o executivo municipal não conseguiu nem consegue pôr cobro, em especial, no centro histórico…
(continua)
Jornal Sintra, 21.11.08, adapt.
…………………………………
* Obras de José Alfredo da Costa Azevedo – II, Recantos e Espaços, Monserrate, pp. 173-203, Câmara Municipal de Sintra ed., Sintra, 1997
quarta-feira, 19 de novembro de 2008
Reabriu ao público o Jardim da Preta. Está muito feliz o meu amigo Adriano Filipe que se fartou de lutar por coisa aparentemente tão simples como isto. Claro que já lá fui. Identifiquei-me à entrada para que, como munícipe e freguês local me franqueassem o acesso. Os guardas são uma simpatia e prestam-se à boa conversa quando, como era o caso, não havia mais nenhum visitante. A propósito, fiquei a saber que um deles é encadernador o que me vai dar um jeitão. Se quiserem, aproveitem a informação...
Dei uma volta ao recinto para constatar o que já previa. Lembram-se daquele canto, mais à direita, onde está o tanque? Então, se não se recordam, melhor é lá dar uma saltada. Vejam a degradação geral, a falta de limpeza e concluam aquilo que não poderão deixar de concluir...
Provavelmente, terei bem entendido as eventuais reservas da Dra. Inês Ferro, directora do Palácio da Vila, relativamente à reabertura do Jardim. Na realidade, aquele canto está numa desgraça e ninguém gosta de dar o flanco em semelhante circunstância. Não menos lamentável é o estado da cantaria, completamente enegrecida, do Esguicho Manuelino, aquela coluna torsa que muitos continuam a designar como pelourinho e que nada tem a ver com semelhante peça. Sabem que está classificado como monumento nacional?
Deixo a sugestão de envolverem alunos da Escola de Recuperação do Património de Sintra nos trabalhos ali indispensáveis. O protocolo não é coisa difícil de concretizar e, como há antecedentes, melhor ainda. E depois, faz-se tudo com a prata da casa. Mas, por favor, actuem depressa. Aquela é uma montra demasiado visível para que nos permitamos o luxo de tal desleixo.
terça-feira, 18 de novembro de 2008
Outonal passeio
Como têm reparado, vai estupendo o Outono em Sintra. É a época por excelência deste incomparável lugar. É a luz deslumbrante de um Sol que, tão docemente, desce sobre as faldas da Serra até à urbe, jamais conseguindo desfazer o sortilégio de sombras perenes e magníficas. São os telúricos odores, tão diferentes em Sintra, na promessa da renovação. É o concerto geral da natureza, em sinfonia que dispensa partitura. Tudo certo e perfeito.
Errada e imperfeita, no entanto, a mão do homem que, há muitos anos, não tem estado à altura do alto privilégio de Sintra. Conjugar o belíssimo Outono, em Sintra, com a infeliz realidade de Sintra, não é exercício fácil mas, inevitavelmente necessário para que não caia o sujeito em depressivo estado de alma...
Como muito prezo os meus amigos e fiéis leitores, pretendo aliviar-vos, ainda que fugazmente, dessa permanente tristeza causada pelas malfeitorias de que Sintra é constante vítima. Por isso, hoje mesmo - e talvez nos próximos dias - proponho que saiam a passear. Não vos convidarei para grande afastamento, descansem os menos habituados a grandes andanças.
Tudo se passa, afinal, no perímetro da Vila velha, numa voltinha em que a beleza não vos larga e espreita, em terra onde tanta e desqualificada gente se tem afadigado no seu aviltamento. Primeiramente, aconselharia o horário da tarde, cerca das quatro, de tal modo que, lá mais para o fim da passeata, aproveitem a tão especial luz crepuscular.
Comecem, então, na Praça da República, junto ao edifício do Turismo, e tomem o caminho da Regaleira. Ah, é verdade, convém não olhar muito atentamente para certos pormenores como, por exemplo, o estado de degradação daquela fonte do outro lado da estrada, à passagem pelos Pizões, porque, caso contrário, ainda soltam uma série de imprecações contra quem, não esqueçam, só deseja o vosso bem...
Chegados àquele esplendoroso monumento arbóreo que é a sobreira dos fetos, junto ao gradeamento da Quinta do Relógio, tomem a vossa direita. Passando o largo e a vizinhança das obras, entrem na Rua Trindade Coelho e prossigam, passando pelas quintas Schindler e do Castanheiro. Estão a internar-se numa parte muito esquecida da Sintra, em que as quintas se sucedem, aliás, como noutros recantos.
Não se contenham. Se vos apetecer e assim vos permitir a necessária agilidade, espreitem sobre os muros, debrucem-se, empoleirem-se, se puderem. Dêem lugar à curiosa criança que continua a andar por aí. Continuem, sempre tendo em consideração as minhas recomendações. Pensem positivo*apesar de se aperceberem do estado em que estão estas propriedades e de tanto quanto há a fazer.
Passados cerca de trezentos metros, vão encontrar uma bifurcação. Desta vez, voltem à direita pelo Caminho dos Castanhaes. Estão a entrar em terra batida e continuam a desfrutar um panorama magnífico, à vossa esquerda, sobre as trazeiras da Vila, baloiçando o olhar entre as vertentes de um minúsculo vale de abundante e colorida vegetação. Agora atravessam a zona onde Eça de Queiroz passou temporadas com a família, numa quinta que, na realidade, até nem era do agrado de sua mulher, D. Emília de Castro (Resende).
Neste momento do trajecto, já trazem a alma lavada. O Outono exerceu em vós o feitiço do costume. Se desconheciam os Castanhaes ou, há muito tempo, deles andavam arredados, perceberam os meus amigos como era acertado o meu conselho. E também o objectivo de vos permitir voltar a sentir uma certa marca sintrense, que os 'responsáveis' ou desconhecem ou, se conhecem, estão positivamente marimbando - desculparão a vulgaridade do verbo - para a sua requalificação.
Mas, c'os diabos, pensem positivo! É que ainda não terminou o passeio, ainda têm de subir uma íngreme e irregular calçada, passar pela Pendoa e por todos aqueles desconchavos desleixados do centro histórico. Portanto, não se deixem acabrunhar pelos pormenores... Olhem, de uma coisa estejam certos, é que o Outono volta todos os anos. Pelo contrário, há para aí uma série de senhores, incapazes de gerir coisa tão especial que, em próximos anos, já não estarão por cá, percebem?
Tenham esperança. Continuem a passear. Reparem nos pormenores à vossa volta. E, por favor, pensando sempre positivo, não se demitam!
*Mas não se confundam. Olhem que o itálico tem que se lhe diga...
sexta-feira, 14 de novembro de 2008
Seteais,
o tanque essencial
Julgo ser da maior pertinência discernir que, no meio de todo este lamentável episódio, se evidencia a forma displicente como o Estado, representado por um alto funcionário, trata o melindre da destruição e transformação do tanque de Seteais. Como não concluir que, nos serviços do Estado, precisamente no IGESPAR, onde tal jamais poderia acontecer, há quem revele uma tão discutível noção de intervenção sobre bens patrimoniais classificados?
A questão é tão mais paradoxal e pertinente que põe em causa princípios de actuação que, no âmbito de compromissos internacionais relacionados com a Defesa do Património, Portugal se obrigou a respeitar. Há décadas que as Cartas de Veneza, de Atenas e até mais recentes, estabelecem princípios e valores que não podem ser feridos com a ligeireza que nos foi comunicada pelo tal senhor arquitecto assessor principal.
Ao lutar pela preservação de um bem patrimonial, preciso é não desviar a atenção do essencial. E o essencial, neste caso, tem a ver com princípios afins da ética na salvaguarda do património, relaciona-se com um problema de filosofia de actuação, assume inequívoca vertente de deontologia. Não perceber isto é confundir a árvore com a floresta.
Sem margem para grandes dúvidas, possível é avançar com a ideia de que a destruição do tanque e o inqualificável híbrido travesti resultante naquela casa de máquinas, na aparente singeleza dos seus contornos, é de tal modo paradigmático que, sem o mínimo exagero, configura os parâmetros indispensáveis à sua abordagem como caso de estudo. Qualquer seminário pega nisto...
quinta-feira, 13 de novembro de 2008
Seteais, pobre tanque
pobre tanque...
Ontem, ao fim da tarde, alguns cidadãos que se têm preocupado com a série de episódios que, tão negativamente, continuam a ferir o sossego do lugar de Seteais, receberam uma mensagem, através de correio electónico que, sem mais comentários, passo a reproduzir na íntegra:
"Exmos Senhores,
Na sequência do v/ e-mail de 5 do corrente, venho esclarecer que a intervenção em curso no Hotel de Seteais obrigou à criação de um espaço coberto para abrigar as bombas de água para rega e para as da própria rede contra incêndios.
Cientes do impacto negativo que necessariamente adviria duma nova construção nos jardins, com essa finalidade, optou-se pela sua instalação no fundo do tanque poente, que se encontrava vazio e abandonado.
A construção em curso será coberta por uma laje impermeabilizada, a qual servirá de fundo a um espelho de água, criando no final da obra a ilusão de um tanque cheio.
Com os melhores cumprimentos.
Luís de Pinho Lopes
Arquitecto Assessor Principal
Instituto Gestão do Património Arquitectónico e Arqueológico, I.P.
Palácio Nacional da Ajuda,
1349-021 Lisboa"
Imediatamente, tive conhecimento da reacção de vários destinatários do texto supra que, tal como eu, resolveram responder directamente ao Senhor Arquitecto Luís de Pinho Lopes. Creio que o assunto merece a divulgação da carta que já remeti. Nestas circunstâncias, passo à sua transcrição:
Exmo Senhor
Arquitecto Luís Pinho Lopes
Arquitecto Assessor Principal do IGESPAR
Senhor Arquitecto,
Acuso a recepção do texto que V. Exa. acaba de enviar, através de correio electrónico, acerca da construção de uma casa de máquinas em Seteais, construção essa que, segundo razão apresentada por V. Exa., decorreu da necessidade de, no contexto da intervenção em curso no Hotel de Seteais, criar "(...) um espaço coberto para abrigar as bombas de água para rega e para as da própria rede contra incêndiosda própria rede contra incêndios (...)".
Perante a necessidade em apreço e "(...) ciente do impacte negativo que necessariamente adviria de uma nova construção nos jardins (...)", o IGESPAR não hesitou em despachar favoravelmente a proposta de destruição de um tanque, instalado a poente da propriedade, aproveitando a sua estrutura para concretização do propósito supra enunciado.
Acabo de ler. Incrédulo e perplexo, leio e releio o texto. V. Exa. deixou-me completamente pasmado. Talvez, dentro de alguns dias, consiga eu classificar a atitude do IGESPAR. Todavia, neste momento, sinto-me incapaz de afirmar seja o que for, para além de adjectivar como incrível a ligeireza com que, de uma penada, sem que se lhe tenha colocado qualquer questão, a mínima dúvida, no âmbito de matérias afins da conservação, preservação e restauro, uma entidade com o perfil daquela onde V. Exa. exerce actividade, terá contribuído para a destruição do equipamento em causa.
Porventura, poder-se-ia ter pensado em, enterrar uma insignificante casa de máquinas, em qualquer canto da propriedade, solução que jamais contribuiria para a criação de qualquer impacto negativo, uma vez que, literalmente, remetida para o subsolo, não se veria. Afinal, o tanque estava mais à mão e, quem se mostrava aparentemente preocupado com a criação de impactos negativos, num contexto que os não merece, acabou por destruir um bem patrimonial articulado com um edifício classificado. Para o efeito, travestiu-o, através de uma solução que, em termos estéticos, não só ofende qualquer noção de bom gosto, como também se posiciona contra o espírito do lugar.
Se, na Administração Pública, há serviços onde, quotidianamente, se lida com conceitos tão pertinentes, como o do espírito do lugar - tantas e tantas vezes invocado, sempre que se analisa os argumentos pró e contra de uma projectada intervenção, no contexto da fase de diagnóstico de situação - naturalmente, o IGESPAR evidenciar-se-á pela frequência.
Porque não se me coloca a dúvida de que o conhecimento de tão básico e comum conceito, não faça parte do conjunto de instrumentos de análise que pressupõe actividade prática e quotidiana dos técnicos do IGESPAR, acreditará V. Exa. que é com a maior dificuldade, com inequívoco pudor, que ouso pôr em causa o discernimento que, a montante, terá justificado e prevalecido na decisão de destruir o tanque.
É que, Senhor Arquitecto, permita-me lembrar, o tanque, sumarissimamente referido por V. Exa. como vazio e abandonado, na realidade, fazia parte do tal espírito do lugar. Instalado a poente da propriedade, parte integrante do património da propriedade, também fazia parte de um património virtual, de memórias de milhares de sintrenses e forasteiros que, nas suas caminhadas à volta de Seteais, a caminho da Penha Verde ou de Monserrate, sempre ali se detiveram, numa especial relação com o local.
Como bem sabem os técnicos do IGESPAR que, tão inadvertida quanto inopinadamente, terão avalizado a decisão de o destruir, aquele não era apenas um ingénuo tanque, num particularmente conhecido recanto da propriedade de Seteais. Tanto não era que bem o demonstra o equipamento de lazer, ainda hoje bem visível, à cota alta, apenas uns dois metros acima.
Refiro-me, como V. Exa. e os técnicos do IGESPAR bem conhecem, ao balcão dotado de uma série de bancos, do tipo conversadeira, aliás, muito bem integrados e enquadrados por uma vegetação em íntima afinidade. O tanque, Senhor Arquitecto, era parte integrante de um bem patente, inequívoco e evidente dispositivo de lazer que articulava com a restante propriedade.
Verdade é que estava vazio. Não menos verdade é que estava abandonado, muito naturalmente, devido à incúria do concessionário do hotel, cujos objectivos não passavam pela preservação de tal equipamento. Contudo, Senhor Arquitecto, tal situação de abandono que, em normais circunstâncias, animaria o proprietário - o Estado Português, agora localmente representado pela empresa de capitais públicos Parques de Sintra Monte da Lua - à necessidade da recuperação da peça, lamentavelmente, acabou por provocar uma atitude de inqualificável desprezo por parte do IGESPAR, afinal, a última entidade que se consideraria possível a patrocinar um tal desconchavo.
Como V. Exa. sabe, Senhor Arquitecto, para que seja considerado objecto a preservar, independentemente da sua eventual classificação, um bem patrimonial pode ser coisa bem simples, ingénua. De qualquer modo, sempre estará afectado por particular sofisticação e sempre, sempre relacionado com a história, com o espírito do lugar e em íntima articulação com as pessoas. Com todos estes items em presença, o simples facto de estar abandonado e vazio não podia ser lido, entendido, como peça a abater.
De facto foi abatido, irremediavelmente destruído o tanque. E tudo tem vindo a acontecer, ao longo de meses, apesar de ter suscitado um movimento de opinião, de o assunto ter sido levado a reunião pública do executivo autárquico e a sessão da Assembleia Municipal de Sintra, embora tenha sido enviada correspondência ao IGESPAR manifestando o desagrado da população e de ter sido presente queixa à UNESCO, junto da delegação portuguesa e em Paris, de terem saído artigos na imprensa e publicadas inúmeras mensagens na blogosfera. Consumou-se a destruição.
E, por fim, Senhor Arquitecto, como se não nos bastasse a ofensa de que fomos objecto - de ter sido subtraído à memória colectiva um bem que tanto significado tinha para a comunidade, substituindo-o por uma prosaica casa de máquinas - ainda se permite V. Exa., em nome do IGESPAR, vir desassossegar-nos com a confirmação daquilo que já sabíamos há muito, ou seja, que "(...) A construção em curso será coberta por uma laje impermeabilizada, a qual servirá de fundo a um espelho de água, criando no final da obra a ilusão de um tanque cheio."
Efectivamente, Senhor Arquitecto, para rematar tanta controvérsia, o IGESPAR não podia ter dado cobertura a solução tão polémica como a cosmética de um ilusionismo de tão flagrante mau gosto, que resvala nos limites do mais pacóvio novo riquismo, algo que, tão sincera e desassombradamente como todas as precedentes palavras, lhe confirmo que não esperava.
Há um facto consumado de destruição mas o assunto não está encerrado. E, a propósito, Senhor Arquitecto, encerrado, isso sim, e com o aval do IGESPAR, está o terreiro de Seteais, medida altamente discutível que não esgota o rol de infelizes decisões na zona. Há dias, convém lembrar, outra ofensa, desta feita ao Poder Local, na pessoa do Presidente da Junta de freguesia de São Martinho, a quem o concessionário do hotel se permitiu recusar a entrada no recinto, depois de o autarca se ter identificado e anunciado que ia em missão de esclarecimento.
Mesmo defronte, na Quinta do Vale dos Anjos, está em curso a designada reconstrução de uma casa de habitação, licenciada pela Câmara Municipal de Sintra, cujo processo já está nas mãos do douto Tribunal Administrativo local.
A história de Seteais, em particular a luta pela manutenção de um acesso público ao local, ao longo de mais de duzentos anos, salpicados de curiosas peripécias, faz parte da História e prossegue, nos nossos dias, com o acrescento destes lamentáveis episódios. No entanto, apesar dos erros de percurso, as instituições continuam a funcionar e, como outrora, com os cidadãos atentos ao desenrolar dos factos, honrando a dignidade de uma nobre herança, plasmada nas posições de tantos sintrenses, que José Alfredo da Costa Azevedo tão bem relatou.
Finalmente, cumpre destacar que o IGESPAR se tem dado ao cuidado de responder às tomadas de posição que lhe têm dirigido alguns cidadãos, entre os quais me incluo. Pela raridade da atitude, não deixo de a assinalar, ao subscrever-me,
Com os melhores cumprimentos,
João Cachado
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Cumpre agora perguntar:
Em Seteais, o que mais nos reservará o próximo futuro?
Com o tipo de atitudes com que, tão amiúde, temos sido confrontados, só podemos concluir que eles consideram poder fazer o que lhes aprouver, contando com a proverbial aquiescência da maioria dos cidadãos.
Todavia, é inequívoco que o grupo em que me incluo já assumiu não se enquadrar nessa maioria, providencialmente adormecida, mesmo a jeito para a consecução de todas as arbitrariedades. Portanto, sejam quais forem as novidades, apenas nos resta continuar, consequentes com os princípios que afirmamos e defendemos.
E apenas mais uma palavra, acerca de quem continua afirmando-se se agente da Defesa do Património de Sintra, embora mantenha uma postura de estratégica ausência, em resultado de compromissos vários e atávicos receios, incompatível com os ataques sistemáticos de que Sintra é vítima permanente. Concedamos-lhes, portanto, o lugar de doce adormecimento que decidiram privilegiar...
quarta-feira, 12 de novembro de 2008
artigo publicado no Jornal de Sintra em 17.02.06
(conclusão)
"Vale da Raposa,
Estacionamento em debate
"(...) Estacionamento, cenas impróprias
Onze da manhã do passado sábado. Mantém-se praticamente deserto o terreiro junto ao edifício do Urbanismo, que funciona como parque de estacionamento informal, acolhendo centenas de automóveis nos dias úteis. Através da passagem sobre a linha férrea, chegar ao Centro Cultural Olga Cadaval - onde decorreria a sessão de apresentação de um sistema de segurança para táxis – não demora mais do que três minutos. *
Em qualquer país civilizado seria a coisa mais natural estacionar ali os carros os carros oficiais e privados e, como era o caso, em circunstância que não determinava a adopção de especiais medidas de segurança. Mas não em Portugal, não em Sintra onde vinga a atitude habitual, pacóvia e de mau gosto [que a foto testemunha]. O efémero poder instituído estaciona os Mercedes ao desbarato, sobre a calçada à portuguesa, enquanto motoristas esperam que Suas Excelências se despachem dos respectivos cuidados para, um pouco mais tarde, as levarem aos importantíssimos destinos.
Naturalmente, não faço reparos aos industriais de carros de aluguer nem aos gerentes da empresa de telemóveis, também envolvidos no encontro, que terão seguido o exemplo dos representantes do Ministério da Administração Interna, da Câmara Municipal de Sintra, da PSP de Sintra, permitindo-se ofender quem não tem outro remédio senão pagar os impostos que cobrem as despesas de tão lamentáveis despropósitos.
E nem sequer me pronuncio quanto ao desrespeito à memória de Francisco Sá Carneiro e da Senhora Marquesa de Cadaval ali homenageados a título perpétuo. Se a falta de nível tem limites, o abuso é perfeitamente intolerável!...
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* Na maior parte dos casos, poderia evitar-se o entupimento a que Sintra fica sujeita quando há espectáculos no Centro Cultural e os carros são caoticamente arrumados por ali à trouxe-mouxe. Já não sei que mais fazer, chamando a atenção à PSP, à Junta de Freguesia, à Câmara Municipal e à SintraQuorum para a vantagem da conjugação de esforços no sentido de indicarem este parque aos espectadores…
Como a falta de civismo é o que se sabe e a iliteracia atinge níveis incomportáveis, não admira que, na Estefânea, em tais alturas, a situação seja altamente perigosa. Sem autoridade a funcionar, não disciplinando os comportamentos abusivos, fica instalado um regime residual de insurreição que parece ninguém incomodar. Num quadro de terceiro mundo, não quero assumir o cargo de pitonisa de serviço. Mas estou cansado de avisar para inevitabilidade da ocorrência de sérios incidentes. É tão frustrante…"
Fim da transcrição
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Bem, como sabem, até hoje, nada mudou. Absolutamente nada! Tanta falta de operacionalidade, tanto desinteresse pela qualidade de vida dos munícipes, tanta arrogância atingem uma escala inqualificável.
Por isso hão-de perdoar que, há alguns dias, tivesse sorrido perante uma das propostas saídas do encontro-jantar que a Alagamares promoveu para debater matéria afim da alteração do Plano Director Municipal. Relacionava-se o alvitre com o aproveitamento do parque de estacionamento que circunda o edifício do departamento do Urbanismo, na Portela.
Como costuma dizer-se, para esse peditório já eu contribuí não sei quantas vezes... Só para terem uma ideia do desconchavo, conservo em meu poder uma carta datada de 14 de Março de 2006 do Senhor Dr. Nuno Fonte, Chefe do Gabinete do Exmo. Senhor Presidente da Câmara, em resposta a uma que remeti em Novembro do ano anterior, através da qual me informava "(...) que foi pedida a avaliação do Senhor Vereador Luís Duque, assim como um pedido de articulação entre a Sintraquorum e a Emes (...) visando os dias em que decorrem eventos no Centro Cultural."
Pela leitura do artigo supra, verificarão que propunha o estacionamento das viaturas dos espectadores dos eventos no Centro Cultural Olga Cadaval no parque em questão que, como sabem, fica a duzentos metros, do outro lado da linha. Claro que as minhas diligências remontam muito antes ao ano de 2005, praticamente à altura em que me apercebi que o CCOC, entre outros graves defeitos de concepção, também não seria dotado de parque de estacionamento. Enviei cartas para todas as entidades envolvidas, desde a força policial e bombeiros, à Câmara, à Junta de Freguesia, à Sintraquorum. E ninguém mexeu uma palha...
Lamentavelmente, a situação em nada se alterou. Os responsáveis do costume estão todos descansados e fazem muito bem as suas digestões. Entretanto, por exemplo, no Bairro das Flores, deixou de viver um casal com uma criança asmática que, certa noite de espectáculo no Olga Cadaval, não conseguia saír de casa, para ir socorrer o filho ao hospital, porque o seu carro que estava completamente atranvancado por outros automóveis. A mãe da criança promoveu abaixo assinado e tudo o mais e nada se resolveu...
Não só nessas noites de espectáculo, naquele bairro e ruas vizinhas, Praceta Francisco Sá Carneiro, na Rua Câmara Pestana, é tão caótico o estacionamento que, se ocorrer algum sinistro, uma viatura de socorro, pura e simplesmente, não consegue passar. Aliás, como não podia deixar de ser, já aconteceu. Se, porventura, também houver um velório nas capelas mortuárias da igreja de São Miguel, o perigo é altamente potenciado. Entretanto, o parque de estacionamento que circunda o edifício do Departamento do Urbanismo fica deserto, vazio...
Que irresponsabilidade é esta? Que gente é esta? Como pode isto aturar-se? Como pode perpetuar-se uma situação destas cuja solução, afinal, é tão fácil, tão expedita?
terça-feira, 11 de novembro de 2008
Artigo publicado no Jornal de Sintra em 17.02.06
"Vale da Raposa,
estacionamento em debate
A anunciada intenção de apresentar um projecto para a construção de um parque de estacionamento no Vale da Raposa, quanto mais não seja, tem o mérito de suscitar a conveniente reflexão acerca da questão crucial do estacionamento na sede do concelho.
Na verdade, oportunidades não têm faltado no sentido de concretizar uma séria atitude de discussão do assunto. Por exemplo, o caso da Volta do Duche e a luta que mobilizou tanta gente em Sintra no fim de 2001 - ao ponto de ser considerado, em 12 de Abril de 2003, pelo Semanário Expresso, como um movimento exemplar de cidadania - deveria ter sido aproveitado para desencadear o correspondente debate das ideias em jogo. Infelizmente assim não aconteceu.
Apesar do êxito subsequente ao envolvimento cívico de cidadãos nas manifestações públicas, dos abaixo-assinados com milhares de assinaturas de nacionais e estrangeiros, da participação dos mais destacados nomes da arquitectura paisagista portuguesa, de artistas, escritores, ambientalistas, intelectuais em geral, não houve capacidade para, posteriormente, levar a cabo o resto do trabalho, ou seja, discutir, fazer luz, que permita participar lucidamente na decisão.
Como já escrevi noutra oportunidade, deste pecado não se penitencia o Jornal de Sintra que ao assunto tem dispensado grande atenção. No que individualmente me respeita, a estas páginas tenho tentado trazer uma opinião que privilegie soluções globais, não contemplando qualquer estratégia casuística. Pelo contrário, impõe-se, ninguém duvide, uma actuação integrada que tenha em consideração todas, mesmo todas, as diversas componentes em presença.
O que está em causa
Isto não significa apenas o equacionar do estacionamento em parques periféricos, não só articulado com bolsas de pequena e média dimensão mais próximas do centro histórico mas também com o parqueamento das viaturas de residentes e comerciantes. Se assim fosse ou estivesse a ser pensado, já nos poderíamos dar por muito felizes… Seria sintoma de uma abordagem minimamente abrangente que, até hoje, nem sequer anunciada foi.
Infelizmente, é sabido como, em geral, a falta de preparação da classe política, a sua proverbial incultura, por um lado, a obediência a interesses de caris partidário e o calendário político, por outro, têm constituído sérios obstáculos à concretização das únicas e correctas práticas de administração da coisa pública que conheço capazes de erradicar o espírito de capelinha instalado nos serviços. Todavia, trabalhar integradamente, com diversos pelouros envolvidos, em perfeita coordenação, não faz parte da nossa cultura mas revela-se absolutamente vital.
Efectivamente, a situação de Sintra está de tal modo inquinada, atrasada e obsoleta que são indispensáveis outras medidas simultâneas, de inequívoca afinidade, decorrente dos diagnósticos de situação que apenas permitem ter a análise sistémica como paradigma. E, caro leitor, qualquer rápido exercício de análise sistémica, não poderá deixar de levar à conclusão de que as várias modalidades previsíveis de estacionamento que facilitem o acesso à sede do concelho e ao seu centro histórico, igualmente pressupõem:
- a mais íntima relação com um sistema integrado de transportes públicos;
- operacionalização de um regime civilizado e expedito de distribuição de mercadorias, com cargas e descargas em horários adequados;
- alteração profunda dos fluxos de tráfego, actualmente labirínticos, perigosos, psicológica e economicamente desgastantes;
- a restrição de circulação em determinadas vias que passariam a estar condicionadas a veículos de emergência, táxis, residentes e comerciantes.
Já tantas vezes me pronunciei, (JS, 20.12.02, 31.01.03, 17.04.03, 17.11.03, 28.11.03, 18.06.04, 24.09. 04, 04.03.05, 09.09.05, 09.12.05, só para mencionar alguns dos artigos publicados neste jornal) até com certo detalhe, acerca de cada um daqueles quatro items de intervenção articulada, que me reservo para futuros contributos durante as sessões de esclarecimento e debate a concretizar no próximo futuro. Inevitavelmente, tanto quanto me parece, tais reuniões deverão contar com a presença empenhada dos presidentes das Juntas de Freguesia da AFRESINTRA uma vez que o assunto também é deles.
Acabo de ter um contacto com o Presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria e São Miguel durante o qual Eduardo Casinhas se mostrou profundamente empenhado na iniciativa de promover a discussão do problema do estacionamento na freguesia e, portanto, também disponível para a abordagem das intenções objecto do projecto para o Vale da Raposa que referi haverá que o diálogo democrático não resolva.
na semana passada.
Pedagogia cívica
Apesar de ter sido anunciado de modo que não evitou a natural reacção de rejeição dos cidadãos habitualmente preocupados com este tipo de questões, o projecto não pode deixar de merecer atenção. Não pode nem deve ser hostilizado pelo que, tê-lo na devida consideração, há-de constituir oportunidade para fazer a pedagogia de quem ainda não adquiriu as certezas dos que, à partida, recusam liminarmente qualquer possibilidade da sua realização.
É o momento de todos quantos se sentirem mobilizados aparecerem no ciclo de reuniões que Eduardo Casinhas vai anunciar proximamente. Autarcas, técnicos, representantes das associações, cidadãos munícipes de Sintra, em geral, fregueses de Santa Maria e do bairro da Estefânea, em particular, sociólogos, comerciantes, arquitectos paisagistas, engenheiros do ambiente, professores e alunos das escolas, todos aprendendo e, com todos, partilhando as decisões.
Há muita discussão a fazer. Há muitos argumentos a confrontar, mas à volta da mesa, de tal modo que não seja necessário ir para a rua fazer valer a força da razão, como o foi, no caso da Volta do Duche. Vamos evitar as lamentáveis consequências da inabilidade política da autarquia que, em 2001, apresentou um facto irremediavelmente consumado, sustentado por uma solução altamente polémica. Por muito polémicas que, actualmente, as propostas se apresentem, nada haverá que o diálogo democrático não resolva. (...)"
(continua)